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quarta-feira, 31 de março de 2021

Mother Nature´s Son singing songs for everyone

 Esta canção é a  canção do Lado A do 2° LP  do Álbum Branco

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 8 canções com Histórias na Primeira Pessoa

                                        as demais 13 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

20. Mother Nature´s Son  (Self Story Song by Paul McCartney)

Paul se coloca na pele de um camponês: 'Nascido como um pobre rapaz do campo, filho da Mãe Natureza, o dia todo canto canções pra todo mundo'. 

Iniciada na Índia, inspirada num texto do guru Maharishi, e complementada em Liverpool, na casa do pai. Uma canção pastoral. O mesmo texto inspirou Child of Nature, de John, que posteriormente teve a letra trocada para a linda Jealous Guy, e foi lançada na carreira solo. Era uma época em que os Beatles começavam com seus trabalhos pessoais. Paul estava num estúdio gravando esta canção, enquanto John e Ringo estavam em outro, terminando Yer Blues. Nesta canção, Paul tocou violão, bumbo e tambor. George Martin fez arranjo de metais (trompetes e trombones). 
 
Caramba, o resumo acima foi o que apresentei quando apresentei as canções dos Beatles que contavam histórias na primeira pessoa, e realmente não em muito mais do que isso pra comentar..... ah, sempre tem, né... 
 
O 'iniciada' em verdade constituiu-se apenas nas três primeiras frases, que estão traduzidas no caput, que vem a ser o Verso 1, depois vem um Verso 2 versando (!) sobre as águas da montanha, e depois um refrão que Paul preferiu deixar sem letra, ficando apenas no tchu-tchu-tchu-ru, e depois mais um verso falando das flores sob o sol, bem pastoral, mesmo, concluindo com outro 
tchu-tchu-tchu-ru, e mais um verso, desta vez apenas murmurado. Um total de apenas nove frases, bem simplesinha, mas bonitinha. Decerto, estaria entre as canções dispensáveis do Álbum Branco, caso fosse seguida a sugestão do Maestro George Martin, que disse que o material que tinham à disposição dava pra encher, com qualidade, apenas um LP com 16 canções, e olhe lá. O sucesso do LP mostrou que o Maestro estava errado! Aliás, coloquei-me esse desafio, de listar quais seriam essas canções, em minha opinião, e voltarei ao tema quando concluir este capítulo. Já venho matutando, e vejo que terei que cortar 'na carne'.... mas a presenta canção, sem dúvida, poderia estar entre as 14.

Ela foi apresentada por Paul aos demais no final de maio, na casa de George e, tão simples que era, não inspirou a nenhum acompanhamento dos amigos. A demo gravada tinha apenas Paul ao violão, e dobrando, tanto voz como instrumento, que também teve o fundo da caixa batucado, como percussão. Ela foi ensaiada no estúdio ainda em junho, sem compromisso, mas é digna de nota essa ocasião, pois foi a mesma sessão em que Blackbird foi gravada, e John, sem utilidade como instrumentista na gravação, ouvia lá da sala de controle e sugeriu que nela cabia uns metais, leves. Paul agradeceu a sugestão lá de baixo, mas disse: "Quem sabe nesta aqui..." e entoou Mother's Nature Son. Estava decidido o toque final da canção. Paul a trouxe oficialmente no estúdio apenas em agosto, finalizando o dia 9, solitário, ao seu violão, durante as últimas quatro horas da sessão, quando a tocou 25 vezes, quase todas completas, e se decidiu pelo Take 24 como base. Ao final, encomendou o arranjo de metais a George Martin, que somente se materializou em 20 de agosto. Eram dois trompetes e dois trombones, que tocaram sob a supervisão de Paul no chão do estúdio mas atentos à pauta escrita por Martin. Os metais entram a partir do Verso 2, e notáveis são os trombones em 5 notas por sobre o baixo, introduzindo as terceiras linhas dos versos a partir dali. Em seguida, em um canal ainda livre, Paul dobrou seu vocal em alguns trechos, e também seu violão em outros, e acrescentou as percussões, que incluíam, além do bumbo, um singelo livro, batucado, que, na linha do "Seu desejo é uma ordem!", teve seu som microfonado e capturado e registrado na gravação final. Ouvem-se esses tapinhas, a partir do Verso 2, mas mais evidentes nos refrões, duelando com o bumbo!
 
Sendo uma canção de Paul, havia alguma chance de ela ser reproduzida ao vivo, e ela foi! Foi na excursão "Back to the US", mas ele não a tocou quando eu vi o show, em Houston, ano que vem completa 20 anos, caramba, o tempo passa! Veja como foi, aqui, neste LINK. No acordeão, Wix Wickens, mago dos teclados que está com Paul até hoje! Aliás, escrevi sobre essa magnífica experiência que eu tive em 2002, aqui, neste LINK, pra quem quiser conhecer!

terça-feira, 30 de março de 2021

Yer Blues ou "John quer morrer?"

Esta canção é a  canção do Lado A do 2° LP  do Álbum Branco

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 5 canções com sobre o estado físico de seus corpos

                                        as demais 4 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

19. Yer Blues  (Help Self Song by John Lennon)

John berra: 'Nuvem negra passa em minha mente, bruma azul em minh'alma, sinto tanta vontade de morrer, até odeio o meu Rock'n Roll. Quero morrer, siiiim, quero morrer' 

Pronto fiz um desafio lá em HELP! e agora, perdi. ESTA, sim, é um 'cry for help' da melhor espécie! Só que não! Bem, ele realmente estava se sentindo assim, sozinho, no acampamento na Índia, quase se separando de Cynthia e já obcecado por Yoko, mergulhando na Meditação Transcendental, e queria falar com Deus! John usou a canção para fazer um pastiche sobre a onda de Blues na Inglaterra, vocês sabem, 'Blue', além de 'Azul', quer dizer 'Triste', e o Blues, como estilo musical, é invariavelmente, um lamento! E John quis elevar esse lamento à mais elevada potência, colocando o máximo lamento, que é a vontade de morrer.  
 
Musicalmente, o vocal de John é impressionante, transmite a angústia, perfeitamente. Muito do clima sombrio da música foi conseguido por causa do local aonde gravaram, uma sala pequena de Abbey Road, que tinha espaço só pra bateria, um gravador de quatro faixas, os guitarristas e os amplificadores, que ficavam voltados para a parede do cubículo. Eles adoraram gravar assim, e decerto foi a chama para embarcarem no Projeto Get Back, de volta às origens da banda. 
 
