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segunda-feira, 31 de maio de 2021

Let It Be In Links

  Capítulo 48 


De minha saga  

O Universo das Canções dos Beatles

Todos os Capítulos da Saga têm acesso neste LINK 


48.1 O Cenário de Let It Be, neste LINK

48.2 Os Assuntos de Let It Be, neste LINK

48.3 As Canções de Let It Be

 Clique no LINK para ler sua análise!


 1. Two Of Us, Paul McCartney

 Blog do Homerix: Two Of Us, eu e você, John, fizemos grandes coisas!

 

 2. Dig A Pony, John Lennon

 Blog do Homerix: Dig a Pony, Saúde!!

 

 3. Across The Universe, John Lennon

  Blog do Homerix: Across The Universe of John's mind

 

 4. I Me Mine, George Harrison

 Blog do Homerix: I Me Mine ... É ieu ... só ieu

 

 5. Dig It, John Lennon

Blog do Homerix: Dig It, Sacou?

 

 6. Let It Be, Paul McCartney

Blog do Homerix: Let It Be, mãe Maria disse

  

7. Maggie Mae (Liverpool folklore)

Blog do Homerix: Maggie Mae (Liverpool Folklore)

 

 8. I've Got A Feeling, Paul McCartney (and John Lennon)

Blog do Homerix: I've Got A Feeling ... and a hard year

 

 9. One After 909, John Lennon

Blog do Homerix: One After 909... seria o trem 910 ou das 9:15

 

 10. The Long And Winding Road, Paul McCartney

Blog do Homerix: The Long and Winding Road, triste estrada

 

 11. For You Blue, George Harrison

Blog do Homerix: For You Blue is a Blue For You, Love!

 

 12. Get Back, Paul McCartney

Blog do Homerix: Get Back to where you belong! Quem é 'You', Paul?



48.4 Lançamento, Recepção e Legado de Let It Be

Blog do Homerix: Let It Be - Lançamento, Recepção, Legado

Maggie Mae (Liverpool Folklore)

Esta canção cover fecha o Lado A do LP Let It Be, o último lançado pelos Beatles

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

Como não se trata de uma canção autoral dos Beatles, 

                                                            nada de Assunto ... muito menos Classe

Atenção, canções com títulos em vermelho 

 são links que levam a análises sobre elas.

7. Maggie Mae (canção tradicional de Liverpool)

Arranjos de John, Paul, George e Ringo

Origem: Canção folclórica famosa entre os trabalhadores portuários de Liverpoool, desde o começo do Século XIX, conta a história de uma prostituta que engana seus clientes marinheiros. A letra tem variado desde 1830, a primeira vez que se tem notícia da melodia.

A canção teve um de seus lançamentos em 1957, por um grupo chamado The Vipers Skiffle Group, por coincidência produzido por um certo George Martin que, àquela altura, nem sonhava que se tornaria parte importante da história da música ao se tornar o assim chamado (e merecido) "5º Beatle". Ela fora tocada por John e Paul junto com os Quarrymen naquele ano e nos dois seguintes, e foi ressuscitada por John e trazida para o Projeto Get Back em 1969. Na verdade, John estava com escassez de composições de sua lavra para apresentar, e via Paul sempre pródigo em composições, e George e até mesmo Ringo arriscou algumas. Então, foi buscar sons do passado. Isso também ocorreu com One After 909 (1958) e Across The Universe (1968). 
 
A ideia foi bem recebida pelos demais, Paul cantou em harmonia com ele, os dois ao violão, George acompanhou na guitarra e Ringo na bateria. Foram três tentativas em 25 de janeiro, ainda tentaram aprimorá-la após o show no terraço da Apple, no último dia do Projeto (dia 31), mas foi infrutífero. Os parcos 39 segundos da terceira tentativa do dia 25 seguiram seu caminho no Projeto e acabou tendo a honra de abrir o Lado B de um LP dos Beatles. Nada demais, apenas uma brincadeira. Sem muito mais para falar sobre ela, apresento a letra que John e Paul se lembraram, um refrão e um fragmento de verso. 
 
Refrão 
Oh, dirty Maggie Mae
They have taken her away
And she'll never walk
Down Lime Street anymore
Oh, the judge she guilty found her
Of robbing the homeward bounder
Dirty no good robbin' Maggie Mae

Verso  

It's the part of Liverpool
She returned me to
Two pound ten a week
That was my pay 
 

 

For You Blue is a Blue For You, Love!

Esta canção é a 4ª do Lado B do LP Let It Be, o último lançado pelos Beatles

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 27 canções sobre Amor por Garotas

                                        as demais 26 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

 são links que levam a análises sobre elas.

11. For You Blue (Love Girl Song by George Harrison)

George se declara 'Porque você é bonita e adorável, garota, eu te amo, é verdade, Eu te amo mais do que amei a qualquer outra garota' 
 
Pense num canção gostosinha de se ouvir, um belo romance, uma declaração de amor entre duas pessoas felizes, um se declarando ao outro, todos contentes em participar desse momento, 'eu estou feliz porque te amo' , 'você é feliz porque é amada'. Esta é For You Blue, a segunda e última canção de George a constar oficialmente do Projeto Get Back. O 'You' do título e letra, decerto refere-se a Pattie, agora Harrison, antes conhecida pelo sobrenome de batismo Boyd, modelo a quem namorou desde 1964, no auge da Beatlemania, e com quem se casou em fins de 1966. Outras canções George trouxe ao projeto, além de I Me Mineque acabou no álbum: as lindas All Things Must Pass e Isn't It a Pity, uma mais religiosa, Hear Me Lord, e mesmo Something, mas ele logo chegou à conclusão que não eram apropriadas ao Projeto, não apropriado a canções lentas e intimistas. Pode ser que ele tenha chegado a essa conclusão por conta da má vontade de John com canções daquele naipe. As três primeiras veriam a luz do sol em seu grande LP de estreia da carreira solo, que levou o nome da primeira, e Something, sabe-se, ele lançaria ainda como Beatle, em Abbey Road, para espanto de todo mundo.  
 
