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domingo, 24 de dezembro de 2006

Casino Royale

      Este novo filme da franquia mais bem sucedida da história do cinema foi precedido da maior polêmica já criada. A escolha do ator Daniel Craig para encarnar James Bond não foi engolida por boa parte dos fãs, justamente os mais fanáticos: louro, baixo, orelhas de abano, impossível! Eu, ainda que preferisse Hugh Jackman, um dos candidatos, para o papel, fiquei apenas ressabiado, porém confiando em que os produtores Barbara Brocolli e Michael G. Wilson, filha e enteado do primeiro produtor da série, não dariam um tiro no pé, enterrando-a com uma escolha infeliz. Houve um movimento mundial incentivando o boicote, comunidades foram criadas com infindáveis críticas, Craig sofreu, como ninguém antes, um pre-julgamento insensato. Agora, após o filme, uma enxurrada de desculpas invadiu a mídia, tanto dos fãs, como da crítica especializada. Teve uma delas, crítica de cinema renomada, que prometeu comer a edição do tablóide em que criticava desmedidamente a escolha, se o agente implacasse um sucesso. Outro dia, eu a vi cumprindo a promessa, acompanhada por goles d’água.

 
       Ao filme: em branco e preto, a primeira cena mostra as primeiras mortes do agente, ainda sem a distinta categoria ‘Double 0’ do serviço secreto britânico MI-6, com permissão para matar. A cena termina com a famosa mira do revólver para a platéia, pela primeira vez, como parte da própria cena. Depois, na abertura, alusões a naipes e cartas de baralho, pano de fundo para a trama que se desencadearia ao longo do filme. Na primeira missão, já colorida, já como 007, uma fenomenal perseguição, não com jatos, helicópteros, motos, esquis, pára-quedas, ou tanques, mas a pé, pelas ruas de Madagascar. O criminoso é magnificamente desempenhado pelo campeão mundial de corrida de rua, ou ‘le parkour’, nome francês, que significa ‘o percurso’, uma febre mundial que hoje contagia jovens dispostos a chegar aos lugares pelo caminho mais rápido e mais difícil, somente com mãos e pés, sem ajuda de nada mecânico. Primeiro sinal de que o enfoque mudou: o agente está usando a parte física, literalmente suando a camisa, nada do arrumadinho, impecável, terno ou smoking.

         Não vou antecipar mais nada do resto do filme, apenas declarar minha satisfação com as mudanças. Depois do mais fantasioso dos filmes de 007 (Um Dia Marcado Para Morrer - 2003) em que até carro invisível tinha, os produtores resolveram dar uma guinada, ainda que aquele tenha sido o filme com mais bem sucedido da franquia, e trazer o personagem de volta à Terra.  Desta vez não há geringonças, equipamentos mirabolantes e, portanto, tornou-se desnecessária a presença de Q, o gadget provider. Caramba, até Miss Moneypenny eles ‘mataram’. E, por incrível que pareça, nenhum deles faz falta: estou me sentindo um traidor! Felizmente, mantiveram M, a impassível chefe, (magistralmente, como sempre, interpretada por Dame Judi Dench), com quem James trava diálogos memoráveis.

       Levaram para a tela o primeiro romance de Ian Fleming, com adaptações para o dia de hoje, que de forma nenhuma conflitaram com o idealizado pelo autor: o vilão não é patrocinado pela Rússia, mas financiador do terrorismo; ordens de pagamento foram trocadas por transferências eletrônicas; bilhetinhos entregues pelo garçon foram trocados por  chamadas em celular; e trocaram o bacará pelo pôquer, claro, muito mais entendível pela platéia.  Enriqueceram o enredo com situações plausíveis e atuais. Aliás, isto era absolutamente necessário: quando eu acabei de ler o livro, há algumas semanas atrás, tive a certeza de que ali não havia materialidade suficiente para um longa-metragem.

        James está mais humano, menos superpoderoso,  tem conflitos internos, está mais pé no chão, mais próximo da realidade. Acerta, mas também erra! Sofre! Bate e apanha! Sangra! Está mais sensível! Tem uma cena tocante, em que consola a bond girl, debaixo do chuveiro (ambos vestidos!), depois que ela ajuda o agente em uma briga que resultou na morte dos malfeitores. Jamais se esperaria uma atitude como esta em filmes anteriores, aliás, nem na idéia original de Mr. Fleming, diga-se de passagem. Cenas de sexo, só insinuadas, sem aparição de partes íntimas,  no máximo aqueles pezinhos entrelaçados, ao pé do colchão.

      Para terminar o relato: a forma com que Daniel Craig diz a fala mais famosa do cinema (The name is Bond ..... James Bond) é de arrepiar! Nunca antes (nesse país!), a cena esteve mais enquadrada ao enredo e à situação extra-filme. James está se apresentando, não somente ao interlocutor na cena (e o cartão de visitas é bem doloroso!), mas ao mundo todo, já que o filme é uma recriação do personagem. Além do que, o próprio ator se apresenta para o papel. Não há mais dúvidas: 
 Daniel Craig É James Bond! 

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

Um Natal e um Ano Novo Espirituoso

Amigos e amigas, está no Aurélio:

espiriteira                            
[De espírito + -eira.]
S. f. Bras.
 1.        Vaso onde se deita (!!!)  espírito de vinho (!!!) ou álcool para arder.  (e eu ainda penso que sei português!)

O momento é de união espiritual
   em torno de um mesmo espírito,
      que encarnou há 2006 anos atrás.

Desejo que, neste domingo, 
   com muita presença de espírito,   
   deitando espírito de vinho no vaso, ou
         deitando um vaso de vinho no espírito,
         que se aqueçam os ricos e os pobres de espírito,
              presentes e ausentes em corpo,
              ainda que espíritos de porco!

