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sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Entaniversários 2022

 Poderia estar no Aurélio (lá venho eu com definições homéricas):

beatle                          
S. m. Ingl.
 1.      qualificativo aplicado a apenas quatro seres humanos
 2.      no plural, entidade especial que se materializou no planeta para compor, cantar, tocar, encantar e mudar o mundo da música, ou melhor, o mundo, sobre os quais frequentemente se ouve falar, em celebrações de aniversário de seus feitos inigualáveis.

Tudo bem, a definição pode ser exagerada, mas vira e mexe aparece nos jornais uma reportagem com manchetes em letras garrafais:
Neste mesmo dia/mês, 10n anos atrás, os Beatles faziam alguma coisa!
(lançavam um disco, davam uma declaração bombástica, abriam uma loja psicodélica, lançavam um novo selo no mercado, tiravam férias nas Bahamas, contratavam uma orquestra para acompanhar rock’n roll, ganhavam um título de Membro do Império Britânico, insultavam Imelda Marcos, reclamavam dos impostos cobrados pela Rainha, levaram um soco de Cassius Clay, faziam uma jam session com Elvis Presley, tomavam banho no mar de Miami, iam ao cinema, comiam pipoca, sei lá!)
Então, surge mais uma definição do Aurélio, desta vez, na versão Homerix:
entaniversário                          
S. m.
múltiplo de dezenas de aniversários (10n anos, sendo 'n' mínimo de 4, máximo de 9), traduzindo, quarENTA, cinquENTA, sessENTA, setENTA, oitENTA, novENTA anos. 
O último Entaniversário celebrado por mim, aliás, eu diria, lamentado por mim, foi justamente o fim, infelizmente, sim!

Era abril de 2020, quando o mundo se lembrou dos 50 anos sem Beatles, e lembrou da declaração de Paul anunciando o fim da maior banda de todos os tempos, como se fosse ele o mentor de tudo: na verdade, o fim era inevitável, seja por causa da vontade de cada um desenvolver seu trabalho individual, seja por causa de John (talvez influenciado por Yoko), enfim, sempre haverá controvérsias. O sonho de colocá-los juntos novamente acabou com a partida de John, em 1980 e de George, em 2001. Agora, só mandando Paul e Ringo para tocar no céu (ou no inferno, como queriam alguns mid-western americanos, quando Lennon disse que os Beatles eram mais populares que Jesus Cristo!). Desde 1970, a imprensa mundial e em especial, a inglesa, cisma em tentar identificar um grupo sucessor para preencher “o vazio”. Mais ou menos como a imprensa brasileira sempre tentou encontrar um Novo Pelé. Novos Beatles, impossível, afinal aquilo foi uma conjugação cósmica de talentos, num momento astral que dificilmente se repetirá. E mesmo que algum grupo chegasse perto, em talento, em musicalidade, em canções inesquecíveis, seria impossível repetir o que conseguiram, em qualidade e quantidade.
Houve um mais recente, mas eu não celebrei. Em agosto de 2020, alguns celebraram os 60 anos dos Beatles, pois foi naquele mês de 1960 que John pensou nesse nome e o adotou para sua banda. Ocorre que, àquela época, Ringo não estava na banda ainda. Portanto, em minha opinião, ainda não eram The Beatles. Os 60 somente ocorrerão em agosto de 2022.
 Bem, na verdade, nada é final quando o assunto é Beatles: logo começará a rodada dos sessentinha, claro! Aliás, ela já começou: no dia 6 de julho de 2017, todos nos lembramos do sessentenário d’O Dia em que John encontrou Paul’, o que certamente daria nome de filme, até já teve, com o nome Nowhere Boy (LINK). John, em sua costumeira modéstia, desde pequeno sabia que seria grande. Sempre foi o líder dos grupos em que se metia, para o bem ou para o mal. E líder ele era dos Quarrymen, uma banda de adolescentes ingleses que tocavam skiffle e rock em variados lugares de Liverpool, inclusive em pátios de igrejas. E foi num pátio de igreja, naquela tarde de verão, que ele foi apresentado a Paul por um amigo comum. Paul mostrou na guitarra seu conhecimento sobre o rock americano e também trechos de composições suas. De imediato, John percebeu que estava diante de  “um igual”. Nas 24 horas seguintes, ficou matutando, com seu imensurável ego, o dilema de continuar como estrela solitária ou deixar seu brilho ser ofuscado pela presença de um outro talento no grupo. Quiseram os deuses que ele optasse pela última, e assim criou-se a semente do sucesso dos Beatles.
Agora, continuará a onda dos 60. Não vi celebrações das idas do grupo para Hamburgo, entre 1960 e 1961, quando eles eram cinco, ainda sem Ringo, que ainda nem sonhava que tipo de vida teria pela frente. Lá na cidade portuária alemã, eles realmente tiraram sangue para tocar ao vivo, 7, 8 horas seguidas por noite, movidos a estimulantes, e desenvolveram seu incomparável carisma e qualidade de desempenho, deixando-os a anos-luz das outras bandas de Liverpool. Até fizeram uma matéria no dia 6 de novembro de 2021, sessenta anos depois que Brian Epstein foi ver um show deles pela primeira vez, este sim, um momento importante, meio escondido no Cavern Club (se é que poderia, com seu impecável terno em meio a jovens com jaquetas de couro).
Nesse período de entresafra de fatos beatle em conjunto, um momento foi lembrado, e um outro será, ambos com o lado triste da coisa, e saindo um pouco dos “enta”:
1.         Em 8 de dezembro de 2020, o mundo lamentou 40 anos de partida de John Lennon deste plano espiritual, de forma torpe, assassinado com vários tiros pelas costas, por um fanático, quando chegava ao edifício onde morava em New York, após uma sessão de gravação daquele que acabaria sendo um álbum póstumo, cuja canção principal era “Just Like Starting Over”, retratando sua volta ao mundo público, após cinco anos de vida privada para dedicar-se a seu segundo filho. Uma notícia que abalou o mundo: a maioria das pessoas se lembra do que estava fazendo quando a ouviu;
2.         Em 29 de novembro de 2021, foram lembrados os 20 anos sem George Harrison, que perdeu a batalha contra um câncer no cérebro, que já combatia há anos, e inspirou a canção título de seu último álbum, “Brainwashed”, aliás, excelente; uma notícia menos traumática que a do companheiro, por ele ter partido por causas “naturais”, porém muito lamentada pelo mundo beatle, já que ele era uma pessoa espiritualmente elevada, e mesmo sendo “The Quiet Beatle”, sempre abriu a boca pelas grandes causas, sempre procurou fazer o bem. E criou muito bem, também, a grande maioria dos solos de guitarra beatle, entre eles, o mais melodioso de todos os tempos, em Something.
Além destes, sempre celebramos os entaniversários de vida dos dois Beatles que sobraram por aqui:  os 80 de Ringo, foram em 7 julho de 2020 e o de Paul, será em 18 de junho de 2022. E que depois venham os 90 e passem dos 100 anos...... Eles têm que compensar a partida prematura dos outros dois e testemunhar a continuidade de sua obra.
 Voltando aos momentos notáveis como grupo, a mídia vai certamente registrar, no primeiro dia de 2022, o sexagésimo aniversário da rejeição dos Beatles pelo burocrata de plantão da gravadora Decca Records, que ouviu um teste ao vivo dos rapazes, e sacramentou, impávido: "Esses grupos com guitarras estão com os dias contados!". Claro que o "gênio" se arrepende até hoje, apesar de ele estar intrinsecamente certo, pois os dias estavam realmente contados: só que o contador já está em 21.915 e segue crescendo! Felizmente, para a sua história, o acaso deu-lhe uma segunda chance, e ele pôde se redimir, e contratou uma outra banda que fez um teste por lá, cujo nome lembrava algo como “Pedras Rolantes”!!
  E virá 5 de outubro de 2022 quando o mundo celebrará 60 anos do nascimento oficial dos Beatles, com  seu primeiro compacto (com “Love me Do” e “P.S. I Love You”), que conseguiu chegar ao 17º lugar na parada nacional inglesa, feito nunca antes alcançado por nenhum outro artista em sua  estréia.
  Talvez 2023 passe em branco, quem sabe uma rápida menção aos sessentinha do lançamento do primeiro LP “Please Please Me” e o tempo recorde de sua gravação, um LP inteiro em apenas um dia, mas 2024 virá com toda força, com o sessentenário da invasão beatle na terra de Tio Sam, com os shows de Ed Sullivan, e do lançamento do filme “A Hard Day’s Night”, aqui lançado como “Os Reis do Iê Iê Iê”, ainda hoje considerado um marco do cinema mundial.
  E por aí irá, 2025, com os 60 anos de “Help” e “Rubber Soul”, 2026 com “Revolver”, todos álbuns antológicos, tornando-se respeitáveis sessentões, e, chegará o ano da graça de 2027, com “Sgt. Peppers’ Lonely Hearts Club Band” e "Magical Mistery Tour", o filme e o disco, e depois, 2028 celebrando um sexagenário Álbum Branco além do filme Yellow Submarine, e 2029, como o último ano produtivo da banda virando idoso, com três momentos: os álbuns Yellow Submarine e Abbey Road e a foto icônica da capa deste último, que também será celebrada.
  Um ciclo se fechará com os 60 anos do lançamento de Let It Be, em 2030, mas certamente não parará por aí. Depois dos 60, virão os 70 e depois os 80, e assim por diante, até que chegarão as comemorações centenárias, então pode ser que já sem a presença de nenhum beatle nesta dimensão, tomara que não. Paul e Ringo já deverão estar lá, juntos a John e a George, observando o “estrago” maravilhoso que fizeram em sua passagem pela Terra. E a gente também lá, quem sabe, vendo os filhos (já passei a bola para os meus!), netos e bisnetos ainda embevecidos pelo inebriante som, e contribuindo para a permanência do mito!!!
    Não há dúvida de que o fenômeno veio pra ficar .... para sempre.
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A partir de agora, um pouco mais de detalhes de algumas da celebrações que virão!

  Em 2027, chegará a vez de celebrar o sessentão “Sgt. Peppers”, o mais-que-notável marco da música mundial, aquele divisor de águas, do antes e do depois. Houve festas mundiais em homenagem ao notável disco, lançado em junho de 1967. Esqueceram-se, entretanto, de notar o quadridecênio (!) da morte do empresário Brian Epstein, que ocorreu apenas 2 meses depois, numa overdose adicional de soníferos, o que, queiram ou não, contribuiu decisivamente para o fim da banda, pois tiveram que tocar o negócio sozinhos. Não entendiam da coisa, Paul se destacou como líder, o que gerou o desconforto de John (ah, o ciúme!), e por aí foi, até que caiu a última gota, a japonesa que virou a cabeça deste último, conseguiu o que queria, e transbordou o copo.
  A imprensa poderá deixar passar despercebido (mas eu não deixarei de registrar) no Natal de 2027, o sexto “entaniversário” da última mensagem de Natal dos Beatles!!!! Surpresa? Explico: desde 1963 (por sugestão de Brian Epstein, claro) os Beatles gravavam uma mensagem de Natal que era direcionada somente aos membros do fã-clube oficial, sempre simpática e bem-humorada. Na última, além da mensagem, gravaram uma canção, da autoria dos quatro, coisa raríssima, chamada “Christmas Time (is here again)”. Ela teria morrido na lembrança dos fanáticos que ouviam discos-pirata, não fosse o projeto Anthology, que a encontrou nos arquivos da EMI e a lançou em 1995 como Lado B de “Free As a Bird”, aquela canção mixada com o além (voz e violão de John, que Paul, George e Ringo adicionaram arranjos, composição adicional e outros instrumentos). Simplezinha mas bonitinha, “Christmas Time ...” é bem melódica, e é uma oportunidade de ouvir a excepcional harmonia vocal de John, Paul, George, Ringo, os quatro cantando juntos, também coisa rara.
    Em julho de 2028. o filme “Yellow Submarine” também tornar-se-á sexagenário. O projeto, que pegava o clima de “Sgt. Peppers” e algumas grandes canções, colocou os quatro Beatles em um desenho animado, numa aventura non-sense fenomenal. Numa falha de avaliação dos Beatles (não foi a única!), eles não acreditavam no projeto e não aceitaram colocar suas próprias vozes. Acabou não fazendo falta, pois colocaram dubladores excelentes e com vozes bem parecidas com os originais, e o resultado global ficou tão bom, que os Beatles adoraram, se arrependeram e acabaram gravando, ao vivo, uma cena final muito simpática e engraçada. O desenho é cultuado como revolucionário, e celebrado até hoje. 
Em novembro de 2028, os jornais celebrarão os 60 anos do lançamento do álbum “The Beatles”, mais conhecido como “White Álbum” (no Brasil, “Álbum Branco”), inédito álbum duplo na carreira deles, inédita capa absolutamente branca apenas com o nome em alto-relevo – no vinil (logo após outra inédita capa, absolutamente lotada de personagens, cores e figuras, que fora o álbum anterior, o não menos famoso “Sgt Peppers”), inéditos encartes com fotos tamanho família dos rapazes (àquela época, já nem tanto), inédita canção de Ringo Starr (primeira a ser permitida pelos donos da banda, Lennon/McCartney), inédita canção experimental de John Lennon, inédito solo (entre os melhores do mundo) executado por um convidado ilustre, inédito “hard rock”, e mais um nem-um-pouco-inédito primeiro lugar em todas as paradas do planeta. Foi o álbum em que ficou patente o começo da divisão: cada beatle chegava com sua composição e praticamente contratava os outros três para tocar instrumentos e prover backing vocal, com pouquíssima influência importante. Nada o que reclamar da celebração, mais que merecida, mas apenas da data em que os festejos começaram, quase seis meses antes do aniversário correto: afinal, o disco foi lançado em novembro de 1968. Entretanto, dá pra entender a expectativa, afinal, tudo o que se refere aos fab four desperta muita atenção, ainda hoje.
           Mais marcante ainda será esperar os jornais de 30 de janeiro de 2029, quando certamente estará estampado nas manchetes .......
    Há 60 anos, os Beatles fizeram sua última aparição ao vivo.
..... lembrando o antológico, e infelizmente curto, concerto realizado no terraço do edifício em que ficavam os estúdios da Apple, em Savile Row, quando cantaram, de maneira primorosa, além de outras, "Get Back", "Don't Let Me Down”, e "One After 909", desconhecida música do começo da carreira, causando um tumulto sem par nas ruas circunvizinhas, até que foi interrompido pela polícia. As imagens daquele show, felizmente registradas, permanecem vivas na memória de muita gente
      Em setembro de 2029, será a vez dos “sessentanos” do lançamento de “Abbey Road”, para mim e para muita gente (incluindo George Martin, o grande arranjador), o melhor disco beatle, infelizmente seu último trabalho juntos: ali estavam “Something”, “Come Together”, “Oh! Darling!”, “Here Comes The Sun” e, além de outras, o imbatível medley “Golden Slumbers / Carry That Weight / The End, com John, Paul e George fazendo um duelo de guitarras, e o único e melódico solo de bateria de Ringo em disco beatle oficial. Além do disco em si, os jornais darão destaque a uma outra data, anterior, mais precisamente o 8 de agosto, quando uma notória fotografia atinge a marca. Depois de desistirem de ir ao Himalaia para tirar uma foto para a capa do disco, que tinha Everest entre seus nomes prováveis (uma mensagem de que haviam chegado ao topo do mundo? Não, apenas era a marca de cigarros que alguns fumavam à época!), naquele belo dia, os Beatles resolveram, naquele belo dia de verão, economizar uns trocados: vamos simplesmente sair do estúdio e atravessar a rua! Doce decisão! Foi o estopim para o surgimento da capa de disco mais famosa de todos os tempos, mais uma capa beatle cheia de mitos, e muita história pra contar. Sim, talvez a foto da capa seja muito celebrada: afinal, trata-se da única faixa de pedestres com notoriedade mundial, ponto de turismo obrigatório!!
    

Strange New Worlds vem aí!

Olha, eu sinto dizer que estou atordoado.... quero publicar tantas coisas, mas eu sei e=que é incompatível com a velocidade de assimilação dos amigos, todos envoltos em seus afazeres.....

Agora por exemplo, eu estava a escrever a reação que tive a um excelente Cartão de Visitas de um novo WApp Beatlemaniac Friend, e que, claro, me instigou a escrever mais a a registrar no blog, quando chegou minha filha dizendo 

"Pai, você TEM que ver ISTO!!"

Ela tinha razão..... mas até pra contar, requer um preâmbulo, para deixar todos num mesmo patamar, mesmo que seja very light..... só que requer que eu volte muito no tempo, até o Big Bang de mais um dos fenômenos que eu acompanho em meu blog....

Leonard Nimoy e Jeffrey Hunter
Jornada nas Estrelas teve dois episódios piloto lááá em 1967. O primeiro, chamava-se The Cage, já era a Enterprise, mas o Capitão se chamava Pike, E Spock já existia mas ainda não era o Oficial de Ciências da Nave, logo abaixo do Capitão. Ele era então o Ensign, uma espécie de Alferes. A Imediato de então, era uma mulher, de quem nunca ficamos sabendo o nome, apenas se referiam a ela como Nº1... Neste piloto, Spock sorri, e esse fato é um tabu para nós, trekkers, existem teses de mestrado e doutorado sobre o sorriso de Spock, e ele volta a fazê-lo umas poucas vezes na Série Original, por motivos diversos e justificáveis, mas o que se sabe dos Vulcanos (que era a origem do Spock) é que eles têm o controle absoluto de suas emoções, levando sempre à conclusão de que sorrir é desnecessário e ilógico.

Por incrível que pareça, esse excelente filme piloto não agradou, e fizeram outro, chamado Where No Man Has Gone Before, aí já com Capitão Kirk no comando e com Spock já como o Oficial de Ciências, os dois sempre se digladiando, a lógica deste com o ímpeto daquele, com vitórias de lado a lado, sendo o mais emblemático duelo intelectual da série toda, e chego a dizer da história da televisão...

Majel Barret Nº1
A Posição Nº1 não existia mais nesse 2º Piloto, e quero crer que foi uma decisão machista... poder demais para uma mulher .... a atriz que fez a Nº1 no 1º Piloto foi aproveitada na série, mas em uma posição inferior, virou enfermeira, mas voltou em várias outras oportunidades da franquia, inclusive casou-se com o criador da série e ficou conhecida como Star Trek First Lady. Seu nome era Majel Barret.

Terminou a Série Original, vieram os 6 filmes com a tripulação original e veio A Nova Geração e mais 4 filmes com esta tripulação, e vieram mais séries, Star Trek: Deep Space 9, e Star Trek: Voyager, e Star Trek: Enterprise, com um capitão pré-Pike, e vieram mais 3 filmes com a tripulação original com Novos Kirk, Spock e Cia na nova Kelvin Timeline, em que o Planeta Romulus é destruído. E, claro, veio, mais recentemente, Star Trek: Discovery, em 2018, acho. Na Timeline do futuro, ela se passa ainda na época da Enterprise do Capitão Pike, e na 2ª temporada (já está na 4ª, o sucesso é sempre enorme) aparece o novo Spock, interpretado magistralmente pelo neto de Gregory Peck, Ethan.

Ethan Peck, Anson Hunt e Rebecca Romijn
A participação de Spock e de Pike termina na 3ª temporada de Discovery, mas os atores que os interpretaram  fizeram tanto sucesso, que os produtores criaram e vão lançar uma nova série ... não perca a conta, acho que já são umas 10, se contarem até as de desenho animado que surgiram... um sucesso intergaláctico. E vem também a nova Nº1 que aparece rapidinho em uns episódios de Discovery. Ela se chama Star Trek: Strange New Worlds, e finalmente chegou o ponto onde eu queria chegar.... agora estamos no mesmo patamar!!!

Então, a série se passa alguns anos antes da chegada de Kirk ao comando da Enterprise, e deve ir até o acidente que aleijou Pike... sim, já sabemos de tudo ... já vimos tudo .... lá na Star Trek: Série Original.... enfim... o que a Renata me mostrou foi um episódio de Short Trek (que é uma série de teasers sobre o que vem por aí) que mostra a chegada do Alferes Spock à Enterprise, sendo recepcionado pela nova Nº1.... Gente, são 5 minutos de um dos melhores diálogos que eu já vi em minha vida.... claro que fica melhor com a gente sabendo das origens de todos, mas eu procurei ajudar, contando do sorriso de Spock.. Os produtores, na verdade o roteirista criou uma situação que possibilitou a descrição da origem sensacional para o movimento facial do nosso querido gênio da ciências... Eu ri alto, e cheguei a chorar algumas vezes!!!!

Só não sei como fazer para que vocês vejam.... mas vou descobrir!!!

quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Restrospectiva das Retropectivas

Um leitor me disse: 
Eu passo tranquilamente 
sem o show do Roberto Carlos, 
ou sem Simone com "Então é Natal", 
mas não dá para passar um fim de ano 
sem o resumo do Homerix no final.
Afinal, eu acostumei mal todo mundo... 

O XY da figura variou de 07 a 15, depois, desanimei... até porque fiquei desanimado a fazer rimas bem-humoradas sobre política, principalmente.

Neste ano, ainda sem clima para isso, nem inspiração. Um ano em que a relação Bom/Mau fica na base do 10/90 não merece ser exaltado... na prática, as únicas coisas boas foram a vacina redentora e o documentário também redentor Get Back, dos Beatles... E a política segue não me animando... muita gente boa morreu ... muita gente ruim segue por aqui ... meu time quase caiu ... e ainda termina com enchente centenária... e fica difícil arrumar rima pra ômicron...

Portanto, XY não terá o valor 21.

A produção de 2007 a 2015 foi bastante profícua, e deixo aqui a vocês o acesso a todas elas. Teve uma que teve 100 estrofes!

Então, aí está ela, a retro das retro, um resumo do que fiz ao longo de nove anos, mas nada nos últimos seis. Quem quiser recordar na íntegra, é só clicar título de cada uma, numa combinação 20XY: Z estrofes


Nas ruas, bandidos insanos,
Revolta, choro e tormento!
Pra eles, direitos humanos?
Ou mais Capitão Nascimento?