For You Blue é o que se chama, em inglês, um 12-Bar-Blue, ou um Blues de 12 compassos, e é uma boa canção pra se aprender a contar os tempos. Cada um dos 6 versos (e não mais há nada além de versos, sem pontes ou refrões), sendo 4 cantados e dois instrumentais, têm 12 compassos cada um. Vou colocar logo aqui o LINK com a versão final, pra vocês acompanharem. Comece contando 1-2-3-4, 1-2-3-4, 1-2-3-4, com cada número representando um tempo, uma batida, e logo você vai se encaixar na canção e se encantar com o mundo dos tempos e compassos, é bem básico e simples, mas delicioso. Você notará que vai contar 12 vezes 1-2-3-4, e aí termina um verso e começa outro, com letra diferente ou com a guitarra deslizando seu solo. Tá com dificuldade pra contar o tempo?  
 
Because you're sweet and lovely girl I love you,
Because you're sweet and lovely girl It's true,
I love you more than ever girl I do.  
 
Bem, decerto, você, ao ouvir a canção fica imediatamente com vontade de acompanhar com palmas, naturalmente você vai bater a primeira na sílaba 'cau' da primeira palavra 'because', da primeira linha do primeiro verso. Este é o Tempo 1. Depois, você vai ter vontade de bater de novo quando termina o 'sweet', esse é o Tempo 3, e você segue, sempre batendo palmas nos Tempos 1 e 3, 1 e 3, 1 e 3, até o final da canção, pois ela não tem variações no tempo. Tente, vai ser uma descoberta, mesmo você não sendo músico. Eu não sou músico, mas sou curioso! 
 
Então, este 1º verso é a declaração de amor. No Verso 2, ele conta a frequência com que ele quer tê-la a seu lado, ao menos toda manhã, ou sempre que ele se sente triste, na verdade, a todo momento ele a quer. É muito amor!  
I want you in the morning girl I love you,
I want you at the moment I feel blue,
I'm living ev'ry moment girl for you. 
Aqui é um bom momento para ressaltar um ponto, pra quem não é familiarizado com o inglês. Você viu que eu disse 'triste' mas você não vê em inglês a palavra 'sad' ou 'unhappy', você vê 'blue'! É que a cor azul é considerada uma cor 'triste', e daí aquele ritmo criado pelos negros americanos, quase sempre com temas tristes, ficou conhecido como 'Blues'. Bem, passada a digressão idiomática, apresento o Verso 3, que vem depois de dois versos instrumentais. Nele, George conta como foi amor à primeira vista, ela só precisou olhar pra ele. Aliás, combina com as primeiras palavras que ele dirigiu a Miss Boyd, quando a conheceu durante as filmagens de A Hard Day's Night: "Quer casar comigo? Se não quiser casar comigo, quer sair pra jantar?"  
 
I've loved you from the moment that I saw you,
You looked at me that's all you had to do,
I feel it now I hope you feel it too.  
 
Depois, repete-se o 1º verso e tudo acaba bem! Note que são 3 versos, com 9 linhas, todas terminadas com o mesmo fonema 'u', ou 'oo', em inglês, 'you-true-do-blue-too'. Fosse em português, cada verso só teria rimas ricas. Era George, adotando a regra Beatle de Composição, compondo versos com letras diferentes e rimas interessantes.  George trouxe a canção no dia 6 de janeiro aos estúdios Twickenham, mas trabalhou sozinho nela ao violão até o dia seguinte. No dia 9, finalmente Paul entrou no piano e John na guitarra, pela manhã, mas no final do dia tentaram a configuração padrão dos Beatles. Tudo entrou em recesso quando George deixou a banda no dia 10, e somente no dia 21, ela voltou, mas rapidinho, agora como a única nova canção de George, com ele desistindo das outras 4 que enumerei ali em cima. O dia 25 foi o real 1º dia a vera de For You Blue, George conduziu seus amigos a 16 ensaios da canção até começarem a gravar em fita e a contar os takes, com ele ao violão, Paul de volta ao piano, Ringo só na base da escovinha na caixa e John todo animado com seu novo brinquedo, uma guitarra de colo havaiana (Lap Steel Guitar) que acabara de adquirir. Paul estava tão especial ao piano que logo o Take 1 foi escolhido para ser lançado no Anthology 3, e é ele que abre a canção, num piano blues sensacional, ao invés do ótimo riff de violão que acabaria por prevalecer. Veja aqui, neste LINK, e note que há apenas um verso instrumental. Logo no take seguinte, entretanto, George apresentou sua proposta de introdução com o violão e, para compensar a perda do piano de Paul, propôs que se colocasse um segundo verso instrumental lá no meio só para Paul mostrar suas habilidades nas teclas. O Take 6 , já com Ringo abandonado as escovas e ficando com as baquetas, foi utilizado no filme Let It Be. As versões estavam praticamente todas ótimas, mas eles seguiram aprimorando, estavam todos felizes, o Take 7 foi o preferido de George, e parte do Take 9 também foi usada no filme, para ilustrar a chegada dos Beatles ao prédio da Apple. O Take 12 ficou melhor em algumas partes que o take escolhido por George, mas ele bateu pé! Findo o Projeto Get Back a canção ficou na prateleira até retornar nas duas tentativas de montagem do álbum. Em 8 de janeiro de 1970, George achou melhor regravar seu vocal, e é nessa sessão que ele inclui as falas, durante os solos instrumentais, uma delas como incentivo a John ('Go, Johnny go!') e outra, já no solo de piano, lembrando Elmore James, grande guitarrista do Blues americano. Uma última modificação foi introduzida por Phil Spector, a pedido de John, recuperando uma fala dele ainda nas primeiras sessões de 1969, antes da saída de George, em que ele fala sobre agentes do FBI usarem maconha, e ela abre a canção. Good old John...  
 