Faço minhas as palavras
de um certo cantor narigudo,
com óculos de aro redondo,
sábio, sarcástico e espirituoso,
que pedia uma chance à paz,
e que deseja, ainda hoje, em espírito:

"And so, Happy Christmas and Happy New Year,
      I hope it´s a good one, without any fear! "

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

BonDubai ou As Aventuras de Bean, Mr. Bean

Poderia estar no Aurélio:
Dubai:    S. m. Bras.
 1.     Porção de emirado árabe cercado de James Bond por todos os lados
         Ao menos, para mim, poderia ter sido assim, não fossem alguns acidentes de percurso.
Fui indicado para representar minha empresa em evento internacional da indústria do petróleo em Dubai, onde apresentaria palestra, convite que aceitei com muita satisfação e orgulho.
Entretanto, quando me dei conta do dia de partida da missão, 15 de dezembro, entrei em desespero. Coincidia, lamentavelmente, com a estréia nacional do novo filme de James Bond – 007 - Casino Royale 2006. Eu já estava doido pelos produtores não haverem promovido uma estréia mundial da esperada inauguração de um novo ator na pele do espião mais famoso do mundo. Lá fora, estreara um mês antes. Agora, a decepção: não poderia comparecer à estréia, vestido a caráter. E, dada a excelente receptividade do filme e do novo espião no resto do mundo, minha ansiedade estava em níveis perigosos. Bem, ato contínuo, verifiquei o itinerário: partida do Rio para São Paulo às 11 da manhã; partida de São Paulo para Londres às 6 da tarde. Hummmm, tem jogo! Se os controladores de vôo não derem chilique, dá pra tentar, tem jogo! Pesquisado o cinema mais próximo e seus horários, tracei o plano da missão.
         Este novo filme da franquia mais bem sucedida da história do cinema foi precedido da maior polêmica já criada. A escolha do ator Daniel Craig para encarnar James Bond não foi engolida por boa parte dos fãs, justamente os mais fanáticos: louro, baixo, orelhas de abano, impossível! Eu, ainda que preferisse Hugh Jackman, um dos candidatos, para o papel, fiquei apenas ressabiado, porém confiando em que os produtores Barbara Brocolli e Michael G. Wilson, filha e enteado do primeiro produtor da série, não dariam um tiro no pé, enterrando-a com uma escolha infeliz. Houve um movimento mundial incentivando o boicote, comunidades foram criadas com infindáveis críticas, Craig sofreu, como ninguém antes, um pre-julgamento insensato. Agora, após o filme, uma enxurrada de desculpas invadiu a mídia, tanto dos fãs, como da crítica especializada. Teve uma delas, crítica de cinema renomada, que prometeu comer a edição do tablóide em que criticava desmedidamente a escolha, se o agente implacasse um sucesso. Outro dia, eu a vi cumprindo a promessa, acompanhada por goles d’água.
         Bem, mala feita, Galeão, check-in na TAM, despachei a mala diretamente para Dubai, consciente do risco que corria, afinal, seriam 3 trechos aéreos. Já havia confirmado a existência de depósito de malas do aeroporto de Guarulhos (SP), a intenção original era deixar a mala (e o computador) lá e partir para o cinema de mãos vazias. Só que não poderia me arriscar a ficar sem tempo para fazer o depósito delas, já que perderia o horário da sessão de cinema. Mantive o computador comigo, claro. Boa a decisão: o vôo atrasou 30 minutos, suficiente para inviabilizar o planejado depósito. Chegando lá, táxi para o Shopping Internacional de Guarulious City, instruções com o motorista sobre a entrada mais próxima, ingresso, pipoca, Coca-Cola, sala de projeção enorme, tipo estádio, poltrona confortável, nível dos olhos coincidindo com o cruzamento das diagonais da super-tela, música, primeira cena!
         Em branco e preto, a primeira cena mostra as primeiras mortes do agente, ainda sem a distinta categoria ‘Double 0’ do serviço secreto britânico MI-6, com permissão para matar. A cena termina com a famosa mira do revólver para a platéia, pela primeira vez, como parte da própria cena. Depois, na abertura, alusões a naipes e cartas de baralho, pano de fundo para a trama que se desencadearia ao longo do filme. Na primeira missão, já colorida, já como 007, uma fenomenal perseguição, não com jatos, helicópteros, motos, esquis, pára-quedas, ou tanques, mas a pé, pelas ruas de Madagascar. O criminoso é magnificamente desempenhado pelo campeão mundial de corrida de rua, ou ‘le parkour’, nome francês, que significa ‘o percurso’, uma febre mundial que hoje contagia jovens dispostos a chegar aos lugares pelo caminho mais rápido e mais difícil, somente com mãos e pés, sem ajuda de nada mecânico. Primeiro sinal de que o enfoque mudou: o agente está usando a parte física, literalmente suando a camisa, nada do arrumadinho, impecável, terno ou smoking.
         Não vou antecipar mais nada do resto do filme, apenas declarar minha satisfação com as mudanças. Depois do mais fantasioso dos filmes de 007 (Um Dia Marcado Para Morrer2003) em que até carro invisível tinha, os produtores resolveram dar uma guinada, ainda que aquele tenha sido o filme com mais bem sucedido da franquia, e trazer o personagem de volta à Terra.  Desta vez não há geringonças, equipamentos mirabolantes e, portanto, tornou-se desnecessária a presença de Q, o gadget provider. Caramba, até Miss Moneypenny eles ‘mataram’. E, por incrível que pareça, nenhum deles faz falta: estou me sentindo um traidor! Felizmente, mantiveram M, a impassível chefe, (magistralmente, como sempre, interpretada por Dame Judi Dench), com quem James trava diálogos memoráveis.
Levaram para a tela o primeiro romance de Ian Fleming, com adaptações para o dia de hoje, que de forma nenhuma conflitaram com o idealizado pelo autor: o vilão não é patrocinado pela Rússia, mas financiador do terrorismo; ordens de pagamento foram trocadas por transferências eletrônicas; bilhetinhos entregues pelo garçon foram trocados por chamadas em celular; e trocaram o bacará pelo pôquer, claro, muito mais entendível pela platéia.  Enriqueceram o enredo com situações plausíveis e atuais. Aliás, isto era absolutamente necessário: quando eu acabei de ler o livro, há algumas semanas, tive a certeza de que ali não havia materialidade suficiente para um longa-metragem.