A boa nova vem do grande irmão:
A black brother in the White House.
Um recado para a administração
Que deixou o mundo no caos!


Zelaya exilou de pijama
Mas aqui ganhou guarida,
E veio inscrever sua cama
No programa Su Casa, Mi Vida

No que depende de mim,
Seja você ele ou ela,
Que tenha saúde sem fim
Em meio a uma vida bela!


O cinema de Hollywood
Teve um ano especial!
Assisti o quanto pude,
E fiz cobertura total!



Foi fraca a  televisão.
Só bombou Avenida Brasil!
Teve Nina, Carminha e Tufão,
Com audiência febril!


Teve um Paulo, um Pedro, um Alberto, um Renato, um Fernando, nomes comuns que produziram números incomuns, como R$ 23 milhões, como US$ 97 milhões, como R$ 423 milhões, como R$ 10 bilhões, ....


2015: Não foi poema nem prosa, mas um ensaio sobre conhecimento
Foram seis descobertas da maturidade, uma delas transcrevo aqui

SEI DESDE CRIANÇA

       QUEM inventou o rádio,
      QUEM inventou o avião, 
      QUEM inventou a lâmpada,
      QUEM inventou o telefone,
      QUEM inventou a dinamite,
      QUEM inventou a imprensa,
      QUEM inventou a alavanca,  
      QUEM inventou o paraquedas,
      QUEM decifrou a equação do amor,
      QUEM elevou a hipotenusa ao quadrado,

MAS SÓ AGORA EU SEI

      QUEM inventou o vento estocado!!!





quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

The Beatles' 1963 - A chegada da Beatlemania - The Book

The Beatles' 1963 - A chegada da Beatlemania

The Book

Como viram, os Beatles terminaram 1962 na estrada, e o último dia do ano coincidiu com o último dia de show da última de quatro excursões a Hamburgo, lugar que foi fundamental para eles ganharem aquela cancha de palco. As últimas duas, já com Ringo no time, e portanto, já sendo The Beatles, como eu considero, foram no Star Club, e as gravações daqueles shows foram captadas e lançadas em disco de baixa qualidade quase 30 anos depois, e foram objeto de ações judiciais. Mas isso é papo pra outra hora! O que importa, agora, é que abriram 1963 voltando pra casa, e logo no dia 3, já estavam na estrada para quatro shows na Escócia, e no dia 10 iniciaram a excursão de inverno pelo Reino Unido embrenhando-se numa maratona de 51 shows em 58 dias, entremeada por eventos notáveis. 

Por exemplo, no dia seguinte, um inesquecível 11 de janeiro, enquanto tocavam no Cavern Club em Liverpool na hora do almoço, e pegavam a estrada para Old Hill (na Inglaterra central) para um show à noite, era lançado em Londres aquele que seria o 1º compacto com uma canção Nº 1 dos Beatles, Please Please Me, tendo Ask Me Why no Lado B. As duas canções haviam sido gravadas ainda em 1962, no dia 26 de novembro, quando um sorridente George Martin profetizou, ao final da sessão: "Parabéns! Vocês acabaram de gravar seu primeiro Nº1!!"... além de Maestro, Pitoniso!  

Em seguida, vamos aos detalhes de suas composições, sua composição, interpretação da letra, identificação de sua estrutura e fatos importantes sobre sua gravação, e eventualmente, breves fofocas, porque ninguém é de ferro...

Antes de apresentá-las, entretanto, vou apresentar aqui o critério para sua numeração. Verão que Please Please Me ganhou o Nº 3 e Ask Me Why, o Nº 4. Por quê? Porque é a ordem de lançamento de canções no catálogo oficial da EMI no Reino Unido. Então, Love Me Do foi a Nº1 e P.S.I Love You foi a Nº2. E quando vier o primeiro álbum "Please Please Me", a canção I Saw Her Standing There será a Nº 5, e subindo com as canções inéditas do Lado A, e depois passando às inéditas do Lado B e assim por diante, compacto a compacto, LP a LP, até chegar à canção Nº 211, que é a última canção do Lado B de Let It Be, último produto lançado pelos Beatles. Então, quando esta fase da saga terminar, todos teremos associado um número a cada uma das 211 canções lançadas pelos Beatles em sua incrível carreira!! Eu acho isso ótimo!! E não me lembro de ter visto alguma classificação desse tipo por aí!

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E vamos ao 2º Compacto dos Beatles, lançado em 11 de janeiro de 1963

3. Please Please Me  (by John Lennon)

John discute o relacionamento: "Eu faço todo o agrado com você, é tão difícil te persuadir. Oh sim, por que você me deixa triste?"
John adorava o fato de a mesma palavra (Please) ter significados diferentes, e as colocou logo no primeiro grande sucesso dos Beatles "Por favor (Please) me agrade (Please Me) como eu agrado você!" e decerto também pensou na conotação sexual da troca mútua de agrados. John faz questão de dizer que ela é 100% dele, assim como Paul faz questão de confirmar isso. O interessante é que ela foi feita como um desafio, nos dois dias seguintes àquele primeiro encontro na EMI, portanto, 7 e 8 de junho de 1962, pois ficaram martelando na cabeça de John as palavras de Martin: '"Vocês ainda não têm material bom o suficiente para o lançamento!"... Ah, é?! Quando os Beatles a apresentaram a Martin ele logo viu que havia cutucado o Leão João com vara curta! 
 
Mas voltemos ao início. Notaram as datas acima? O 6 de junho foi o primeiro encontro de trabalho dos Beatles na EMI, ainda com Pete Best na bateria... Ringo nem sonhava que sua vida mudaria, alguns dias após aquela data histórica. Como dito, John se internou dois dias (7 e 8) em sua casa em Menlove Avenue, inspirou-se em Roy Orbison para a música, e lembrou-se de Bing Crosby na letra, uma canção em que dizia 'Listen to my pleas', associou com o verbo 'to please'. Ele utilizaria a exata fala de Crosby em Tell Me Why, de 1964.  Bem, no dia seguinte (9) chegou à casa de Paul, com a canção quase pronta e com duas garotas. Lá ficaram a noite toda, não se tem registro se fizeram algo mais além de arranjos da canção... Mas, sim, elas declararam em entrevistas que os dois trabalharam muito nela! John compôs uma canção na estrutura que seria quase padrão nos Beatles, verso-verso-ponte-verso, sem refrão. No Verso 1, John conta a um amigo (provavelmente Paul) que discutiu com a garota dele na noite anterior, e conta o diálogo que teve, terminando já com o histórico "C'mon, C'mon C'mon, C'mon C'mon, C'mon, C'mon C'monPlease please me, whoa yeah, like I please you". O Verso 2 segue a reclamação do tipo "Quer que eu desenhe"... "Preciso falar todas as vezes?", e repete o brado! Então vem a ponte, melodia diferente, com mais esclarecimentos: "Não quero reclamar, mas por que só eu preciso te agradar? Por que você me faz tão triste?". Depois, repete-se o 1º Verso. 
 
Quando a canção chegou a Abbey Road  em 4 de setembro (já com Ringo Starr a tiracolo), ela chegou lenta, mas George Martin, em mais uma intervenção notável como produtor, sugeriu, quase mandando, que se dobrasse a velocidade da canção. Paul olhou pra John que olhou pra Paul, como que pensando: "Esse cara sabe das coisas! Como não pensamos nisso!?". Martin também sugeriu a introdução e a conclusão da canção. Tem potencial esse menino!! Uma semana depois, quando ainda se discutia qual seria a canção para o Lado B do 1º compacto, os meninos mostraram a George Martin o que eles haviam evoluído durante a semana. Ele gostou mas disse que faltava algo. Sugeriu, por exemplo a harmonia vocal de Paul nas frases dos versos. Bom, esse menino! Ao final do dia, John disse que a canção era boa demais para ser um Lado B, e voltariam a ela posteriormente! Há rumores de que a versão daquele dia tinha Andy White, um baterista contratado, no comando das baquetas. Ela apareceu no Anthology 1, ouça aqui, neste LINK. Ringo não confirma nem desconfirma... ele nunca se conformou com a presença de Andy White para fazer o trabalho dele. Note ali que a gaitinha famosa ainda não está, nem as harmonias vocais na ponte, os uuu's e a resposta ("in my heart"). Elas vieram penas em novembro, quando os Beatles recomeçaram Please Please Me do zero, dedicando a ela três horas de gravação ao longo de 18 takesintroduzindo a gaita de John pra cá, modificando a guitarra de George pra ali, Ringo aperfeiçoando a bateria acolá, dando um jeitinho nas harmonias vocais perfeitas de George e Paul, e assim que terminou a sessão, Martin falou pelo microfone, lá do 'aquário' do segundo piso: “You’ve just made your first Number One!  
 
                                  Profético! 
 
Muito ajudou ao efeito uma ligação que um certo Dick James deu a um produtor de TV, tocando Please Please Me para ele ali mesmo pelo telefone, encantando o interlocutor e garantindo a participação dos Beatles no programa da TV Thank Your Lucky Stars, numa gelada noite de 12 de janeiro de 1963, um dia após seu lançamento oficial em compacto, tendo Ask Me Why no Lado B. The Beatles ganharam visão nacional e encantaram, não apenas pelas canções, mas pela aparência (os terninhos e os cabelos e os sorrisos) e carisma. Daí, a canção pegou firme o rumo do topo das paradas e o resto é história! O autor do telefonema virou o editor das canções dos Beatles, até o final da carreira. Deixo aqui este LINK de um show nos EUA, pena que o microfone de Paul estava mais baixo, mas dá pra perceber a harmonia dele e depois com George e é muito legal a bateria de Ringo!

 

4. Ask Me Why  (by John Lennon)

John se declara: "Eu te amo porque você me diz coisas que eu quero saber. E é verdade Isso realmente só serve para mostrar que eu sei que eu, eu, eu, eu
Nunca, nunca, nunca deveria ficar triste"
 
Antes de ser canção do Please Please Me, o álbum, Ask Me Why foi lançada em compacto como Lado B de Please Please Me, a canção. Era o 2º compacto dos Beatles, e o 1º a chegar em 1º lugar nas paradas da Inglaterra. Portanto, mais respeito, por favor, com Ask Me Why! Ela faz parte dos prolegômenos dos Beatles.  Pra se ter uma ideia, ela foi ainda executada na EMI com Pete Best na bateria! Era o histórico 6 de junho de 1962, infelizmente sem registro sonoro das quatro canções ensaiadas naquele dia, em que George Martin deu a entender que na sessão seguinte traria um baterista de estúdio para a gravação. John e Paul entenderam o recado e na segunda vez que adentraram aos estúdios da EMI, em 5 de setembro, quem apareceu foi Ringo Starr para pilotar a bateria em novos ensaios, e ela chegou a ser considerada para o Lado B do 1º compacto, mas acabou sendo preterida. Finalmente, em 26 de novembro, Ask Me Why foi gravada seriamente, e após 6 Takes, estava pronta, sem necessidade de nenhum acréscimo, com os Beatles em seus instrumentos tradicionais, e John Paul e George cantando e harmonizando ao vivo. 
 
Ask Me Why era complexa, tanto estrutural como musicalmente. Já era um espanto praqueles dois compositores que não não haviam chegado aos 22 anos à época de sua composição. Vejam que os acordes estavam cheios de sustenidos, menores e sétimas. 
 
E a estrutura era completa, com  Verso 1 - Verso 2 - Ponte - Refrão, repetindo os dois últimos no final.  A ideia original era de John, com Paul ajudando na letra. O Verso 1 está traduzido ali no caput, mas é importante mostrar o efeito marcante da penúltima frase do verso: "That I - I - I - I should never ever ever be blue", além de ser a segunda vez em que usavam a gíria "blue", para denotar tristeza, o que fariam em outra meia-dúzia de canções, até porque era rima fácil para "true" e "you", enquanto "sad" fazia rimas negativas, com "bad" ou "mad", hehe, apenas conjeturando. Nós simplesmente a-ma-mos aqueles quatro I's repetidos,"ai...ai ai ai ai" em português! No 2º Verso, John atesta sua felicidade, a ponto de até chorar, não porque está triste (aqui usando "sad"), mas porque ela era a primeira garota dele. Na Ponte, ele diz que ainda não acredita que aquilo aconteceu com ele e ele não concebe (esse verbo, "to conceive" é raríssimo em canções, mesmo em inglês) que volta a ficar na miséria. Aliás "misery" seria utilizada em outra canção daquele começo. Finalmente no refrão, vem o nome da canção: "Ask me why, I'll say I love you, and I'm always thinking of you", sempre pensando nela ... ah, o amor!!! 
 
Ask Me Why era parte dos shows do Cavern Club, viajou a Hamburgo, em 1962, e até foi tocada a BBC, ainda com Pete Best, sendo a primeira Lennon/McCartney ouvida pelos ingleses, depois do lançamento do compacto, ela seguiu aparecendo aqui e ali, inclusive na BBC (deixo aqui o LINK), agora com Ringo, até setembro de 1963, quando foi sua última apresentação. Note como eram capazes de fazer harmonias vocais triplas perfeitas, em diversos pontos da canção. Perceberão claramente!

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O lançamento do compacto não interrompeu, claro, a excursão de inverno, eles seguiam com sua trupe pela Inglaterra, invariavelmente composta por eles mesmos e por seus dois roadies: 
  • Mal Evans, um gigante gentil, de metro e 96, que viria a se tornar seu segurança, verdadeiro faz-tudo, pau pra toda obra, e inclusive até tocaria um que outro instrumento em gravações no futuro (inusitadas como bumbo de banda ou bigorna, ou até mesmo tradicional piano ou teclado);
  • Neil Aspinall, que além de roadie era o motorista selecionado para levá-los a todos os lugares, ambos amigos fiéis de Liverpool, que seguiram com eles até o fim da carreira, e depois!
Entre shows, hotéis e estradas, aparições em rádio e TV apareciam cada vez mais e eles não recusavam nenhuma oportunidade de aparecerem. A primeira de grande importância na TV foi no show "Thank Your Lucky Stars", da ABC TV, gravado em Birmingham logo  depois do lançamento do compacto. O programa foi ao ar, para toda a Inglaterra, numa fria noite de 19 de janeiro, em que todos estavam em frente à televisão! Ali começava a decolar o fenômeno. Em rádio, a BBC, entre outras, começou a dar mais valor aos meninos, tanto que num sábado, 22 de janeiro, receberam The Beatles para três programas em Londres, um deles o prestigioso Saturday Club, em que apareceriam muitas outras vezes.

A menção a 'hotéis' aqui em cima fez-me lembrar de uma imagem notável, que toca muito a nós, beatlemaníacos. Invariavelmente, eles ocupavam 3 quartos, em twin beds (camas de solteiro), um com os dois roadies, outro com George e Ringo, e outro com John e Paul. Era comum que os dois, cada um em seu violão, sentassem de frente um para o outro, cada um em sua cama, para comporem alguns dos clássicos Lennon/McCartney. Momento mágico, sem dúvida, inda mais pelo fato de que, pelo fato de Paul ser canhoto, as duas guitarras apontavam para o mesmo lugar do quarto, parecia que um era o espelho de outro, olho no olho, ou eye-ball to eye-ball, como eles gostavam de dizer. 

O sucesso no programa de TV fez com que os Beatles fossem chamados para acompanhar as excursões de três artistas então mais conhecidos do que eles. A primeira delas foi com Helen Shapiro. Foi num ônibus que levava vários artistas entre uma cidade e outra, que John e Paul apresentaram a Helen uma das canções que haviam acabado de de compor quarto de hotel. Ela gostou, mas seu empresário, não, mais um homem de visão... Um segundo artista integrante aceitou e gravou. Depois, os próprios Beatles resolveram gravá-la. Era Misery! Eles tiveram que interromper sua participação naquela primeira perna da excursão, que foi de 2 a 9 de fevereiro pois teriam que estar em Londres para a gravação do 1º LP, que levaria o nome daquele primeiro grande sucesso, Please Please Me. E fá-lo-iam naquele único e histórico dia!

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Viram, então, que os Beatles abandonaram uma excursão pela Inglaterra para estarem em Londres no dia 11 de fevereiro para a gravação do 1º LP. Aquele seria um dia histórico.

Quatro canções já estavam destinadas ao 1º LP, justamente as canções já lançadas em compactos, aliás, uma prática que iriam abandonando com o passar do tempo, essa de lançar em LPs o mesmo que lançaram em compactos. O que mais aconteceu dali em diante era os compactos terem vida própria!! Bem, eram necessárias mais 10 canções, uma praxe da época na Inglaterra, os LPs de pop/rock terem 14 faixas. Nos Estados Unidos, o número mágico era 12. A dupla Lennon/McCartney ofereceu 4 delas, e foram buscar outras 6 nos covers de artistas americanos que cantavam em seus shows! Pois eles gravaram essas 10 canções, e mais uma, Hold Me Tight, que acabou ficando para o LP seguinte, portanto 11 canções, TODAS NO MESMO DIA, feito não repetido nunca mais. Daí por diante, principalmente a partir de 1965, com a complexidade das canções aumentando exponencialmente, não foram poucas as vezes em que dedicavam dois, cinco ou até mais dias para a confecção de uma só canção. Em vez de 11 canções em dia, chegaram a gastar 11 dias em uma canção... O ápice seria com Sgt. Peppers, que levou quase 6 meses para ser gravado. Falando em sessões de gravação, Please Please Me teve 4, e Sgt. Pepper's, 67!!!

As 8 canções originais eram destinadas a garotas, sendo 4 declarações de amor (P.S.I Love You, Ask Me Why, Do You Want To Know A Secret e There's A Place, esta, fiquei em dúvida, mas como ele diz o famoso I Love You, deixei como canção de amor), duas em plena paquera (a inaugural Love Me Do, e I Saw Her Standing There), uma discutindo a relação (Please Please Me, a 1ª Nº1), e a última, de saudade pelo amor perdido, esta última sendo aquela que Helen Shapiro recusou, graças a seu visionário empresário. Ela deve ter ficado in Misery, quando viu a oportunidade que perdeu!

Elas foram compostas em diferentes estágios das vidas de John e Paul, mas muitas foram naquele esquema olho no olho, sentados em suas camas, com seus violões apontando para um mesmo local do quarto de hotel em que estavam, nas extensas excursões pelo interior da Inglaterra. 

Ter os Beatles como banda cover era um luxo só. Era garantia de que ela seria, no mínimo em mesmo nível (quando os autores/cantores são Chuck Berry, Little Richards ou Carl Perkins), mas na grande maioria, melhor, bem melhor que a gravação original. Eles já vinham de anos de estrada tocando rock de tudo quanto é jeito, e eram imbatíveis, tinham vigor, tinham harmonia vocal impressionante. As covers de Please Please Me não têm essa gente grande toda, mas destaco dois deles que fariam sucesso a partir de então e em décadas seguintes, os notáveis Burt Bacharah e Carole King, esta última, que era apenas compositora e passou posteriormente ao microfone, com grande sucesso nas décadas seguintes.

Nos vocais, começava, logo no 1º LP, uma prática poucas vezes desobedecida na carreira, a de conceder um posto de destaque a George e Ringo, mesmo sem terem composições para agregar, era uma exigência das fãs dos dois. No caso, George ganhou duas faixas, uma delas com uma original Lennon/McCartney, Do You Want To Know A Secret, e a outra com uma cover, Chains, justamente a canção de Carole King, em parceria com Goffin, e Ringo gravou, com maestria, uma canção que já tocava nos shows dos Beatles, Boys, de Dixon/Farrel, você conhecia? Eu, não! Aliás, essa situação se repetiu justamente na cover mais famosa de toda a carreira dos Beatle, Twist And Shout, de Medley/Russel, pois é... conhece? Não? Eu também, até prestar atenção nesse detalhe. A canção foi gravada no final da noite, com John com a garganta quase estourada, e foi em um take só. Pode apostar: sempre que em uma festa você pedir para o DJ colocar Beatles, é essa que ele vai escolher. Já fiz essa experiência um montão de vezes, e não errei uma. E normalmente é a única concessão que fazem em meio a uma povoação de axés, funks, batidões e sertanejos presentes nessas celebrações! Interessante que nem ele nem 99% das pessoas que adoram a canção sabem que não é composição dos Beatles. Bem, terminando o parágrafo sobre os vocais, das demais 11 canções do LP, John faz o vocal principal em 7 e Paul nas demais 4, claro que um quase sempre ajudando o outro com vocais de apoio, e quase sempre também de George, em prefeitas harmonias.

E vamos às canções.... e à contagem que propus para elas.... uma linha sequencial, que começou em 1 para Love Me Do, 2 para P.S I Love You do 1º compacto, e passou por 3 para Please Please Me e 4 para Ask Me Why do 2º compacto, e agora seguirá com as canções inéditas do 1º LP, ok? Portanto, não se espante ao ver o número 5 estampando a 1ª canção do LP Please Please Me, ok. Essa contagem irá até 211, que irá para a For You Blue, a última canção do último LP lançado, lá em maio de 1970. Esse é o critério, o lançamento oficial das canções, segundo o catálogo britânico!

Uma coisa que nunca comentei foi o posicionamento das canções já anteriormente lançadas, nos dois lados da bolachona. As duas do 2º compacto fecham o Lado A, enquanto as duas do 1º compacto abrem o Lado B. Portanto, 5 canções inéditas abrem o Lado A, da mesma forma que 5 canções inéditas fecham o Lado B. Portanto 'as nova fais um sanduiche das véia'.

Cada uma das 10 canções inéditas de Please Please Me (Canções 5 a 14) serão analisadas a seguir em sua composição, estrutura, e gravação. As mesmas análises de estão disponíveis para as demais 4 canções já lançadas anteriormente a um click sobre seu nome. As canções 3 e 4 fecham o Lado A e as canções 1 e 2 abrem o Lado B.