Falando em John, não há dúvida que ele é o músico de maior destaque em For You Blue. Sua 'guitarra deslizante de colo' é a primeira lembrança que vem à mente quando se lembra da canção. Ela entra logo após a sensacional introdução de George ao violão (que tem cinco compassos... e meio), ouve-se o dedal de metal deslizando pelas cordas deitadas em seu colo na busca pela nota adequada de cada acorde, até quase o final do verso, quando ele toca as quatro notas de baixo introdutórias para o verso seguinte (tum-tum-tum-tum). Ao longo do verso, ouve-se a caixa e o prato de Ringo, as notas abafadas do piano de Paul, o violão de George marcando no ritmo certo. O Verso 2 vem igual, apenas com a charmosa parada de Ringo nos dois últimos compassos, dando o destaque aos baixos de John, que segue brilhando no verso instrumental comandado por ele, e 'ouvindo' as falas de George (que na verdade vieram depois, como falei). E veio o segundo verso instrumental, desta vez com destaque para o solo sutil de piano a la Honky Tonk de Paul, que também 'ouve' uma fala de George, ouça o pianista desferindo um firme stacatto para introduzir o 3º verso cantado e, a seguir, o último verso repete a letra do primeiro, onde Paul faz mais dois stacattos no piano, o último deles preparando a conclusão tradicional do Blues. Uma palavra? Delicioso! 
 
A canção teve a honra de estar no último compacto dos Beatles, um Lado B para The Long and Winding Road, que fez grande sucesso nos Estados Unidos, ocupando o topo das paradas, aliás, foi a 20ª vez que isso aconteceu, um recorde. Interessante que os conterrâneos dos Beatles que quiseram ter a posse dessa preciosidade tiveram que importá-la, porque o compositor da faixa do Lado A não permitiu seu lançamento no Reino Unido: havia detestado a versão orquestral de sua canção. 
 
Para finalizar, um bônus! For You Blue nunca foi tocada ao vivo pelos Beatles, e George a tocou uma vez em 1974, numa excursão pelos EUA. Felizmente, mas pelo pior motivo, ela foi tocada por dois Beatles no Concert for George, que ocorreu no Albert Hall em 2002. O motivo foi sua morte um ano antes. Deixo aqui os três links: LINK1, LINK2, LINK3!! Faço questão que preste atenção em várias coisas.... Paul cantando e no violão ... Ringo na bateria, Dhani o filho de George, a cara dele, logo ali atrás ao violão, Billy Preston em um dos teclados, e note o guitarrista ao fundo fazendo os slides, porém de pé, diferente de Lennon, que sentava. Pena que está apenas em trechos.... pra dar água na boca .... e fazê-los ter vontade de acessar o concerto inteiro, seguramente, o mais perfeito DVD musical que tenho!!

domingo, 30 de maio de 2021

The Long and Winding Road, triste estrada

 Esta canção é a 3ª do Lado B do LP Let It Be, o último lançado pelos Beatles

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 8 canções sobre Saudade, na Classe Tristeza

                                        as demais 7 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

10. The Long and Winding Road (Sadness Miss Song by Paul McCartney)

Paul suplica: 'Na noite selvagem e tempestuosa que a chuva lavou deixou uma piscina de lágrimas chorando pelo dia. Por que me deixar aqui sozinho? Mostre-me o caminho' 

Linda balada, que teve múltiplas versões, só com banda ou orquestrada. Incrivelmente, o plano de Paul era dá-la para Tom Jones lançar, mas ele não pôde aceitar. Ela foi o 20° e último compacto dos Beatles a atingir o N°1 nas paradas americanas, em junho de 1970, já após o fim da banda! 
 
Com estas breves linhas, eu resumi a história dessa canção no alvorecer de minha saga, quando listei as canções tristes, de saudades, que os Beatles embarcaram em sua carreira, como eu disse acima, em oito oportunidades. Chegada a hora de dar um pouca mais de detalhes dessa obra como parte do LP Let It Be, uma boa coisa neste caso, é começar pelo começo, porque a primeira vez que o mundo externo ao mundo particular de Paul McCartney ouviu os primeiros acordes desse monumento foi muito especial. Numa sexta-feira de setembro de 1968, os Beatles terminavam um belo dia de gravações, quando depuraram Piggies de George Harrison, o assistente de Paul, Alistair Taylor, começou a dar boa noite a todos e procurou seu 'chefe' para o efeito, saiu perambulando pelos diversos locais dos estúdios, e quando adentrou ao enorme Estúdio 1, viu uma luz ao fundo, iluminando apenas o piano de cauda, começou a ouvir uns sons, e uma voz que identificou como a de Paul, foi chegando, e ficando encantado, e quando parou já próximo, emocionado por haver testemunhado um momento histórico, disse: 'Paul, que linda canção!' e mencionou que a esposa dele iria adorar. Em seguida, Paul perguntou ao único técnico que sobrou se tinha alguma fita sobrando, pediu pra rodar e fez  primeiro registro da canção, ainda com somente um verso 'The long and winding road that leads to your door will never disappear, I've seen that road before. It always leads me here, lead me to your door', e meia ponte 'many times I've been alone, and many times i've cried', lá nos acordes e tom já definitivos. Dia seguinte, à tarde, Paul foi ao escritório, lá estava Taylor e recebeu do 'chefe' um disco de acetato, ouvindo: 'Leve pra Leslie!' (a esposa dele), aí tirou do bolso um rolo de fita, pegou uma tesoura, desenrolou a fita e a picou, em mil pedacinhos, ao final falou: 'Esse acetato que te dei é a única mostra desta canção na face da Terra'. Paul sabia do valor daquilo. Só que... você, amigo, ouviu aquele som alguma vez? Nem eu, nem ninguém, nunca mais ninguém achou aquela preciosidade, Taylor já morreu, ninguém sabe, ninguém viu, ou melhor, ouviu... Ah, como eu queria ter vivido aquilo, ter incorporado em alguns daqueles técnicos que testemunharam tantos momentos incríveis de criação, naquele assoalho de tacos onde já me ajoelhei e beijei, em 2005. Ao menos se aquele menino, de 6 a 12 anos de idade do outro lado do Atlântico tivesse a capacidade de dupla visão, poderia fazer algumas visitas... Mas chega de reminiscências. 
 