Yer Blues foi apresentada aos demais nas famosas sessões de Esher, casa de George, com John ao violão e George também, já pensando em partes do solo que faria depois, Paul e Ringo na percussão. A letra estava ainda diferente da definitiva, inclusive ela dava diferentes 'nacionalidades' de sua mãe e pai, que ali eram, respectivamente, da 'terra' e do 'céu', rimando "sky" com "why", mas na versão final trocou "mother" por "father", e  ficou muito melhor, com a rima mais elegante, de "earth" com "worth". Um ou outro, o fato é que a imagem envolvendo "sky" e "earth" foi i
nspirada nos poemas de Yoko.   Também John não estava tão dramático: na demo, ele estava apenas "insecure" como o Mr. Johns de Bob Dylan, já na versão final, ele estava "suicidal", o que seria o extremo do 'feeling blue'. No estúdio, foi em 12 de agosto, e lá se foi a parafernália de instrumentos e amplificadores para uma sala 2x5 metros, um almoxarifado sem acústica, em que tinham até que ter cuidado para não esbarrar guitarras, e lá ocorreu uma sessão bem produtiva, cada um com seu instrumento tradicional captado por um canal da fita. Nunca os Beatles trabalharam tão unidos. Lembraram-se da época do Cavern Club.  Foram 14 takes, mas os melhores foram o 5 e o 6, e fizeram uma junção das melhores partes deles, criando o Take 15. 
 
Não há pontes ou refrões na estrutura, são 9 versos direto, sendo 4 deles instrumentais, e os outros 5 sempre terminando com a mesma frase "If I ain't dead already, oh girl you know the reason why". Versos 1 e 2 têm métricas similares, com as frases de John "Yes I'm Lonely", "gonna die", (repete), "In the morning", "gonna die", "In the evening", "gonna die", são entremeadas por riffs chorosos da guitarra de John e de trios de uma nota só da guitarra estridente de George, e as duas se juntam em harmonia descendente antes da frase final. O baixo de Paul nessa sessão é bem blues básico, sem firulas. Cada frase de John é introduzida por uma virada da bateria de Ringo que, aliás, está impossível na canção, com aquele prato insano durante toda a canção. O Verso 3 ("My mother was of the sky" e mais três frases), o Verso 4 ("The eagle picks my eye" e mais três frases) e o Verso 5 ("Black cloud crossed my mind" e mais três frases) são diferentes dos primeiros. É notável a sucessão de Beatles Breaks, com John cantando as três primeiras frases sem qualquer instrumento por trás, seguidos por glissandos descendentes das duas guitarras de John e George e do baixo de Paul, movimento que felizmente pudemos testemunhar VISUALMENTE no Rock And Roll Circus, o qual explicarei mais adiante. Os três versos também terminam com John e George em harmonia descendente antes da frase final. No verso 5, quando John declara um surpreendente "even hate my rock and roll!",  o ritmo deixa o blues básico, e passa a ritmo diferente, mais batido, mais animado. Os Versos 6 e 7 são puramente instrumentais  eguem integralmente no ritmo final do Verso 5, e têm destaques para a guitarra sincopada de John no primeiro (com a de George no background) e para a guitarra estridente de George no último (com a de John no background), trabalho de equipe. Depois com uma sensacional virada da bateria de Ringo, volta ao ritmo inicial, com o Verso 8 só instrumental, ouvindo-se a voz de John  ao fundo, entoando a letra do Verso 1, e segue o Verso 9, que começa mas cai em fade-out até terminar a canção. Estes dois versos finais não são tocados na base, apenas são cópias do Take 5, mas com o vocal abafado. No dia seguinte, John gravou seu estonteante vocal principal, e Paul acrescentou um vocal de apoio no segundo e no terceiro "girl, you know the reason why", os engenheiros dobraram as guitarras dos Versos 6 e 7, e acrescentaram aquele eco na voz de John! Ô coisa boa!!
 
A música também notabilizou-se por ser a ÚNICA num período de mais de dois anos, em que um Beatle aparece tocando uma canção dos Beatles ao vivo! Foi por conta de um projeto de Mick Jaegger para a TV, chamado Rock And Roll Circus, em que John tocou numa superbanda, com Eric Clapton na guitarra, Keith Richards no baixo, e Mitch Mitchells (Cream) na bateria, uma banda que levou o nome de Dirty Mac. O espetáculo não foi ao ar, mas pode ser conferido neste LINK. Peço especial atenção para o momento 'My father was of the sky', note os 3 guitarristas num 'glissando' pelos braços dos agudos aos graves de suas guitarras, e mais um depois de 'My mother was of the Earth'. Notável!

segunda-feira, 29 de março de 2021

The Beatles Self Songs - Help Class

                                                                    Capítulo 23

O Universo das Canções dos Beatles

Todos os Capítulos têm acesso neste LINK

Das Self Songs, onde seus autores falam de si mesmos, já falei das Classes Mind e Body. Neste capítulo, falarei das Help Songs e no próximo, falarei das Dream Songs.
Mais uma vez, John é o campeão da Classe, com 4,5 das 5 canções em que os autores pedem socorro. Paul tem a outra meia-canção, With a Little Help from my Friends, mas eu a atribuo apenas a ele, até para deixar com John a outra Lennon/McCartney do LP Sgt. Pepper's, a magistral A Day in The Life.



E agora, passamos a alguns detalhes dessas canções...
As canções que estão em vermelho já tenho 
análises mais aprofundadas sobre elas! 
Basta clicar em seus nomes!

1. I'm A Loser (Beatles For Sale - 1964)

John grita: 'O que eu fiz para merecer esse destino? Eu percebi que deixei isso muito tarde. E é verdade, o orgulho sempre ca uma queda. Estou te dizendo isso para você abrir o olho. Sou um perdedor, e eu perdi alguém que estava perto de mim, sou um perdedor, e eu não sou o que pareço ser!' Em que pese esse desespero todo ser porque ele perdeu uma menina, centrei-me na dúvida interna do autor, se está chorando não por ela, mas por ele (Is it for her or myself that I cry?), punindo-se por ser tão orgulhoso! É uma auto-análise, então, é uma Self Song, ele pede ajuda aos amigos para ele melhore. Paul a considera parte de uma tríade de 'cry for help songs' de John, junto com a própria Help!, da qual falarei em seguida, e Nowhere Man (que por ser falada na terceira pessoa, eu a classifiquei como Story Song), as três escritas um período de 1 ano. Ela foi uma favorita dos shows, com John e Paul dividindo o microfone e levantando a galera no refrão. Muito simpática também era a gaita que John tocava acoplada ao violão. A canção tinha força pra ser lançada em um compacto, e seria, se o mesmo John não aparecesse dias depois com nada menos que I Feel Fine, gente, fico até emocionado! Naquele ano, John estava realmente dominante na dupla naquele ano. 