         James está mais humano, menos superpoderoso,  tem conflitos internos, está mais pé no chão, mais próximo da realidade. Acerta, mas também erra! Sofre! Bate e apanha! Sangra! Está mais sensível! Tem uma cena tocante, em que consola a bond girl, debaixo do chuveiro (ambos vestidos!), depois que ela ajuda o agente em uma briga que resultou na morte dos malfeitores. Jamais se esperaria uma atitude como esta em filmes anteriores, aliás, nem na idéia original de Mr. Fleming, diga-se de passagem. Cenas de sexo, só insinuadas, sem aparição de partes íntimas,  no máximo aqueles pezinhos entrelaçados, ao pé do colchão.
         Para terminar o relato: a forma com que Daniel Craig diz a fala mais famosa do cinema (The name is Bond ..... James Bond) é de arrepiar! Nunca antes (nesse país!), a cena esteve mais enquadrada ao enredo e à situação extra-filme. James está se apresentando, não somente ao interlocutor na cena (e o cartão de visitas é bem doloroso!), mas ao mundo todo, já que o filme é uma recriação do personagem. Além do que, o próprio ator se apresenta para o papel. Não há mais dúvidas: Daniel Craig É James Bond!
         Enfim, valeu a correria. Cheguei em tempo hábil para o check-in na Brittish Airways (BA, a partir daqui) para Londres. Quem não estava em tempo hábil era a própria BA. O vôo estava atrasado em 2 horas! Foi o suficiente para estragar a conexão de colegas que iriam para a Líbia, mas não a nossa (minha e de um colega companheiro de missão) para Dubai: teríamos ainda 2 horas e meia de conexão. Embarcado, instalado na poltrona, acabei adormecendo, para refazer-me das emoções vespertinas. Acordei quando o avião partiu, 1:45 depois!!! A habilidade da BA deve ter sido contaminada pelos controladores de vôo brasileiros, sem dúvida. Então, nossa folgadíssima conexão de 4,5 horas fora reduzida a míseros 45 minutos. Na chegada a Londres, fila para cheque de bagagem: a cidade ainda está traumatizada pela descoberta de planos explosão de bombas em vôos ingleses, elaboradas a partir de líqüidos. Todos estavam obrigados a recolher frascos suspeitos, fora o costumeiro tira sapato, tira computador, tira cinto. Passado este obstáculo, tive que ir ao balcão da BA, pois não me haviam fornecido, em SP, o cartão de embarque para Dubai. Tudo bem, parti para o portão 6, como instruía o cartão. Lá chegando, um silêncio, não havia viva alma no portão 6.  O portão certo era o 25 e fui aconselhado: “You have to run, sir!”. O portão 25 era o último do terminal, em uma área separada. E, sabe-se, nestas horas, não aparecem aqueles carrinhos elétricos que dão carona aos idosos e atrasados. Fui o último a embarcar e ainda assim, o pessoal de bordo da BA me pediu desculpas pela confusão. Esses ingleses!
         Dubai é um Emirado, o segundo mais importante da comunidade dos 7 Emirados Árabes Unidos (EAU). Abu Dhabi é o principal e seu Emir é o presidente da EAU e o seu Ruler (como eles gostam de chamar). O Ruler de Dubai, His Highness Sheikh Bin Rashid Mohammed Al Maktoum é o vice-presidente da comunidade. Pelas regras da EAU, criada em 1971, toda a riqueza do petróleo é dividida pelo Emirados, tenham ou não sido abençoados pela natureza, como é o caso de alguns deles. Abu Dhabi tem a maior reserva.
Em Dubai, o Sheik Maktoum pensa longe e, ao invés de torrar o dinheiro como alguns de seus pares, resolveu investir pesado no país. Sua alteza resolveu que ia transformar o pequeno país em um paraíso do turismo. Sabe que a latitude e o clima são atrativos para os europeus, cansados com o miserable weather lá presente na maior parte do ano. Dubai é garantia de tempo bom. A média é de 7 dias de chuva por ano (e nós presenciamos 2 deles). Os europeus, que trabalham pouco, têm suas férias ao sol como sagradas, planejando-as com indecente antecedência. Dubai, com seus 358 dias com o Astro Rei bombando, é opção segura, e cai como uma luva.
Chegando em Dubai, fomos recepcionados na porta do avião por duas filipinas, enviadas pela organização do evento para facilitar nossos caminhos. Pegaram  nossos passaportes e levaram-nos ao controle da alfândega, sem filas para nós. Aeroporto enorme, limpo, moderno, cheio de estruturas em aço inox. Em vários pontos, grandes cartazes dizendo: “Welcome to Tomorrow”. Depois, acompanharam-nos às esteiras, mais de 20!!! Ao chegar à nossa, fiquei espantado ao ver meu nome estampado numa lista de mais ou menos uns 20. Ou seja, nem precisei passar por aquela frustração crescente de ver que as malas passam e sua mala, não; de ver os passageiros, um a um, pegando sua mala e ir embora, até que se fica sozinho, você e a esteira, até que ela pára. Eles já sabiam que minha mala não havia chagado. A BA havia informado: não havia saído de Londres! Fomos, eu e minha filipina particular, ao serviço apropriado, registrei minha queixa e fui aguardar meu transporte. Na espera, mais observação da decoração, e uma surpresa: os relógios de parede, enormes, eram da marca Rolex! Demoramos muito no aeroporto, apesar de todos os caminhos limpos, o transporte demorou a pegar-nos. Nesse meio tempo, aconselhado por meu colega, acionei o seguro que a empresa nos oferece quando viajamos. No caminho para o hotel já deu pra ter uma mostra das luzes da cidade. Não chega a ser uma Las Vegas, mas eles chegam lá! Chegamos ao hotel à 1:30 da manhã.
Tudo fechado até às 10 da manhã, tive que ir à abertura do evento com a mesma roupa que vinha usando há 2 dias, não sem antes dar uma passadinha de ferro básica. Somente na hora do almoço, peguei um táxi e fui ao Shopping mais próximo. Comprei 2 calças, 3 camisas, cuecas, meias e um blaser, afinal, iria fazer uma palestra e tinha que me apresentar condignamente. Felizmente, os preços são bons. De qualquer modo, haveria, decerto,  uma indenização.
Mr. Maktoum pensa alto também. Aproveitando a afluência maciça de gente endinheirada, começou a engendrar planos agressivos. Pretende, por exemplo, que Dubai seja um centro de referência em medicina. Pretende (e vai) atrair os maiores nomes de cada especialidade, incuindo brasileiros para cirurgia plástica, por exemplo. Pretende (e vai)  ser o entreposto comercial e de negócios para o Oriente Médio e toda a Ásia. E o aeroporto, que já é gigantesco e luxuoso, se mostrou insuficiente e já está sendo ampliado para se tornar o maior daquela metade oriental do planeta.