Paul não desenvolveu mais a canção àquela época, então ela não foi considerada para o Álbum Branco, mas chegou a hora dela no Projeto Get Back, em janeiro de 1969, ainda que não se encaixasse no perfil do que se esperava para ele, mais próximo de rock e folk, tanto que a maioria das vezes em que ele a tocou, o fez sozinho ao piano, com eventuais participações de um ou outro companheiro, e a primeira vez que todos participaram, foi já próximo do final, no dia 26, com John no baixo, porque ele estava ao piano, George na guitarra, Ringo na bateria, e Billy Preston no órgão, já agregado ao grupo após o retorno de George de seu exílio voluntário de 10 dias. Àquela altura, os outros versos e a metade final da chorosa ponte ('Anyway you'll never know the many ways I've tried) já estavam prontos, o Verso 2 já traduzido no caput, e o Verso 3, que vem após a ponte e é repetido no final, após uma ponte instrumental, sendo uma corruptela do Verso 1, inclusive colocando o título da canção em outra posição (na linha 2 ao invés de abrir o verso), coisa que só grande letrista consegue, e que termina com mais um apelo 'You left me standing here a long long time ago. Don't keep me waiting here! Lead me to your door'). 
 
Poxa, brincando, brincando, acabei reproduzindo quase a totalidade da linda e rica letra, com muitas rimas idem way-day-away, tears-here, door-before. Bem, foram 16 ensaios nesse primeiro dia de fato, e o destaque foi a luta de John para acertar o baixo, como se sabe, que não é seu instrumento de origem. Paul o orientava na busca do baixo perfeito. O take final do dia ficou quase perfeito, ouça neste LINK, note o trabalho sutil da banda, especialmente o chimbal de Ringo, de levinho, acompanhando toda a canção, as entradas de George na guitarra distorcida preenchendo eventualmente um que outro espaço entre letras, e de vez em quando o órgão de Billy. Olha, se o John errou algo, e consta que errou uma ou outra nota, não percebi. A versão foi usada tanto na tentativa inicial de fazer LP Get Back ainda em 1969 por Glyn Johns, como quando Phil Spector pegou a missão em 1970. Nos dias 27 e 28 de janeiro, outras sete vezes foi ensaiada a canção, porém nenhuma melhor que a versão do dia 26. No último dia do Projeto, dia 31, retornaram ao estúdio para filmar 3 canções para aparecerem no filme Let It Be, sendo nossa linda balada tentada 19 vezes, em meio a falhas de todos pelo meio do caminho, inclusive nesta última, quando quem falhou foi o próprio autor, cantando letras levemente diferentes. Só que já estavam cansados, ainda teriam que filmar a canção Let It Be, e aceitaram a versão. Só quem viu o filme, percebeu, e também após 2003, quando finalmente saiu em disco, no Let It Be Naked. Hoje, o vídeo está disponível, e eu mostro aqui, neste LINK. Note a delicadeza de Paul ao piano, sempre olhando para a câmera, os dois guitarristas sentados, John prestando uma atenção enorme ao baixo que estava tocando, Yoko ali ao lado, quietinha, Billy no teclado, especialmente na ponte instrumental, mas perceba um concentrado Ringo, sentindo a canção e quase que permanentemente acionando o chimbal com o pé.
 
O banho de orquestra de Phil Spector veio no dia 1º de abril de 1970, desta vez ele criou sua Wall of Sound colocando a versão lá de 26 de janeiro de 1969 nos Canais 1 a 5, todas as cordas (27 músicos, incluindo uma harpa) no Canal 6, os metais (8 músicos) e uma nova bateria de Ringo (único Beatle presente) no Canal 7 e o Coral (14 cantores) no Canal 8 do gravador de 8 faixas. Paul foi o único Beatle que não gostou da orquestração, preferia a versão básica, como ficou Let It Be. Porém, junto-me aos outros 3 Beatles e, decerto, à grande maioria dos ouvintes: a orquestra e coral ficaram excelentes, encaixaram perfeitamente! Ouça aqui, no terceiro LINK deste post, verdadeira overdose de 'longuenduaindinroud' pra vocês, metais e cordas entrando firme logo no segundo compasso, em quatro chamadas (pa-pa pa-pa), depois levemente acompanhando o vocal do primeiro verso, com o coral entrando após 'that road before'. No Verso 2, o arranjo já aparece mais, e tem aquelas quatro notas descendentes famosas dos metais depois que a chuva lava o caminho. Pra mim, o mais arrepiante acontece na ponte que vem em seguida, com aquelas quatro espirais crescentes sucessivas das cordas nos quatro primeiros compassos, e tudo subindo uma oitava nos quatro últimos, o coral acompanhando no agudo ao longo dos sete primeiros compassos e entrando em transe épico no oitavo. No Verso 3, o arranjo muda um pouquinho e depois repete-se a ponte, e agora, sem a voz de Paul, percebe-se melhor a grandeza do arranjo. Na repetição do Verso 3, tudo cresce, e arrepie-se com a harpa ao final, ao longo do yeah yeah yeah yeah de Paul. 
 