Lado A


5.  I Saw Her Standing There (by Paul McCartney


Paul convida: Bem, ela olhou para mim, e eu, eu pude entender que não tardaria muito para eu me apaixonar por ela. Ela não dançaria com outro (whooh) quando a vi parada lá  
 
A primeira canção do primeiro LP dos Beatles é uma paquera com uma menina de 17 anos que ele convida pra dançar e não vai entregar pra mais ninguém. A letra original falava 'She'd never been a beauty queen', mas Paul não gostou da rima, e John veio com a definitiva 'And you kow what I mean', muuuito melhor, até pelas segundas intenções de sexo com uma menor de idade, enfim. Esse diálogo aconteceu na casa de Paul em Liverpool, em algum dia de novembro de 1962, portanto, após o lançamento de Love Me Do, o 1º compacto dos Beatles. A canção tinha o título provisório de Seventeen, que era a idade de uma das garotas com quem Paul estava saindo, sim, ele saía com mais de uma... depois resolveram nomeá-la com a frase que termina os versos, quase um refrão por si só. I Saw Her Standing There era perfeita para abrir o LP até porque foi a PRIMEIRA canção efetivamente composta pela dupla Lennon/McCartney! Naqueles tempos, e só naquele primeiro LP, a dupla se assinava como McCartney/Lennon, mas a coisa reverteu, e adotou-se o nome que ficou para a posteridade. Ordem alfabética?
 
A estrutura da canção desde já mostrava uma prática de versos + pontes. E também uma prática que foi pouquíssimas vezes quebrada: a  composição dos Beatles terá, no mínimo, DOIS versos com letra diferente! Neste caso, foram, TRÊS. Em tempo, o termo 'Verso', musicalmente falando, não tem o mesmo significado da poesia. Em música, 'Verso' é o conjunto de frases que apresenta a melodia principal, e a ideia básica da letra. O Verso 1 conta como a garota capturou a atenção do autor, parecendo a ele sem comparação com qualquer outra que havia conhecido, e que ele garante que vai dançar com ela. O Verso 2 mostra a resposta do olhar dela e ele logo vê que iria se apaixonar. Aí vem a Ponte, aquele trecho de melodia diferente, que muda o nível de tensão, neste caso para cima (mas pode ser no sentido oposto), onde ele diz que seu coração estava explodindo quando cruzou o salão em sua direção e pegou-lhe a mão, e grita em falsete extremo sua satisfação. O Verso 3 mostra que ele já a conquistou e dançou com ela a noite toda! Depois, nos acordes dos versos, vem o solo de guitarra de George, que seria o primeiro de sua carreira, pois as cinco primeiras canções gravadas (Canções 1 a 4) até então não tinham solos. E, finalmente, o verso final repete ipsis literis o Verso 3.  
 
Como já falado na introdução para este álbum, os dois compactos já lançados com extremo sucesso, levaram George Martin a pedir mais 10 canções para completar um primeiro álbum, e eles só teriam um dia para completá-lo, e esse dia foi 11 de fevereiro de 1963. Os Beatles chegaram cedo, começaram a gravar às 10 da manhã. I Saw Her Standing There foi a segunda canção a ser gravada, antes do almoço. O 1º Take foi perfeito, mas decidiram seguir tentando melhorar, mas houve sucessivos problemas, ou de Paul que errava a letra, ou de John na harmonização. Nos Versos, John e Paul fazem harmonia vocal perfeita, mas a letra variou entre "She wouldn't dance" para "I'll never dance" ou "How could I dance", ou George não fazia um solo legal, ou mesmo Ringo se esquecia de um chimbal, enfim a coisa foi evoluindo até o Take 9, que saiu perfeito. Eles decidiram não almoçar, para continuar praticando outras canções, tomando apenas leite. Mais adiante, George Martin deu sua pitada, e chamou todos no final da tarde para baterem palmas sobre um playback do Take 9. Ficou bom, mas Martin achou que o Take 1 estava melhor, e então repetiu-se a operação das palmas sobre ele!
 

A canção foi muito tocada ao vivo pelos Beatles, inclusive, no começo, John tocava gaita na seção solo. Ela esteve no set list do histórico show no Washington Coliseum, o 2º do processo de conquista da América, em fevereiro de 1964, mas após junho daquele ano, outras canções tomaram seu lugar. Muito reproduzida ao longo das décadas, em shows, com destaque para o próprio John em sua antológica participação no show de Elton John, em New York, 1974, e por Billy Joel na reinauguração do Shea Stadium em 2008, também na Big Apple, e tal, mas nada supera o destaque mais recente que Paul McCartney deu a ela, cantando inteirinha numa festa de fim de ano corporativa da empresa de sua esposa Nancy Shevell, no final de 2019. Dispenso a piadinha sem graça que acompanhou dezenas de mensagens que recebi, com um texto de quem não sabia nada do que estava acontecendo, e dizendo tratar-se de um avô sem noção com sua netinha... ela que na época tinha 60 anos... neguinho tem que fazer graça... abominei! Olha que show, neste LINK. Recentemente, eu descobri uma versão que tem que ser destacada aqui, do grande Little Richards, neste LINK.... parece até que ele assumiu a canção para ele. Que cantor!!

 

6. Misery (by John Lennon) - vocal de John
John, saudoso, clama que mandem sua garota de volta pra ele, porque sem ela, ele está em petição de miséria. 
 
É a segunda canção do álbum de estreia, que foi gravado todo em UM dia. Adoooro aquele pianinho que aparece na ponte! Aliás, é a primeira contribuição instrumental do Maestro George Martin. Interessante que ela foi composta pela dupla McCartney/Lennon (era assim que eles mesmos se chamavam naquele primeiro LP) para um outro artista. Sim, era para ser a voz de Helen Shapiro, uma jovem cantora já com dois hits Nº1 nas paradas inglesas, para quem eles abriam shows naquele início de 1963. O gerente dela, entretanto, visionário que era, renegou-a. Um outro artista que também fazia parte da tour, entretanto, gostou, então eles modificaram a letra para a ótica masculina, e Kenny Linch tornou-se o primeiro cantor a gravar uma original Lennon/McCartney.  (173) Kenny Lynch - Misery - YouTube Alguns dias depois, eles decidiram gravá-la, e John modificou um pouco mais ainda a letra, que era "You’ve been treating me bad" e passou para a nossa conhecida "The world is treating me bad" dando uma conotação muito maior à canção de Saudade, descambando para a Classe Desespero, como eu a defini. 
  
Misery começa numa ótima introdução de John e Paul cantando (quase) a capella a frase final do Verso 1, após o arpejo inicial de guitarra e piano, sensacional. A estrutura da canção mostrava dois versos, com letras diferentes, retratando a mágoa lá em cima (1), e a desesperança de vê-la novamente (2), depois uma ponte, desta feita diminuindo um pouco a tensão do lamento, com o pobre abandonado lembrando os momentos felizes que tiveram, depois um 3º verso volta com o desespero da súplica pela volta dela, sob pena de ele ficar sem chão, ou, traduzindo literalmente, 'continuar na miséria'. Depois, vem uma 2ª Ponte, agora rogando uma leve praga à malvada, finalmente repete-se o Verso 3. Na conclusão, ótimos UUuuu's e um perfeito La la la la la la em falsete!
 
E veio o inesquecível 11 de fevereiro de 1963, quando gravaram um disco inteiro, ou melhor, tudo o que faltava para completar as 14 canções requeridas para o efeito, e Misery foi a 5ª de 10 canções gravadas. O primeiro dos 11 takes, com todos em seus instrumentos,  e com Paul e John cantando juntos a letra toda, já foi perfeito, ou quase, e seguiram tentando melhorar, mas John errava a letra em um take, ou algum acorde em outro, ou George ajustando o volume da guitarra acolá, e Ringo passando a usar um pouco mais de caixa, ou ainda Paul melhorando sua linha de baixo. Adoro a única harmonia vocal, com Paul lançando seu agudo em todas as vezes em que se pronuncia o título da canção "..in miiiisery". Bem, no Take 7, George Martin pediu para o xará Harrison não tocar as notas descendentes que fazia na ponte, entre o "...all the litttle things we've done" e o "Can't she see she'll always be the only one, lonely one" pois decidiu que acrescentaria ali seu ótimo piano.  Aliás, a 2ª Ponte traz aquela praguinha mencionada acima, pois eles mudam a 2ª frase para "She’ll remember and she’ll miss her only one, lonely one.", mostrando desde cedo a preocupação em trazer o máximo de originalidade possível. Os Beatles eram avessos a mesmices. O Take 9 foi considerado bom, e partiram para a sessão noturna de gravações. No dia 20, sem a presença dos Beatles, George Martin gravou seu piano, mas ao ouvir, achou que a primeira parte não estava satisfatória e foi buscar a equivalente do Take 7, fez uma mixagem com a 2ª metade do Take 9, produzindo finalmente o Take 11, por sobre o qual gravou suas partes de piano nas duas pontes e também o arpejo inicial da ótima introdução, dobrando por cima da guitarra de seu xará. 
 
A canção nunca fez parte de nenhum ranking de melhores dos Beatles mas eu a considero sensacional, retrato perfeito daquele início romântico. Ao contrário das demais canções do álbum essa canção, por ter sido composta recentemente e para outro artista, não fora ainda tocada com frequência nos shows dos Beatles, daí o elevado número de takes para acertar o arranjo. Mas ela entrou no set list em alguns shows, e foi gravada também na BBC. Ali, claro, não tem o piano de George Martin, pois volta a guitarra do outro George, agora perfeitamente executada!

 

7. Anna (Go to Him) (by Alexander) - vocal de John

Gravada originalmente por seu autor, o americano Arthur Alexander, poucos meses antes, Anna (Go To Him) era uma balada soul favorita de John, também uma de minhas favoritas!  A letra é um romance lascado, com o autor reclamando de seu amor perdido "You give back your ring to me and I willl set you free, go with him".  Foi a 7ª de 11 canções gravadas naquele 11 de fevereiro, 10 das quais se materializaram no 1º LP. Era a sessão noturna, que começou com Hold Me Tight, que foi deixada para o LP seguinte. Anna veio logo a seguir! Apenas três takes foram necessários, com todos ao vivo, em seus instrumentos tradicionais. John deu show na gravação vocal. George também a cantava ao vivo em shows. Deixo aqui o LINK da versão tocada ao vivo na BBC, muito bem, virtualmente igual à de estúdio, com John preferindo não subir a nota na 2ª sílaba de "...searCHING", mas as harmonias de Paul e George ("Aaaaaaanna") estão lá, bem como o ótimo baixo de Paul surpreendentemente bem definido para uma gravação ao vivo.


8. Chains (by Goffin/King) - vocal de George

Composta por Goffin e King, e este King, na verdade é mulher, e é, sim, a diva Carole King, quem diria... de grandes sucessos nas décadas seguintes, deixo aqui como registro apenas dois, It's Too Late e You've Got a Friend, precisa mais não, né! Quem a gravou originalmente foi o grupo vocal The Cookies, que teve breve sucesso, mas terminou por virar backing vocals de Ray Charles. Ela é cantada por George em Please Please Me. Não é de minhas favoritas, mas tem uma harmonia vocal espetacular de John e Paul, as usual, cantando junto com George nos versos e deixando-o solo apenas nas pontes "I'm gonna tell you pretty baby...". Foi a 9ª de 11 canções gravadas naquele 11 de fevereiro, 10 das quais se materializaram no 1º LP. Apenas quatro takes foram gravados, sendo escolhido o primeiro deles como o melhor, com todos ao vivo, em seus instrumentos tradicionais, mas também com a sensacional gaita de John na introdução, que ele abandona abruptamente para começar a harmonia vocal, e passar à sua guitarra. Aliás, foi esta a primeira vez em se ouviu em disco a maraca registrada dos Beatles: a harmonia vocal tripla! E eles a fizeram ao vivo, sem overdubs. Os Beatles eram sensacionais! Deixo aqui o LINK da versão tocada ao vivo na BBC, aqui, sem a gaitinha.

 

9. Boys (by Dixon/Farrel) - vocal de Ringo

Ali, naquela primeira sessão de gravação de LP da história dos Beatles, já se instalava o costume de reservar uma oportunidade para Ringo brilhar. E foi em Boys, sempre tocada nos shows da banda naquele começo de carreira, para gáudio das fãs, uma interpretação vigorosa do nosso querido baterista cantor, coisa raríssima naqueles dias, mais um daqueles nunca-antes-na-história-das-bandas-de-rock. E Ringo herdara essa atribuição do baterista que ele deslocou: era Pete Beat quem cantava Boys. Interessante que era uma canção sobre meninos cantada por The Shireless, um grupo vocal feminino americano (do qual Dione Warwick fez parte algumas vezes), Lado B de um compacto de 1960. E parece que era um número de Ringo em sua antiga banda, Rory Storm and The Hurricanes, da qual John e Paul o sequestraram para os Beatles. Foi a 8ª de 11 canções gravadas naquele 11 de fevereiro, 10 das quais se materializaram no 1º LP. Eles estavam tão afinados, que apenas UM TAKE foi necessário, decidiram que não precisavam tentar melhora nem uma coisinha sequer! O "paptchua papatchua" de Paul, John e George é sensacional! Isso era Beatles, rapaz! E foi a única canção em que isso aconteceu... bem, sim, já cantei em prosa e verso que Twist And Shout foi conseguida no 1º take, só que eles ainda tentaram uma 2ª vez, sem sucesso. Aqui, vou deixar uma performance ao vivo, com vídeo, para se encantarem com Ringo, neste LINK. É um trecho do documentário Eight Days a Week (The Touring Years) e as cenas do show foram no Hollywood Bowl. 


4. Ask Me Why (by John Lennon) 

 

3. Please Please Me (by John Lennon) 

 

Lado B

1. Love Me Do (by Paul McCartney) - vocal de John e Paul

 

2. P.S. I Love You (by Paul McCartney) 

 

10. Baby It´s You (by David/Williams/Bacharach) - vocal de John

A canção (sim, o Bacharach, um dos 3 compositores é aquele mesmo Burt, conhecido das baladas de 1970, coisa pouca, tipo assim Raindrops Keep Falling On My Head) foi um sucesso na voz de The Shireless (de novo, um grupo de meninas!), mas ganhou mais corpo na voz dos Beatles, mais especificamente na de John com direito a charmosísssimos "cheat-cheat", e magnificamente contracantada por Paul e George, em deliciosos "Scha-la-la-la-la-la-la's" e "uuuu's" e "aaaa'sAlém dos instrumentos tradicionais, George Martin adicionou uma pianola, posteriormente, de leve, por sobre o solo do outro George na guitarra! Foi a penúltima canção gravada na histórica sessão de 11 de fevereiro, e foram apenas 3 takes!! A experiência de tocá-la ao vivo já há um ano foi fundamental para essa rápida conclusão. Pra manter a norma, deixo aqui a versão tocada ao vivo na BBC, neste LINK. Note que o solo é feito ao vivo por George, e com extrema competência e com direito a três notas extras em relação à gravação de estúdio. Ele estava confiante! Os rapazes eram de extrema categoria! 

 

11. Do You Want to Know a Secret (by John Lennon - vocal de George 
George conta um segredo para a garota: "Ouça, deixe-me cochichar em seu ouvido, dizer as coisas que você quer tanto ouvir: Estou apaixonado por você! Ouça, uu-aa-uu, você quer saber um segredo?"
John se lembra de sua mãe Julia cantando 'Want to know a secret? Promise not to tell?do filme Branca de Neve, até seus 3 anos, quando ela o abandonou, deixando para a irmã criar. Foi onde se inspirou. Ela foi escrita na mesma onda da recomendação de Epstein, de comporem mais e mais. Paul contribuiu com a ideia de parte da introdução relembrando uma melodia espanhola (só faltaram as castanholas) e na ponte ("I've known a secret for a week or two... nobody knows, just we two"). John delegou o lead vocal, ao caçula da banda, por ser uma melodia simples, de pouca exigência vocal, iniciando uma prática de sempre fornecer uma oportunidade vocal a George, uma exigência das fãs. Neste LP, inclusive, ele teria ainda uma outra canção, uma cover de outro artista. Marcantes são os "uu-aa-uu's" de John e Paul e adoro aquelas batidas com eco, de Ringo, ao final da ponte, aliás, cá entre nós, é a melhor parte daquele trecho, que eu considero fraco, letra fraca, rima fraca, aliás, da mesma palavra (ô, gente, podia buscar um "blue" ou um "true", ou mesmo um "you"!). Note que é a segunda e ÚLTIMA vez, em que os versos são repetidos, sem variações, sendo Love Me Do a primeira e PENÚLTIMA vez e que isso ocorreu EM TODA A CARREIRA DOS BEATLES. NOTÁVEL!! John nunca deu muito valor a ela, e reza a lenda de que ao gravar uma Demo num banheiro de um night club em Hamburgo (última vez em que lá estiveram), por ser o lugar mais silencioso possível, mas quando terminou, puxou a descarga para ela...  injusto... 
 
Sua gravação foi no histórico 11 de fevereiro, quando foram gravadas todas as 10 canções que faltavam para completar o 1º álbum dos Beatles, Please Please Me, sendo as demais 4 gravações utilizadas nos dois primeiros compactos, ainda em 1962. Ela foi a 4ª canção a ser gravada, já de tarde, e levou 5 takes para tomar forma, com todos em seus instrumentos usuais, e com George cantando o vocal principal em todos eles, inclusive os falsetes no final dos versos idênticos em letra. Destaque para a complicada linha de baixo de Paul e para a guitarra 'espanhola' de John na introdução, ideia, como disse, de Paul! No Take 6, Ringo bateu suas ótimas baquetas com eco, conforme sugestão de George Martin, no Take 7, John e Paul introduziram suas respostas vocais em todos os versos, mas John sugeriu que o 1º Verso não tivesse o backing vocal, já incorporando a técnica de estabelecer variação entre versos, além do crescimento de qualidade ao longo da canção, começando por um som mais básico. Sábia decisão! 
 
Do You Want to Know a Secret foi tocada ao vivo logo no dia seguinte à sua gravação, nas duas excursões do primeiro semestre de 1963, e na BBC e programas de TV, mas não encontrei nenhum registro em vídeo ao vivo, então deixou este LINK com a canção original por sobre um vídeo com imagens deles à época! Após o lançamento do LP, ela fez grande sucesso na voz de Billy J Kramer, um camarada deles de Liverpool, amparado por uma back band The Dakotas, que chegou em 2º Lugar, perdendo apenas para os próprios Beatles em 1º com Please Please Me, ouçam a versão dele neste LINK. Esses artistas gravariam ainda outras originais Lennon McCartney! Ela fez sucesso novamente um ano depois, na época da invasão da América, lançada em compacto e chegando ao 2º lugar na parada americana, perdendo só para uma banda chamada The Beatles (!), com Can't Buy Me Love!

 

12. A Taste of Honey (by Scott/Marlow) - vocal de Paul

A Taste of Honey é uma preferida de Paul, que nos leva a um clima de faroeste, uma valsa, que era um tema instrumental, feita por Scott e Marlow para um musical da Broadway, baseado numa peça inglesa, que depois virou filme, tu,do do mesmo nome, e que depois ganhou uma letra, nesta versão sendo regravada mais de 250 vezes, portanto com muito sucesso. Ao contrário das outras Covers do LP, A Taste of Honey não foi gravada na sessão noturna daquele 11 de fevereiro histórico, mas abriu a sessão da tarde, após o almoço, que os Beatles optaram por não saborear, para ensaiar ainda mais! Muito responsáveis os Beatles!! 
 
Foram 5 takes, com todos tocando seus instrumentos tradicionais, e Paul cantando seu vocal principal e John e George seus ótimos backing vocals. Após, isso passaram a outra canção, mas George Martin chamou Paul para dobrar o vocal, para dar mais corpo, cantando por sobre o vocal nas pontes da canção ("I wiiiil return yes I will return..."). Martin orientou que ele fizesse uma ponte em cada take, portanto, o Take 7 foi o considerado final! Foi a primeira vez que foi usada essa técnica de dobrarem  vocais, de muuuitas que os vocalistas usaram em inúúúmeras canções da carreira, e a única no LP Please Please Me. Paul gostava tanto dessa canção que escolheu cantá-la na Noite Que Mudou a América, no Ed Sullivan Show de 9 de fevereiro de 1964, mas o LINK que mostro aqui é da performance ao vivo na BBC, sem imagens. Note-se a mudança de ritmo do verso (valsa) para a ponte (r4x4), mostrando a versatilidade de Ringo. E, claro, as harmonias vocais, na introdução com o título da canção, os tchu-ru-ru-ru nos versos, e as respostas "You'll come back..." no final. Excepcionais garotos! 

 

13. There´s a Place (by John Lennon) 
John percorre sua mente: "Povoam minha cabeça coisas que você disse como: Eu amo apenas você'. Em minha mente não há lamentos, você não sabe disso?"
Há um limiar nessa minha definição de que se trata de uma Love Girl Song, e eu mantenho, porque ele está 'in love' com a garota, mas ela quase escorrega para uma Mind Self Song, pois a letra diz  "There is a place where I can go when I feel low when I feel blue. And it's my mind and there's no time when I'm alone". E esse tal lugar é a mente de John! Preferi deixá-la como uma Heart Song, até pra não precipitar as coisas. John nos graves e Paul nos agudos dividem o lead vocal, George faz backing vocal, e destaca-se a gaita de John logo no início! 
 
Pausa para confissão: 
É a canção autoral que eu menos gosto deste LP!!
Fim da confissão 
 
Pois é... mas não que não seja notável em muitos aspectos. A estrutura é aquela que seria repetida muitas vezes ao longo da carreira, verso-verso-ponte-verso, sem refrão. Acresça-se que os dois versos iniciais, além de terem letras distintas, marca registradas dos Beatles em N-2 canções da carreira, aqui, um verso é mais longo que o outro. O Verso 1, de 15 compassos, John é a porção Mind Song da letra, quando John fala daquele local onde ele se encontra quando está triste, que é a sua mente. O Verso 2, tem apenas 12 compassos, por ter no final uma preparação para a ponte, é a porção Love Song da letra, em que John pensa nas coisas que a garota lhe disse, especialmente o 'I Love only you'. Na ponte ele diz que não se arrepende e que não ficará triste, e aqui o autor usa uma das rimas mais manjadas da história, "sorrow" com "tomorrow" do cancioneiro mundial. Depois, repetem o 1º Verso, e a conclusão repetindo várias vezes a letra.] 
 