Isto posto, Dubai vem experimentando o maior projeto arquitetônico de que se tem notícia, com um incrível ritmo na construção civil. A quantidade de gruas instaladas no topo dos esdifícios em construção é de impressionar. E não se economiza dinheiro em idéias arquitetônicas ousadas, espalham-se pela cidade gigantescos edifícios ou torres (Burj, como chamam) com design moderno e arrojado, muitos deles com um toque árabe, que dá charme à arquitetura, distinguindo-os da americana, que tem apenas vidro e metal aos roldões. À noite, a iluminação complementa o brilho. Dizem que só da Alemanha, estão lá mais de 5.000 engenheiros. Mania de grandeza instalada no DNA do Senhor das Regras, Mr. OB, está em construção a Burj Dubai, que será o edifício mais alto do mundo. Interessante é que se mantém a altura final da torre sob absoluto segredo de estado, especula-se em algo entre 800 e 900 m (só como referência, nosso Corcovado tem 709 metros). A idéia é fazer do edifício uma mini-cidade, com apartamentos, hospitais, teatros, hospital, e um shopping com 2000 lojas.
A proximidade do deserto não intimida, até ajuda, a criatividade megalômano-arquitetônica dubaísta(?!). Diariamente, toneladas de areia das dunas estão sendo ‘bombeadas’ para o Golfo Pérsico (ou melhor, Arábico, como eles exigem que se chame, daquele lado; aliás, tive esse cuidado na minha apresentação). Motivo: estão construindo ilhas artificiais obedecendo a um determinado arranjo e formato, de forma a se ter uma visão bem definida, quando olhado lá bem do alto. Mais ou menos o que imaginou Niemeyer quando projetou Brasília com a forma de um avião. Tanta areia no deserto, por que não fazer algo de útil, e lucrativo, com ela?! O primeiro projeto, o Palm Jumeirah, é residencial e hoteleiro, tem a forma de uma palmeira e está quase pronto. Outros dois parecidos estão em fase de projeto. O mais impressionante, entretanto, na linha de redesenho da geografia terrestre, é o “The World”, onde se transfere o Mapa-Mundi para o oceano: quase 300 ilhas desenhadas na forma dos cinco continentes + Antártida! O Brasil, por exemplo, com suas dimensões continentais, é representado por 3 ilhas. Uma das ilhas que formam a Europa foi presenteada por Mr. Régua (esta foi triste, sorry!) ao hepta-campeão Michael Schumacher.
Aproveitando o gancho do esporte com a megalomania, temos o Burj Al Arab. O Senhor das Regras dubaianas (?!) se coçava quando ouvia falar daquele hotel na África do Sul, o Sun City, que, de tão luxuoso, recebeu a classificação ‘6 Estrelas’ da Embratur mundial. Aquilo não podia ficar asssim! Para acabar com seus pruridos alérgicos pensou em construir um de 7. Vini Vidi Vinci! Em 1999, ficou pronto o hotel, um edifício em forma de uma gigantesca vela, que merece cada pedaço da sétima estrela, já garantida e estampada no Guia 4 Rodas Internacional (que coisa antiga!). São 200 suítes duplex em 27 andares idem, com áreas que variam de 170 a 780 metros quadrados, cada uma! O lobby tem o maior átrio já feito pela raça humana, mais de 180 metros de altura. Tudo construído com o que há de melhor, em termos de material de construção, do mundo, inclusive granitos brasileiros (está lá escrito!). Metais sanitários são talhados em ouro maciço! Se alguém tinha dúvidas sobre as fábulas das Mil e Uma Noites, é só pagar pra ver. Aliás, a coisa é tão luxuosa que tem que pagar mesmo (e muito!) para entrar e conhecer. Muito justo: a administração quer preservar a privacidade dos humildes hóspedes, evitando uma invasão de centenas de curiosos turistas e suas maravilhosas câmeras digitais sapecando milhares de fotos. Afinal, pagaram de 1.500 a 15.000 dólares de diária por esse direito (fiz questão de colocar o separador de milhar para que não haja dúvida). Continha rápida: quem está na suíte presidencial, está pagando cerca de 10 dólares por minuto, ou seja, em uma concentrada básica no assento sanitário, lá se foram US$ 100! Na baixa temporada, outubro, época do Ramadán, os custos descem em 1/3, grande alívio! Há uma portaria dedicada a cada andar, com direito a mordomo negro com luva branca. Quem paga para entrar, às vezes só pode conhecer a parte social, pois a ocupação é, em boa parte do tempo, de 100%!!! Depois, ainda tem gente que duvida do fenômeno da concentração de riqueza. Ah, a ligação com o esporte mencionada lá em cima: o esbanjamento e a criatividade são tamanhos que o Chefe Supremo convidou Roger Federer e Andre Agassi para bater uma bolinha no imenso heliporto do hotel, uma pequena (!) estrutura em balanço, suspensa a mais de 200 metros de altura, ele próprio uma atração à parte, que foi adaptado para o evento.
Bem, aquela pujança toda não é construída apenas por nativos dubaínos (?!). Aliás, eles são absoluta minoria, 80% é de estrangeiros!!!! Dubai é uma verdadeira Babel, com mais de 200 nacionalidades presentes, legalmente imigrados, entregando seu suor ao crescimento do país que os abriga. As ruas são mantidas limpíssimas por humildes indianos (pelo visto, a maior colônia) e africanos. Chinesas, filipinas, e tailandesas nas recepções. Malaios, paquistaneses e indonésios nos restaurantes. Os indianos (de novo) um pouco mais esclarecidos são motoristas de táxi e vendedores de eletrônicos em supermercados (e os super-esclarecidos estão na Europa e nos EUA...). E não só os países mais subdesenvolvidos estão lá: europeus e americanos estão presentes. E claro, brasileiros, como não poderia deixar de ser. Os dubaienses (?!) fazem questão de usar suas vestimentas típicas até mesmo para se diferenciarem, fica claro quem são os donos daquilo tudo. Os homens, predominantemente em branco, mas com variações coloridas, as mulheres, de negro, mostrando apenas o rosto. Os estranhos são bem recebidos pelos dubaiáticos (?!). Eles têm os mesmos direitos: não pagam impostos. Ouvimos falar de um deles, brasileiro, de alto nível, que está prestando serviço ao Sheik: “Você não imagina como é bom chegar ao final do mês e ter um contra-cheque em que o salário bruto é igual ao líqüido!”.   
         Missão cumprida, palestra proferida, no último dia em Dubai, nossos organizadores conseguiram permissão para que fôssemos visitar o famoso Burj Al Arab, aquela ‘pensão’ que mencionei aí em cima. Claro que a permissão incluía um jantar, regiamente pago. Achamos justo, encaramos a parada e valeu a pena. Poderíamos passar a noite ali, somente admirando cada detalhe da decoração, do luxo. Até frustrei minha programação: havia pensado em assistir de novo a Casino Royale, desta vez sem legenda, para apreciar melhor os diálogos do filme, pois não tem jeito: quando tem legenda, os olhos vão pra lá automaticamente e você acaba perdendo detalhes importantes. O tempo foi passando e acabou não dando tempo de ver a última sessão, às 23:45, no Mall of the Emirates, aliás uma atração à parte: eles fizeram uma pista de esqui, em pleno deserto. Neve mesmo, de verdade, uma rampa enorme, em concreto armado. Só vendo.
