-

domingo, 7 de fevereiro de 2021

Getting Better, a cada momento

Esta é a  canção do Lado A do álbum Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 19 canções com DR's, desta vez, um pouco diferente.

as demais 18 canções de mesmo Assunto e  Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

4. Getting Better (DtR Girl Song by Paul McCartney)

Paul se abre: 'Estava acostumado a ser um rapaz mau, escondia minha cabeça na areia, você me deu a dica, eu ouvi finalmente, estou fazendo o melhor que eu posso''. 
Eis uma clássica canção Lennon/McCartney. De uma ideia de Paul, uma frase que virara piada interna três anos antes (dita pelo baterista substituto Jimmy Nicol), ele criou a melodia, o refrão otimista e uma ideia para os versos, e aí vem John com as partes mais sombrias. Interpretei como se fosse um homem fazendo uma DR com seu passado, em que era mau com as namoradas, mas que está melhorando ("I'm doing the best that I can"). John admitiu ser dele o 3° verso ("I used to be cruel to my woman, I beat her and kept her apart from the thing that she loved"), e como se arrepende de ter sido assim. Cynthia, sua primeira esposa, entretanto, diz que foi apenas uma vez, ainda namorada, ela deu um gelo nele, e nunca mais ocorreu. As reminiscências sobre professores, Paul diz que vieram dos dois, ("The teachers who taught weren't cool .... feeling me up with 'your' rules"), mas sabedor da fama de bom menino de Paul e de garoto problema ("angry young man") de John, com sua vida de abandono, tenho quase a certeza que partiram deste último. Então, deixo para Paul  apenas a ideia otimista "It's getting better all the time ... since you've been mine"). Mais sobre quem está falando o quê virá na análise musical,  de vozes e instrumentos, mais abaixo.
Agora, eu termino com a análise das rimas, que eu deixei um pouco de lado em análises recentes. Os dois primeiros versos são constituídos de cinco frases, no emparelhamento rimado AABBA, veja,  no 1° verso tem AAA "school-cool-rules" / BB "down-round" e, no 2° verso tem AAA "man-sand-can" / BB "word-heard", todas rimas ricas, exceto "homem" com "areia", que são dois substantivos. Um estribilho segue cada verso "I have to admit it's getting better"), com a rima rica "...all the time" com"...you've been mine". E vem o refrão "It's getting better all the time" sem espaço para rimas. O 3° verso será melhor comentado na parte musical, porque é estonteante, e é também intrigante porque modifica a melodia e é falado em duas frases, cada uma delas seguidinha, e ele não tem qualquer rima!
As sessões de Getting Better foram cheias, de situações. A primeira sessão, por exemplo, estava marcada para as 7 da noite, mas o primeiro Beatle a chegar foi Ringo, às 11, e a coisa começou à 1 da madrugada, os técnicos que esperem os astros chegarem quando quiserem!! Mesmo assim, ensaiaram, e saiu a primeira base, com Paul em guia vocal, e numa pianeta (elétrica), John um baixo distorcido, George na guitarra, Ringo na bateria, e George Martin tocando direto nas cordas do piano. A segunda sessão teve o produtor Geoff Emmerick de volta, para gáudio de todos,  com Ringo colocando mais bateria, pois não ficou feliz com a base, que o engenheiro de plantão gravara na primeira sessão, e teve um cravo de George Martin, e teve um espetacular tambura de George, no Verso 3, absolutamente encaixado e apropriado ao clima sombrio da letra, que fala de homens que batem em mulheres. Tambura é aquele instrumento de cordas indiano, com um bojo enorme, que eu certamente teria, ao menos como decoração, ih, acho que já falei isso, mas repito! Numa sessão posterior, Ringo acrescentou um sensacional atabaque no mesmo verso. Ouça e se arrepie!! No final da noite, assim como na canção anterior, Paul ficou sozinho no estúdio, dedicado a mais uma espetacular linha de baixo, cheia de glissandos decrescentes no riff, muito elegante! E Emmerick ampliou o efeito do som ampliando o eco, usando o banheiro como caixa de ressonância! A mágica terminou às 4 da matina. A terceira sessão veio somente 10 dias depois, e foi um desastre!
