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sexta-feira, 20 de abril de 2018

Amor e Ódio

Eles estão de volta!!
Micoçanduaki se vou ou não!
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O título deste texto expressa minha relação com a banda inglesa Radiohead!
Na verdade, ela é cronologicamente inversa!
Em 1998, houve uma eleição com audiência de uma rádio inglesa ou um site, que apontou um certo CD chamado Ok Computer, de uma certa banda chamada Radiohead, como 'The Best Album Ever'. Fiquei intrigado, afinal, que obra seria aquela, capaz de desbancar tantas outras, de tantos monstros sagrados, só para ficar no mundo do rock'n roll? Teria fôlego para superar pelo menos cinco discos dos Beatles (Abbey Road, Sgt Peppers, White Album, Revolver e Rubber Soul), quatro discos do Pink Floyd (Dark Side of The Moon, The Wall, Wish You Were Here, Atom Heart Mother), um do Led Zeppelin (o 3), um dos Eagles (Hotel California), um de John Lennon (Imagine), um de George Harrison (All Things Must Pass), um do Roger Waters (Amused to Death), e até mesmo um do Rolling Stones (Aftermath)?
Curioso, comprei o tal CD só pra conferir, ouvi e o joguei solenemente no lixo, no mesmo dia. Que era aquilo? Concluí que era mais um processo eleitoral com resultado totalmente parcial, imediatista, sem uma base estatística, sem uma amostragem decente, com um universo restrito, nada representativo,  e  por aí vai. Só poderia resultar em heresias! Mais ou menos como voltaria a acontecer anos depois, com o episódio do site que elegeu Maradona o maior de todos os tempos no futebol. Não quer dizer naaaadddddaaaa. É impossível! Basta colocar números, e Pelé ganha em todos os quesitos, gols, jogos, títulos.
Enfim, aplacada a ira, lavrado o protesto no Primeiro Lixório de Notas, virei a página, esqueci-me do assunto, e segui adiante. Anos mais tarde, quando meu filho começou a gostar de música, sabedor da minha ojeriza ao famoso grupo inglês, começou a respeitosamente tentar fazer com que eu abrisse meu coração e desse uma nova chance aos rapazes. Claro que aceitei o desafio, e ouvi o CD que ele havia comprado, o mesmo Ok Computer. Mais calmo e disposto a tentar entender, gostei do que ouvi logo de cara! Na segunda vez, mais um pouco! Na terceira virei fã! Concluí que estava cego, ou melhor, surdo de ódio, sete anos antes, dado o contexto em que ouvira a obra. O disco era realmente muito bom.
Claro que numa linha bastante distinta daqueles outros que motivaram meu comlúrbico protesto, uma linha experimental. Um som pesado, não no sentido de som, mas de tom, angustiante por vezes, a angústia passada pela música, mesmo que não se entenda a letra. Uma das músicas me fez chorar, e ainda hoje me arrepio ao ouvi-la, quando vai chegando o clímax: ela se chama 'Exit Music (for a film)', estranho nome, principalmente quando se lê a letra, enfim, mas a interpretação do vocalista Thom Yorke é de cortar o coração. O resto do disco é todo bom, com destaque para 'No Surprises', o principal hit do disco, e que veio a se tornar a música tema do namoro de meu filho, que, em 2006, tocou seu riff inicial de guitarra, num intervalo de show da escola, olhando para sua pretendente, com quem namorou por oito anos. Claro que uma amiga comum, uma verdadeira cupida, havia dado o toque de que ela era fissurada em Radiohead! Muito boa também é 'Paranoyd Android', que, musicalmente, poderia muito bem ser música tema de algum filme de 007.
Bem, passei a concordar com aquela enquete do passado? Claro que não! Melhor de todos os tempos, não! Mas tem calibre suficiente para deslocar Rubber Soul, Revolver (olha só o tamanho da virada!), Atom Heart Mother, Hotel Califórnia, Amused to Death, e Aftermath, colocando Ok Computer na minha Top Ten. Tá bom, não tá?
A vida continuou seguindo e veio então a grande notícia: em 2009, Radiohead no Brasil-il-il-il, para delírio de uma enorme nação. Re-ouvi a carreira toda, outros seis CDs, e me animei. Além disso, ir ao show era um 'good value for the money', apesar do desconforto da Praça da Apoteose, pois eram 3 x 1: três shows pelo preço de um. O Kraftwerk, grupo de música eletrônica alemão, estava abrindo os shows do Radiohead na turnê do disco 'In Rainbows'. E, para completar, uma banda local era chamada para abrir o show dos grandes astros estrangeiros. E escolheram nada menos que Los Hermanos para o efeito!!! Justamente uma banda que acabara, ou havia dado um tempo, que eu reputo como o que há de melhor no cenário musical brasileiro (ou havia?).
Chegou finalmente o momento esperado.
Apoteose!
Noite de 20 de março de 2009, apoteótica!
Nem tanto peLos Hermanos, que pareceram meio enferrujados pelo período sabático, mas ainda assim levantaram a platéia com os sucessos que a galera sabe de cor, mas prejudicados pelo som péssimo baixinho, já que o som bãozão estava guardado para os estrangeiros.
Só um pouco apoteótico, pelo Kraftwerk, um show discreto, palco minimalista, com quatro teclados e quatro computadores, pouca ação dos quatro 'músicos' pois a maior parte é pré-programada, mas presenciamos um audiovisual competente, um figurino futurista com roupas pretas ajustadas aos corpos, com direito a uma troca, quando entram quatro robôs sensacionais para acompanharem com alguns movimentos leves de dança, a música 'We Are The Robots'. Enfim, uma coisa muito interessante, onde se releva as músicas até um pouco bobinhas, pelo fato de terem sido eles, há mais de 30 anos, os inventores da música eletrônica.
Apoteótico mesmo foi quando veio a atração principal.