2HELP!  Help Self Song by John Lennon)

John grita: 'Ajude-me se você puder, estou me sentindo desanimado. Eu gostaria de ter você por perto. Ajude-me a colocar meus pés de volta ao chão.Você não vai, por favor, me ajudar, me ajudar, me ajudar?'
Nada mais HELP que isso!  John estava no topo do mundo, mesmo assim estava deprimido (e gordo, segundo ele), e externou seu sentimento.  O interessante foi a forma como a canção composta, bem parecida com o primeiro filme  no ano anterior. Estavam filmando novamente, e novamente o filme não tinha nome. Quer dizer, provisoriamente era Eight Arms To Hold You, ideia de Ringo por causa de uma estátua indiana cheia de baços que aparecia no filme e porque eles quatro terem, na soma, oito braços. Só que ninguém estava contente, algumas sugestões incríveis rolaram até que alguém sugeriu HELP, que tinha a ver com o roteiro do filme, onde todos tinham que ajudar Ringo. Só que já havia canção registrada com esse nome, e eles fica
ram perdidos até que o diretor Richard Lester teve uma brilhante ideia: E se colocar um poto de exclamação, pode? Podia! Isto posto, a quem dariam a missão de escrever a canção, quem, Quem, QUEM?? Claro, novamente John! Conforme fizera com A Hard Day's Night, John finalizou a canção numa noite!  Gênios são assim! No dia seguinte, Paul se juntou a ele em sua residência de Kenwood e  contribuiu com aquele genial diálogo, o contracanto, com que ele e George complementam a fala de John, tão marcante na canção, e estava pronto mais um sucesso Lennon/McCartney, direto para o topo das paradas no mundo todo! No Brasil, felizmente, utilizaram a versão americana de HELP no LP, que tinha um introdução genial, a la James Bond (LINK),  tocada na abertura do LP, depois vinha um brevíssismo intervalo e eles vêm com tudo..
Paul/George - HELP, John - I need somebody
Paul/George - HELP, John - Not just anybody
Paul/George - HELP, John - You know I need someone, 
Paul/George - HEEELP!

  

3. With a Little Help From My Friends (Sgt Peppers - 1967)

Paul e John investem-se na pele de Ringo: 'Empreste-me seus ouvidos e te cantarei uma canção e vou tentar não desafinar, ohh baby eu consigo com  uma pequena ajuda de meus amigos, eu quero chegar alto, com a ajuda dos meus amigos, vou tentar com uma pequena ajuda de meus amigos' E Ringo precisava de oportunidade no novo disco, e lá foram Paul e John compor para ele. Paul teve a ideia da 'help from my friends',  genial, porque é o que os amigos estavam fazendo ao baterista, dando oportunidades a ele. A melodia é mais de John, que complementou alguns versos, e pronto. Tiveram o cuidado de não estender as notas, para adaptar ao alcance vocal limitado do Ringo. Atribuíram-lhe o fictício nome de Billy Shears, e o apresentam ao final da canção título, que abre o LP. Esse nome faz parte da teoria de conspiração sobre a morte de Paul, em um acidente de 1966, que foi 'comprovada' por várias evidências encontradas na capa daquele disco e também de Abbey Road. Enfim, bobagens à parte, a canção é magnífica, tem aquele duelo de perguntas e respostas, entre Ringo e Paul+John. O 'get high' da letra foi imediatamente associado ao estado da mente de quem usa drogas, então a canção foi banida de algumas rádios nos EUA, nada que impedisse que atingisse  o sucesso merecido. Ringo fecha os shows de sua All Star Band até hoje, e vale aqui o destaque para o cover de Joe Cocker, bastante alterado em relação ao original, e que alcançou corações e mentes de todos, arrebentando no Festival de Woodstock.

 

4. Good Morning Good Morning (Sgt Peppers - 1967)

John insinua: 'Depois de algum tempo, você começa a sorrir, agora se sente legal. Então você decide dar uma volta perto da velha escola. Nada mudou, ela ainda está igual.Eu não tenho nada a dizer, mas tudo bem! Bom dia, bom dia, bom diaDisfarçado na letra aparentemente jogada está um John Lennon frustrado com a vida de casado. Ele vê o amigo Paul, livre leve solto, passeando pela cena londrina, participando da vanguarda que surgia, e ele como marido, que tem que voltar pra casa, pra mulher e filho, e ver TV, e os comerciais de Corn Flakes, de onde tira o título da canção. Ele vê que 'Everyone you see is full of life' mas ele fica preso porque 'It's time for tea and meet the wife', aliás, Meet The Wife era um programa que  ele via na TV. Depois ele se resigna, 'Go to a show you hope she goes... I've got nothing to say but it's O.K. Good Morning Good Morning Good Morning'. Típica Help Self Song, musicalmente muito rica, com potentes metais, efeitos sonoros (muitos animais de fazenda), mudanças constantes no tempo (segura aí, Ringo!), e a interessante  troca de papéis na guitarra, com Paul fazendo o solo, e George fazendo o ritmo! E, para finalizar, a marca registrada do álbum Sgt.Peppers, com seu final mesclando com o início da próxima canção, no caso, a despedida da banda, a reprise da canção título do álbum, com letra um pouco alterada.
 

5. Yer Blues (Álbum Branco - 1968)

John berra: 'Nuvem negra passa minha mente, bruma azul em minh'alma, sinto tanta vontade de morrer, até odeio o meu Rock'n Roll, Quero morrer, sim, quero morrer' Pronto fiz um desafio lá em HELP! e agora, perdi. ESTA, sim, é um 'cry for help' da melhor espécie! Só que não! Bem, ele realmente estava se sentindo assim, sozinho, no acampamento na Índia, quase se separando de Cynthia e apaixonado por Yoko, mergulhando na Meditação Transcendental, e queria falar com Deus! John usou a canção para fazer um pastiche sobre a onda de Blues na Inglaterra, vocês sabem, 'Blue', além de 'Azul', quer dizer 'Triste', e o Blues, como estilo musical, é invariavelmente, um lamento! E John quis elevar esse lamento à mais elevada potência, colocando o máximo lamento, que é a vontade de morrer. 
Musicalmente, o vocal de John é impressionante, transmite a angústia, perfeitamente. Muito do clima sombrio da música foi conseguido por causa do local aonde gravaram, uma sala pequena de Abbey Road, que tinha espaço só pra bateria, um gravador de quatro faixas, os guitarristas e os amplificadores, que ficavam voltados para a parede do cubículo. Eles adoraram gravar assim, e decerto foi a chama para embarcarem no Projeto Get Back, de volta às origens da banda. 
A música também notabilizou-se por ser a ÚNICA num período de mais de dois anos, em que um Beatle aparece tocando uma canção dos Beatles ao vivo! Foi por conta de um projeto de Mick Jagger para a TV, chamado Rock And Roll Circus, em que John tocou numa superbanda, com Eric Clapton na guitarra, Keith Richards no baixo, e Mitch Mitchells (Cream) na bateria, que levou o nome de Dirty Mac. O espetáculo não foi ao ar, mas pode ser conferido neste LINK. Peço especial atenção para o momento 'My father was of the sky', note os 3 guitarristas num 'glissando' pelos braços dos agudos aos graves de suas guitarras, e mais um depois de 'My mother was of the Earth'. Notável!
 