Fiquei monitorando todo o tempo o paradeiro de minha querida mala, junto à seguradora e nenhuma novidade. Já desistindo de recuperá-la ainda em Dubai, improvisei o empacotamento do pouco que tinha em uma sacola emprestada por meu colega. Quando estava a fazer o check-out do hotel, eis que ela, a mala, surge, bela, fogosa e intacta. Melhor assim, não vou precisar ficar brigando com a BA para indenização. Ficarei satisfeito com a compensação pelos 5 dias que fiquei sem ela, o que certamente virá! Re-arranjei a bagagem, em uma malinha extra que eu trouxera dobrada, como sempre faço, nunca se sabe! Na espera do vôo fui ver o itinerário da viagem: chegada em Londres às 16:00; partida para São Paulo às 21:10. Hummmm, tem jogo! Decidi repetir em Londres o mesmo esquema de São Paulo. Perguntei a uma BA Madam, que me disse que os lugares mais próximos do aeroporto seriam Hounslow e Kingston. Pesquisei na internet: só este último subúrbio tinha cinema, horário 17:40. Hummmm, vou jogar! E parti. No vôo diurno, dorme-se pouco e aproveitei para escrever o relatório oficial. Quando o avião estava aterrisando, o comandante avisou: fog intenso, temperatura 1 grau Celsius! Lembram-se do que falei sobre miserable weather, não?
Já em terra, demorei um pouco na alfândega, nada que comprometesse o plano de jogo. Bem, táxi nem me passou pela cabeça, pois tem preço proibitivo. Primeira tentativa, metrô. Procurei no mapa, achei Hounslow, mas Kingston, nada. Hummmm, o jogo tá duro! A bilheteira africana me aconselhou ônibus. O ônibus indicado, 285, somente saía do terminal 2. Estava no terminal 4, lá fui eu, ainda com tempo, pelo expresso entre terminais. Na saída do aeroporto, percebi toda a intensidade do anúncio do comandante. Não se via nada a mais de 20 metros de distância, o clima, gélido e o sol, já era: estava tudo escuro, às 5:30! Tudo bem, tudo vale! Só que, ao perguntar onde era o ponto do 285, o guarda contou que o trajeto do 285 até Kingston estava lento devido a acidentes provocados pela baixa visibilidade e sugeriu o 111. Hummmm, o jogo tá difícil! Tudo bem, nesta altura eu já me dava por satisfeito por assistir a um trecho do filme, só pra ter um gostinho. Subi no 111, fui ao motorista e perguntei quanto tempo levava para chegar a Kingston. Ele olhou na tabelinha e, com precisão britânica, sacramentou: 1 hora e 13 minutos! Aquela miserável da BA Madam (that bitch!) havia me sugerido um lugar que estava a mais de uma hora do aeroporto! Perguntei ao preciso motorista se havia outro cinema no caminho, ele disse: “Sim, em Feltham, a 20 minutos daqui, só que não por este ônibus, vou lhe deixar no próximo ponto e você pega o 285(!), que está vindo a 5 minutos atrás de mim”. Hummmm, esse jogo não acaba! Tudo bem! Desci e esperei. O lugar era ermo, um entroncamento de rodovias de acesso, sem uma alma viva, e o nevoeiro bombando, só tinha lá o ponto de ônibus. Conforme previsto pelo informado motorista, lá vinha o 285, cinco minutos depois. Fiz o meu sinal, o 285 veio e ....  o 285 foi. Nem parou (that bastard!)! Estava lotado! Hummmm, perdi o jogo! Só então caiu a ficha de que não estava escrito que eu iria ver Casino Royale sem legendas, pelo menos não naquele dia. Desisti e decidi voltar ao aeroporto. Só que como eu disse, não era um lugar que eu passasse para o outro lado da rua para pegar o ônibus de volta. Comecei a andar a pé pelo que eu achava ser o caminho de volta. Após uns 15 minutos de caminhada sem rumo, vi que aquilo poderia demorar, nem um táxi aparecia, a bexiga começou a apertar (aquele frio apressou as coisas!) e não tive dúvidas, foi ali mesmo, num matinho. Já posso contar a meus netos: “I've pissed in London!”. Caminhei mais um pouco, os dedos já duros, encontrei um posto policial. Ainda bem que não foi ele que me encontrou uns minutos antes, fazendo 'aquilo'. Por trás da cerca eu chamei um officer. Ele veio desconfiado, me iluminando com a lanterna dele e não deve ter entendido nada: um executivo, de paletó, com seu computador, ali no meio do nada, fazendo o quê!  Bem,  ele não quis saber detalhes e me orientou como chegar a um ponto de ônibus no caminho de volta para o aeroporto. Mais 5 minutos, lá estava eu esperando e chega o 285 (ele de novo!), de volta. Claro que era outro e dessa vez ele parou, subi, estava quentinho, aquecido, um alívio! Frustrado e aliviado.
As emoções não pararam por aí. A viagem tinha que terminar com chave de ouro! O último aeroaperto ainda estava por vir. Os caminhos aéreos britânicos (BA) estavam tumultuados. Mais de 250 vôos de curta duração haviam sido cancelados, devido ao nevoeiro. Deixaram partir apenas os vôos de longa duração. A chamada para embarque aconteceu no horário, mas aí, parece Déja Vu: “Embarcado, instalado na poltrona, acabei adormecendo, para refazer-me das emoções vespertinas. Acordei quando o avião partiu, 2:30 depois!” Quem leu este texto com atenção deve ter percebido um leve copy/paste. Só troquei o tempo de sono, e de atraso. Parece brincadeira! Aproveitei o tempo extra de vôo, sem sono, e escrevi o começo deste trecho alternativo. Chegando em SP, pela manhã, claro que a conexão TAM para o Rio se fora. A BA disse que vôo de Guarulhos não havia mais, Congonhas não estava aceitando mais reservas, só tinha como reservar a partir das 8 da noite. Eles me dariam um hotel para eu descansar, almoço, tudo o que eu tinha direito. Se eu quisesse arriscar, entretanto, poderia ir a Congonhas e ficar tentando. Se não desse certo, voltava para Guarulhos e ia pra o Rio às 8 da noite. Ela disse que os prejudicados se dividiram entre as duas opções. Eu fiz umas contas: ir para Congonhas, trânsito complicado, na muvuca da paulicéia desvairada, 4 volumes de bagagem na chegada (mala, malinha, computador, free-shop), risco de esperar lá e ter que voltar, mais trânsito. Baixou o espírito de Angélica e propus uma terceira opção: vou de táxi para o Rio! E aqui estou, já chegando em casa, às 4 da tarde do dia 21, ao mesmo tempo em que termino o texto.
Foram ou não foram tantas emoções?

segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Boleto Para Pasear

Outro dia, destilei meu veneno contra o oportunismo das coletâneas e acabei por elogiar uma delas. Tudo bem que era uma daquelas coisas especiais, muito bem produzidas, uma obra de George Martin (In My Life), em que o ‘quinto beatle’ mostrava a carreira dos outros quatro, nas vozes e interpretações dos mais inesperados artistas.
         E agora, lá venho eu de novo queimar minha língua  ....Ai!
         Bem, na verdade, mais uma vez, é uma produção de George Martin! Aliás, vamos fazer o seguinte: tudo o que eu disse contra coletâneas permanece válido, a não ser que seja criado e produzido pelo genial maestro. Estamos combinados?
         Chega às lojas mais uma coletânea dos The Beatles, chamada Love2006. Tem o mesmo nome, e vem a ser a trilha sonora do mais novo espetáculo do Cirque de Soleil, que estão ‘levando’ em Las Vegas, inspirado na carreira os rapazes de Liverpool.  Estes artistas levam pelo mundo uma proposta diferente de circo, sem animais, com muita música (com letras em uma língua inventada!!!), interpretação, cenários de sonho e movimentos ousados. E não são só um grupo. Estão espalhados nos quatro cantos do planeta encantando multidões, digo, pequenos grupos de privilegiados que têm condições de pagar o caríssimo ingresso, com sua arte. O espetáculo que esteve aqui no Brasil, Saltimbanco, na verdade é o primeiro que seu idealizador, um canadense malabarista de rua (ou seja, há futuro para os nossos garotos!!!) montou em 1984. Com o sucesso do primeiro, ele foi montando outros, cada vez mais criativos e hoje são mais de 10 espetáculos simultâneos sendo levados em 4 continentes, movimentando um império de mais de 1 bilhão de dólares. Como acharam que Saltimbanco já tinha dado o que tinha que dar, abriram uma concessão aos pobres do Hemisfério Sul e vieram acabar a carreira dele aqui.
          A trilha sonora de Love é uma recriação de canções beatle com um quê de diferente. George Martin conhece como ninguém as canções, esteve envolvido em cada uma delas (minto, apenas 95% delas) e percebeu possibilidades de combinações interessantes. Então, você verá em uma faixa, uma música combinada com outra e às vezes com uma terceira, que você nunca imaginou que tivessem algo em comum. Em uma outra, um efeito sonoro utilizado originalmente em uma canção aplicado em outra. Talvez sejam detalhes que só os fãs percebam. Não recomendaria o disco para quem quer começar a apreciar Beatles. Sou partidário de que o melhor mesmo é comprar os discos originais, todos estão em catálogo. E, como todos os álbuns têm mais de 80% de  músicas que agradam, é um ‘good value for the money’.
         As coletâneas beatle tiveram seu auge na década de 70, ainda na era dos LPs, quando o mundo da música estava ainda inconformado com a separação do grupo. Destaco dois  lançamentos temáticos e 2 lançamentos temporais. No primeiro grupo, Love Songs1976 grupava 25 canções românticas (o limite na era dos LP’s era de 40 minutos, no máximo), em álbum duplo, e Rock’n Roll Music1977, um outro duplo com 28 canções de Rock’n Roll (acho que não precisava explicar!). Antes, haviam lançado as coletâneas temporais, dividindo a carreira beatle em 2 períodos: The Beatles 1962-19661973, 26 canções em álbum duplo com a cor vermelha predominante e, na capa, uma repetição da capa do primeiro disco dos Fab Four, Please Please Me1962, uma foto tirada de baixo para cima, na escadaria da EMI Abbey Road Studios, com os rapazes olhando pra baixo, com aquele visual comportado da época; e The Beatles 1967-19701973, 28 canções em álbum duplo com a cor azul predominante e, na capa, uma foto na mesma posição da anterior, no mesmo lugar,  com os rapazes olhando do mesmo jeito, porém com aquele visual rebelde, cabeludo, barbudo, bigodudo, usual da juventude de 1969. A idéia desta última foto não fora, evidentemnte, a de ilustrar um álbum de coletânea, afinal, eles ainda estavam juntos quando tiraram a foto, claro. É que, naquele ano, eles haviam planejado lançar um álbum com o título Get Back, uma volta às origens, com canções gravadas ao vivo, sem muita edição, que eles gravaram no mês de janeiro. A capa do disco seria aquela signifactiva foto, mostrando-os mais velhos, porém tocando como no passado. O projeto acabou não indo pra frente conforme planejado, mas as canções foram lançadas logo após o desmanche do grupo, no álbum Let It Be2000. As duas coloridas coletâneas ficaram popularmente conhecidas como Red Album e Blue Album, em contraposição ao The White Album, como ficou popularmente conhecido o memorável disco The Beatles1968, cuja capa era absolutamente branca, até mesmo o título, que vinha em alto-relevo.
         Na década de 80, em que houve a aparição e popularização dos CDs, o mais notável lançamento foram os 2 álbuns Past Masters #11988 e Past Masters #21988, em que compilam em LP e CD tudo aquilo que havia saído apenas em compactos e em outros lançamentos multi-artistas. Tão importante foi aquele lançamento, que os dois Past Masters foram incorporados ao catálogo oficial da EMI. Nem podem ser considerados como coletâneas, afinal reúnem canções que de outra forma seria impossível de se ter acesso, na era dos CD’s.