Ao que parece, os Beatles estavam animados, pois que abriram a sessão histórica de11 de fevereiro de 1963, em que foram gravadas 10 canções do álbum, e There's A Place abriu os trabalhos, ainda com a introdução feita apenas com a guitarra de George. Levaram 10 takes até acertar alguns detalhes, como o volume dos microfones, a harmonia vocal entre John e Paul, especialmente as 5 notas de abertura A Capella dos versos, o "The-e-e-e-ere" e o "I I I I I", também marcante na canção. O outro destaque, que é a gaita de John, na introdução, no meio e no final, foi gravada por sobre o Take 10, mas foram duas tentativas, sendo o Take 13 o que se ouve no disco até hoje! 
 
There's A Place foi tocada ao vivo apenas em programas da BBC, nunca em shows. Deixo aqui esse LINK.

 

14Twist and Shout (by Medley/Russell)  - vocal de John

Excepcionais garotos! Excepcional John Lennon, como já falei na introdução. Um take só, no final do dia, para entrar para a história, assim como o vídeo deste LINK, que deixo pra vocês! 

A canção era quase obrigatória nas shows da banda. Composta por Scott e Marlow, que, s
eguramente, jamais sonharam que ela alcançaria a fama que tem hoje, e estaria ainda viva 60 anos depois de ter sido escrita. E certamente sorriem no túmulo, a cada vez que ouvem a interpretação Beatle de sua canção dançante, muito melhor que na gravação mais popular até então, pelos Isley Brothers.
 
 
Graças ao chão percorrido, eles puderam lançar seu primeiro LP, Please Please Me, com 14 canções, sendo 10 gravadas em apenas um dia de estúdio, na Abbey Road. Foram 14 canções, sendo 8 de autoria deles (uma coisa inédita nas bandas da época!) entremeadas com 6 covers. Foram 9:45 horas de gravação, naquele que pode ser considerado o dia mais produtivo da história do rock. Isto sem contar os intervalos entre as três sessões, em que eles seguiam ensaiando, e tomando leite, para preservar a garganta, afinal era inverno, estavam todos resfriados. Nada comeram naquele dia. 
 
Quando chegou 10:00, o estúdio ia fechar, mas ainda faltava uma canção. Foi quando John disse que a garganta estava prestes a explodir. Tinha ‘estoque’ para mais uma e única performance, um esforço final. Era uma chance só! E decidiram gravar Twist and Shout, justamente a mais berrante das canções do LP, e que era levada justamente por John. Às 10:30 da noite do dia 11 de fevereiro de 1963, John gargarejou uma última golfada de leite, e soltou a voz, mais áspera do que nunca, e a banda acompanhou nos woooos e haaaas. Terminado o esforço, silêncio absoluto no estúdio, todos se entreolhavam calados, um misto de espanto e agradecimento. Haviam acabado de testemunhar a mais impressionante interpretação vocal e instrumental da história do rock’n roll até então E ela é assim, por muitos, considerada até hoje. Digo mais, Twist and Shout somente está hoje aí, firme e forte, por causa da primorosa e imbatível gravação dos Beatles. O que se ouviu naquele momento é exatamente o que se ouve até hoje. Aquela tomada foi a definitiva. Ainda tentaram mais uma, melhorar o imelhorável, mas a voz de John sumiu, apagou, como ele mesmo previra. 
 

Ela foi tocada no Ed Sullivan Show, em fevereiro de 1964, na mais espetacular invasão dos Estados Unidos de todos os tempos, uma invasão do bem, quando os Beatles simplesmente tomaram de assalto a principal cidade do país, parando o aeroporto e depois as ruas de New York. E também em outro momento marcante, em novembro de 1963, numa noite de gala no Prince of Whales Theatre, quando, na presença da mãe e da irmã da rainha Elizabeth II, John Lennon fez um famoso e antológico apelo, antes da canção final, que explicarei melhor mais adiante!!!


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O que você faria um dia depois de um dia intenso de 10 horas gravações, começando às 10 da manhã,  terminando às 11 da noite, esgotado? Bem, se não sabe, eu digo o que os Beatles fizeram...voltaram à estrada!! E não foi ali do lado não, foi a 200 milhas, para além de Liverpool, na grande Manchester, em Oldham. E assim ficaram dia após dia na estrada, para shows noite após noite, com breves intervalos para atenderem a outros compromissos de sua cada vez mais agitada agenda... mais um Thank Your Lucky Stars, nacional, e uma aparição na ABC TV, e mais na rádio BBC, no programa Parade of The Pops, e vem a segunda perna, em oito shows, da turnê com a famosa Helen Shapiro, ,durante a qual John e Paul compõem dentro do ônibus, entre York e Shrewsbury, a sua próxima Nº1, From Me To You, que gravaram em 5 de março, dia também em que fizeram a histórica sessão de fotos para o LP Please Pelease Me.

Os Beatles foram chamados ao edifício sede da EMI, em Manchester Square, e dirigidos pelo fotógrafo Angus McBean, considerado legendário no mundo do teatro britânico, chamado por George Martin. A EMI caprichou logo no LP de lançamento dos rapazes!  Angus orientou a subirem as escadas, e disse; "Agora, parem! Olhem para baixo!". Então, com maestria, venceu o desafio da backlight e tirou a famosa foto. Veja que as canções de chamada são as que saíram como Lado A dos dois compactos lançados até então. 

No dia seguinte, seguiriam em Londres para se apresentarem no programa Here We Go, da BBC, e voltaram à estrada para shows apenas eles e

O LP Please Please Me foi lançado na Inglaterra em 22 de março de 1963, direto para o topo das paradas, aonde ficou durante 30 semanas até perder o lugar para uma banda chamada .... The Beatles. Sim, era o 2º LP da banda, With The Beatles! No Brasil, o lançamento foi esquartejado entre dois LPs (Beatlemania e The Beatles Again) e um compacto duplo, basicamente com covers. Nos Estados Unidos, também apenas em julho de 1963, o LP Introducing The Beatles por um selo pequeno, chamado Vee Jay, com as mesmas canções, mas que não fez coceira nas paradas americanas, incrível, que diferença não faz uma bela campanha. A Capitol, americana, ainda não despertara para o fenômeno, que somente ocorreria em fevereiro de 1964 quando lançou o compacto com I Wanna Hold Your Hand no lado A e I Saw Her Standing (deste LP) no Lado B.

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O 3º compacto dos Beatles já foi notado em dois momentos neste texto, afinal essas coisas se entrelaçam, a composição, a gravação o lançamento de uma canção vão acontecendo concomitantemente com distintos estágios de outras canções já consideradas ou daquelas que ainda estão por vir. Então, já vimos que a canção do Lado A do novo compacto foi composta em plena viagem entre dois pontos da excursão em que os Beatles levavam pela Inglaterra e que promovia o 1º LP. 
Ela era From Me To You. 
Em 28 de fevereiro,  o ônibus da excursão de Helen Shapiro saíra de York rumo a Schrewsbury, e John e Paul aproveitaram o tempo livre, pegaram seus violões e foram para o fundo do ônibus. e compuseram aquela que seria sua nova Nº1, simples assim. 
From York To Schrewsbury virou From Me To You! 
E mostraram ali também uma outra canção que haviam feito dias antes, Thank You Girl. Os companheiros de excursão não acreditavam no que viam... e ouviam... talvez alguns deles desconfiassem de que estavam presenciando o nascimento de um fenômeno...

O outro momento em que soubemos dela foi a sua gravação, em 5 de março, no mesmo dia em que tiraram a foto da capa do LP Please Please Me, em outro ponto de Londres, dias sempre agitados. Mais sobre esses dois momentos virão na análise da canção, bem como da canção eleita para compor o Lado B, chamada Thank You Girl, que ganharão agora respectivamente os números 15 e 16 do cancioneiro Beatle, de acordo com o critério adotado nesta publicação. As duas canções são também notáveis por serem as últimas McCartney/Lennon, notação que haviam adotado até ali. A partir de então, entraria em cena a mais famosa parceria da música pop.... Lennon/McCartney!

Bem, voltemos à estrada... para contar um pouco mais sobre o período em que ainda se juntavam a caravanas de outros astros... em breve, eles se tornariam uma entidade superior, um Astro Rei, com luz própria para  iluminar todo o planeta, e mais ninguém...

Quando os Beatles pararam em Londres pra tirar fotos e gravar, já havia terminado a excursão com Helen Shapiro, e eles já estavam em meio a um curtíssimo período viajando sozinhos. E ali terminaram as excursões de inverno! E viria a sagração da primavera!!
Não... isso é Stravinski... Aqui, foi ... 

A Consagração da Primavera! 

Logo no dia 9 de março, embarcariam em mais uma trupe, comandada por dois jovens americanos, Chris Montez e Tommy Roe, embarcando em um ônibus pelas estradas inglesas... Note no cartaz que os Beatles são os únicos que tinha suas carinhas mostradas além dos dois astros americanos, que teoricamente, eram os que 'puxavam' a excursão. A ocasião é celebrada como sendo a primeira em que apareciam imagens deles, as anteriores, mesmo as que estavam solo, só continha o nome das atrações.

No começo da excursão, ainda levavam apenas Love Me Do e Please Please Me, esta última já com o status de Nº1 nas paradas. Chris e Tommy logo viram que, apesar de serem eles os astros principais, logo que os Beatles terminavam sua apresentação, a plateia quase esvaziava, porque os fãs seguiam os rapazes para caitituá-los... era o começo da febre, ainda incipiente, mas já dando sinais.... No começo, os dois astros já se impressionavam, primeiro com as duas originais que levavam, mas também com os vocais sensacionais de Paul em Long Tall Sally e John em Twist and Shout... mas, à medida que ia se aproximando o 22 de março, os rapazes mostravam com orgulho o LP que ia sair em breve, colocavam pros outros ouvirem, e todos se espantavam com tanta qualidade. No final daquela excursão, o repertório era de 6 canções de Please Please Me, a canção título e mais Love Me Do, Misery, A Taste Of Honey, Do You Want To Know A Secret, e I Saw Her Standing There. Recentemente, vi uma entrevista de Montez, que aparenta ser muito mais jovem do que é, que contou sobre esse espanto, e também que Paul era o mais gentil, George e Ringo eram quem deixavam as meninas mais loucas, e John.... bem ele saiu na porrada com John, hehehe, depois de levar um banho de cerveja vinda do quarto de hotel, enquanto ele conversava com amigos no térreo.... ah, esse John... já casado e ainda moleque!!

Claro que os Beatles não ficavam 100% do tempo dedicados à excursão. As chamadas para aparições em rádio e TV pululavam. Logo no dia 11 de março, a Rádio Luxemburgo os chamou para o programa Friday Spectacular. No dia seguinte, John caiu de cama com um baita resfriado, e desfalcou a banda durante 3 dias, com os três atuando como Power Trio. Esse estado fez cancelar mais uma participação no Saturday Club da BBC.... mas lá já estavam todos presentes no dia 21, no programa On The Scene. Na estrada, celebraram o lançamento oficial de seu 1º LP, no dia 22. A excursão com Chris Montez e Tommy Rue seguiu até o último de março e no 1º de abril, já estavam todos a gravar na BBC, dois programas da série Side By Side, e mais dias na estrada, agora, sós, com uma parada em Londres no dia 5 para receberem seu primeiro Disco de Prata, por causa das vendas de 250 mil cópias do compacto Please Please Me / Ask Me Why..... o primeiro de muitos .... e de metais mais valiosos.... 

No dia 8 de abril, nasceu a primeira pessoa que poderia dizer: "Sou filho de um Beatle!" Era Julian, filho de John e Cynthia, que o teve sozinha na maternidade em Liverpool, pois John estava na estrada e sua mãe no Canada! Era incomum pais testemunharem o nascimento dos filhos, ainda mais seria para John, em meio a um efervescente período de compromissos naquele início de carreira. Naquele mesmo dia, os Beatles estavam em Londres para um show, e dia seguinte, para gravações de rádio (BBC - Pop In) e TV (BBC - Tuesday Rendevouz) e mais um show à noite... ufa!! John só foi conhecer seu filho no dia 11!

E nesse mesmo dia, veio ao mundo o 3º compacto dos Beatles. O Reino Unido conheceu então mais dois clássicos Lennon/McCartney, ou melhor, como sabem, as duas últimas McCartney/Lennon

E vamos a elas. Como sempre, basta clicar em seus nomes para acessar a análise da letra, da música, de sua estrutura, de sua gravação e lançamento!

15. From Me To You (by McCartney/Lennon- vocal de John e Paul


John e Paul paqueram: 'Se tiver qualquer coisa que você queira, se tiver qualquer coisa que eu possa fazer, apenas me chame que eu mandarei, Com amor, de mim, pra você'

Mais uma pura Lennon McCartney, e esta foi feita, literalmente, na estrada!  
 
Após o sucesso de seu primeiro compacto Nº1, com Please Please Me/Ask Me Why, os Beatles foram convidados para formar uma trupe, com alguns artistas, liderados pela cantora Helen Shapiro (em destaque na foto), para um tour de 30 dias pelo interior da Inglaterra, viajando de ônibus entre as cidades. Numa dessas pernas, após o show de York, John lia uma revista pop, New Musical Express, e o nome da seção de cartas começou a piscar pra ele. Era From You To Us. Como eles já estavam na pressão para produzir mais canções, ele chamou Paul para o fundo do ônibus com um violão, os acordes e letras começaram a surgir, primeiro por John que fez a primeira linha do primeiro verso (If there's anything that you want,) e Paul com as seguintes ('If there's anything I can do, Just call on me and I'll send it along) e finalizaram o verso, com 'With love from me to you' com o nome da canção! Disso que falei, apenas tenho certeza do primeira frase de John, o resto eu romanceei, mas os dois declararam que foi uma composição fifty/fifty entre os dois. E veio mais um verso, com letra diferente, mas com a mesma finalização, repetindo o título da canção. Os demais artistas da trupe (eram 4 além da líder Shapiro) testemunharam, com espanto, a criação de mais um Nº1 dos Beatles, ainda antes do destino daquela perna. Aliás, não só ela, ainda mostraram aos demais uma  outra canção, Thank You Girl, que sairia no Lado B. A líder da trupe foi chamada a opinar qual das duas seria Lado A e ela escolheu a mesma que eles já haviam decidido. Paul era especialmente orgulhoso da ponte, que veio depois, com um acorde menor, que deu um charme todo especial à melodia, (I've got arms that long to hold you, and keep you by my side). Em seguida, eles introduzem um acorde digno do som que grassava do outro lado do Atlântico, mais para o Sul Maravilha, uma certa Bossa Nova, quando entoam o 'satisfied': um belíssimo Cm7M, em outras palavras, um Dó Menor com 7ª Maior! João Gilberto ficaria orgulhoso daqueles meninos de vinte e pouquíssimos anos. E a ponte ainda terminava com aquele Uuuuuu!, que já cantavam ao vivo e que já haviam gravado em estúdio, e que lançariam em Twist And Shout e levariam aos píncaros da fama em She Loves You com aquelas cabeças balançando e levando fãs ao delírio.  Era 28 de fevereiro de 1963. 
 
Os Beatles e George Martin
Cinco dias depois, estavam todos no estúdio para gravar as duas canções, e resolveram tudo naquele 5 de março. Após uma sessão de fotos na cantina da EMI, foram ao trabalho, sempre tocando e cantando ao vivo. Começaram em uma batida mais lenta que a original, à que chegaram somente no Take 3, ainda sem os temperos instrumentais que viriam depois. No Take 5, George Martin deu a ideia de fazer um verso instrumental, John gostou mas sugeriu ao outro George, o da guitarra, para apenas abrir a 1ª linha, e ele e Paul respondiam em uníssono 'From me' e depois a 2ª com 'to you' e eles voltariam a cantar a 3ª e 4ª linhas. Ficou marcante! No Take 7, Martin deu a ideia de usar gaita em vez de guitarra, na introdução, no verso instrumental e na conclusão, e levaram três takes para ficarem satisfeitos, mas então Martin deu outra ideia, em seu papel de produtor, e disse pra John e Paul acompanharem em uníssono, primeiro murmurando, depois com Da-ra-ran Da-ra-ran-dan-daaa nas mesmas notas da gaita, na introdução e na conclusão, mas não no verso instrumental. Mais duas tentativas e a canção estava pronta, com tudo no lugar: as harmonias vocais, perfeitas, em pontos selecionados, as viradas de Ringo introduzindo o Verso 1, finalizando a ponte, e também na conclusão entremeando os 'to you' precisas, além da mudança na batida durante a ponte, o baixo de Paul em duas notas por compasso, discreto, a gaita de John, enfim, tudo certo. 
 
From Me To You foi muito cantada ao vivo, em shows e em programas de rádio e TV. Destaco, neste LINK, a apresentação para a realeza, no Royal Variety Show, aquele da melhor piada de John ao vivo, na introdução de Twist And Shout. Note que na impossibilidade de tocar adequadamente a gaita, as partes dela são tocadas pela guitarra de George, aliás, como era no original, até que George Martin veio com a ótima ideia. O compacto From Me To You/Thank You Girl foi lançado em abril, e rapidamente chegou ao 1º lugar nas paradas inglesas, estava começando a febre que seria denominada Beatlemania no final do ano, e ele ficou incríveis 7 semanas no tipo, feito só igualado por Hello Goodbye, quatro anos depois. Paradoxalmente, nos Estados Unidos, ela não passou da 41ª posição, quando foi lançada como Lado B de Please Please Me, durante a febre que assolou o país, no início de 1964.

 

16. Thank You Girl (by McCartney/Lennon) - vocal de John 
John e Paul agradecem 'Oh, oh Você tem sido boa comigo, você me deixou alegre quando eu estava triste. E eu serei eternamente apaixonado por você e tudo que eu tenho que fazer é agradecer a você, garota, agradecer você, garota.'

A canção com esse nome foi feita para agradecer às muitas fãs que enlouqueciam nos shows e enchiam a caixa de correios dos rapazes. A letra conta de um cara profundamente apaixonado e agradecido e que faz juras de amor eterno. Ela foi feita face a face, John e Paul, um propondo uma frase o outro propondo a seguinte e assim por diante, provavelmente John na ímpares e Paul nas pares, e Paul chamou para si o título, que é a alma da canção. Esse tête-a-tête aconteceu durante a excursão dos Beatles na trupe de Helen Shapiro pelo interior da Inglaterra em fevereiro de 1963. A estrutura é deveras complexa, tem verso refrão e ponte, além de uma introdução que serve também como uma elaborada e vibrante conclusão, criada pela imaginação do produtor George Martin e por um excepcional desempenho de Ringo. Delineando os elementos estruturais, temos: 
  • Versos: 'You've been good to me, you made me glad when I was blue, and eternally I'll always be in love with you,' e 'I could tell the world a thing or two about our love. I know little girl, only a fool would doubt our love!' 
  • Refrão: 'And all I gotta do is thank you girl, thank you girl!' 
  • Ponte: ' Thank you girl for loving me the way that you do, (way that you do). That's the kind of love that is too good to be true!' 
O refrão insere-se após cada verso e também após a ponte. O 'little girl' ali do Verso 2 talvez tenha motivado o nome de trabalho da canção, Thank You Little Girl, mas logo desistiram, até porque não cabe nem um pouquinho na métrica. 
 
O dia da gravação foi um 5 de fevereiro encaixado numa agenda de shows diários e apresentações em rádio e TV. E a ordem de gravação obedeceu à que apresentaria o próximo compacto, primeiro o Lado A, From Me To You, depois, o Lado B, Thank You Girl. Para esta última, os Beatles tocaram seus instrumentos usuais e cantaram ao vivo seis vezes, a última sendo considerada a melhor. E aí veio a primeira ideia de George Martin, que gostou da Introdução, com aquele 'oh... oh ...', e instigou-os a acrescentar mais um 'oh....', e Ringo a fazer o que não gostava, solos seguidos de bateria, e ele fez no no estilo do baterista de Buddy Holly, entremeados duas vezes entre os 'oh... oh ... oh...', três vezes seguidas, concluindo magistralmente a canção. Demoraram mais 7 takes até atingir a perfeição. Na edição final, acrescentar-se-iam ecos adicionais aos 9 'oh...' 
 
Depois, os Beatles seguiram para seus intensos compromissos, mas John voltou ao estúdio no dia 13, para a implementação de mais uma ideia do produtor. George Martin adorava aquela gaita de John, foi o que o fez aceitar Love Me Do, e recomendou sua inclusão em From Me To You. Só que John estava num péssimo dia, super resfriado, ouvia-se seu nariz trabalhando em meio às gravações, tão ruim ele estava que nem fora a Bedford na noite anterior para o show dos Beatles, que viraram um power trio, e tiveram realmente que se virar nos vocais de Please Please Me, com George honrando a casa (adoraria ouvir essa versão...). Para complementar, John chegou sem a sua gaita e teve que usar a de um técnico de som, imagina, uma coisa tão pessoal, ainda mais com ele naquele estado. Enfim, John levou uma hora e 15 takes para produzir 6 inserções de gaita. A versão que saiu no compacto, em mono, tinha apenas 3 delas, as mais importantes eu diria, ficaram de fora duas breves inserções durante a ponte e a finalização. O compacto foi direto ao 1º Lugar nas paradas inglesas. 
 
Apenas as versões em estéreo mantiveram a meia-dúzia de inserções da gaita, que podem ser ouvidas neste LINK, com a versão remasterizada em 2009, no Projeto 090909 (veja aqui, neste outro LINK a descrição de minhas reações ao abrir a preciosidade). Aliás, vou usar como ilustração deste presente post, a foto da preciosidade 090909 em minha estante! 
 
Destaca-se também Thank You Girl por ser a última canção gravada e lançada da hoje estranha parceria McCartney/Lennon, que estampou as 8 canções autorais do álbum Please Please Me e From Me To You, o lançamento a seguir, She Loves You / I'll Get You já estampariam no selo a mais famosa parceria da história como a conhecemos. Várias razões.. 
John é mais velho que Paul - 1x0
John vem antes de Paul no alfabeto - 2x0
Lennon vem antes de McCartney no alfabeto - 3x0
John começou tudo - 4x0

 

Algo contra?