Outros capítulos de Self Songs

As 6 Dream Self Songs dos Beatles - Neste LINK

As 6 Mind Self Songs dos Beatles - Neste LINK

 As 3 Body Self Songs dos Beatles - Neste LINK

The Beatles Self Songs - Body Class

Capítulo 22

Esta é minha saga 

O Universo das Canções dos Beatles

Todos os capítulos têm acesso neste LINK 

Neste capítulo, continua a descrição das Self Songs dos Beatles, onde seus autores falam de si mesmos. Identifiquei 4 Classes, Mind, Body, Help, e Dream

Por uma questão de continuidade, como analisamos no capítulo anterior o estado da mente dos Beatles, passamos agora ao estado do corpo! Ele é dedicado às Body Self Songs, elas foram apenas três!  E esta é a primeira classe a ser dominada por um único beatle! Foi John quem comentou sobre seu estado físico, com um intervalo de dois anos entre cada uma delas!



E agora, passamos a alguns detalhes dessas canções...
As canções que estão em vermelho já tenho 
análises mais aprofundadas sobre elas! 
Basta clicar em seus nomes!

1. A Hard Day´s Night (A Hard Day´s Night - 1963)

John reclama: 'Hoje foi um dia difícil, eu tenho trabalhado como um cachorro. Hoje foi um dia difícil Eu deveria estar dormindo como uma pedra mas qu as ando eu chego em casa, eu descubro que você me faz sentir tão bem'   Imagine as filmagens do primeiro filme dos Beatles, 1964, ainda sem nome, dia cansativo, chega a noite, Ringo senta-se numa daquelas cadeiras de Diretor e fala pros outros: “It’s been a hard day ... 's night...”, sendo que o 'night' ele falou quando percebeu que já estava de noite.. John, que estava distraído, ouviu, olhou pra Paul, e disse: “That’s the name!” E foi pra casa e compôs a música, no verso de um cartão que seu filho de 1 ano recebera de um fã, e virou o nome do disco e do filme.  Foi um de vários 'Ringoisms' da história beatle. Sendo muito simples, ele soltava uma dessas de vez em quando, frases ligeiramente incorretas, aparentemente estranhas, mas com um sentido cômico, isso tem até nome, malapropismo! Fato interessante é que John escreveu a letra, quase finalizada,  e a acabou  num táxi a caminho do estúdio, aos olhos de um amigo boquiaberto que o pegara em sua casa, e que depois acompanhou a gravação da canção, em apenas 3 horas de estúdio, onde John passou a ponte (When I'm home, everything seems to be right) para Paul cantar, porque não atingia o agudo da canção que ele mesmo compusera! Apesar de a letra ressaltar a importância da mulher de John que o abraça firme quando ele chega em casa, cansado de um dia duro, preferi focar no estado físico do autor, de pleno cansaço.
Musicalmente, são notáveis a abertura e o fechamento da canção. O acorde poderoso e estridente que abre a canção (e o LP, e o Filme) mereceu análises profundas nos anos seguintes ... houve até um artigo publicado numa revista científica, intitulado "Mathematics, Physics and 'A Hard Day's Night'", em que o cientista analisa o incrível som segundo Transformadas de Fourier!! E ainda foi contestado por outro matemático que atribuiu outro enfoque, mas também utilizando as tais Transformadas. Mas não é pra menos. Dá só uma olhada nas notações possíveis, identificadas pelos especialistas: G7add9sus4 ou G7sus4 ou G11sus4 ou ainda Dm7sus4, mas também poderia ser um 'simples' Fadd9... ufa! Aquele primeiro ali pode ser explicado como 'Sol com Sétima e Nona, com a Quarta em vez da Terça', ou seja, G-B-D-F-A-C, tá fácil procê? Ou seja, quase todas as notas da escala! O Mi (E) deve ter ficado chateado por não participar de mais esse momento genial dos Beatles. O efeito magistral foi obtido por duas guitarras, de John e George, o baixo de Paul, o piano de George Martin e ainda Ringo, na caixa e prato.  O fundamental do acorde é o baixo em Ré (D) do Paul. Uau! E no final, um belíssimo arpejo de George Harrison, em loop, que segue até a próxima música do disco, ou até a próxima cena do filme, foi pra isso que foi criado!!!

 

2. I´m Only Sleeping (Revolver - 1966)

John reclama: 'Por favor, não me acorde, não, não me sacuda, deixe-me onde estou, estou apenas dormindo. Todo mundo acha que eu sou preguiçoso. Eu não me importo, acho eles que são loucos.' E depois ele segue  num verdadeiro hino à preguiça, 'Pra que correr tanto, sem necessidade',  e depois 'Deitado ali e olhando para o teto, esperando por aquela vontade de dormir', e por aí ia! Testemunhas confirmavam que John era assim mesmo. Disposto ao trabalho, à composição, à leitura (e ao sexo, segundo ele confirmou), mas afora essa atividades, era cama direto!! Musicalmente, o grande destaque é a guitarra dupla tocando em reverso, considerado como revolucionário, que tomou 5 horas de trabalho duro dos dois Georges! Além de ser a primeira vez em que tocaram vibrafone numa canção beatle!

 

3. I´m So Tired (Álbum Branco - 1968)

John reclama: 'Estou tão, não preguei os olhos, tão cansado minha mente acesa, acho que vou levantar e tomar um drink' E em outra tentativa, ele acende um cigarro e pragueja com quem trouxe o fumo à Inglaterra, pobre Sir Walter Raleigh, estava lá quieto há séculos. Escrita na Índia, a insônia foi causada pelo intenso treinamento em Meditação Transcendental, e a lembrança de Yoko Ono, então apenas um caso dele, não o deixava dormir. É pra ela que ele diz 'my mind is set on you, I wonder should I call you but I know what you would do! e também  'You know I'd give you everything I've got for a little peace of mind'. Musicalmente, o destaque é para o murmúrio final de John, falado em reverso, que foi considerado mais uma peça da conspiração de que Paul estaria morto.

 

 

Outros capítulos

As 4 Help Self Songs dos Beatles - Em Pensamento

As 3 Mind Self Songs dos Beatles - Neste LINK

 


Birthday? Parabéns a você!! Um dia só!