Nos anos 90, com os CDs bombando e deixando as simpáticas bolachas de vinil no ostracismo, os 3 Beatles sobreviventes e mais a viúva nipônica resolveram que era hora de faturar de novo. Os lançamentos daqueles anos foram basicamente para oficializar a pirataria! Os Beatles tinham uma legião de fãs, certamente a maior de todos os tempos. Alguns deles, mais ousados, conseguiam gravações pirata (ou seja, não oficiais) de todos os momentos beatle, seja de shows antigos, ao vivo, na TV ou radio, seja de momentos de estúdio. Esta iniciativa gerou uma descomunal indústria pirata (‘bootleg’, como é conhecido o termo em inglês). Os fãs mais ardorosos disputavam a tapa tais gravações, saudosos que estavam dos bons momentos da década de 60. Eu mesmo não era muito chegado, apenas fui comprar meu primeiro pirata em 1990, numa feira de rua de Londres, na Portobello Road, um CD com os legendários Decca Tapes, curioso que estava por entender por que o ‘visionário’ produtor da gravadora Decca não gostou do que ouviu dos rapazes, num teste que fizeram no sagrado feriado de 1º de janeiro de 1962, decretando que “esse grupos que tocam guitarra não têm muito futuro”. Gênio!
         O primeiro lançamento anti-pirataria foi o CD duplo Live at the BBC1994. No começo da carreira, os Beatles utilizavam-se muito do veículo rádio para levar os fãs à loucura. Foram inúmeras aparições ao vivo, entre 1962 e 1964, em variados programas da Brittish Broadcast Corporation, estatal da comunicação inglesa, onde eles cantavam, além dos próprios sucessos, clássicos do Rock’n Roll da época e do final da década de 50. No álbum, 69 faixas (56 canções e 13 falas), com uma qualidade muito superior à dos piratas, cujos espertos produtores eram os únicos a faturar e em cima do sucesso alheio.
         Depois, os 3 Beatles remanescentes dedicaram-se a um grande projeto, uma antológica recompilação na carreira, que gerou discos, filmes e livro, o Projeto Anthology. De música, foram 3 CD’s duplos Anthology 11995, Anthology 21996 e Anthology 31996. Está no nome: antológicos!!! Prometo não utilizar mais o adjetivo! A não ser que seja necessário! Um dos chamativos era o lançamento de duas inéditas gravações, do além, com a voz de Lennon, Free as a Bird e Real Love: canções de John Lennon, gravadas em fita que foram trabalhadas, limpadas, melhoradas e até acrescidas pelos outros 3, produzindo um antoló ... digo, memorável revival do grupo, 25 anos após seu fim. Os fãs sentiram, por momentos, que o grupo se reunía novamente, como tanto haviam sonhado, até os tiros covardes de Mark Chapman. Além disso, os 3 albuns são povoados de momentos de fazer os fanáticos babarem. Nós nos deliciamos ao ouvir as primeiras gravações de grandes sucessos, apenas em voz e violão, ou voz e guitarra, ou voz e piano; nos deleitamos em ouvir os out-takes abortados de canções que amamos; nos revoltamos ao ouvir canções inéditas, da autoria deles, que não viram a luz por absoluta falta de espaço nos discos, ao mesmo tempo agradecendo por ter a oportunidade de conhecê-las; nos divertimos em presenciar o bom humor dos rapazes no estúdio; nos aprazemos em sentir a emoção dos fãs que presenciavam os fantásticos desempenhos do grupo ao vivo, em shows de TV. Os 3 CD’s Duplos, que facilmente chegaram ao topo das paradas americanas, têm um total de 155 faixas (!), incluindo algumas memoráveis falas. Venderam, no total, mais de 50 milhões de cópias, fazendo com que The Beatles se tornassem o grupo que mais faturou na década de 90, ou seja, mais de 25 anos após o desenlace.
         Entretanto, a série Anthology é coisa pra fã! Se você nunca teve em casa nada do grupo, não recomendo as compilações antológicas, pois é recomendável conhecimento prévio para melhor apreciá-las. Como já disse, o ideal é ter a coleção completa: são 15 CDs. Entretanto, se a disponibilidade financeira é apenas para 4 CDs, invista em uma das combinações Red/Blue ou Love/Rock, pois são excelentes resumos, cada um do seu jeito. Agora, se a coisa tá preta e o dinheirinho só dá pra um CD, também tenho a solução. Compre 12001! Sim, 1 é o nome de uma compilação com todos os sucessos que atingiram o nº 1 das paradas americanas ou britânicas, em compactos. Foram 27. Ih! Pensando bem, desconsidere a sugestão dos 4 CDs, afinal, têm número parecido de canções (ah!, o poder da gravação digital)! Bem, o próprio 1 também atingiu o topo das paradas, em todo o mundo e rapidamente, aliás, mais um ‘Book of Guinness Record‘ para o grupo: o disco com vendas mais rápidas de toda a história, com 13,5 milhões de cópias vendidas em um único mês, ao redor do mundo (30 milhões até hoje). Claro que, apesar de já ter toda a obra, adquiri 1 e agradeci muito a decisão: o grande lance é o encarte! Nele, estão, entre outras coisas, as capas do compactos lançadas em vários países (infelizmente não nos brindaram com os lançamentos brasileiros). Muito legal é que, nos países de língua espanhola, eles tinham o estranho hábito de traduzir os títulos das músicas (pra quê!). É im-pa-gá-vel! Em outras línguas, português, francês, até japonês, mantêm-se os nomes originais, no mínimo como referência. Solamente los hermanos los ponen solo en español!!  Bem, vou listar abaixo alguns deles, em ordem crescente de divertimento. Primeiro, os títulos das obras de Los Beatles, en español.