Como dito aqui em cima, o compacto ficou inéditas 7 (sete) semanas no topo das paradas inglesas, feito só desbancado 4 anos depois pelos próprios Beatles!!  E o ano estava no começo!! Ainda viriam mais dois compactos bombásticos, e outro LP, em meio ao que seria conhecido como Beatlemania!!

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No dia 12 de abril, então, os Beatles já eram uma banda com um LP e 3 compactos, tendo duas dessas peças já passado pelo topo das paradas e a última, lançada um dia antes, a caminho de fazer história. Mas a história deles continuava na estrada... agora sem serem liderados por ninguém! E essa nova etapa começava na terra natal. E no reduto que os consagrou, o Cavern Club. E aquela seria a penúltima de 280 apresentações (há controvérsias quanto ao número total...) dos Beatles, em suas várias formações, naquela caverna enfurnada povoada de sons. Eles lideraram aquela noite de 8 grupos. Foram recebidos como verdadeiros heróis por seus conterrâneos! Eles tinham razão para celebrar... estavam no firme caminho do estrelato... e mesmo terminando sua apresentação à meia-noite daquela Sexta-feira da Paixão, no Sábado de Aleluia já estavam em Londres, na BBC, para extensivos ensaios, e gravação de sua primeira aparição na TV em nível nacional, na Inglaterra toda, o 625 Show, que iria ao ar três dias depois.... e já eram a atração principal. E fechando aquela Santa Semana, que começara com o nascimento de Julian, naquele Domingo de Páscoa conheceram os Rolling Stones num clube de Londres, estabelecendo uma amizade desde sempre que descambaria para uma rivalidade sadia, que ainda movimenta a imprensa até hoje. 

Gente... se eu for seguir nesse detalhe, isso aqui não acaba mais, né.... mas vocês hão de convir que aquela semana mereceu o destaque, não? Vou tentar manter as diversas aparições em rádio ou TV, e os shows, na base da contagem, pura e simples, a não ser que mereçam o destaque de uma menção mais detalhada .... certo ... combinado .... mas logo no dia 18 surgiu uma, afinal, o 1º show no Royal Albert Hall ninguém esquece, não é mesmo? Sim, afinal é onde cabem os 4.000 buracos de Blackburn, Lancashire, entendedores entenderão. Tive o prazer de assistir a dois shows lá, o espaço é fenomenal. Pois é, se não bastassem as quatro canções que lá tocaram, como atração principal, duas em cada sessão, as duas últimas sendo transmitidas pela rádio BBC nacionalmente, ao final, foi lá que Paul conheceu Jane Asher, que estava ali também para um compromisso oficial, mas teria gritado como uma fã, juntamente com amigas, enfim. Ela logo se tornaria sua namorada, ele até viveu na casa dos pais dela, noivaram mas após 5 anos de relacionamento, não se consumou a união oficial.

E 10 dias depois vieram as famosas férias de 12 dias dos Beatles, quando Paul, George e Ringo foram juntos para Tenerife, mas John, com um filho pequeno, ficou junto a Cynthia paparicando o rebento .... não, não foi assim ... o 'bastardo' do John, como ele mesmo se definiu em entrevistas posteriores a respeito do episódio, foi para Barcelona com Brian Epstein, dando campo a rumores de que teria havido relacionamento homossexual entre os dois, dado que Brian era um homossexual enrustido, naquela terra que considerava crime esse tipo de relacionamento, levando até mesmo a sentenças de castração química dos condenados. Enfim, nunca houve confirmação de que algo aconteceu, até que Pete Shotton, grande amigo de John, acabou contando que John confessou ter havido contato físico, porém sem a chamada consumação, nada além de carícias, a pedido de Brian, que queria apenas tocá-lo. Enfim... sabia-se que o empresário sofria com sua orientação e que não raro, era encontrado jogado pelas ruas, surrado por parceiros nada carinhosos. Pobre Brian! 

Bem, dentre inúmeras aparições em rádio (Saturday Club, Thank Your Lucky Stars) uma se destaca, a decisão da Rádio BBC de montar um programa liderado pelos Beatles, chamado Pop Go The Beatles. O convite veio em 24 de maio e o primeiro programa (inicialmente de 4), de meia-hora, foi ao ar em 4 de junho, misturava música e bate-papo. Alguém duvidava que seria um sucesso?

Antes disso, começara no dia 18 e foi até 9 de junho a última excursão dos Beatles liderada por outro astro, e ele era o grande Roy Orbison, americano, apesar de já aparecerem no topo do cartaz. Ela foi a última porque, depois de poucos dias, os organizadores decidiram colocar os Beatles fechando o show, devido à reação da plateia, para grande embaraço dos rapazes, que tinham Orbison como ídolo, admirando muito sua voz. Outra banda de destaque era Gerry And The Peacemakers, também de Liverpool, também gerenciada por Brian Epstein, e também com direito a aparecer com sua imagem no cartaz.

O último dia da excursão com Roy Orbison foi em Blackburn, Lancashire (acho que já falei sobre isso...). E foi a única vez em que lá estiveram, mas decerto será eternamente lembrada por estar presente na letra de uma das canções mais espetaculares dos Beatles, A Day In The Life, pronto, agora já sabem o que os entendedores entenderam... procurem a letra canção e também farão parte desse grupo, entendem? "I read the news today, oh boy!"

Ao longo de toda a excursão, tocaram as mesmas 7 canções, seis do 1º LP, Do You Want To Know A Secret, Love Me Do, From Me To You, Please Please Me, I Saw Her Standing There e Twist And Shout (em revezamento com Long Tall Sally), e uma cover favorita dos shows ao vivo, Some Other Guy, que, infelizmente, nunca viu a luz de uma gravação dos Beatles, por incrível que pareça, uma de duas únicas canções de que se tem imagens de Beatles no Cavern Club, numa filmagem que fizeram justamente no primeiro dia em que Ringo tocou com os Beatles. Deixo o vídeo aqui neste LINK  pra vocês... A excursão teve 20 shows, em 18 cidades da Inglaterra, além de Glasgow, na Escócia e Cardiff, no País de Gales. Aquele ônibus que levou o astro americano e outras bandas viu serem compostas sobre suas rodas pérolas como Pretty Woman e All My Loving. Não é pouco, não! Nenhuma das paradas da excursão foi em Londres, mas volta e meia os Beatles davam uma parada por lá para seus compromissos, mais notavelmente para gravarem mais dois de seus programas exclusivos, Pop Go The Beatles, na BBC. 

Brian Epstein não deixou os meninos descansarem um só instante, e nem bem deram adeus a Roy Orbison, embrenharam-se nas excursões de verão, e em Bath, logo no dia 10, tomaram um banho com os bons fluidos de Stonehenge, aonde apenas voltariam para filmar algumas cenas de HELP!, dois anos depois. A semana era notável para Brian Epstein, pois 3 bandas gerenciadas por ele comandavam as paradas na Inglaterra, e ele celebrou-a com a promoção do último de seis shows com o sugestivo nome de Mersey Beat Showcase Concerts, tentando promover ainda mais a cidade natal de todos eles, que é banhada pelo Rio Mersey! As outras duas bandas eram Gerry And The Peacemakers e Billy J Kramer And The Dakotas, sendo que esta última estava fazendo esse sucesso todo com uma autêntica Lennon/McCartney, Do You Want TO Know A Secret, e chegaria ao topo com Bad To Me, canção rejeitada pelos Beatles... pois é... além dos próprios sucessos eles exportavam qualidade para bandas amigas!!!  Em verdade, John disse que escreveu essa canção, junto com Paul, numa van e especialmente para Billy J, que chegou a cantá-la no prestigioso Ed Sullivan Show, que é o que deixo aqui, neste LINK. Na verdade, acontecia assim.... quando Lennon/McCartney compunham uma canção e não gostavam do resultado, mandavam-na para Billy J Kramer, hehe. 

A excursão do verão de 1963 teve 72 shows, terminando em 14 de setembro, portanto 97 dias, portanto, uma média de 3 shows a cada 4 dias, por 33 cidades do Reino Unido, ufa! Dá pra ter uma ideia do espraiamento de localidades no mapa ao lado, que extraí do Paul McCartney Project. Noto a bolinha mais ao sul, muito mais pra França que Inglaterra, são as Channel Islands, sendo Jersey a mais conhecida, ali fizeram 4 shows. Em outras cidades, faziam uma temporada de 5 ou 6 shows, como Bournemouth, Southport, Margate, Weston super-Mare (onde tiraram famosas fotos cavalgando jegues), ou ainda uma de nome muito esquisito, Llandudno, no País de Gales.

Quando veem uma bolinha de 23 shows em Liverpool, na verdade significa na região de Liverpool. A cidade natal recebeu apenas 3 show da excursão, um deles, um sábado 3 de agosto, marcou a última presença dos Beatles no Cavern Club, última porque os Beatles estavam maiores, bem maiores que o Cavern Club. Inclusive tiveram a peculiaridade de tocarem sem luz por alguns minutos e sabe o que tocaram, acústico? Whn I'm Sixty-Four!!! Sim, ela já estava quase pronta, quase 4 anos antes de vir à luz em Sgt. Peppers's... Bem, já Blackpool (também em Lancashire, como Blackburn, aquela dos 4.000 buracos), logo ao norte de Liverpool, era uma favorita naquela área, recebeu a visita deles 8 vezes. Londres, por exemplo, que aparece com 4 shows, na verdade não teve nenhum, a bolinha consolidava a região da capital! Em Londres mesmo eles fizeram a última parada para mais uma visita ao Royal Albert Hall (aquele dos 4.000 buracos), por incrível que pareça, a 2ª e última vez naquele palco real!!

E o que eles faziam nos dias 'de folga', entre as pernas da excursão? O de sempre, obedecendo a compromissos para divulgação de sua obra, na rádio e TV e entrevistas para jornais. Por exemplo, as rádios mostravam o Easy Beat, o Saturday Club, o The Beat Show, o Non Stop Pop, e, claro, o Pop Go The Beatles, na BBC, sim, aquele programa liderado pelos Beatles fez tanto sucesso que contrataram-nos para mais 11 edições. E eles voltavam de onde estivessem na excursão de verão para gravarem seus programas, foram dois no dia 10 de julho, três no dia 16 (18 canções em 8 horas de gravação, Beatles, teu nome é trabalho!) e as outras 5 em agosto e setembro! Na TV, não era diferente, a imagem dos rapazes vendia muito, e fizeram aparições na BBC, na ITV, na Granada TV, mas especialmente na AlphaTV, no programa Summer Spin, que era a versão Verão de Thank Your Lucky Stars, aquele mesmo da 1ª aparição nacional que catapultou as vendas do single Please Please Me no frio inverno daquele mesmo ano!


Pausa para um situação deveras tensa....
John ainda tinha resquícios do temperamento explosivo que o perseguira na adolescência, fruto de uma vida de frustrações em família. Ocorreu que em 18 de junho, na festa do aniversário de 21 anos de Paul em Liverpool, o DJ do Cavern Club, super amigo deles, insinuou que John teve envolvimento mais que amigável com Brian Epstein, e John, nas alturas da bebida, encheu ele de porrada, o pobre foi para o hospital, e recebeu do astro um pedido de desculpas por telegrama dois dias depois. A história foi notada na Inglaterra toda, e no dia seguinte, John participava do Juke Box Jury, na BBC TV, detonando todas as 8 canções submetidas a julgamento se iriam ser sucesso, e pegava um helicóptero até o País de Gales, onde a banda já o esperava para um show, na mesma noite!! A vida de astro na veia!! 
Fim da pausa para uma situação deveras tensa!

E, claro, além de paradas para aparições em Rádio e TV, eles também baixavam em Londres para trabalhar! Aconteceu o seguinte... John e Paul haviam feito uma daquelas seções cara a cara em quarto de hotel, em meio à excursão de verão, num certo 28 de junho, e ali nasceu She Loves You, com base numa ideia de Paul. Dias depois, John foi à casa de Paul em Liverpool e a terminaram, com a aprovação do pai de Paul, que apenas recomendou que não se rebaixassem àqueles americanismos de Yeah Yeah Yeah (sic), felizmente, Paul não acatou o conservadorismo do pai. Mal sabia o velho Jim que aquilo seria a marca registrada dos Beatles, associada ao balouçar das cabeças em insanos uuuuuuu's. Então, como já tinham outra canção, então chamada Get You In The End, eles avisaram que estavam prontos para ir a Abbey Road para gravar o próximo sucesso! A sessão ocorreu em 1º de julho de 1963. E no dia 23 de agosto, veio ao mundo o 4º compacto dos Beatles, com um sucesso que lhes conferiria um recorde que duraria 14 anos ..... somente batido por um cara chamado Paul McCartney!!

E vamos às canções, a análise da letra, da música, de sua estrutura, de sua gravação e lançamento!


17. She Loves You (by Lennon/McCartney/- vocal de John e Paul

John e Paul alertam 'Ela te ama, sim, sim, sim. Você pensa que perdeu seu amor? Bem, eu a vi ontem. É em você que ela pensa. E me disse o que te dizer. Ela diz que te ama, e você sabe que isso não pode ser ruim. Sim, ela te ama e você sabe que deveira estar feliz. UUUUU' 
 
She Loves You é uma tradicional Lennon/McCartney de 1963, Lado A de compacto N°1 instantâneo, que encantou as meninas com o Uuuuuuh e as cabeças tremendo dos rapazes, mas encantou também o público masculino, vejam só ESTE VÍDEO, com a torcida do Liverpool, com 100% de  marmanjos cantando em uníssono a canção, em 1964. 
 
Eu sigo impressionado com o vídeo que anexei, ainda mais quando fiz a análise de Thank You Girl, e com a alegria de homens entoando inteirinha a canção que ora analiso, vi que o título daquela canção poderia muito bem ser expandido para Thank You Boy. Também os homens amavam os Beatles. 
 
She Loves You foi a primeira obra-prima dos Beatles, na 11ª canção autoral apresentada ao mundo. Seu ritmo alucinante, seu brado inconfundível Yeah Yeah Yeah ecoando até hoje, sua bateria marcante, seus acordes inovadores, e as cabeleiras balançando, permanecem indeléveis nas memórias dos fãs e até de não-fãs. Os números alcançados por suas vendas permaneceram imbatíveis até que um dos seus compositores o bateu quase 15 anos depois, explicando: o compacto liderado por She Loves You vendeu 1,3 milhão de cópias no Reino Unido, imbatível até que Paul McCartney, em carreira solo, vendeu 2 milhões de cópias com sua Mull of Kintire em 1977. Interessante que seu desempenho não foi suficiente para desbancar From Me To You do título de canção com mais semanas no topo, que ficou sozinha, com 7 semanas, até ganhar a companhia de Hello Goodbye, sabe, né, aquela canção dos ... Beatles, anos depois. She Loves You teve apenas 6 semanas, e em dois períodos, respectivamente de 4 e 2 semanas cada um, a competição estava mais acirrada. A quantidade espantosa de bolachinhas vendidas foi por conta da longevidade de sua presença nas paradas, com 6 meses no Top 20.                                                                                                                                      
Com o acúmulo de excursões, shows, apresentações em rádio e TV, por conta da fama que vinha junto com dois compactos e um álbum Nº 1 nas paradas, as composições daquele tempo foram muitas delas feitas na estrada. She Loves You começou com uma ideia de Paul numa viagem de ônibus, quando gostou da ideia de 'mudar de pessoa', todas as composições deles vinham usando a 1ª e 2ª pessoas, I, You, Me, e estava na hora de passarem para a 3ª pessoa, e veio o She .... Loves You. Chegados da viagem, enquanto aguardavam o show em Newcastle, sentaram-se em suas camas num quarto de hotel, um de frente pro outro, John complementou com o Yeah Yeah Yeah, e estava pronto o refrão, aliás, foi a primeira vez em que usavam essa peça estrutural em suas canções, até então eram apenas versos e pontes. Ali no tête-a-tête, foram desenvolvendo os versos, contando como o autor dava uma de cupido com o amigo, dizendo que a ex-namorada ainda pensava nele e o amava (Verso 1), e que, apesar de ferida e quase ter perdido a cabeça, sabia que ele era um cara legal, e queria dar uma segunda chance (Verso 2) e que ele tinha que deixar de ser orgulhoso e ir lá 'apologyze to her' (Verso 3). Àquela altura de sua vida como compositores, já estava em curso a política de não repetição de letras, que abandonaram em Do You Want To Know A Secret. 
 
Cinco dias depois das camas no hotel, e dois após uma reunião de finalização na casa de Paul em Liverpool, os Beatles adentraram aos estúdios de Abbey Road para gravar as duas canções do compacto, num 1º de julho. Infelizmente, os registros de sua gravação foram perdidos, então não esperem deste escriba os detalhes de número de takes, completos ou abortados, e quem errou o quê, quando, e mesmo se eles tocaram tudo ao vivo como vinham fazendo, ou se fizeram uma base e gravaram os vocais depois. Geoff Emmerick escreveu em seu livro Here There and Everywhere que ocorreu esta última opção, mas há controvérsias porque eles vinham utilizando a primeira até então. O que dá pra afirmar é que nunca os sorrisos dos técnicos estiveram tão presentes ao longo de toda a sessão, todos orgulhosos pelo que ouviram ali. George Martin e todos ficaram intrigados com 6ª de Sol (Mi), que George entoava no 4º Yeah da introdução, complementando John na terça (Si) e Paul na quinta (Ré), acorde repetido na conclusão. Martin garantiu que já ouvira aquilo em um certo grupo vocal, mas decerto foi a primeira vez em um grupo de rock'n roll. 
 
Era o crescimento musical dos Beatles, patente a cada movimento... a começar pela batida sincopada da bateria de Ringo, triplo tom-tom nos compassos pares da introdução/refrão (ele repetiria o movimento em Ticket To Ride dois anos depois). Note-se a descida de uma oitava no mesmo verso, 'she says she loves YOU....' terminando lá no alto, e despencando no 'and you know it can be bad', e logo George emenda as notas do 'Yeah Yeah Yeah' na guitarra. Ao longo da canção John e Paul cantam em unisom, mas com precisas harmonias em pontos selecionados, especialmente nas palavras finais de algumas linhas ('thinking OF - your LOVE - be BAD - her SO - she KNOWS - to YOU - you TOO') nos pontos de rima aliás, adoro esta última. George se junta nos refrões e com aquela nota sinistra no final dele, e também harmoniza nas frases pares dos versos. E encante-se com as batidas 1-2-3 de Ringo no 'love like that' introduzindo três Beatles Breaks sensacionais. 
 
Não é preciso dizer que She Loves You foi muuuito tocada ao vivo. Deixo aqui, como registro, a performance no show de Ed Sullivan em 9 de fevereiro de 1964, quando The Beatles conquistaram a América. Neste LINK. E é um still desse vídeo a imagem que deixo, também é do show, com aquela configuração simétrica de Paul e George, somente possível porque Paul é canhoto. Eu rio sempre nos momentos em que eles balançam as cabeças, e as garotas vão à loucura. E choro...


18. I'll Get You (by John Lennon)
John se declara 'Eu penso em você noite e dia. Eu preciso de você e é verdade, quando penso em você, eu posso dizer que eu nunca, nunca, nunca, nunca fico triste. Então eu estou lhe dizendo, minha amiga, que eu vou conquistá-la, eu vou conquistá-la no final. Sim, eu vou conquistá-la, eu vou conquistá-la no final' 
 
Quando veio a missão de fazer o próximo compacto após o lançamento do 1º LP, eles estavam numa parada em casa, em meio a mais uma excursão pela Inglaterra, quando ainda moravam em Liverpool. I'll Get You foi a primeira que veio à cabeça de John. Foi em sua casa em Menlove Avenue, onde morava com sua Tia Mimi, que ele e Paul a começaram e finalizaram em menos de três horas de trabalho. Foram dois versos, sendo o primeiro repetido após uma ponte, tradicional estrutura 'aaba', sem refrão. No Verso 1, ele começa incitando a imaginação da garota em como seria bom ela ficar com ele, "Imagine I'm in love with you...e termina mostrando aquela confiança em seu taco, no magnífico "...Yes I will, I'll get you in the end. Oh Yeah Oh Yeah". O Verso 2 tem o mesmo final, confiante, mas antes ele abre seu coração, dizendo "I think about you night and day..." e que, com ela, ele jamais seria triste de novo. Finalmente a ponte, aquelas sensacionais três frases em acordes descendentes "Well, there's gonna be a time, when I'm gonna change your mind, so you might as well resign yourself to me, oh yeah", ele mostra a confiança de novo e aconselha que ela desista de resistir ao seu charme. A canção seria a Lado A do lançamento até que chegou a arrasa-quarteirões She Loves You.
 
Pausa para uma estrutura alternativa. 
Eu vou aqui propor uma estrutura um pouco diferente, acho que ela é uma canção um pouco mais complexa. Eu enxergo, dentro de cada verso original, na verdade, um verso menor, uma sub-ponte e um refrão, veja se não. Minha estrutura alternativa seria 'abcabcdabc'. A sub-ponte (b) seria apenas a 5ª frase de cada verso original, que tem uma melodia diferente "It's not like me to pretend" e "So I'm telling you my friend" fazendo a ligação para a peça seguinte. E o resto de cada verso original, pra mim, seria um refrão (c), veja: "But (that) I'll get you, I'll get you in the end, yes I will, I'll get you in the end, oh yeah, oh yeah". Não tem uma tremenda cara de refrão? Ah, mas isso é só uma ilação deste analista. Somente para finalizar,  nessa nova estrutura, o 'd' da estrutura alternativa seria a verdadeira ponte da estrutura original.

 Fim da estrutura alternativa.    

Seja qual fora a real estrutura, eu queria dar um destaque para a tal sup-ponte, como eu a defini, até mesmo porque o próprio Paul, que parece ter sido seu autor, pois fez propaganda do acorde menor que ele usa, no caso, o La Menor (Am) ali quando se ouve "to preTEND" e no "you my FRIEND", quando o usual seria um acorde maior, no caso, o La Maior (A). Além disso, no arranjo, ele estimula a que as guitarras pulsem firme em staccato, o que tem um efeito fantástico nos shows ao vivo, vejam, ou melhor, ouçam como as garotas recebem, histéricas, os começos daquelas duas frases, neste LINK, gravado em um programa de TV e felizmente recuperado e revelado oficialmente no Anthology 1. 
 