 Esta canção abre  o 2° LP  do Álbum Branco

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 9 canções com histórias contando um caso

as demais 8 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

18. Birthday (Person Speech Song by Paul McCartney)

Paul celebra: "Você diz que é o seu aniversário, É o meu aniversário também, sim. Eles disseram que é o seu aniversário. Nós vamos nos divertir. Que bom que é o seu aniversário.  Feliz aniversário para você!"
Ô letra simples e direta!! Pouco a ser dito sobre ela! Apenas que foi feita no estúdio, uma vontade de Paul de fazer uma coisa 'pra cima'. E que foi George quem tocou o baixo, ficando Paul na guitarra. E que Yoko fez backing vocal e bateu palmas, e também Pattie, a esposa de George. Ah, sim, a música é contagiante!! 
 
Só isso? Não!! Este foi o texto resumo que ilustrava o capítulo sobre as canções de mesmo assunto e classe, na primeira fase de minha saga! E não tem nada de 'pouco' a ser dito sobre ela!!! Trata-se de um pérola de rock 'n roll. Aliás, parece que tinha uma regra no manual Beatle, um mandamento, ao menos entre 1966 e 1968:  
Sempre abrirão um LP com um Rock do bom! 
Afinal, vejam: 
1966 - Revolver abriu com Taxman, 
1967 - Sgt. Peepper's LHCB abriu com Sgt. Peepper's LHCB, 
1967 - Magical Mistery Tour abriu com Magical Mistery Tour, 
1968 - Álbum Branco LP1 abriu com Back In The USSR 
 
Vamos a mais detalhes sobre ela. Nem vou analisar letra, rimas, muito aprofundadamente, pois ela foi literalmente jogada, por sobre uma base que foi feita sem pensar em letra nenhuma, de puro rock'n roll, duas guitarras, baixo bateria! A coisa começou (e terminou) num dia inusual, porque os Beatles queriam ver de noite na TV Inglesa um filme com vários astros de rock americano. Então, eles chegaram às 5 da tarde no estúdio, ou seja, duas horas antes do usual, pararam às 8:30, foram pra casa de Paul ali perto, viram o filme, voltaram ao estúdio e foram até as 5 da manhã seguinte, já com a canção pronta!! E a canção não existia até às 5 da tarde do dia anterior! Paul chegou um pouco mais cedo que os demais e se sentou ao piano com a música na cabeça. Quando os outros chegaram, ele a mostrou, passou ao baixo, John e George pegaram de suas guitarras, e Ringo de sua bateria, cada um plugado numa faixa de uma fita de 4 canais, e prepararam 20 takes, as guitarras tocando o mesmo som, uma oitava acima da outra em boa parte da canção, e a bateria com um destaque solo, coisa que Ringo detestava! O último take foi considerado bom, e caminharam para a casa de Paul. Na volta, já estava pronta a nova fita, de 8 canais, Take 21, por sobre o qual apuseram vocais e novos instrumentos. O maior destaque instrumental foi para o piano de Paul, ligado ao já  famoso Leslie speaker, a trapizonga que fez aquele enorme efeito na voz de John e na bateria de Ringo em Tomorrow Never Knows. O som ficou especial, reverberado.  
 
Agora é uma boa hora pra falar da estrutura! O começo é um verso, mas instrumental, com Ringo abrindo para as guitarras oitavadas de John e George, depois a bateria de Ringo pa-pa-pa-pa, repetindo-se a dupla guitarra-bateria, 5 vezes, em tons diferentes, e Paul no baixo, espelhando as guitarras anteriores nos compassos de Ringo. Entra o segundo verso, onde aqueles pa-pa-pa-pa's acompanham os vocais principais de John e Paul, com este harmonizando lá no alto, ("You say it's your birthday! It's my birthday too, yeah, They say it's you birthday, We're gonna have a good time, I'm glad it's your birthday, Happy birthday to you"). Agora, vem uma sessão de preparação para a ponte, e dá pra ouvir Paul contando os compassos de 1 a 8, acompanhando o solo de Ringo, para designar a hora da volta das guitarras, e elas voltam pesadas, junto do pandeiro de George e das palmas de Ringo e de Mal Evans, o gigante sempre ponto a ajudar, enquanto John entra com "Yes, we're going to a party, party”, depois ele repete o chamado, com George um tom acima, e os dois, uma terceira vez, com Paul entrando lá no alto, lembrando os bons tempos de Twist And Shout cinco anos antes, rock do bom, com Ringo continuando seu show! 
 
E então vem a ponte, que mais parece uma 
montanha-russa na guitarra de George, subindo e descendo, enquanto John e Paul chamam as meninas para dançar, e elas respondem "Birthday", sendo 'elas', no caso, Yoko Ono e Pattie Harrison, e a coisa se repete duas vezes, até Paul externar seu "daaaaance yeah" lá no alto, e quase invadir o próximo verso, de novo instrumental, mas com o pa-pa-pa-pa de Ringo sendo acompanhado pelo piano altamente reverberado de Paul, e pelo pandeiro de George. Agora vem outra ponte, mas com uma introdução solo das 3 guitarras, ou seja, o baixo de Paul, a guitarra de John uma oitava acima e a de George uma outra oitava acima, espelhando as me
smas notas, e vêm novos convites dos rapazes "I would like you to dance" e as mesmas respostas das meninas, três vezes novamente, e mais um berro de Paul, extenso, super-animado, aliás, todos estavam muito animados, adentrando ao verso final com tudo o que tinham direito:  a bateria de Ringo, os vocais de John e Paul, pandeiro de George, as palmas de Ringo e Mal, e o piano doidão de Paul, num final apoteótico para um show de rock'n roll!!! Exuberimpressionante, se eu puder criar um neologismo qualificativo ao som que eles criaram em 12 horas de trabalho, com direito a um intervalo de duas horas pra ver TV! 
 
Paul McCartney desejou Feliz Aniversário várias vezes em sua carreira solo, uma delas na Praça Vermelha, veja aqui neste LINK.

sábado, 27 de março de 2021

Julia, mãe presente e perdida

Esta canção finaliza o 1° LP  do Álbum Branco

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 8 canções com Saudade nível Tristeza

                                        as demais 7 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

17. Julia  (Dream Self Song by John Lennon)

John lamenta: "Metade do que digo não faz sentido algum, mas eu digo só para que você ouça, Julia. Julia, Julia, filha do oceano, me chama, então eu canto uma canção de amor, Julia!'"