Paul rejeitou tanto a versão que impediu o lançamento do single com ela! Felizmente, não impediu o lançamento nos Estados Unidos, ladeada com For You Blue, de George, no Lado B, onde ficou duas semanas no topo da parada, constituindo-se na 20ª ocorrência do binômio Beatles Single / Topo da Parada Americana, um recorde! Foi lançada em várias coletâneas, das mais conhecidas, como o Blue Album a outras menos conhecidas, como o Reel Album, que eu nem conhecia, coletando as principais canções dos filmes dos Beatles. Achei tão interessante a ideia que montei a imagem abaixo para ilustrar este post, o track list da coletânea, que vendeu mais de 500 mil cópias... tudo gerava dinheiro para os Beatles!

 


 

sábado, 29 de maio de 2021

One After 909... seria o trem 910 ou das 9:15

 Esta canção é a 2ª do Lado B do LP Let It Be, o último lançado pelos Beatles

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 8 canções com um Histórias na Primeira Pessoa

                                        as demais 7 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

 são links que levam a análises sobre elas.

9. One After 909 (Self Story Song by John Lennon)

John conta: "Peguei minha mochila, corri pra estação, o cara me disse que eu peguei o número errado...'

Canção feita por John em 1957, tentada para lançamento em 1963, como Lado B de From Me To You, mas só materializada no Projeto Get Back, seis anos depois. O título quer dizer '910' (um depois do 909), que seria o trem que ele deveria pegar. Ou o trem depois do trem das 9:09 horas, ou seja, por volta das 9:15. Rock raiz da melhor espécie, que felizmente sobreviveu, ganhando o auxílio luxuoso de Billy Preston no teclado, e ainda teve a honra de ser tocada ao vivo na última aparição dos Beatles ao vivo, no antológico Rooftop Concert, em 30 de janeiro de 1969 (LINK), que foi o último momento do projeto. John disse que na verdade foi uma brincadeira com o Número 9, que era especial, porque nasceu num dia 9, morava no número 9 de uma rua, tanto que fez aquela doideira do Revolution 9,  enfim... mas infelizmente não viu a luz do sol do dia 9 de dezembro de 1980... 
 
Ainda em seus 17 anos, John já demonstrava a maturidade que que desfilou em toda sua carreira de letrista. A canção tinha dois versos diferentes, e uma ponte, com rimas que seriam ricas em português: line-nine, ice-twice, me-knees, home-wrong, deslizando um pouco com station-location. No Verso 1, a menina avisa que vai embora de trem, e ele apela que ela tenha compaixão, no Verso 2, ele pede de joelhos mas ainda achava que ela estava brincando dizendo que ia embora, mas ela foi, e na ponte, ele pega sua mochila e corre atrás dela, mas o maquinista diz que ele pegou o número errado! Simples, mas já competente!    
 
A canção esteve nos planos dos Beatles bem cedinho, chegaram a gravá-la num gravador caseiro em 1960, depois com a chegada de Ringo em 1962, ela foi ensaiada como possível contendora para aparecer no primeiro compacto, mas foi preterida, e depois, para o terceiro compacto em 1963, chegou a ter alguns takes em Abbey Road, mas foi numa sessão complicada, não se acertaram de jeito nenhum, e ela de novo foi preterida, e foi para a prateleira (ouça neste LINK, e conclua depois que ficou muito melhor em 1969)! Com o advento do Projeto Get Bck, de volta às origens, em janeiro de 1969, rapidamente John se lembrou dela, Paul gostava, e One After 909 entrou no ritmo de ensaios, logo no segundo dia, o glorioso 3 de janeiro, com 3 ensaios (3x3=9), todos em seus instrumentos regulares, tendo diferente apenas o pedal de wah wah na guitarra de George. Próximos 3 ensaios no dia 6 (6+3=9), e mais 4 no dia 7 (7+4=11-1-1=9), teve mais 1 ensaio no dia 8 (8+1=9) e 4 no dia 9 foram 4 (9+4x0=9), viram que, afora duas apelações de minha parte, o 9 continuou presente na vida de John e sua One After 909. No dia 9+1, George deixou a banda por 9+1 dias, e, na volta, trouxe Billy Preston e seu piano elétrico, que seria muito importante nas gravações, especialmente desta rocker de John. Voltaram a pensar nela apenas no dia 28, quando foi ensaiada algumas vezescom a guitarra de George já sem o efeito do pedal, mantendo o som raiz, e já com intenções de tocá-la ao vivo, em local que seria decidido no dia seguinte! No dia 20+9,  o Dia D-1, foram mais 3 (divisor de 9) vezes, e apenas a última com Billy Preston, impressionante como ele se ajustou rapidamente à canção. 
 
No Dia D, 30 de janeiro, no terraço do edifício, One After 909 abriu os trabalhos, em apenas um trecho, para aquecer instrumentos e foi tocada apenas UMA vez inteira, ótima, tão boa que foi a versão utilizada no LP Let It Be. Todos desempenharam como nunca haviam feito nos ensaios, quando um ou outro errava em alguma parte. John não errou nenhuma letra; George fez ótimos riffs, tanto na introdução como ao longo dela, e produziu um solo de guitarra impecável, tanto que deu um sorrisinho para John ao terminá-lo; Ringo fez paradas e retomadas perfeitas em todos os finais de verso; Billy Preston preencheu perfeitamente os espaços entre as linhas iniciais dos versos, e liderou os instrumentos impecavelmente ao longo de toda a execução, e Paul em seu baixo de rock, seguro, e provendo limpo e agudo vocal de apoio a John na totalidade dos versos e no 'run to the station' da ponte, yeeeeaahh. Todos se olharam mutuamente orgulhosos ao final e John puxou uma citação irlandês 'Danny Boy, the old savannah callling' acompanhado timidamente por Paul, que até foi mantido na versão do LP. Acompanhe o show aqui, neste LINK. Não preciso dizer mais nada! 
 
