-

domingo, 26 de fevereiro de 2006

You Too Would Like It

         Eu e minha filha assistíamos, extasiados, ao Show do U2, segunda à noite, pela Globo, quando, sem mais nem menos, a querida emissora cometeu a heresia de interrompê-lo para um comercial! Refeito da revolta, fui à cozinha pegar algo para beliscar, e escolhi um tubo de biscoitos de chocolate recheados com chocolate. Ao oferecê-los à minha filha, ela recusou, pois não era a marca que ela gostava. Entretanto, olhou bem para a embalagem e disse:
         "Bem, ao menos, é um biscoito temático, vou aceitar!"
         Não entendi bem, por alguns segundos, mas logo desabei em risos, e complementei:
         "É ..... Agora, nós vamos ver, ouvir e comer Bono!!!!", provocando nela outros risos.
         Para quem não entendeu, Bono é o nome do biscoito de chocolate recheado da Nestlé e Bono também é nome do vocalista da banda irlandesa, que comandava o Show que nos deixava em êxtase!
         Aproveitando a historinha, declaro:
         Que S how!!!!
         O vermelhito em fonte maior é absolutamente necessário!
         É inacreditável o som que a banda, de apenas 4 músicos (ou melhor, 3, já que Bono está 99% do tempo de mãos vazias), produz. Não havia tecladista, naipe de metais, percussão ou backing vocals, como no também fantástico show dos Stones de dois dias antes. Apenas uma guitarra, um baixo, e a bateria!!!
         A guitarra solo, mordaz, marcante, é conduzida pelo homem que modestamente se autodenomina The Edge. Eu sempre implicara com a petulância do cara, que fez questão de abandonar o próprio nome e sair pelo mundo dizendo: Eu sou o máximo! Olha, o sujeito subiu muitos pontos no meu conceito. Ele pode não ser 'deus' (desde que Eric Clapton veio ao mundo, o título tem dono!), mas o cara é bom! Ele também toca teclado, em New Year's Day e faz um competente backing vocal em várias canções. E não sua, como bem observou Bono, não faz aquelas micagens de palco, tão comum em alguns colegas, que parecem possuídos.
         No baixo, o muito competente Adam Clayton. Não que ele seja um baixista marcante e influente como Paul McCartney e Roger Waters foram para The Beatles e Pink Floyd. Por outro lado, não se trata daquele típico baixista de 90% das bandas, que fica escondido, de preferência por detrás de 2 ou 3 guitarristas, burocraticamente executando seu essencial trabalho. O U2, com sua configuração minimalista, usa o baixo como fonte dos acordes musicais, papel que seria realizado pelo guitarrista base, da configuração tradicional (nos Beatles, por exemplo, John Lennon fazia a guitarra base). É só lembrar de With or Without You , daquele tum, tum, tum que se ouve ao fundo, ou de tantas outras belas canções. Repetitivo, mas fundamental!
         Na bateria, Larry Mullen não faz o gênero de se contentar em ser um 'mal necessário', como são vistos 90% dos bateristas. Normalmente, o baterista é o mais calado, não compõe, não dá opinião, age como instrumentista contratado. Porém, aqui, o fato de ser responsável por 1/3 dos instrumentos da banda eleva o moral e dá ânimo para sair da batida burocrática e dar o ar de sua graça. Notável é a batida marchante de Sunday Bloody Sunday. Aliás, falando em graça, registro aqui um comentário que ouvi, ontem pela manhã, de colunistas do sexo feminino da Band News, em reportagem sobre o show: "E o baterista do U2, o que é aquilo!!!!" Essas mulheres ....
         Bem, no comando, Bono Vox. Poderia parar por aqui, já que o vocalista é por demais conhecido de todos. Porém, não posso deixar de registrar o carisma, a presença de palco, o domínio completo da platéia. Não bastasse ter uma (ainda) potente voz, ele carrega todo o seu trabalho, de  eterno e merecidamente indicado ao Prêmio Nobel da Paz, para o palco. Listou no telão a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e não perdeu a oportunidade de pregar a paz religiosa entre palestinos, cristãos e judeus em uma memorável bandana que brincava com a palavra COEXIST e os 3 símbolos máximos das 3 religiões. Conquistou o público (ele nem precisava disto) com inúmeras declarações em português, começando com uma alusão ao enorme sucesso de Mick Jagger arriscando o idioma, dizendo "Oi, galera ... agora é a nossa vez", passando por declarações de júbilo futebolista, e finalizando com o cantarolar de "Ai, ai, ai, ai ... tá chegando a hora ..." no que foi imediatamente seguido pela platéia. Puxou ao palco um garoto de 13 anos (um iluminado, pois nem tinha idade para estar lá!) para falar alguma coisa, e uma garota para cantar uma canção romântica (With or Without You), e receber carinhos explícitos, com direito a selinho, tornando ambos celebridades instantâneas. Musicalmente, brindou a todos com todos os grandes sucessos, nem vou listar aqui. Destaque para Miss Sarajevo, em que canta em italiano, o que, no original, era levado por Pavarotti. No final, majestoso, numa canção que eu não conhecia, pede ao público que entoe o refrão "How long we'll gonna sing that song?" e deixa o palco, junto com os demais. O público continua lá, obedientemente entoando a questão por vários minutos, até que o baterista volta, acompanha a galera um pouco mais e comanda o final.
Cai o pano!!!!

Nesta era de blog, posso ilustrar um pouco mais, então,
eis uma ilustração do grande astro irlandês.