Antes de passar à gravação, mais umas poucas considerações sobre a letra. Rimas que seriam ricas (não todas) em português, "day-say", "true-you-blue","pretend-end-friend", "time-mind"... ou seria "time-mine"? O porquê da interrogação? Note as duas primeiras frases da ponte. Para rimar com "be a time" da 1ª frase, a 2ª vem "change your mind", só que a ponte é toda cantada em harmonia tripla John-Paul-George, e um deles troca para "make you mine". Dado o cronograma apertado, eles não voltaram para corrigir o erro, que foi percebido ao menos por uma fã que escreveu à EMI, solicitando que corrigissem o erro, e recebeu de volta uma carta de desculpas. Interessante que o "mine or mind" rima  internamente com o verbo da "resign 3ª frase que, aliás, apresenta mais uma outra rima 'entre quatro paredes', perceba: "So you might as WELL resign YOURSELF to me, oh yeah". Eu acho essas coisas geniais! Para completar esse papo de letras, eu dou destaque a uma rima métrica, se é que posso chamar assim,  entre a 4ª frase do Verso 1 com a 4ª frase do Verso 2. Uma diz "many, many, many times before" a outra "I'm never, never, never, never blue", ambas a mesma palavra, três ou quatro vezes. Eu acho essas coisas geniais! (acho que já disse isso...). 
 
Bem, pensando bem, foi bom evoluir um pouco no assunto 'letra' porque no assunto 'gravação' temos pouco a falar. Ela foi gravada no mesmo dia que She Loves You, e já sabemos que não há registro sobre os detalhes da gravação naquele dia, parece que baixou um buraco negro naquele 1º de julho em Abbey Road. Sabe-se apenas que ela foi gravada na sessão noturna, após uma tarde dedicada ao Lado A do compacto. Sabe-se que foram duas horas de tentativas, Sabe-se que ela era conhecida como Get You In The End. Sabe-se do vocal principal de John e das harmonias perfeitas, primeiro de Paul em pontos selecionados dos versos, e de Paul e George na ponte, com certeza com o dedo mágico de George Martin os orientando. Sabe-se, porque se ouve, que John gravou a gaita que acompanha os versos (não a ponte) posteriormente (porque seria impossível cantar e tocar gaita ao mesmo tempo), mas não se tem noção se foi no mesmo dia ou em outro dia. Mas não se sabe se houve evolução no arranjo ou se ela chegou já pronta. Tampouco se sabe quando as deliciosas palmas foram gravadas. Não se sabe dos erros, nem de brincadeiras, nem de falhas ao longo do processo, coisas que nós gostamos tanto de saber. Enfim... 
 
O compacto, tendo She Loves You como carro-chefe, foi lançado em 23 de agosto e fez tremendo sucesso, como falei, vendeu 1,3 milhão de cópias na Inglaterra, em 6 meses no Top 20 das paradas. Interessante é que nos EUA, ainda antes de a Beatlemania chegar lá, seu lançamento inicial foi um fracasso. Coisas dos americanos... Deixo aqui o LINK do YouTube com a gravação original, onde poderão apreciar a gaita de John, as palmas de todos, e notar os detalhes de letras e acordes que ressaltei no texto!

ENJOY 


Como dito aqui em cima, o compacto vendeu inéditas 1,3 milhão de cópias, feito só desbancado 14 anos depois com Mull of Kintire, da carreira solo de Paul!! 

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Transcorria, à época deste último lançamento, em 23 de agosto, a excursão de verão, sobre a qual já falamos, e que iria até 15 de setembro. Destaques de rádio e TV adicionais desse período final dessa excursão sob o sol foram, 

i. a filmagem do documentário The Mersey Sound, da BBC TV, do qual participaram, sob a luz do Sol de Southport, na costa oeste da Inglaterra, de 27 a 30 de agosto, enquanto brilhavam em shows noturnos, e 

ii. mais uma participação no Saturday Club na Rábio BBC num sábado (claro!), 7 de setembro, onde, além de tocarem cinco canções, cantaram, os quatro, um Happy Birthday To You ao programa, uma gravação que usava sempre para saudar os aniversários dos amigos, ouçam aqui, neste LINKprática que interrompi já há alguns anos, notarão pelas datas dos comentários de agradecimento... 

Ah, sim, mais um destaque: em 10 de setembro, a menos de um mês de completarem um ano do lançamento de seu primeiro compacto, John e Paul representaram os Beatles num almoço no chiquérrimo Savoy Hotel, para receberem o prêmio de Melhor Grupo Vocal do Ano, do aguardadíssimo Variety Club Showbiz Awards, uma espécie de Oscar Britânico do Show Business, celebrando cinema, TV, teatro, música popular e clássica. Seria o primeiro de uma série... 

Na época da estrada, tão certo como o outono segue o verão, terminada a excursão de verão, começaria a excursão de outono... Brian Epstein não lhes dava muito descanso! Mas antes, um merecido período de 12 dias de férias. George, ainda sem namorada, pegou o irmão Peter e foram visitar a irmã Louise em Illinois, Estados Unidos. Paul e Ringo foram com as respectivas namoradas Jane Asher e Maureen Cox para a Grécia. E John, finalmente levou Cynthia à lua de mel, em Paris, onde ficaram hospedados no George V Hotel, dos milionários, que os Beatles já eram! Cynthia contou que lá encontraram Astrid Kircherr, fotógrafa dos tempos de Hamburgo, agora viúva de Stuart Sutcliffe, por quem John devia ser caidinho, como se desconfiou em Baby's In Black, entendedores entenderão...

A excursão começou em outro país, mas ainda no Reino Unido, com 3 shows na Escócia, a partir de 5 de outubro, um deles em Kircaldy, o da duquesa de CryBaby Cry, entendedores entenderão. Depois de mais 4 shows na Inglaterra, viria uma temporada de 5 shows em 5 dias na Suécia, a primeira no exterior contratada na esteira de seu sucesso, cada vez mais arrebatador. Sim, houvera duas temporadas em Hamburgo, já como Beatles, mas mas tratavam-se de resquícios contratuais antigos.

Mas pera aí, antes de seguir com a excursão, volto àquele breve período na Inglaterra, mais especificamente a parada em Londres, pois um dos show aconteceu no celebradíssimo London Palladium. Não se pode deixar passar aquele domingo, 13 de outubro, em branco. Foi após aquele show, que foi transmitido para todo o Reino Unido pela Alpha TV (ATV), que a fama crescente, exponencial, dos Beatles, causou eventos inimagináveis de  histeria coletiva, que chegou até a ameaçar a integridade física dos rapazes, um verdadeiro fenômeno, que acabou ganhando um nome, da imprensa Britânica.

Ele foi denominado Beatlemania

Os Beatles eram a principal atração da noite, e tocaram apenas quatro músicas, From Me To You, I'll Get You, She Loves You e Twist And Shout, mas ninguém falou delas, ou das outras bandas que tocaram no evento. Uma audiência de 15 milhões de pessoas viu ao vivo o fenômeno. O barulho era tanto que John mandou as garotas se calarem, para gáudio da audiência mais velha! Todos os jornais deram 1ª página ao evento, e noticiaram o frenesi incontrolável dos fãs, desde antes do show e seguiu durante e depois, quase que eles não conseguiram sair ilesos. A saída do Palladium foi complicada a ponto de Ringo ficar desorientado e entrar enganado no carro da polícia!  E um dos jornais cunhou o termo, que traduziu perfeitamente o fenômeno. Aquela sisuda ilha britânica estava com Mania de Beatles. Logo, logo, seria o mundo todo...

Outra amostra do sucesso foi o famoso Royal Variety Performance Show, de 4 de novembro, tradicional show anual no Prince of Whales Theatre, em que a Realeza recebe os mais destacados nomes do Show Business, com gravação de TV (naquele ano era a BBC, que revezava com a ITV) para posterior transmissão ao vivo para toda a Inglaterra. Presentes a Rainha Mãe e a Princesa Margareth. Os Beatles eram a 7ª atração da noite, mas entraram dispostos a causar. 

Terminada a 6ª atração, cortinas se fecham, um breve período passa, e então se ouve um som esperado, uma banda entoa acordes juntamente com vozes dizendo

Da-ra-rein  Da-ra-rein Dein-Da
Da-ra-rein  Da-ra-rein Dein-Da
If there's anything that you want
If there's anything I could do
e as cortinas se abrem e aparecem The Beatles
Just call on me and I'll send it along
With love from me to you

As cabeças da comportada plateia balançam, mas não mais que isso, pois o público era seleto, e não era a histeria que estavam acostumados a presenciar. Ao final da canção, eles  quebram o protocolo, movendo os dois microfones para a frente do palco, colocando-os bem próximos ao povo que já dominavam, e cantam She Loves You, o sucesso Nº1 naquele momento, Yeah Yeah Yeah Yeaaaaah. Após o demorado aplauso, Paul faz uma piadinha dizendo ser Sophie Tucker seu grupo americano favorito e entoam uma canção ainda inédita, que sairia 17 dias depois no 2º LP, With The Beatles, a linda balada Till There Was You, para acalmar os corações, ao final da qual, John e Paul retornam os microfones aos locais originais, e John ajeita o seu, e diz, com um sorriso sarcástico:

For our last number I’d like to ask your help. 
The people in the cheaper seats clap your hands. 
And the rest of you, if you’d just rattle your jewellery. 
We'd like to sing a song called ‘Twist And Shout’. 

E olha para a banda e as guitarras

                        tchan tchan tchan tchan - tchan tchan tchan

                                        tcha-ran-tchan-ran        

                        tchan tchan tchan tchan - tchan tchan tchan

... e aparece a voz áspera de John berrando 

                            'ousheikirolbeeibenau'

... e Paul e George respondendo, juntos no outro microfone

                            ‘sheikirolbeeeibé'

... volta John com 

                            ‘tuistendshaaaut’

... e Paul/George com  

                            ‘tuistendshaut'

... e John completa

                            ‘camoncamoncamoncamonbeibenaaau’

... e Ringo firme na bateria

... e por aí foi até o final, quando os quatro, sob aplausos desenfreados, fazem reverências à plateia e ao camarote real, e fecham-se as cortinas novamente, e não se falará de outra coisa nos jornais do dia seguinte senão do show dos Beatles e, especialmente, da crítica social de John, que podem conferir aqui, neste LINK.

E enquanto tudo aquilo acontecia em que interrompiam a excursão de shows pelo país (e até Europa) para as aparições de Rádio (4) e TV (5), eles voltavam aos estúdios da EMI para mais 6 sessões de gravação do novo LP, sendo 3 em setembro e outras 3 em outubro, além da sessão de julho durante o verão, gravando 8 canções autorais, sendo 7 novas e uma remanescente de Please Please Me, mais 6 covers de artistas americanos, repetindo os quantitativos do primeiro LP. 

O LP With The Beatles foi lançado em 22 de novembro de 1963. Havendo já sido lançadas 16 canções (1 LP e 3 Compactos), a numeração começa em 19.  

E vamos às canções! Encontrarão agora a análise das letra, das músicas, de suas estruturas, e de sua gravação!


19. It Won´t Be Long (Lennon/McCartney)

John anseia: "Toda noite, lágrimas escorrem pelo meu rosto. Todo dia eu não tenho feito nada além de chorar! Não vai demorar, yeah Não vai demorar, yeah  Não vai demorar, yeah , para que eu seja seu"

Saudade no modo "Quero voltar pra ela". Essa quantidade toda de yeah's do refrão foi caso pensado de John. Ele estava animado com os yeah's de She Loves You (yeah yeah yeah), e queriam produzir mais um sucesso Nº1 com a mesma fórmula. Aproveitou para fazer de novo um jogo de palavras como fizera em Please Please Me, o outro N°1 anterior, juntando na mesma frase uma expressão verbal ("be-long") e um verbo ("belong") com significados diferentes ("demorar"pertencer")! Duas fórmulas de sucesso combinadas não podia dar errado.... mas deu! Quer dizer, não deu porque não houve um compacto com a canção! Sabe por quê? Porque eles apareceram com outra para o posto, fraquinha, chamada I Want To Hold Your Hand... Começava ali a política de lançarem canções inéditas sem colocá-las em LPs. Paul contribuiu com letras internas e com arranjos harmônicos, além dos vocais no duelo de yeah's, e com os backing vocals da ponte ("Since you left me, I'm so alone, now you're coming, you're coming on home)". 
 
Uma ponte não existe sem versos, certo? Claro que eles estão lá, mas nesta canção, novidade, quem começa é o refrão, ou o coro, com o título da canção e aquele duelo sensacional de "yeah yeah yeah's" em que John se mostra otimista quanto ao retorno de seu amor. São três versos, bem curtos, de apenas sete compassos e cada um com letra diferente do outro, seguindo na política dos Beatles de composição. No 1º, John diz que está sozinho enquanto todo mundo se diverte, no 2º, segue em sua tristeza dizendo que não faz outra coisa senão chorar, mas depois que ele diz, na ponte, que ela voltou pra casa, no 3º Verso ele já está todo felizão e diz que nunca mais vão se separar, que lindo!
 
A canção foi a 1ª original a ser gravada para o LP With The Beatles na 2ª sessão de gravação para o efeito, em 30 de julho de 1963, um dia muito produtivo, em que trabalharam em outras cinco canções do LP. Foram 10 takes pela manhã, que foram desconsiderados, e de noite, outros sete foram executados, com todos em seus instrumentos usuais, e com John e Paul entregando seus perfeitos vocais, e finalmente mais seis vezes apenas com George tentando acertar os floreios descendentes em sua guitarra, após cada frase dos versos. O que se ouve até hoje é o Take 17 com os floreios do Take 21, mas então já com o vocal dobrado de John, o popular double tracking, procedimento usado aqui pela primeira vez. 

 
A canção não saiu em compacto, mas sua força em ritmo a levou ao posto de abrir o LP, que foi lançado em 4 de dezembro de 1963. Apesar disso, os Beatles nunca a tocaram ao vivo, apenas em uma dublagem para o Ready Steady Go, na TV inglesa. Deixo aqui então, o original, neste LINKNote como terminam a canção com John  em falsete em tripla harmonia com Paul e George, no "Yoooou", em acorde dissonante, como haviam acabado de fazer, em "She loves  you yeah yeah yeah yeeaah


20. All I´ve Got to Do (Lennon/McCartney)

John declara: "E quando e-e-e-u, eu quiser te beijar, tudo que tenho que fazer é sussurrar em seu ouvido as palavras que você quer ouvir e eu estarei te beijando! 
 
Imaginem a seguinte cena. Era 11 de setembro, a terceira sessão de gravação do álbum, John chega ao estúdio da Abbey Road e diz parra Paul, George e Ringo: "Camaradas, tenho esta canção aqui, que vocês nunca ouviram, e ela vai servir para encher o nosso álbum!" E, 15 takes depois, ela está pronta, com apenas um overdub da guitarra de George, e mais nada. Assim foi essa canção, a qual os Beatles se dedicaram, pela primeira e ÚLTIMA vez! Nunca a tocaram em nenhum show, foi pouquíssimo tocada em rádios, se é que foi, nunca lhe deram a menor atenção! E mesmo sendo uma album filler, é uma ótima canção, que nós adoramos! Era John inspirado em Smokey Robinson na melodia, e com letra mais dedicada ao público americano, pois falava em chamar a garota ao telefone, coisa que nunca fez parte da sua juventude, um recurso que ele viria a usar de novo em No Reply, um ano depois. 
 
O papo do telefone vem logo no 1º verso, John diz que sempre que quer ter a garota a seu lado, tudo o que tem a fazer é ligar!! No Verso 2, vem aquele papo de sussurrar as palavras certas no ouvido dela. Em ambos os versos, Paul faz harmonia vocal aguda no título da canção "All I've gotta do-oooo".  Ali também note-se uma interessante mudança de ritmo, começando com uma batida sincopada, e passando ao rock balada, na 2ª parte, valeu, Ringo! Aí, vem o refrão, aumenta o clima,  John diz que o mesmo vale pra ela, que sempre quiser, é só ligar, com a companhia de Paul e George em ótimas harmonias "aaaaaah, you've just gotta call on me". No verso final, que não e o final (veremos!), há um mix entre os dizeres dos Versos 1 e 2, e então repete-se o ótimo refrão, e finalmente (aqui, a explicação do 'veremos!'), a conclusão é com a melodia dos versos, mas apenas murmurada, sem letra, desaparecendo no horizonte, em fade-out. Charmoso! Ouça-a aqui, neste LINK.

 

21. All My Loving (Lennon/McCartney)

Paul promete: "E enquanto eu estiver fora, escreverei para casa todo dia e mandarei todo meu amor pra você. Todo meu amor, eu mandarei pra você. Todo meu amor, querida, eu serei verdadeiro"
Promessa de cartas diárias a seu amor, Jane Asher, enquanto estiver fora. Era maio de 1963, e ele estava começando um relacionamento com a atriz que conhecera um mês antes, nos camarins do show dos Beatles no Albert Hall! Foi a primeira vez que Paul escreveu primeiro a letra, depois encaixou a melodia. Ponto altíssimo do disco! A estrutura da canção difere um pouco da que vinha utilizando, um refrão após dois versos, depois mais um refrão e uma ponte apenas solada, sem letra, com estrutura de acordes diferente dos versos. Depois, repete-se o Verso 1, e finaliza com um refrão modificado. 
 
A gravação foi feita num ocupadíssimo 30 de julho de 1963, em que trabalharam em outras cinco canções do LP With The Beatles. Era a 2ª sessão para o 2º álbum da banda! Ela finalizou o dia, já de noite, e foram 11 takes, com a já famosa combinação John-Paul-George-Ringo com base-baixo-solo-bateria. E Paul cantou ao vivo em todos eles seu vocal principal. Os Takes 12 a 14 foram para Paul dobrar seu vocal nos Versos 1 e 2, e para harmonizar consigo mesmo no Verso 3. Nos shows, naturalmente seria John quem faria a segunda voz, mas não seria possível pois ele estava muitíssimo concentrado em sua es-pe-ta-cu-lar guitarra base em triplets, aquele tarara-tarara-tarara-tarara contínuo e sonoríssimo! Então, era George quem fazia esse papel, muito bem. Aliás, ele fazia o vocal principal e Paul entrava com a terça. Isso é que era uma banda. John faz um vocal de apoio, junto com George, mas apenas no refrão, em U-u-u-u-s!!!! George faz um solo de guitarra inesquecível na ponte, e Ringo sempre espanando sua bateria, como ninguém! Até deixo aqui este LINK, para poderem apreciar tudo o que foi mencionado (ver foto abaixo)! 
 
 
 
canção foi tocada durante todo o ano de 1964, com grande sucesso, inclusive foi escolhida para abrir, e dar o tom da primeira aparição no Ed Sullivan Show, em 9 de fevereiro de 1964, a "Noite Que Mudou A América"! John sempre considerou esta canção como uma obra-prima de Paul! 
 
Deixo também aqui um momento muito importante em minha vida: quando ouvi All My Loving ao vivo, pela primeira vez, claro, não com os Beatles, mas com Paul McCartney. Era 2002, eu estava em Houston, e fui ver um show dele no Compaq Center, uma parada de sua Back In The US Tour. Felizmente, existe um vídeo dessa performance, em meio a imagens das reações da plateia... Quer saber como eu me sentia? Note a imagem de um sujeito de cavanhaque, totalmente emocionado, com lágrimas nos olhos.... era assim que eu estava! Neste LINK. 
 
Para finalizar mesmo, não posso deixar de registrar como a ouvimos aqui no Brasil, em versão de Renato Barros (e seus Blue Caps), chamada Feche Os Olhos. Esqueça as particularidades do BlueCap Translator e curta muito como eram aqueles tempos por aqui. Neste LINK. 
 

22. Don´t Bother Me (George Harrison)

George lamenta: " Desde que ela se foi, eu não quero ninguém pra conversar comigo. Não é a mesma coisa mas eu sou responsável, é fácil de ver. Então vá embora, me deixe sozinho, não me amole" 
Primeira canção de George nos Beatles. E veio no modo GGG, Greta Garbo George, "I want to be alone!" Era uma canção de Saudade, na classe Tristeza, uma das poucas que escapavam àquele estilo 'happy-go-lucky', de garotos felizes e apaixonados daquele início de carreira. Ela foi feita durante uma turnê em Bournemouth, em que ele mais ficou na cama por estar doente (foto), só saía de lá pra tocar, nos 6 shows. Ele passou esse climão pra letra. E mesmo sendo sua primeira, já usou o padrão Beatle de composição: fazer mais de um verso com letras diferentes. Aqui foram logo três. No 1º, ele quer ficar só e admite a culpa por seu estado. No 2º Verso, ele não pode crer que está só, que não é justo, e tal, mas quer continuar só. Então vem a ponte, com melodia diferente, onde declara que não será mais o mesmo, e que aquela garota é a certa pra ele. No Verso 3, ele confirma seu desejo: não quer ver ninguém até que ela volte! Então vem um verso quase todo instrumental, com a guitarra do autor e a finalização repetindo a repulsa final do Verso 2. Depois, mais uma ponte, igual, e a finalização com um "Não me amole!" do titulo da canção repetido várias vezes em fade out.
 
A 1ª tentativa para a 1ª canção de George foi feita na 3ª sessão de gravação para o 2º LP dos Beatles teve 4 takes em 11 de setembro de 1963, apenas os 4 Beatles tocando seus 4 instrumentos usuais, mas tantos números ordinais e cardinais não serviram pra nada! Minto! John estava em sua guitarra base, sim, mas introduziu um toque diferente, um trêmulo, constituindo-se na 1ª vez em que um equipamento eletrônico foi usado na carreira dos Beatles! Decidiram começar do zero, mas numeraram a 1ª tentativa como Take 10, sabe-se lá por quê. E ela foi quase perfeita, já com vocal e solo de George, mas decidiram colocar aquela parada (Beatles break) logo após a introdução. Mais 3 Takes e o Take 14, que na verdade era o 9º, ah, chega de números, foi a base para overdubs. George dobrou seu vocal, com umas poucas falhas, afinal era a 1ª vez que fazia, e aí resolveram abrir a sala de instrumentos de percussão da EMI: Paul pegou duas claves e Ringo, um bongô árabe. Os Takes 15 a 19 foram executados, sendo o primeiro deles considerado final!
 