Aliás, digo! Tem mais uma ocorrência do Number Nine neste lançamento:  
 
A canção é a 2ª do Lado B do LP Let It Be. 
Como o Lado A tem 7 canções, então, 
7+2=9
CQD

sexta-feira, 28 de maio de 2021

I've Got A Feeling ... and a hard year

 Esta canção abre o Lado B do LP Let It Be, o último lançado pelos Beatles

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 9 canções sobre si mesmos, na Classe Sonho

                                        as demais 8 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

8. I've Got A Feeling (Mind Self Song by Paul McCartney)

Paul sente: 'Eu tenho um sentimento, um sentimento aqui dentro, Oh, sim, oh, sim (está certo). Eu tenho um sentimento, um sentimento que não consigo esconder. Oh, não! Oh, não! Oh, não' e John admite: 'Everybody had a hard year'

Na verdade, são duas canções inacabadas, uma de Paul outra de John, que alguém percebeu que tinham os mesmos acordes, e resolveu juntar as duas numa só, com uma terminando a outra! Imagino que a ideia tenha sido de Paul, pois ele é quem tinha as ideias, mas não vi isso escrito em lugar nenhum. A de Paul é mais positiva, e ele tem um desempenho vocal perfeito. A de John chamava-se ‘Ev'rybody had a hard year’, era uma ladainha, com todos os versos começando na mesma palavra (Everybody) e era meio down, coadunando-se com seu próprio estado de espírito, tendo separado de Cynthia, Yoko tendo um aborto, ele lutando contra o vício de heroína, sendo preso por porte de drogas, em crise com os Beatles, enfim... A junção das duas ficou sensacional, e tão boa, que a cantaram, e muito bem, no RoofTop Concert, a última aparição deles ao vivo! Deixo aqui o LINK pra vocês. A estrutura ficou assim: primeiro Paul canta a dele (com John na segunda voz no segundo verso), depois John canta a dele, e finalmente os dois cantam ao mesmo tempo as duas, uma solução brilhante, plástica, um verdadeiro jogral! Até fiz uma figura pra explicar. Acompanhem com o vídeo. 
 
 
 
A canção de John é basicamente esta que foi apresentada à direita, enquanto que a de Paul tinha mais dois versos e uma ponte, em que ele literalmente grita, como nos melhores tempos de I'm Down, Long Tall Sally e como ainda faria em Oh, Darling mais adiante naquele ano, um trecho que leva a crer que ele pensava em Linda, 'All these years I've been wandering around, Wondering how come nobody told me  all that I was looking for was somebody who looked like you'... (ou seria John?). Entretanto, com a mistura de duas canções e a outra sendo meio 'down', deixei a canção como um todo como Mind Self Song. Na ponte, é sem rimas, e nos versos, John uniu time com sunshine, e Paul foi mais pródigo, rimou sempre que pôde, inside-hide, leave me-believe me, train-again, e ainda buscou os próprios artelhos, toes, pra rimar com knows, as o mais legal da letra, minha opinião, são as interjeições se coadunando com a frase precedente, sendo sempre 'oh, yeah' se a frase é positiva e 'oh, no' se a frase é negativa, pode conferir!
 
Como era parte do Projeto Get Back, minimalista, de volta às origens, todos tocaram seus instrumentos usuais, mas contaram com o auxílio luxuoso (adoro essa expressão, cunhada por Luiz Melodia) de Billy Preston, no piano elétrico!! John a trouxe no primeiro dia de gravações no estúdio de Twickenham, 2 de janeiro, já com o arranjo pronto, tipo "eu canto a minha parte, ele a dele, e depois cantamos juntos" e até chegou a arriscar a parte de Paul. Quando este e Ringo chegaram, conseguiram ensaiar 20 vezes. Nos próximas cinco sessões, mais 23 vezes, aprimorando vocais e batidas de Ringo. O 6º dia foi o fatídico dia 10, que só foi metade na prática, porque George foi-se embora na hora do almoço, abandonando a banda! Paul chegara antes e começou uma tomada de I've Got A Feeling no piano, e os outros foram chegando e juntando no som. Depois da saída de George, teve mais um ensaio só com os três remanescentes, que acabou em bagunça! No dia da volta de George, foram mais 4 vezes e, no dia seguinte, a enormidade de 29 vezes, já com alguma contribuição de Billy Preston ao final, e a decisão de diminuir aquela ponte, com subida e descida de acordes, de inicialmente 4 vezes no meio e outras 4 vezes no final, para, respectivamente, uma e três vezes. Um desses 29 ensaios foi guardado e lançado no Anthology 3, por causa das respostas divertidas de John às frases de Paul, legal mesmo, veja neste LINK, mas peço sua atenção para o vocal de Paul na ponte, e imagine ele fazendo AQUILO .... VINTE E NOVE VEZES num mesmo dia!! Um herói ... e aquela garganta, abençoada!! Nossa, fiquei até cansado! E ainda teve 9 vezes e mais 17 vezes nos dois dias seguintes, sendo que nas primeiras do dia 27, Paul estava ausente e John fez as partes dele, adaptadas ao seu alcance vocal que não era o mesmo. Ah, como eu queria ouvir esses takes.... enfim. I've Got A Feeling era uma das cinco canções que seriam tocadas na apresentação do dia 30, então cada uma delas foi ensaiada uma vez no dia anterior, mas sem os esforços vocais para poupar as gargantas. No dia do show, eles deram UM SHOW, a canção foi tocada duas vezes, sendo a primeira considerada tão boa que foi escolhida para estar no álbum, além, é claro, do filme Let It Be. 
 