Rolling Stones - inesquecível

Em 20 de fevereiro de 2006, enviei a um grupo de amigos o meu novo número de celular e recebi a seguinte mensagem de um deles, admirador de música, saudosista da época do Classic Rock, como eu, no dia seguinte.

Caro Homero
Obrigado por estar incluído no grupo de AMIGOS.
Fui ao épico de Copacabana, na turma do ‘gargarejo’!!!!
INESQUECÍVEL!!!
Você foi?
Abraço

Respondi no dia 22,
Caro Amigo
Invejável!!!!
Também fui, só que na turma do ‘aconchego’!
Também achei INESQUECÍVEL ... levaram meu celular e documentos ... INESQUECÍVEL  .... e traumatizante ..... voltei pra casa e vi o show na TV  ... realmente épico!
Quando parar de rir, me ligue para contar detalhes...
Ontem, também na TV vi outro épico .... fantástico  ... aguarde meus comentários!!!
By the way, dentre meus amigos, você faz parte do grupo MUSIC, com quem divido abobrinhas musicais!
Olha, o fato lamentável acima, eu estou abrindo para um grupo reduzidíssimo de colegas! Agradeceria manter em segredo!
Abraço

O colega me ligou logo que parou de rir, e comentamos os acontecimentos, lamentáveis os meus, admiráveis os dele. Agora que já faz alguns meses, a raiva já passou, então posso compartilhar detalhes.
 O épico a que ELE se referia era o show dos Rolling Stones, em Copacabana, Rio de Janeiro, no dia da graça de 19 de fevereiro de 2006, para mais de 1.500.000 pessoas, que lotavam as areias da praia, de graça. Ele, convidado que foi de última hora para a área VIP, viu o show ali do gargarejo, sem atropelos, a uma confortável distância de 0,5 metro do espectador mais próximo, e pôde observar cada ruga de Keith Richards, ver cada movimento sincopado de Charlie Watts, e receber uma que outra gota de suor de Mick Jagger, em seus impressionantes movimentos pelo palco.
O épico a que EU me referia era o show do U2 no Morumbi, dois dias depois, no Morumbi, em São Paulo. Escrevi um artigo, inebriado que estava com o magnífico show que, com certeza, extasiou quem pagou o ingresso. Sim, lá, o ingresso era pago.
Fiz planos de assistir àquele épico da praia, junto com a galera, tolinho. Fomos, eu e minha filha, que temeridade!. Meu filho escapou, pois estava viajando. Estávamos animados, pegamos o metrô, descemos na Estação Cardeal Arcoverde, caminhamos junto do povão, todos felizes e ansiosos. Decidimos ficar mais ou menos perto do palco, então descemos uma rua apropriada para isso. Ao chegarmos à beira da Avenida Atlântica, começamos a entrar no bolo de gente. Seguríssimo com minha bermuda super-esperta, com bolsos fechados a velcro, lá coloquei meu celular e documento. Botei minha fila na minha frente, e comecei a guiá-la, com as mãos sobre os ombros dela, do alto dos meus 1,85 metros, achando-me o máximo, sabendo por onde encontrar as brechas no meio daquele mundaréu, em meio a vendedores com enormes geladeiras de isopor voando por sobre nossas cabeças, com seus braços levantados (!!!!). Até que consegui avançar bastante, porém, cada vez menos, menos, e menos, ..... até que parei. E onde parei, nada via do palco, onde tocavam os Titãs, banda de abertura do show, quer coisa melhor, de lambuja, via o show de meus ídolos! Entretanto, ali não dava pra ficar. Pra somente ouvir, toco meus CDs. Decidimos procurar um lugar mais longe do palco. Tentamos voltar, eu protegendo minha filha como podia, o povo grudado em nós, todos suados, alguns com uma cara mal-encarada de dar medo. O caminho de volta foi bem mais perigoso, assustador. Chegou um momento em que não éramos mais donos de nossas decisões, íamos conforme a turba mandava. Uma coisa, isto sim, épica, pra não dizer homérica.  Cheguei a temer por nossa integridade física. Imaginei minha filha pisoteada! Quando finalmente conseguimos ver a luz, respirar um pouco de ar fresco, e dar aquele Ufa!, pensei em ligar para casa para compartilhar o sufoco. Verifiquei o bolso do celular, o esquerdo, ainda fechado, ledo engano, estava vazio. O do lado direito, onde estava o documento, vazio também! Um sentimento de inutilidade se apossou do meu ser. Os caras tinham enfiado a mão nos meus bolsos super-velcro-protected, e eu não percebi nada! Idiota! Resignado, abaixei minhas orelhas de burro, e caminhamos no sentido da Princesa Isabel. Voltamos à praia, porém o palco estava muito longe. Pra ver por telão, melhor em casa! Ficamos desanimados e pegamos um táxi de volta, com os R$ 20,00 que haviam deixado no bolso de trás, que, por ironia, não tinha velcro!!! Fiquei me lembrando dos colegas a quem eu orgulhosamente garantia: “Sábado à noite, me encontrarão na praia de Copacabana!” respondiam: “Que coragem, que ânimo!” ou então “Tô fora!”. Sábios foram eles! Ou então, aqueles que conseguiram área vip!
Esta, a minha pequena aventura. Lição aprendida: programa ‘de grátis’, nunca mais! Tem que haver uma cobrança, nem que seja simbólica, para que seja feita uma seleção social. Ou, claro, no esquema boca-livre, com mordomias, nestes, tô dentro! E depois daquela, mereço!!!
Quando ocorrer outra oportunidade como aquela, agora digo: “Tô fora! Me inclua fora dessa!”
Fui!