Por incrível que possa parecer, Don't Bother Me nunca mais foi tocada pelos Beatles, e nem por George em sua carreira solo, e nem por seus amigos no concerto de despedida, um ano depois de sua morte! Felizmente, ela acabou entrando para a posteridade, pois aparece no filme A Hard Day's Night no ano seguinte ao seu lançamento, mas apenas como música incidental, é uma das que toca enquanto os Beatles dançam, é a 2ª, neste LINK.

 

23. Little Child (Lennon/McCartney)

John propõe: "Se você quer alguém que te faça feliz, então nos divertiremos quando você for minha. Então vamos lá"
A canção era considerada como mais uma canção de trabalho, apenas um album filler, mais de John que de Paul, para Ringo cantar, mas ele não se sentiu bem cantando a letra "I'm so sad and lonely", ele gostava de entrar no clima da canção, e ele não estava nem triste nem solitário. Foi John, então, que levou o vocal principal dessa canção de paquera simples e direta, até um pouco direta demais com algum apelo sexual. Instrumentos usuais mais um piano de Paul e uma gaita de John! Outra que também não viu a luz do sol de uma apresentação ao vivo! Pra um breve resumo, estaria bom, né? Mas a canção merece um pouco mais de detalhe! 

Letra?  
"Paquera um pouco direta demais com algum apelo sexual
"? Talvez sim, talvez não, mas leva jeito, pois "I'll make you feel so fine" e o "have some fun" e o "Come on Come on Come on!" trazem essa conotação, e o "Little child" sempre lembra a menor idade da moça, e tal, meio perigoso isso... Aqui, os versos não variam de letra, são sempre como na imagem ao lado,
 delicioso, que é repetido três vezes, entremeados dor duas pontes, aí sim, com letras diferentes, e mais um solo instrumental, com uma estrutura de acordes diferente tanto dos versos como das pontes! Riqueza considerável! Mas aí já invadi o campo do próximo parágrafo.  
 
Música? 
Ali em cima, no resumo, eu falei muito sem cerimônia "mais um piano de Paul mais uma gaita de John"... Nããão! Tinha que ter sido mais enfático, porque foi um MAGNÍFICO piano de Paul, pela primeira vez assumindo o instrumento, que o maestro Martin havia tocado em outras canções, e uma ESPETACULAR gaita de John, que perpassa TODA a canção, em todos os versos e pontes. Mas antes vamos à base. Ela foi gravada primeiro em dois takes no dia 11 de setembro, e mais cinco no dia seguinte, quando então passaram aos overdubs. A gaita de John levou outros seis takes para se chegar àquela sensação, começando pela introdução solo de quatro compassos, as respostas nos versos, o acompanhamento nas pontes, a seção solo em 12 compassos, tudo perfeito. Paul acertou tudo em duas vezes, e tão bem, que foi colocado alto na mixagem e quase não se ouve o próprio baixo de Paul. Fizeram a conta, né, estamos no Take 15. Eles se juntam de novo para mais três performances, com John tocando sua gaita na seção solo, que ficou tão estupenda na 3ª vez, que foi escolhida para ser colocada por sobre aquele Take 15 do piano de Paul, e essa combinação é o que ouvimos na versão final, operação feita no dia 30. John e Paul ainda retornaram três dias depois para acertarem seus vocais, John dobrando o dele no principal e Paul agregando a linda harmonia em "I'm so sad and lonely". Mesmo tão especial, Little Child nunca viu a luz do sol de um palco, não foi nem tentada na BBC. Então, não tenho outro jeito senão deixar aqui o LINK original.

 

24. Till There Was You  (by Meredith Wilson )

A canção foi composta para o musical da Broadway 'The Music Man' do final da década anterior.  Gravada por muitos, inclusive nossas conhecidas Shirley Jones e Peggy Lee, sendo a versão desta última a base utilizada por Paul para sua performance. A importância dela na carreira dos Beatles, poucos sabem, é transcendental. Brian Epstein a selecionou para o teste na gravadora Decca, para mostrar a versatilidade dos rapazes. Após serem recusados pelo gênio de plantão, Brian levou a fita daquela sessão para outras gravadoras, inclusive a EMI, onde um tal de George Martin mostrou interesse especial justamente por ela. Não foi à toa que resolveram oficializá-la no catálogo Beatle, com sua gravação para o 2º LP. E foi logo no 1º dia de gravação para o efeito, no dia 18 de julho de 1963, ali realizando três takes, ainda com Ringo em sua bateria! Já nos cinco takes seguintes, no dia 30, George Martin usou sua prerrogativa de produtor e entregou dois atabaques para Ringo tocar, deixando de lado a bateria naquela canção. Todos tocaram ao vivo, Paul cantou 
ao vivo e nada mais foi necessário,. A canção estava pronta! E foi a primeira cover a aparecer no LP! Destaque merecido!
 

Era uma balada romântica que Paul fazia questão de cantar para mostrar a versatilidade do grupo. Ela fez parte de shows importantes dos Beatles, como a apresentação para a realeza britânica no final de 1963, e o que fizeram no programa de Ed Sullivan, quando conquistaram a América no início de 1964, nas duas ocasiões fazendo questão de apresentar a canção como da trilha do citado musical, que foi sucesso nos dois países! Ah... esse Paul, sempre antenado! O vídeo que deixo aqui, neste LINK, foi o do show real, vejam que gracinha o vocal de Paul, o magnífico solo de guitarra de George e notem ao fundo, o hi hat  (chimbal) da bateria de Ringo. Vale lembrar também de uma versão brasileira, de Beto Guedes da canção, que fez muito sucesso aqui (LINK)

 

25. Please Mr. Postman (by Dobbins, Garrett, Gorman, Holland, Bateman )


A canção já era um sucesso mundial e ganhou uma versão espetacular dos Beatles. Os quatro autores aí de cima a fizeram para um grupo vocal feminino, uma referência para os Beatles, The Marvelettes! Tudo foi gravado na 2ª sessão de With The Beatles. Foram apenas sete takes, todos tocando e cantando ao vivo, sendo que só nos finais foi adotada aquela sensacional parada no final somente acompanhada por palmas, que vieram em mais dois takes, de overdubs posteriores, juntamente com o vocal dobrado de John. 
 
Aliás, John apresentou um vigoroso vocal principal, que implorava ao carteiro por uma carta de seu amor. Paul e George capricharam na harmonia vocal, tanto no contracanto perfeito nos refrões, que imploram ao carteiro, como nos u-u-u-u's acompanhando John nos versos, que contam a história. Destaque para os magníficos handclaps (palmas), na introdução, enquanto chama o carteiro, e nas paradas das cordas do fim da gravação, tão singelas que resolvi colocar aqui este LINK para as pessoas se deliciarem numa apresentação ao vivo, em que dublaram a gravação de estúdio! Imperdível! Vale o destaque de que a canção teve a letra modificada para a perspectiva masculina, e teve inúmeras versões cover, uma delas que ouvi muito, dos Carpenters, 10 anos depois.  

 

26. Roll Over Beethoven  (by Chuck Berry)

Uma favorita de John, Paul e George, feita pelo compositor americano guindado por John ao posto de Rei do Rock & Roll. Era um dos compactos que chegaram às docas de Liverpool antes do resto da Europa, e que os três tiraram em suas guitarras, desde 1956, e que eles tocavam sempre, e continuaram a tocar até as turnês de 1964 pelos EUA. Foi George quem deu vocal a esse hino, direcionado ao compositor clássico Beethoven (e Tchaikovski e outros), dizendo pra ele se revirar no túmulo porque o Rock chegou! Aliás, foi uma de três faixas de With The Beatles que têm George como Lead Singer, sendo uma delas sua primeira autoral. 
 
O clássico de Chuck Berry foi gravado rapidamente, primeiramente ao vivo, em cinco takes, com todos tocando, e George cantando ao vivo, na 2ª sessão de gravação para o álbum, em 30 de julho de 1963, depois, mais dois takes de overdubs, para melhoras na guitarra e no vocal de George, e um final de mixagem, entre melhores momentos de takes anteriores, total de 8!!! Veja como George era inspirado ao cantar Chuck Berry e realizar excelente solos em sua guitarra, seguro... neste LINK.

 

27. Hold Me Tight (Lennon/McCartney)
Paul pede à garota: "Sinta agora, segure-me forte, diga-me que sou o único e então eu poderia nunca estar sozinho. Então, segure-me forte esta noite (esta noite), é você você, você, você, oo" 
 
Olha, prestando atenção mais na letra dessa canção que eu ADORO, poderia muito bem tê-la classificado como Sex Song, "making love" e "alone tonight with you", humm, decerto era, e só não teve problemas com a censura porque não foi muito tocada nas rádios. Hold Me Tight era pra sair n
o primeiro LP, Please Please Me! Ela foi gravada naquela sessão histórica em que gravaram e finalizaram 10 canções em um só dia, o já famoso 11 de fevereiro de 1963.  Pois é, foram 11! Entretanto, apesar de finalizada, considerada pronta após 13 takes, ela foi considerada mais fraca, e deixada de lado. Na imagem, encontrei a Recording Sheet da prova de que Hold Me Tight foi gravada no mesmo dia que outras canções do 1º LP dos Beatles. Oito meses depois, na ânsia  de angariar canções para o novo álbum, lembraram-se dela, só que... não acharam o tape! Ou gravaram por cima! Então, começaram do zero! E foi um primor!! 
 
A canção é de Paul com pouquíssima participação de John. Muitas escolhas magníficas, 
  1. o começo "It feels so right now..." com o final da ponte, que reaparece mais duas vezes, lá do meio da canção,  
  2. a guitarra de George, pulsante, brilhante, o tempo todo,   
  3. o duelo pergunta-resposta, com Paul chamando e George/John atendendo "Hold (Hold) Me tight (Me tight) Tonight (Tonight)" nos versos, 
  4. a brilhante transição do final do 2º verso com o começo da ponte, ambas peças estruturais compartilhando um mesmo compasso na palavra "YOU", perceba: "It's you, you, you, you, you, YOU don't know what it means to hold you tight", 
  5. as palmas o tempo TODO,
  6. as harmonias vocais quase em toda a canção, 
  7. o final desacelerando, inédito. 
Sete pontos! Um número mágico para uma canção idem. Um espetáculo! Era uma daquelas que eu ouvia e repetia e repetia, em meu LP Beatles Again, já mencionado! É uma canção injustamente subavaliada na minha opinião!  
 
A sessão em que a Fênix ressuscitou das cinzas foi em 12 de setembro, a 4ª sessão de gravação para o 2º LP, With The Beatles. Apesar de terem passados 13 takes, lá em fevereiro, o primeiro da sessão foi numerado 20! Daí até o Take 23, considerado base, seriam 4 vezes, né, só que não.... em vários deles se falou "Ah esse não valeu!", porque houve um erro de vocal ali, um de bateria ali, uma guitarra acolá e voltava-se à mesma numeração, um pouco de indisciplina foi verificado. Então, começou uma série de 6 takes até acertarem as palmas e vocais adicionais Um erro que acabou ficando foi John dizendo "so" ao invés de "now", após o "It feels so nice...". O que se houve no disco é uma combinação dos Takes 26 e 29. 
 
Embora tocada nos tempos do Cavern Club, nunca mais foi tocada ao vivo após seu lançamento. Felizmente, alguma justiça lhe foi feita ao ser lembrada para a sequência inicial do filme Across The Universe. Deixo com vocês um trabalho impressionante de um iteliano Frudua, que faz incríveis pesquisas de harmonias vocais nos Beatles. Vale a pena ver todos eles. Aqui neste LINK, ele destrincha Hold Me Tight.

 

28. You Really Got a Hold on Me (by Robinson)


"I don't like you but I love you!" Assim começa uma favorita do álbum pra muita gente. Linda balada! 
Surpreendentemente, é George quem faz harmonia com John, enquanto Paul entra esporadicamente. O Robinson do título é de Smokey Robinson, um favorito de John, em quem ele se inspirou em muitas de suas canções. Em homenagem a essa idolatria, deixo aqui um LINK com e sua banda backing vocal The Miracles.
 
 
Ela foi a 1ª canção gravada na 1ª sessão de gravação do LP, em 18 de julho. Foram 7 takes iniciais, com o auxílio luxuoso de George Martin ao piano, já na base, como se fosse um membro da banda, na introdução, que volta no meio e no final! Depois, foram mais 4 takes para reforço do riff final de guitarra e, particularmente, dos "baby"s, que John quis melhorar!  You Really Got A Hold On Me foi tocada ao vivo em sessões da BBC, e depois aparece no filme Let It Be, das sessões do Projeto Get Back, de 1969.

 

29. I Wanna Be Your Man (Lennon/McCartney)

Ringo se declara à garota: "Quero ser seu amor, garota, quero ser seu homem, amo você como ninguém, quero ser seu homem" 
 
Com a recusa de Ringo em cantar Little Child, John e Paul tinham que arrumar outra para seu baterista, afinal era regra que ele deveria cantar ao menos uma em todo LP, dado seu número crescente de fãs! John teve a ideia do título, Paul fez o resto. E o resto não é muito! A letra quase toda está ali em cima! Simples, simples, simples, e com amplitude vocal reduzida, para Ringo poder cantar tocando bateria, ao vivo! Mais interessante, porém, na história dessa canção, é que numa certa tarde, de 10 de setembro de 1963, tendo a canção ainda em começo de estruturação, John e Paul caminhavam em Londres (quando eles podiam!) e viram Mick Jaegger e Keith Richards num táxi e pegaram uma carona com eles, sabe, né, aqueles táxis negros, espaçosíssimos, em que se sentam 5 pessoas de frente umas pras outras, com espaço para uma mesinha entre eles, um táxi social, enfim. Conversa vai, conversa vem, Mick pergunta: "Got any songs?", Paul e John se entreolharam, com a mesma ideia, e responderam uníssono: "Yes!", seguiram com eles até o estúdio, finalizaram a canção, em 10 minutos, quando John fez o título e colocou como refrão, e depois os Rolling Stones a gravaram, constituindo-se em seu primeiro Hit nas paradas inglesas, atingindo o posto N°12. Fui buscar a imagem desse compacto, especialmente para mostrar a gravadora, conhecem? Sim, Decca, a mesma que recusou The Beatles em janeiro de 1962. Felizmente, para o visionário gerente de plantão, um raio caiu duas vezes no mesmo lugar e ele pôde salvar sua biografia!  

A letra toda tem apenas 17 palavras, em sua totalidade, "I-wanna-be-your-lover-baby-man-love-you-like-no-other-can-tell-me-let-understanddistribuídas em uma estrutura verso-refrão-verso-refrão, tão curta, mesmo assim, com letras diferentes nos versos! No 1º, Ringo paquera a garota indo direto ao ponto: "Quero ser seu homem!" e apresentando suas credenciais "Ninguém a amará como eu!". No 2º Verso, implora que ela diga que o ama, ele precisa entender! O Verso 3, após o solo instrumental, repete o Verso 1. Simples assim! Para agregar ao cardápio de curiosidades Beatle, I Wanna Be Your Man, é a 4ª em menor número de palavras do cancioneiro da banda, perdendo apenas Wild Honey Pie, com 5, The End com 11, e I Want You, com 15 palavras. Bem, caso se desconsidere Wild Honey Pie como canção, I Wanna Be Your Man leva Medalha de Bronze, subindo ao pódio da modalidade!! 
 
No dia seguinte àquele encontro com os Stones, os Beatles fizeram um take da canção, e partiram para outras canções, retornando no Dia 12, onde fizeram mais seis takes, todos em seus instrumentos e com Ringo cantando ao vivo! John e Paul também harmonizaram com Ringo nos refrães e ficaram doidos durante o solo de George, gritando e brincando! No final do mês, George Martin acrescentou um órgão Hammond, em seis tentativas, e aos três dias de outubro, Ringo apareceu para mais duas, uma dobrando seu vocal e outra acrescentando chocalho! Era o Take 13, final! 
 
I Wanna Be Your Man sucedeu Boys, nas apresentações ao vivo da banda com Ringo no vocal, sendo a primeira de cinco canções Lennon/McCartney que cantaria ao longo da carreira, e Ringo cantou-a muita vezes para delírio de suas muitas fãs, uma delas inclusive no histórico show no Washington Colliseum, na semana da conquista da América! Queria deixar uma delas aqui pra vocês mas não achei imagens, então deixo esta aqui, dele, aos 70 anos, e tocando sua bateria com sua All Star Band! Neste LINK.

 

30. Devil in Her Heart (by Drapkin)


Se as quatro covers até aqui foram sucesso na América, este não foi o caso de Devil In Her Heart. Canção obscura, de um selo obscuro, não chegou às paradas nem nos Estados Unidos, muito menos na Inglaterra. Mas encantou aos Beatles. Sendo mais uma composição feita para mulheres cantarem (inclusive seu nome falava em His Heart), eles adaptaram a letra para a perspectiva masculina. Tocaram-na em shows, e inclusive na BBC, após o que resolveram que era uma boa opção para seu 2º álbum! E foi! E somente então a canção chegou ao estrelato, com que seu autor nunca sonhou! E foi George quem a vocalizou, constituindo-se na sua 3ª aparição no LP, coisa que só se repetiria em Revolver, dois anos depois. Ela foi gravada na 1º sessão de gravação do LP, em 18 de julho de 1963. Executaram-na três vezes, ao vivo, com vocais, principal e de apoio, perfeitos. Em mais 3 takes, aperfeiçoaram partes da guitarra, dobraram o vocal de George e Ringo acrescentou um chocalho. Aqui, neste LINK, o som original.

 

31. Not a Second Time (Lennon/McCartney)

John despreza a ex-namorada: "Você está contando a mesma velha história e eu me pergunto para quê! Você me magoou e agora voltou. Não, não, não, não uma segunda vez" 
 
Se há uma canção que parece mais solo que Beatles, essa é Not A Second Time. A música é apenas de John, abandonado pela namorada (portanto, uma Miss Song), mas nem aí para as tentativas de volta (Disdain Class), apenas John canta, quase não se ouve o baixo de Paul, suplantado pelo magnífico piano de George Martin, inclusive na seção solo, e a guitarra de George está bem escondida. Ringo aparece um pouco mais, principalmente porque a bateria não entra de imediato mas somente ao final do primeiro verso, bem sonora! 
 
"A estrutura de acordes da canção era complexa, com as tônicas maiores em sétimas e nonas, além de apresentar heterodoxias na relação entre harmonia e melodia, mudanças de tom peculiares, tão naturais na cadência eólica de Not A Second Time", dizia um artigo de um crítico musical do tradicionalíssimo The Times, um certo Mr. William Mann, um mês após o lançamento, que elevou o trabalho dos 'meninos' a um nível bem acima dos cabeludos-fazendo-música-barulhenta-enlouquecendo-fãs, que era o que a imprensa estava acostumada a exaltar. Para se ter uma ideia, comparou seu trabalho a Mahler! Tanto John como Paul referiam-se a esse autor em entrevistas posteriores, mesmo admitindo que nem percebiam o que faziam. 


Eram apenas gênios, afinal!

Mas olha, eu fui buscar os acordes da canção para ilustrar as tais sétimas e nonas levantadas pelo artigo, mas não encontrei, apenas os acordes maiores usuais, tendo apenas um Ré com 7ª para quebrar a onda. Decerto, os Beatles têm em seu catálogo canções muito mais complexas que esta, mas enfim, o artigo foi importante para elevar a impressão que os Beatles despertavam na imprensa a um  'outro patamar', para usar uma expressão moderna. A própria Ask Me Why, do 1º LP, esta sim, tem uma profusão de acordes bem complexos. Também, a tal da cadência eólica levantada pelo especialista, não consigo entender ou captar, aliás, John morreu sem saber também, mas morreu feliz com o artigo. Neste LINK, está o artigo todo, inclusive transcrito, muito bom, em que ele fala de outra meia-dúzia de canções, vale a leitura!

Em termos estruturais, é um simples verso-verso-ponte, depois uma ponte instrumental (com o piano de Martin entoando a melodia), e repetem-se as três peças iniciais, e vem a conclusão. Os dois versos são curtos (apenas sete compassos) e letras diferentes, o 1º está com John sem saber por que chora por ela, no 2º, ele percebe que ela mudou de ideia, mas ele, não. E na ponte, que está todinha ali no caput, ele diz: "Aqui não, bebê!! De novo, não!!". 

A criação em estúdio de Not A Second Time, entretanto, foi bastante simples e rápida! Foram apenas cinco takes, em 11 de setembro, com a banda em seus instrumentos tradicionais. Depois, mais quatro somente com o piano de George Martin e a dobra de vocal de John em momentos selecionados! Como outras cinco originais de With The Beatles, a canção nunca foi tocada ao vivo. Conheça-a, ou lembre-se dela, aqui, neste LINK.


32. Money - That´s What I Want  (by Bradford/Gordy)

Money era minha preferida aos 7 anos de idade, quando ouvia o Beatles Again, que foi o LP onde saiu por aqui. Versão muito melhor que a original e muuuuito melhor ainda que a versão que os Rolling Stones fizeram dela, a voz de John está áspera, as respostas vocais de Paul e George, imbatíveis, só Beatles faziam daquele jeito, E sem se esquecer do perfeito piano de George Martin, cada vez mais ativo nas faixas dos Beatles! Na voz de Barret Strong, a canção foi o 1º sucesso da Motown Records, fundada por um de seus compositores Berry Gordy. 
 
A canção fez parte do famoso teste da Decca que foi recusado pelo cara que disse que grupos de guitarra estavam com dias contados .. só que o contador passa dos 22.000 e crescendo! Ouvindo hoje, dá pra perceber como o grupo cresceu em pouco tempo, pois a versão da virada do ano de 1962 é muitos pontos inferior à que se materializou nos estúdios da EMI ano e meio depois!
 