A canção é tão espetacular, minha preferida do Projeto Get Back (*), que vale uma descrição, passo a passo. O riff inicial de guitarra distorcida é de John, que segue, acompanhando a voz de Paul no Verso 1, que entra firme, só, mas na segunda frase já se ouve a bateria de Ringo, note o chimbal, thic thic. No Verso 2, Paul tem a companhia de John harmonizando 'Oh please believe me, I'd hate to miss the train, oh, yeah..'. Na segunda frase, nota-se já a guitarra de George pareando a de John em acordes triplos, distintos do riff inicial, e o piano elétrico de Billy, e os pratos de Ringo e a linha de baixo de Paul. Aí vem a ponte, maravilhosamente gritada de Paul, tão impressionante que a gente nem nota a guitarra de George ao fundo e se pergunta como Paul pode continuar prestando atenção em seu próprio baixo cantando daquele jeito! Estonteante! E aí, volta John com a guitarra chorando em notas descendentes introduzindo o Verso 3, 'I've got a feeling that keeps me on my toes, oh yeah', cantado apenas por Paul, com eventuais entradas de John. Finalmente chega a canção de John, pra acalmar um pouco o coração que Paul deixou acelerado. São dois versos acompanhados do educado chimbal de Ringo, da guitarra de George e do piano de Billy. E vem depois uma ponte instrumental fantástica, com as guitarras de George e John fazendo caminhos inversos, uma subindo no primeiro compasso e descendo no segundo, e a outra descendo e subindo, respectivamente, genial, acompanhadas dos tom-tom's de Ringo. Então, volta o riff inicial de John para introduzir as duas canções, a de Paul e a de John, cantadas simultaneamente por eles, olha, uma coisa linda! A canção termina com a repetição, de três vezes, da ponte instrumental, fenomenal trabalho de equipe, com as guitarras de John e de George subindo/descendo, o que dizer dessa maravilha? 
 
Acho que não preciso dizer mais nada, né? 
 
Ah, sim, falta ... a explicação do (*)... 
é que do disco mesmo, a que eu gosto mais 
é Across The Universe, mas eu considero 
que ela não é 'do' Projeto.... a original, 
a que foi gravada com a participação 
de uma brasileira cantando,
fora gravada em 1968.
  

quinta-feira, 27 de maio de 2021

Let It Be, mãe Maria disse

Esta canção é a 6ª do Lado A do LP Let It Be, o último lançado pelos Beatles

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 9 canções sobre si mesmos, na Classe Sonho

                                        as demais 8 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

6. Let It |Be (Dream Self Song by Paul McCartney)

Paul sonha com sua mãe: 'Quando eu me encontro em momentos difíceis, Mãe Maria vem para mim, sábia, e diz: Deixa estar. E nas minhas horas sombrias ela está em pé bem na minha frente, sempre sábia, e diz: Deixa estar' 

Isso mesmo, parece que uma constante naqueles tempos, mais precisamente em 1968, Paul, assim como, John, como George, e até como Ringo (como vimos acima) estava preocupado com os rumos da banda, e ele teve uma visão de sua mãe Mary, em sonho, dizendo Let it be.... mas a quem lhe perguntava se Mary não era a mãe de Jesus, ele deixava a critério do avaliador a interpretação. Só não lhe viessem com a esculhambação de dizer que seria Marijuana (maconha), que ele ficava doido. Paul, como John, perdera sua mãe cedo, mas para o câncer de mama, quando ela ainda atuava como enfermeira, e ainda antes dele encontrar John. Aos 14 anos, um Paul arrasado encontrou consolo num violão que seu pai Jim havia comprado recentemente para ele e seu irmão Mike, enfiando a cara no instrumento, e ficando tão bom, que impressionou John no encontro no pátio de uma igreja, menos de 9 meses depois. Foi como uma gestação, sendo a semente, a dor da perda, e sendo o parto, o nascimento da maior dupla de compositores de todos os tempos.  Depois da homenagem, ao mencionar a mãe numa canção, Paul também deu o nome dela à sua primeira filha com Linda, que nasceu em 1969. 
 
Pausa para uma fofoquinha...
À parte desta terna inspiração veiculada, com o nome da canção ditado por sua mãe em sonho, há uma outra, paralela, menos emotiva. Paul contou a Mal Evans, o grande (mesmo) companheiro assistente, antes roadie, para todas as horas, que em uma sessão de meditação (que aprendeu com o Maharishi), ele tivera uma visão com o gigante (metro e 96) amigo lhe dizendo "Let it be" em reposta a suas mágoas com o momento da banda. Verdade ou não, é que na primeira vez que ele a tocou em estúdio, ainda longe de ter arranjos e letras finas, ele cantou 'Mother Malcom', ao invés de 'Mary'.... duas vezes. Era setembro de 1968, sessão para Álbum Branco. Bem, visão da mãe ou do amigo, não interessa.
Fim da fofoquinha 
 
A composição obedece aos critérios Beatle de fazer música, levado ao extremo: não há repetições de letra entre os 6 (seis) versos cantados (!), e ainda tem o requinte de mudar levemente a letra entre um refrão e outro ('Whisper words of wisdom' e 'There will be an answer'! Isso é Paul McCartney. Os Versos 1 e 2 contam o encontro dele com sua mãe em sonho, os Versos 3 e 4 estendem o benefício do conselho aos que estão magoados, com o coração partido, e aos que estão separados por algum motivo, e os Versos 5 e 6 retomam o contato com a mãe mas de uma forma diferente, contando que ela é uma luz que sempre brilha a seu lado. Muito lindo! Lembrando disso, deixo registrado aqui um momento de emoção de Paul, já mais recente, quando ele anda de carro com um apresentador de Talk Show. Realmente tocante, neste LINK. Interessante que a única rima da canção é no fonema 'ee'' ou 'i' em português, 'be-me-see-agree'. Além dos seis versos cantados, há um verso instrumental na introdução, ao piano, e dois acompanhados com solos de guitarra. 
 