Mulher do mundo, Julia Lennon teve seu filho John e deixou com sua irmã Mimi, para criar, quando ele tinha 5 anos de idade! Aos 15 anos, John voltou a conviver com Julia, e tinha nela, não só uma mãe, mas uma amiga, com seu espírito jovial. Amante do Rock and Roll, que começava a despontar nos USA, ela ensinou a John os primeiros acordes musicais em um banjo. Extrovertida, andava com o filho para todos os lados e os amigos dele a adoravam, inclusive Paul.
 
Ela fazia coisas do tipo andar com óculos sem lentes, parar um transeunte e, no meio da explicação, começar a coçar os olhos através do aro... John a adorava! Tudo ia muito bem, até que o destino deu um duro golpe no rapaz: em Julho de 1958, quando atravessava a rua da casa de sua irmã, Menlove Avenue, para pegar um ônibus, Julia foi atropelada por um policial bêbado, de folga, sendo lançada a metros de distância, e morrendo instantaneamente, aos 44 anos de idade. John nunca se conformou e, 10 anos depois, fez esta primeira homenagem a ela, durante seu retiro espiritual na Índia, que materializou-se no Álbum Branco, com John tocando um lindo dedilhado no violão, que aprendeu lá, com o companheiro Donovan, e também usou em Dear Prudence, do mesmo álbum. Nenhum outro Beatle toca na canção. John faria outras duas canções no tema, e que foram lançadas em sua carreira solo, Mother (ma-ra-vi-lho-sa!!) e My Mummy's Dead (uau!). 
Julia foi a primeira canção que John escreveu no retiro da Índia, no ashram do Maharishi em Rishikesh. À época, ele começava um relacionamento com Yoko Ono, e imediatamente viu nela uma figura matriarcal. E juntou na letra a expressão "Ocean child", que é o significado do nome da artista. Ela escrevia cartas a ele com imagens que o levaram a viajar na imaginação e escrever coisas como "seashell eyes" e "windy smile".  Outra influência foi Kahlil Gibran, cujos poemas o inspiraram a escrever as lindas frases da introdução em nota única "Half of what I say is meaningless..e de sua repetição melódica (Intro 2) em "When I cannot sing my heart, I can only speak my mind" lá no meio da canção. Após a Intro 1, que termina em "Juuuliia", o primeiro verso começa com uma sobreposição deste último "a" de "Julia" com o primeiro "Ju" de "Julia, Julia, ocean child, calls me". Essa mesma sobreposição ocorre também entre Verso 1 e Verso 2, e na segunda vez que a melodia da introdução é cantada, emendando com o penúltimo verso. Isso causou a necessidade de 3 linhas de vocal de John. Entre o Verso 2 ("Julia, seashell eyes, windy smile, calls me") e o Verso 3 ("Julia, Julia, morning Moon, touch me"), há uma breve ponte "Her hair of floating sky is shimmering, glimmering, in the Sun", depois vindo a citada Intro 2, e depois os versos finais, 4 ("Julia, sleeping sand, silent cloud, touch me") e 5(murmurado)O resultado lírico é de chorar. A ocorrência de poucas ou quase nenhuma rima não impede a emoção do relato, brilhantemente desempenhado por um John emocionado. Fiz questão de colocar a letra toda, maravilhosa, que é completada com esta linda conclusão, de cada um dos 5 versos: 
"So I sing a song of love, Julia" 
Em que pese ter sido a primeira canção a ser escrita, Julia foi a última a ser gravada! Por incrível que pareça, ela só entrou no jogo porque duas canções, uma do próprio John (What's The New, Mary Jane?) e outra de George (Not Guilty) não chegaram a bom termo em suas gravações, e o álbum precisava de sua 30ª canção, então Paul incentivou John a oficializar a linda canção, ele não queria por ser muito lenta!! Além disso, Paul o convenceu a ir sozinho, sem mais ninguém, nem ele mesmo, que havia arriscado uma harmonização na demo que eles gravaram no fim de maio na casa de George em Esher, já com a letra definitiva. E foi assim, num domingo (!!), 13 de outubro, que a EMI estava a postos às 7 da noite para receber John e seu violão. Paul (que morava perto) esteve lá pra dar apoio e ficou um tempo indeterminado na sala de controle, o suficiente para ser decisivo. A canção era difícil. John ficou ensaiando mais de 4 horas (!!) até se sentir seguro para começar a gravar takes oficiais, que começaram perto de meia-noite. No meio do caminho, ele teve dificuldades, pensou em tocar de pé, e chegou a propor desistir do dedilhado e fazer o chakundum, imagina o desastre, perder aquele movimento tão delicado, que Paul disse que apenas John, entre eles, conseguia fazer. Então, começaram os takes, interessante que todo o ensaio fora feito em C (DÓ maior), mas os takes oficiais foram tocados em D (RÉ maior) com a colocação do CAPO no 2°traste do violão. Em meio a elogios de Paul lá da sala de controle, John fez um Take 2 quase perfeito, mas errou um pequeno trecho, chegou a sugerir que apenas se repetisse o trecho e depois a edição juntaria as partes boas, mas Paul o incentivou a tentar mais uma vez, e o Take 3 veio perfeito. Em faixa livre da fita desse take, John fez 3 linhas de vocal, por causa das três sobreposições de sílabas de "Julia", acima explicados. Por sobre seu violão original, John dobrou um segundo violão, a partir do Verso 1, o que mostra sua tremenda capacidade e, claro, o efeito das 5 horas tocando a mesma música! O efeito foi estrondoso! Outro efeito ótimo foi a dobra de seu vocal, em partes selecionadas. Um primor! O vocal de John, normalmente áspero, e aqui tão doce, rivaliza com os melhores de Paul, e Julia disputa com galhardia o título de melhor balada dos Beatles. E quase ia ficando de fora!!
Mais uma vez, recorro a The Analogues para ter uma ideia de como seria Julia ao vivo, só que, e-xa-ta-men-te, é im-pos-sí-vel, por causa das sobreposições no vocal de John. Mas The Analogues têm dois cantores que simulam John Lennon, então o efeito é muito bom. Neste LINK, tem o show todo deles tocando o Álbum Branco todo, então se quiserem ir direto vão até o 46:50, e apreciem!

The Beatles Self Songs - Mind Class

Capítulo 21 

Aqui começa a terceira dezena de capítulos da saga

O Universo das Canções dos Beatles

Tenha acesso às outras dezenas neste LINK

Neste 21° Capítulo, começa a descrição das Self Songs dos Beatles, onde seus autores falam de si mesmos. Identifiquei 4 Classes, Mind, Body, Help, e Dream

Ele é dedicado às Mind Self Songs, em que o compositor conversa consigo, descreve o que vai em sua mente. Elas foram 6, mas vamos parar de papo e mostrar em gráfico.




E agora, passamos a alguns detalhes dessas canções...