         Leiam e tentem entender do que se trata:


·         Socorro
·         Lluvia
·         Ocho Días A La Semana
·         Sally La Longa
·         No Puedes Hacer Eso
·         No Puede Comprarme Amor
·         Me Siento Bien
·         Todo Lo Que Necesitas Es Amor
·         Es Una Mujer
·         Um Camino Largo Y Sinuoso
·         Si, Esto Es
·         Vuelve 
·         Anochecer De Un Día Agitado
·         Quiero Coger Tu Mano
·         Por Ti, Tristeza
·         Nene, Eres Un Hombre Rico
·         Déjalo Ser
·         Podemos Solucionarlo
·         Vacación De Un Día
·         Novelista

E, para terminar com Chave de Ouro,
     

Boleto Para Pasear


         

Bem, agora, os títulos originais em inglês:


                        Divirtam-se!!!



·         Help
·         Rain
·         Eight Days A Week
·         Long Tall Sally
·         You Can’t Do That
·         Can’t Buy Me Love
·         I Feel Fine
·         All You Need Is Love
·         She’s A Woman
·         The Long And
Winding Road
·         Yes, It Is
·         Get Back 
·         A Hard Day’s Night
·         I Want To Hold Your Hand
·         For You Blue
·         Baby, You’re A Rich Man
·         Let It Be
·         We Can Work It Out
·         Day Tripper
·         Paperback Writer

E, para terminar com Llave de Oro,

                     Ticket To Ride