Muitos ensaios e versões estavam reservadas a Let It Be, desde que Paul a apresentou oficialmente ao Projeto Get Back, nos estúdios de Twickenham. Já no dia 3, Paul tocou para Ringo, um verso e um refrão, mas de fato mesmo foi no dia 8, primeiro apenas com ajuda de Ringo e John, e ainda usando vez ou outra o incrível "Mother Malcom" na letra, e no final do dia, com a chegada de George, com John já arriscando uns vocais de apoio, mas a canção ainda estava sem forma, nada que valesse a pena ser contado como ensaio. No dia seguinte, a coisa ficou mais definida, por exemplo, John, que começou com sua guitarra, já havia passado ao baixo nos últimos dos 16 ensaios do dia, já que Paul ficaria ao piano, e eles tinham aquela ideia de não ter acréscimos posteriores no projeto, a canção tinha que ser executada integralmente por eles ao vivo. No dia 10, George saiu da banda, voltou 10 dias depois, já com Billy Preston e seus teclados no barco, para quem Paul apresentou a canção no dia 23 e, dia seguinte  Paul ensaiou Let It Be 14 vezes, mas só com seus companheiros de banda. Foram mais 18 vezes no dia 25, mas tudo parecia ainda desconjuntado até que, na última do dia, ele falou para o produtor: "Grave a próxima que será ótima!" E foi! E foi boa o suficiente pra ser lançada no Anthology 3, veja, neste LINK, que ainda não há a letra dos Versos 5 e 6, ele repete a dos Versos 1 e 2, mas a estrutura já está toda lá, com dois bons solos de George em duas vezes 8 compassos do meio da canção, mas ainda sem o órgão de Billy. E a introdução ainda não é a que conhecemos, mas a mesma sequência de acordes descendentes ao piano do final, a chamada coda, que se ouve no final, e em duas vezes no meio da canção, introduzindo os solos. 
 
Vocês viram que os números de ensaios começaram a aumentar, né... pois bem, no dia seguinte, não se perca, dia 26, foram mais 28 vezes! Era a progressão em busca da 'batida' perfeita, agora com a presença do órgão de Billy Preston, em especial na segunda coda intermediária, trazendo um som de igreja à canção.. Houve mais 12 ensaios no dia seguinte e, nos dois dias em que se decidiu fazer (e se fez) o show no terraço, Let It Be foi levada apenas uma vez, com nada de novo. Depois do show, era o último dia do Projeto, pois Ringo começaria a filmar seu novo filme, com Peter Sellers, então ocorreram os 8, na verdade, 9 takes finais, nem todos indo até o fim, todos já começando com a introdução definitiva ao piano, e os que foram até o final, tinham, finalmente, as letras definitivas dos dois versos finais, ufa! Uma das versões foi para o filme Let It Be. 
 
A razão do 'na verdade' ali de cima, é que os takes foram numerados 20 a 27 (!) por causa da claquete do filme, acho que ficaram com vergonha de mostrar no filme que já haviam atingido a marca centenária de ensaios, sim, pode contar, naquele dia seria o 101º ensaio. Só que após o Take 27, que ficou ótimo, resolveram fazer mais um, com o mesmo número, então virou o Take 27b, o primeiro ganhando a alcunha de 27a, escolhido como o melhor. Ufa! Terminou? Nããão! George ficou meses matutando que seu solo de guitarra do escolhido Take 27a não estava como alguns que ele havia conseguido em outros takes, e chamou Chris Thomas ao estúdio no dia 30 de abril para gravar mais um solo, matador, que materializar-se-ia no compacto quase um ano depois. Agora terminou? Nããão! Já em 1970, no dia 4, ocorreu a última sessão de gravação dos Beatles, com Paul, George e Ringo, e George Martin, que trouxe um arranjo de violoncelos e metais para ser gravado e incluído em Let It Be no compacto a ser lançado. Nesse dia, George fez um novo solo de guitarra, Paul tocou um piano elétrico e um chocalho, e Ringo alguma bateria. Finalmente, terminou? Siiiim, no que tange a participação de Beatles no processo, mas não na manipulação de versões, porque, como já se sabe, Phil Spector foi chamado para produzir o LP, e escolheu o solo de guitarra de George do dia 4 para ser lançado no LP, além de aumentar o som dos metais de George Martin, e colocou eco no chocalho de Paul dos versos finais e ressaltou o chimbau (hi-hat) de Ringo nos versos intermediários. Pra mim, afora a escolha do solo mais recente de George, foram ótimas decisões. O solo de George do 'single' é o que mora em meu coração, é aquele que eu toco em meu 'air guitar'. Spector também acrescentou um terceiro refrão ao final, originalmente com dois, desta forma fazendo a canção invadir em um segundo o quinto minuto de exibição de uma pérola, muito admirada e regravada ao longo dos últimos 51 anos.
 
Por incrível que pareça, a canção teve 'mixed reviews', no lançamento do compacto, em março de 1970, tendo exaltadores, e detratores, um deles o próprio Lennon, que achava que aquilo não era para os Beatles lançarem, oh, come on, John! O compacto atingiu 'apenas' o N°2 na Inglaterra, mas não falhou em alcançar o topo nos EUA, garantindo 3 recordes: (1) tal como Elvis Presley, os Beatles tiveram o seu 7° ano em sequência com pelo menos um hit N°1 na parada americana, carregando junto (2) o produtor da canção George Martin, que igualou-se ao produtor de Elvis, mas o (3) é só deles, pois foi a primeira vez que uma entidade compositora, no caso, Lennon/McCartney, atingiu tal feito, tendo ao menos um N°1 em 7 anos seguidos, 1964, 1965, 1966, 1967, 1968, 1969 e 1970... 
 
Quantos mais não seriam, se os Beatles continuassem juntos e lançando canções como My Sweet Lord, Another Day, Uncle Albert/Admiral Halsey, Imagine, Happy Christmas, It Don't Come Easy, Give Me Love, My Love, Mull of Kintire, Band On The Run, Photograph, Live and Let Die, Mind Games, Whatever Gets You Thru The Night, Steel and Glass, With a Little Luck, Just Like Starting Over, Woman, Ebony and Ivory, Tug of War, e tantas outras? 
 
Esta é a questão que fica ... 
e também o conselho de Paul ... 
na canção de despedida dos Beatles... 
Let it be!