As canções que estão em vermelho já tenho 
análises mais aprofundadas sobre elas! 
Basta clicar em seus nomes!

1. Rain (Compacto - 1966 e Past Masters#2)

John conta 'Chuva, eu não ligo. Brilhe, o tempo está bom. Você pode me ouvir que quando chove ou brilha o sol é só um estado da mente. Pode me ouvir, pode me ouvir? Chuva ou sol é só um estado da mente. Não importa, o que vale é seu estado mental. Inspirada por uma chuva torrencial na Austrália, que fez John pensar, Rain é considerada o melhor Lado B dos Beatles, veja bem, considerando-se que o lançamento junto com Paperback Writer no Lado A não é considerado um Double A Side Single. Rain é Labo B mesmo, e nesse merece a alcunha. Tem ótimos desempenhos do baixo de Paul e da bateria de Ringo, tem a inovação técnica desenvolvida intramuros Abbey Road, de sigla ATOC, que fez com que a voz de John fosse ouvida mais alto, foi a primeira vez em que se ouve trechos tocados em reverso, feito por John em sua casa (e meio alto), que ficou marcante na canção. Além disso, seu vídeo promocional era uma coisa inédita, a ponto de Goerge dizer, anos depois: 'Nós inventamos a MTV!'.  Nota-se no vídeo um Paul com uma cicatriz no lábio, proveniente de um acidente de moto uns meses antes que foi o gerador do boato 'Paul is Dead' que se desenvolveu ao longo dos anos seguintes, com evidências 'claríssimas' de que ele era um sósia, especialmente nas capas de Sgt. Peppers e Abbey Road.


2. Fixing a Hole (Sgt. Peppers - 1967)

Paul pensa 'Estou consertando um buraco por onde a chuva cai, e impede minha mente de vagar. Aonde ela irá?"  E quando ela pensa ele se lembra de múltiplas coisas, inclusive nas garotas que tentam invadir sua casa, e depois se auto-afirma, dizendo que está certo, esteja ou não certo, e mais pro final diz que vem gastando mais tempo em coisas que não eram importantes ontem. Reflexões. A canção é uma das 8 que saíram da ideia dele no álbum que saiu da idéia dele. Como expressão 'fix a hole' era o mesmo que  'aplicar uma injeção', diziam que a canção era uma alusão a heroína, droga injetável, mas Paul nunca entrou nessa onda, mas admitiu que a maconha foi inspiradora daquelas reflexões. A canção teve a 'honra' de ser referenciada, nem que fosse ironicamente, por John, em Glass Onion, um ano depois. Musicalmente, os quatro Beatles participam em seus instrumentos de origem, ou quase, porque John tocou baixo e tinha um lindo cravo na abertura, tocado por George Martin.

 

3. The Inner Light (Compacto - 1968 e Past Masters #2)

George declama 'Sem sair de casa, eu posso conhecer o mundo inteiro. Sem olhar pela minha janela, eu posso conhecer os caminhos que levam ao paraíso" Eu usei o verbo 'declamar' porque trata-se de um poema chinês musicado. Na verdade, ele canta 'você', mas no original era 'eu'. O que se pode atingir no seu eu interior, ver sem olhar, chegar sem viajar. Invocativo da Meditação Transcendental que aprenderam na Índia, esta foi, inclusive, gravada na Índia, em Bombaim (hoje, Mumbai), sendo a única canção beatle gravada fora da Europa. no Lado A. Foi a primeira vez que George teve a distinção de um compacto! Ela foi o Lado B de Lady Madonna. Em minha opinião, The Inner Light é a mais linda das 3 canções 'indianas' que George compôs na época beatle. Tanto que foi a escolhida, do gênero, para constar na homenagem que lhe fizeram, um ano após sua morte, em Concert for George, com a presença de Anoushka Shankar, filha de Ravi, o mentor do compositor em assuntos indianos. John e Paul também adoraram e contribuíram com vocais de apoio no verso final,
Arrive without travelling (George dobrado)
See all without looking (George)
Do all without doing (George, John e Paul)
Neste LINK, você pode ouvir este trecho, envolto em belos instrumentos indianos. Como última informação, The Inner Light é um episódio de Jornada nas Estrelas - Nova Geração, nomeado e inspirado na canção de George. Nele, o Capitão Picard está imerso em descobertas de sua mente! Bastante apropriado! Ademais, o que os tripulantes da Enterprise fazem no futuro é 'arrive without travelling', não é? Santo teletransporte!!!

 