Começando pelo palco, cheio de instrumentos, eletrônicos, elétricos e acústicos, percussões variadas, piano, órgãos, xilofone, mesa de som, e outros artefatos inidentificáveis, mas que foram todos utilizados; o cenário eram apenas tubos enormes de tungstênio pendurados lá do alto, uns de 10 ou 12 metros ao redor, outros de 5 a 6 metros na região central para dar liberdade de movimentos aos artistas, que serviram ao espetacular esquema de iluminação, já qua cada polegada quadrada poderia assumir infinitas cores e luzes, fazendo jogo com o telão principal e dois auxiliares, de alta definição.
Depois, pelo show absolutamente competente por parte dos instrumentistas. O baterista Phil Selway tem que se virar com as variações entre uma música e outra presentes nas canções do álbum mais recente, totalmente reproduzidas no show; a olhar seus movimentos quase todo o tempo, escondido, de lado para a platéia, estava o baixista Colin Greenwood, figura bem apagada, seguindo a política do baixista-não-pode-aparecer; ou então, do 'let-my-baby-brother-shine' pois seu irmão caçula, o franjudo Jonny Greenwood, guitarrista solo,  desdobra-se em cima do palco, toca também o teclado e os samplers, sei lá como chama, e percussão; o guitarrista base Eddie O'Brien manda muito bem em vários instrumentos também, mas tem uma postura mais estacionária, do lado esquerdo do palco, e faz uma segunda voz em algumas canções.
Mas, finalmente, a apoteose vem cristalina com o dono da primeira voz, o incrível Thom Yorke, um verdadeiro monstro de afinação, de expressão, de animação quando apropriado, atingindo tons agudos e graves com precisão, a relação da boca dele com o microfone é muito íntima, pois mesmo quando a cabeça se agita tresloucadamente, a posição relativa entre os dois permanece inalterada. Não há dúvida de que é a alma da banda. E deve ser o autor principal de todas as canções, ainda que o autor oficial de tudo o que é composto por Radiohead é a entidade Radiohead. Digo isso pela entrega com que ele se joga às canções enquanto canta. Um show muito bem observado por todos nós, pois permanentemente, ao menos uma câmera está dando close nele, em suas expressões, em seus olhos desalinhados. Havia outras câmeras apontadas para os demais, claro, mas os nossos olhos iam, naturalmente, para a presença magnética de Yorke. O repertório teve, além das 10 canções do último CD, outras 15 participações de todos os álbuns da carreira,  em especial, três de Ok, mas não as mesmas acima destacadas por mim. Meu filho e namorada (e outros 25 mil fãs) celebraram fervorosamente os acordes iniciais e todos os demais de 'No Surprises', e também todas as variações de ritmo paranóicas do andróide. Entretanto, preferiram deixar, como Exit Music (for a show) a ótima 'Creep', grande sucesso do primeiro disco deles, em que Yorke canta para a garota: "You are fucking special .... I wish I was special ...", para delírio de todos nós, que dizemos, sem a menor sombra de dúvida:
"You are fucking special, Mr. Yorke!!!"