Começaram a gravá-la logo na 1ª sessão do LP With The Beatles, dia 18 de julho, foram 6 takes, todos juntos, inclusive vocais, principal e duelos, e com George Martin ao piano, desde sempre, aliás, ele fez mais um take sozinho ao piano. Numa 2ª sessão, 12 dias depois, somente ele ao piano em mais 7 takes, que acabaram não sendo utilizados. Então o que  se ouve hoje é o resultado do 1º dia, sensacional, dando um final ao álbum sem nada deixar a dever ao final do 1º álbum, Please Please Me, com a indefectível Twist And Shout, mais um espetacular desempenho de John Lennon e seus pares. Neste LINK, um raro desempenho deles ao vivo, desta canção, onde já podemos notar o destaque da bateria de Ringo, no alto, Paul e George com suas guitarras lado a lado apontando para a plateia, porque Paul é canhoto, muito mágico, dividindo um microfone, no "That's what I want", e John soltando sua voz, e o encanto das meninas com o som e a imagem dos rapazes. O único defeito é que não está lá, claro, o piano de George Martin.

A capa do álbum 'With The Beatles' inaugurou uma parceria de sucesso, que duraria até 1965, com Robert Freeman, fotógrafo jornalista do Sunday Times. Com seu trabalho de fotografias de astros do jazz aprovado pelos 4 Beatles, ele foi chamado a Bournemouth, cidade onde faziam 6 shows em agosto (aquele mesmo período em que George Harrison estava doente, citado aqui em cima na análise de Don't Bother Me), e não precisou mais que uma hora para fazer uma foto que foi referência para várias outras bandas!! Beneficiou-se da conjunção de luzes de um corredor escuro com uma luz natural de uma janela, pela direita dos rapazes, e saiu aquela foto maravilhosa, com as faces esquerdas na escuridão. Antes, por causa da necessidade de se adequar a foto a uma capa de disco, posicionou Ringo mais abaixo, até porque, disse ele, era o mais baixo dos quatro mesmo, e havia sido o último a entrar na banda! Aliás, exatamente um ano antes! A ideia original era que a capa fosse apenas a foto, sem palavras ou nomes. A direção da EMI achou que eles não eram famosos o suficiente para tanto...  falta de fé... meses depois, quem fez isso foram os Rolling Stones, em seu LP de estreia, e os Beatles perderam a primazia ... só essa! A EMI ficou também inconformada com as expressões sérias e teria vetado a ideia, não fosse a intervenção firme de George Martin, que bateu o pé!

'With The Beatles' foi direto para o topo das parada, tirando de lá 'Please Please Me', o primeiro LP, e lá ficou por mais 21 semanas, fazendo dos Beatles a primeira banda a conquistar a façanha!

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Agora, vamos passear pelos últimos 40 dias do ano de 1963, a partir daquele dia, do lançamento de 'With The Beatles', o 2º LP. 

Eles estavam em meio à excursão de outono, e assim seguiram, mas deram outra parada para participar de mais um Scene at 6:30 na Granada TV, e logo chegou o dia 29, quando foi lançado o 5º Compacto, com nada menos que I Wanna Hold Your Hand, com This Boy no Lado B! E o que aconteceu? Com os Beatles, nada, seguiam em sua excursão pelo Reino Unido, mas o compacto subiu como um foguete na parada e foi ao 1º lugar, desbancando quem? Uma banda chamada The Beatles, que estava lá com She Loves You, desde agosto. E então aconteceu uma situação como nunca dantes e jamais repetida por outra banda: The Beatles ocupavam o 1º e o 2º lugar na parada dos compactos e, também, o 1º e o 2º lugar na parada dos LPs, porque With The Beatles havia desbancado Please Please Me. Era sucesso ou não era? Sem dúvida, mas, do outro lado do Atlântico, nada acontecia... Mas foi justamente a canção recentemente lançada que seria o veículo para o fenômeno que aconteceria no ano seguinte. Mas ano seguinte é papo para o ano seguinte. Voltemos a 1963.

I Wanna Hold Your Hand e This Boy já haviam sido gravadas em 17 de outubro, numa mesma sessão em que gravaram You Really Got A Hold On Me, e também uma mensagem de Natal em disco flexível 45 rpm que seria remetida em dezembro exclusivamente para os membros cadastrados no Fã-Clube Oficial, que se alastrava por toda a Inglaterra. Essa prática foi mantida até o último Natal da banda, em 1969. Nela, cada Beatle exercitava seu carisma, em mensagem de agradecimento, com muito humor, comentando feitos do ano e desejando bom ano novo. Quem tiver curiosidade, tenho aqui o link com todas elas. A de 1963 ocupa os cinco primeiros minutos, neste LINK.

Em seguida, encontrem as análises das canções do novo compacto, sua composição, gravação, instrumentação, harmonias, estrutura, e decerto alguma oportunidade de ouvi-las. E como já estão acostumados, a numeração adotada nesta fase é a sequencial, desde o 1ª lançada, Love Me Do. As novas ganharam então os números 33 e 34, com apenas 13 meses de carreira.

Como a canção 33 foi a responsável pelo 1º Nº 1 nas paradas dos Estados Unidos, encontrarão em sua análise fatos que aconteceram já em 1964. Com certeza, repeti-los-ei no dia-a-dia daquele ano.


33. I Want To Hold Your Hand (by Lennon/McCartney)

John se declara 'Oh, sim eu direi algo a você, eu acho que você entenderá quando eu disser: Eu quero segurar a sua mão! Eu quero segurar a sua mão! Eu quero segurar a sua mão!'
 
Uma letra singela, um desejo simples, um pleito comum, cujo objetivo maior era segurar a mão de uma garota, envolto em uma canção pulsante foi o veículo para catapultar The Beatles ao Olimpo do entretenimento. Precisou mais de um ano de carreira bem sucedida do outro lado do oceano para que aquele 'fenômeno social' acontecesse em terras do novo mundo. Foi assim que uma garota de 15 anos definiu o que acontecia, quando expressou seu espanto a uma rádio de Washington, numa carta súplica para que tocassem Beatles. A canção que ela ouvira foi She Loves You. O DJ que a leu, pediu que uma aeromoça trouxesse a novidade da Inglaterra para que pudesse exibi-la, mas o que a moça trouxe foi I Wanna Hold Your Hand, ele a colocou no ar e a coisa começou a acontecer, quase um mês antes da chegada oficial daquele som prevista pela Capitol. Era 17 de dezembro de 1963, outras rádios fariam cópias em fita para serem reproduzidas ao redor do pais. A Capitol tentou bloquear judicialmente essas iniciativas que pipocavam pelo continental país, ninguém ligou e a febre já estava instalada até que finalmente ela decidiu antecipar o lançamento, para 26 de dezembro, quando quase todas as rádios populares já tocavam clandestinamente a canção. Seu Lado B era I Saw Here Standing There. A procura era tanta que eles tiveram que contratar fábricas de discos adicionais para atender à demanda, que chegaria rapidamente aos 7 dígitos.  
 
Quase um mês depois, no dia 24 de janeiro, os Beatles receberam a notícia da chegada de I Wanna Hold Your Hand ao topo de uma das principais paradas de sucessos americanas, e celebraram com uma guerra de travesseiros, e com um jantar de gala no Hotel George V em Paris, onde estavam hospedados durante 19 dias para dois shows diários no famoso Olympia. Finalmente, estava dado o sinal verde que eles mesmos se impuseram para atravessar o Atlântico. Só queriam desembarcar nos Estados Unidos quando fossem o Nº1. 
 
Quando o desembarque aconteceu, em 7 de fevereiro de 1964, em New York, com  uma multidão aglomerada no Aeroporto John Kennedy, as vendas estavam a caminho dos 2 milhões de cópias. Dois dias depois, a América sentou-se em frente à TV para assistir ao Ed Sullivan Show na edição mais famosa de sua história. Mais 10 dias nos EUA, com shows no Carnegie Hall (para nunca mais), no Washington Collyseum (1º show em um ginásio de esportes), e mais um Ed Sullivan em Miami, sendo tratados como reis que já eram (e um encontro com outro Rei, Cassius Clay no dia 18), eles estavam de volta a Londres, e um mês depois, I Wanna Hold You Hand já havia vendido 3,4 milhões de cópias só na ex-colônia ultramarina, cifra que subiria para incríveis 5 milhões ao longo dos meses seguintes. Era muito para quatro rapazes de 22 a 24 anos de idade. 
 
Bem, vocês notaram que desvirtuei de minha estrutura regular de análise. Normalmente, esse papo de vendas só viria ao final do post, após, detalhes da composição, quem escreveu o quê, qual a estrutura da canção, como foi a gravação, e tal. Foi porque, neste caso, o mais relevante de tudo foi essa reação que a canção provocou, ponto de mutação na carreira deles. Enfim, voltemos ao reme-reme. 
 
Buscava-se uma canção para o 5º compacto dos Beatles, e, claro, a encomenda foi dada à sua dupla fenomenal. Paul e John se reuniram no porão da casa da namorada do primeiro, aliás onde ele moraria nos próximos 4 anos, a convite dos pais dela. O objetivo deles era claro: buscar um som que agradasse aos americanos, que era o próximo mercado alvo da banda! Parece que conseguiram, né? Após duas horas, estavam elaborados alguns versos, com letra bem assim, assim, pareando "tell you something" com "say that something", conviremos que não foi nada muito brilhante, não é mesmo? O começo, com o "Oh, Yeah", seguia a linha das últimas duas canções, She Loves You e I'll Get You, que usaram a interjeição bem americana com grande sucesso. A ponte que vem a seguir tem a ótima repetição de frases, que fica na cabeça, e que pega, e que leva ao 3º grito que leva meninas à loucura, o famoso "
I get hiiiiigh". Oooops, não é isso? Não... mas isso foi o que Bob Dylan achava que era, quando apresentou a maconha aos rapazes em 28 de agosto de 1964, e pensou que eles já a conheciam por causa do canto, que na verdade era 'I can't hide, I can't hide, I can't hiiiide'. Pra quem não sabe, "I get high" era gíria para 'Eu fico doidão!" 
 
A gravação foi feita integralmente no dia 17 de outubro de 1963. Após duas horas de ensaio, inauguraram o equipamento de gravação de 4 canais em 17 takes, dando adeus ao de dois canais usado nas primeiras gravações. Fora uma concessão da direção da EMI, que reservava o equipamento melhor para gravações de orquestras, só que aquele grupo de jovens estava ganhando mais dinheiro para a gravadora do que muitas gerações de instrumentistas clássicos... A confiança de John era imensa, tanto que chamou George Martin lá da sala de controle: "Prepare-se para conhecer nosso novo Nº1"! Mas acho que nem ele imaginava que seria verdade também nas plagas americanas. Logo nos primeiros takes, eles decidiram abrir a canção com aquele final de ponte, das três frases repetidas, apenas nos instrumentos, o que se mostrou uma ótima decisão. Todos tocaram e cantaram juntos em todas as 17 vezes. Paul cantou em unisom com John, fazendo a harmonia aguda nos primeiros "hand' de cada verso, e também na totalidade ponte. John dobrou seu vocal por cima do Take 17, bem como as palmas foram acrescentadas por todos os quatro que se tornariam Reis na América 100 dias depois.
 
A canção foi muuuuito tocada ao vivo durante seu primeiro ano de vida. Claro que foi destaque no Ed Sullivan Show, LINK que deixo aqui, e notarão também nos EUA se faz caquinha, pois o microfone de John estava praticamente desligado e quase que somente se ouve a voz de Paul! O compacto original na Inglaterra vinha com This Boy no Lado B, e vendeu 1,25 milhão de cópias, somente perdendo para o compacto anterior, She Loves You e I'll Get You. 
 
No Brasil, a canção saiu no LP Beatlemania e num compacto simples tendo nada menos que She Loves You no Lado B, ambos em 1964. Na década seguinte, essas duas canções foram homenageadas pelo grande Belchior que termina sua linda canção Medo de Avião, se não conhece, ouça aqui neste LINK, se já conhece, ouça de novo, e arrepie-se, e quem sabe, chore, como eu, ao ouvi-la de novo...

 

34. This Boy (by John Lennon)

John aconselha: 'Aquele menino levou meu amor, embora ele se arrependerá algum dia, Mas este menino quer você de volta. Aquele menino não é bom para você, embora ele possa te querer também. Este menino quer você de volta' 
 
This Boy, também de 1963, é John aconselhando a moça de como ela não deve ficar com AQUELE rapaz que a vai fazer chorar, mas, sim com ESTE que a quer de volta pois é feliz só por amá-la. Bem, se ESTE rapaz é ele mesmo, não sei, e nesse caso, a canção seria na Classe Paquera mas, de qualquer forma, ele seque atuando como Cupido, mesmo que seja dele mesmo!! Aliás, a primeira linha do primeiro verso, 'That  boy took my love away' estabelece que a garota dele foi embora com outro, pobre rapaz, então, eu poderia afixar a canção no Assunto Saudade, na Classe Retorno, também sem problemas, mas como ele passa o resto da letra tentando convencê-la a ficar com ESTE rapaz, mantenho-a como uma Cupid Song. Até porque mudar tudo agora ia dar um trabaaalho.... 
 
Bem, seja de que assunto for,  trata-se da primeira balada que os Beatles fizeram, primeira no ritmo de valsa, mais especificamente no tempo 6/8, mostrando a versatilidade da banda, e quem teve a ideia foi, incrivelmente John, bem mais afeto ao bom rock'n roll. John chama a autoria da canção para ele em entrevistas posteriores dizendo ter-se inspirado em Smokey Robinsson, mas Paul garante que foi mais uma daquelas tête-a-tête (eye-ball to eye-ball, como eles gostavam de dizer) em quartos de hotel, cada um sentado de frente pro outro em suas camas de solteiro (twin beds). A ideia da harmonia tripla sempre esteve presente, claro que ainda dupla naquele quarto de hotel, mas depois chamaram o companheiro George para ensaiá-la e, claro, o outro George, o Martin, para dar aquele retoque final em estúdio. Olha, pode ser que outros grupos vocais tenham harmonias melhores, mas considerando que This Band ainda compunha e tocava e brilhava em todos os campos, não tenho duvida de que é mais completa conjunção de talentos de todos os tempos. 
 
A estrutura da canção é a mais-que-comum verso-verso-ponte-verso, sem refrão, cada um dos quatro componentes tem 16 compassos, a batida nas cordas é aquela Pã-pararara- pã-pã-pã. Para acompanhar a contagem dos compassos, fixe o número em cada 1º Pã, você vai ver que depois que chegar ao 16, a canção muda de verso, ou vai pra ponte, e note que internamente, você conta até 6 em cada compasso, por isso o tempo é 6/8, estou aprendendo junto com vocês essa coisa de compasso e tempo musical.
 
Na letra, John conversa com a garota tentando convencê-la a voltar. No Verso 1 ele reclama ter perdido seu amor e avisa a ela que o outro vai se arrepender, e que ele a quer de volta. Esta última linha é repetida nos Versos 2 e 3. Mas entre esses últimos tem uma ponte, uma espetacular ponte, eu a chamaria de a Golden Gate dos Beatles, porque John entrega um desempenho ímpar e aí é John mesmo, pois deliga-se a magnífica harmonia tripla dos dois primeiros versos, e ele chora, só, acompanhado dos murmúrios de seus companheiros em harmonia dupla... 
Oh, and this boy .... Would be happy
Just to love you .... But oh, my-y-y-y
That boy ... Won't be happy
'Til he's seen you cry-y-y-y 
Fiz questão de aumentar a fonte da ponte do my-y-y-y e do cry-y-y-y porque a emoção dele (e a nossa) vai aos píncaros, nesses trechos só ele mesmo, solo, chorando pra ela voltar, magnífico! Logo depois, volta a harmonia tripla em um 3º verso, desta vez com uma rima tripla pain-same-again. 
 
A gravação em Abbey Road foi feita em 17 de outubro de 1963, no mesmo dia que I Wanna Hold You Hand, e durou incrivelmente poucos 60 minutos, em 15 takes, já no novíssimo gravador de quatro canais, com que foram presenteados pela direção da casa, pois seria prerrogativa das gravações clássicas. 
 
Lembrar que a canção, só instrumental sem a letra, foi creditada como Ringo's Song no primeiro filme dos Beatles, Os Reis do Iê Iê Iê, de 1964 e acompanha o querido baterista numa longa e famosa cena. Admire aqui, neste LINK, o talento de Ringo, ou ainda, se quiser apreciar o talento de George Martin, deixo aqui o arranjo, só em áudio LINK. 
 
Porém, o maior destaque são mesmo os vocais em harmonia tripla John/Paul/George ao longo de toda a canção, ou no contraponto para John, ou acompanhando-o em hummmmms, no solo da ponte, majestoso. Deixo aqui ESTE VÍDEO, dos 3 gênios no show de Ed Sullivan em Miami, 16 de fevereiro de 1964, em que dividem um microfone único. Imperdível e emocionante! Note que desligam-se os berros das garotas, todos prestando enorme atenção, inclusive a linda menina que aparece no final. É daquele show, também que tirei o still para ilustrar este post..

Com todo esse sucesso, os Beatles seguiam em sua excursão de outono, e deram uma parada em 2 de dezembro para gravarem uma espetacular participação no programa dos comediantes Morecambe e Wise. Foi uma mostra da extensão do talento dos quatro fabulosos para o campo da atuação, da comédia, entrando totalmente no clima do programa, com direito a uma execução de mais uma canção, a tradicional Moonlight Bay, lá do começo do século, muito divertido. Deles, eles cantaram os dois lados do compacto recente, além de All My Loving, que haviam lançado no LP With The Beatles. Incrivelmente, o programa somente foi ao ar em março de 1964. Felizmente, tivemos acesso oficial a seu áudio no Projeto Anthology, de 1993, mas o vídeo ainda existe e deixo aqui, neste LINK. Abrem com This Boy, apenas Ringo aparecendo, tocando só no chimbal, os demais na sombra, e depois John com seu lead vocal, mas sempre acompanhado de Paul e George em magnífica harmonia tripla, a segunda melhor da carreira deles em minha opinião (Because é imbatível, mas nunca foi tocada ao vivo). Emendam com All My Loving, com a diferença de sempre quando a tocavam ao vivo: vejam que é George quem faz a harmonia com Paul no verso de volta do solo de guitarra, pois John, que a faz na gravação, está muito ocupado, fazendo sua espetacular sequência de triplets na guitarra, prestando uma atenção danada, notem! Paul até mesmo ressaltou isso no recente documentário McCartney 123. E após um breve aparição dos comediantes, vem o arrasa-quarteirões I Wanna Hold Your Hand, com Paul e John cantando em uníssono nos versos e em  harmonia na ponte! Depois, vem o famosíssimo diálogo dos comediantes com os Beatles, ou melhor, com John Paul George e.... Bongo!! E então trocam de roupa para cantarem o clássico! Muito bom!!

No dia 7 do último mês de 1963 foi deveras especial, em Liverpool, onde comandaram um Juke Box Jury, da BBC TV, em que julgavam as canções pretendentes a serem hits. E, logo após, brindaram a audiência com um fenomenal show, que traduz o clima da Beatlemania, os gritos, as faces, o encanto das 2.500 meninas (e meninos também), todos fãs cadastrados, acompanhando o fenomenal desempenho dos rapazes. Um extrato de 30 minutos do show foi ao ar no mesmo dia em rede nacional, horário nobre, num programa que foi chamado It's The Beatles. Um extrato desse extrato deixo neste LINK

E com todas essa paradas para aparecer em rádio e TV, gravar, lançar discos e brilhar, terminava em 14 de dezembro a excursão de outono no Reino Unido, com 38 shows, que começara lá em 1º de novembro, com direito a tirar onda com a Realeza! Um descanso de 7 dias foi ocupado com mais aparições em rádio (mais um Saturday Club) e TV (mais um Thank You Lucky Stars).

Outro grande destaque foi um especial de duas horas que comandaram na BBC (rádio), gravado no dia 18 e transmitido no Boxing Day (26). Claro que eram a principal atração, cantaram nove canções ao vivo, sendo que uma delas teve a letra modificada: From Me To You, pois trocaram os tempos dos pronomes do singular para o plural ("I" para "we", "me" para "us)", que virou From Us To You, que inclusive tornou-se o nome do programa (era pra ser Beatle Time) e teve um sucesso tão grande que sua fórmula e nome foram repetidas outras quatro vezes. Vale o registro desse áudio, aqui neste LINK.

Claro que Brian Epstein não deixava os meninos descansarem por muito tempo e dessa vez, verdadeiramente tirou-lhes o couro. Já em outubro, ele vislumbrara uma fonte de dinheiro durante as festas de fim de ano. Vendeu 100 mil ingressos para 30 shows num mesmo teatro, o Finsbury Park Astoria, de 21 de dezembro de 1963 a 11 de janeiro de 1964, portanto, dois shows por dia na maioria das vezes, inclusive no 1º do ano!! Dias de folga? Apenas 2, um deles o dia de Natal, que bonzinho era Brian! E cada show consistia em duas entradas dos Beatles, fechando cada uma com 4 e 5 canções respectivamente, mas não ficavam só nisso, eles participavam de sketches cômicos, envergando trajes diferentes, que se não eram brilhantes, faziam muito sucesso. Essa prática se repetiria nos dois anos seguintes!!

Como chave de ouro para este glorioso ano de 1963 na vida dos Beatles.  Entretanto, 1964 seria ainda mais glorioso! Começaremos a descrevê-los em breve. para o momento hora de atualizar os quantitativos de uma carreira espetacular. 


NÚMEROS DOS BEATLES

Até 31 de dezembro de 1962

Compactos: 5

Álbuns: 2

Canções Originais: 20

Canções Cover: 14

Sessões de gravação: 12

Shows no Reino Unido: 299

Shows na Europa (afora UK): 29

Aparições em Rádio: 32

Aparições em TV: 24

Beatles casados: 1

Namoradas Oficiais: 2

Filhos Beatle: 1

Eu juro que qualquer hora eu vou dar 

um formato melhor a essa plêiade de números