4. Across the Universe (1969, Let It Be - 1970 e Past Masters #2 )

John declama 'Piscinas de mágoas, ondas de alegria, atravessam minha mente aberta, possuindo-me e acariciando-me... eu saúdo o Guru ... Nada vai mudar meu mundo' Pronto, gente, pera um pouco que eu vou me recuperar. Vocês estão prestes a ver o papo sobre uma das mais belas letras da história, não dos Beatles, mas da humanidade. Dá vontade de apenas colocar a letra toda aqui e não falar mais nada. Mas não é esse o papel deste analista neste estudo. Usei novamente o verbo declamar, porque se trata de uma poesia em prosa. 
'Palavras voam como uma chuva sem fim num copo de papel, elas deslizam enquanto passam, elas seguem seu caminho através do universo ...". 
Não, não vou colocar a letra, toda ela é linda, procurem, é fácil achar. Bem vamos à história.. estavam os Beatles se preparando para viajar à Índia, animados que estavam em aprender Meditação Transcendental, e deixaram algumas canções para serem lançadas em compacto enquanto estavam fora. John tinha essa canção que começou quando ele e Cynthia foram dormir após uma discussão de casal, onde Cynthia falou um monte, John demorou a dormir e aí veio a primeira frase: 'Words are flying out' Quem diria que uma balada cósmica tão linda teria começado numa DR... Felizmente, a coisa mudou dali em diante e virou uma viagem. 
"Imagens de luzes falhas dançam à minha frente como milhões de olhos, que me chamam de novo e de novo, através do universo" 
... ih, olha eu de novo ... sorry, não resisti. Enfim, era uma noite fria de fevereiro de 1968, a gravação não ficava boa e Paul teve mais uma daquelas idéias que só Paul mesmo. Saiu fora do estúdio, viu aquele grupo de garotas que sempre estavam lá, carinhosamente chamadas de Apple Scruffs, e perguntou se havia quem soubesse cantar. A brasileira Lizzie Bravo levantou a mão e chamou uma amiga inglesa pra ir junto com ela e AS DUAS PARTICIPARAM DE UMA GRAVAÇÃO DOS BEATLES! Muita  história ela conta desse dia desde então, conheci ela há dois anos e ela até contribuiu para meu post sobre esse feito inesquecível. Ela e a amiga fazem vocal de apoio no refrão 'Nothing's gonna change my world', em todas as vezes em que ele foi cantado. Eles foram viajar, escolheram outras duas canções para o compacto e Across The Universe ficou engavetada.  
"Sons de risos, sombras de amor tocam meus ouvidos atentos, excitando-me e convidando-me"
Não resisto! Felizmente, um produtor frequentador de Abbey Road ouviu a música, encantou-se com ela e propôs e foi aceito que fosse lançada num LP para levantar fundos. Claro que o próprio nome do LP acabou sendo o refrão da canção, um pouco modificado. Como a instituição beneficiada era o 'World WildLife' acresceram sons de pássaros no começo e no final da canção e o disco foi lançado em dezembro de 1969. A versão, entretanto, que o mundo conheceu foi outra, lançada em maio de 1970, no último disco lançado pelos Beatles, Let It Be, mas agora com orquestra e coral que o produtor Phil Spector encasquetou de colocar. Sinceramente, achei que caiu bem a orquestração pra acompanhar uma melodia tão... tão poética... 
"Pensamentos vagueiam como um vento sem fim por entre uma caixa de correio, eles vão caindo enquanto fazem seu caminho através do universo" 
Estou incorrigível, hoje ... Sim, era uma boa versão, mas os beatles a abominaram! Tanto que 30 anos depois, lançaram o Let It Be inteirinho como ele gostariam que tivesse sido lançado, cru, básico, NAKED, que foi como eles nomearam o lançamento! Antes, e felizmente, em 1988, o projeto Past Masters, que reuniu canções não lançadas em LP's, reviveu a versão do projeto de caridade, aquela em que UMA BRASILEIRA CANTOU COM OS BEATLES!!!
Bravo, Lizzie!!
Across The Universe foi regravada por muitos cantores, incluindo David Bowie, numa gravação que teve a participação do próprio John Lennon, bem recebida pelo autor, e mal recebida pela crítica. A versão que mais gosto, entretanto, me emocionou tanto que mereceu post meu, e muito da emoção foi por conta da participação de seu filho Sean fazendo uma segunda voz para Rufus e Moby, cada um cantando em uma oitava diferente, aliás, chorei de novo quando revi agora, e deixo aqui pra dividir com vocês, finalizando este capítulo. Neste LINK, não perca, e reserve um lenço...
"Um amor incondicional sem limites que  brilha à minha volta como milhões de sóis e me chama para ir pelo universo"

 

 5. I've Got a Feeling (Let It Be- 1970)

Paul sente'Eu tenho um sentimento, um sentimento aqui dentro, Oh, sim, oh, sim (está certo). Eu tenho um sentimento, um sentimento que não consigo esconder. Oh, não! Oh, não! Oh, não'  Na verdade, são duas canções inacabadas, uma de Paul outra de John, que alguém percebeu que tinham os mesmos acordes, e resolveu juntar as  duas numa só, com uma terminando a outra! Imagino que a idéia tenha sido de Paul, pois ele é quem tinha as idéias, mas não vi isso escrito em lugar nenhum. A de Paul é mais positiva, e ele tem um desempenho vocal perfeito, reclamando aos gritos, que ‘ninguém me disse que tudo que eu procurava era alguém que se parecesse com você’, só que não se sabe quem era o ‘você!’, se era Linda ou o próprio John. A de John chamava-se ‘Ev'rybody had a hard year’, era uma ladainha, com todos os versos começando na mesma palavra (Everybody) e era meio down, coadunando-se com seu próprio estado de espírito, tendo separado de Cynthia, Yoko tendo um aborto, ele lutando contra o vício de heroína, sendo preso por porte de drogas, em crise com os Beatles, enfim... A junção das duas ficou sensacional, e tão boa, que cantaram, e muito bem, no RoofTop Concert, a última aparição deles ao vivo! Deixo aqui o LINK pra vocês. A estrutura ficou assim: primeiro Paul canta a dele (com John na segunda voz na segunda estrofe), depois John canta a dele, depois os dois cantam ao mesmo tempo as duas, uma solução brilhante! Até fiz uma figura pra explicar. Acompanhem com o vídeo!
Como era parte do Projeto Get Back, minimalista, de volta às origens, todos tocaram seus instrumentos usuais, mas contaram com o auxílio luxuoso (adoro essa expressão, cunhada por Luiz Melodia) de Billy Preston, no piano elétrico!

 6. I Me Mine (Let It Be- 1970)

George admite: 'Ao longo do dia é só eu, depois eu e mais eu e ao longo da noite, eu, mim, meu, eu, mim, meu, eu, mim, meu, agora estão com medo de largar, todos estão tramando, tornando-se mais forte o tempo todo' Ao mesmo tempo em que George faz uma crítica ao egoísmo, falando em todas as formas de primeira pessoa, em todos os pronomes possíveis, como se fosse ele se auto-acusando (e por isso eu coloquei a canção nesta categoria), ele lança mensagem direta a seus companheiros John e Paul (o 'todos' da letra), os autores maiorais da banda, por só pensarem nas composições deles, não abrindo espaço para as dele. Uma imagem emblemática do desprezo pode ser vista no filme Let It Be, uma cena aparentemente singela, de John dançando uma valsa com Yoko, ao som da canção de George, que é, em verdade, uma valsa (mudando para rock no refrão), pode-se perceber a batida, tum-ta-ta, tum-ta-ta. Ocorre que John desprezou a canção desde o início, criticando-a por ser uma valsa, que isso não poderia ser uma canção beatle. Aparentemente, ninguém se lembrou de esfregar na cara dele que ele já fizera uma valsa, seis anos antes, Baby's In Black! O fato é que John nem participou da gravação. O clima estava tão ruim (era começo de 1969) que George deixou a banda, mas voltou uma semana depois. Como o projeto Get Back, onde se inseria a canção, foi rejeitado como um todo, a canção foi esquecida até ser retomada quase um ano depois, em 3 de janeiro de 1970, naquela que foi A ÚLTIMA sessão de gravação dos Beatles como uma banda, mas só com três deles. John já havia deixado o grupo, mas o mundo não sabia. Então foi George no violão, Paul no baixo, Ringo na bateria, mas depois Paul foi ao piano, e George acresceu lindas guitarras distorcidas. Para o lançamento do LP, entretanto, ainda levaria um banho de orquestra pelo produtor contratado Phil Spector, e uma das canções lavadas foi I Me Mine, de George Harrison.
  

Próximos capítulos

As 6 Dream Self Songs dos Beatles - Em Elaboração

As 4 Help Self Songs dos Beatles - Em Pensamento

As 3 Body Self Songs dos Beatles - Em Pensamento