Pausa para fofoca! Os vocais seriam a atração da noite, Ringo nem estava presente, mas as harmonias não se encaixavam, tão atípico para os Beatles aquilo era. John estava desfocado, não se sentia bem. George Martin, preocupado, levou-o para tomar um ar fresco no terraço dos estúdios, terceiro andar, e deixou-o lá vendo as estrelas. Ao notarem a ausência do amigo, entretanto, Paul e George ficaram sabendo da ação de Martin. Próxima cena é Paul e George arremetendo em desabalada carreira escadas acima, os roadies Mal Evans e Neil Aspinal logo atrás. Ao chegarem, viram John na beira do parapeito, olhando para as estrelas, quase caindo, agarraram-no e trouxeram-no de volta, são e salvo! Ele estava em plena viagem alucinógena, LSD na mente! Decerto, não fora uma correta decisão deixá-lo lá, Martin ingenuamente não percebera seu estado. Claro que a sessão foi encerrada, Paul levou John até sua casa ali do lado, e embarcou também num ácido, para fazer companhia ao amigo. Grande companheiro! Posteriormente, John contou que tomara o comprimido errado, era pra ser um estimulante para deixá-lo acordado. Fim da fofoca!
Bem, apagada aquela terceira sessão da memória no quesito musical, a quarta e última sessão veio dois dias depois. Ringo gravou seu atabaque, Paul harmonizou uma guitarra espelhando a batida de George, mas em outra nota, e os vocais vieram em todo o seu esplendor!  Coloque então o seu fone de ouvido, e viaje comigo, no bom sentido! Volte tantas vezes for necessário para perceber os detalhes!
Note a abertura com as duas guitarras, uma em FA, outra em SOL (um lindo som dissonante que se ouvirá até o final acompanhando estribilhos e refrões), pa-pa-pa-pa-para-pa-pa-para, e vêm as três vozes Beatle em harmonia "It's getting better all the time", e vem Ringo em batida de marcha, e Paul no seu baixo, glissando, e cantando o verso 1, "I used to get mad in my school" (mas imagine que é o garoto problema John contando), e ouça as vozes de John e George em falsetto contestando "No, I can't complain!(mas imagine que é o bom menino Paul dizendo que não era bem assim), e note a bateria firme e especialmente o chimbal de Ringo, neste verso e nos seguintes; e vem o primeiro refrão, com o otimista Paul "I have to admit it's getting better, it's getting better all the time" e o pessimista John (junto com George, em falsetto) contestando "it can’t get no worse" duas vezes; e vem o verso 2, com Paul naquele linguajar de índio, ou Tarzan, "Me used to be angry young man, Me hiding me head in the sand..." e note ali a chegada das palmas, de todos, e da pianeta, de Paul, e do baixo, de Paul, em uma levada arrojada; e vem mais um refrão igual, e um estribilho com duplo "It's getting better all the time", desta vez seguido por John e George dizendo "Better, Better, Beeeetter" nas duas vezes; e nesse momento, toda a atenção, e controle a emoção para a chegada do tambura, uma viagem zumbida para apimentar a declaração sombria do verso 3, com Paul, John e George em harmonia expressando a confissão de John "I used to be cruel to my woman, I beat her...", acompanhado de palmas e de um perfeito atabaque de Ringo que, aliás, pontua até o final; e mais um refrão e mais dois estribilhos duplos, e um final com os três cantando "Getting so much better all the time" e aquele acorde de guitarra dupla dissonante  pa-pa-pa-pa-para-pa-pa-para.... acompanhado do atabaque seguindo até o infinito. E não se esqueça de tentar perceber ainda, um cravo de George Martin, um baixo distorcido de John, e ainda uma guitarra deste último, que ainda constam da ficha técnica. Ufa! É qualidade demais!!   
Paul fez o favor, em sua carreira solo, de corrigir o pecado de os Beatles nunca mais terem tocado ao vivo, e nos brindar com exibições de Getting Better, em suas excursões de 2002 e 2003, nos EUA, México e Japão, e depois em Moscow e em outras cidades privilegiadas. E eu tive o privilégio de assistir a um dos shows, em Houston, saiba mais aqui, neste LINK. E, para ilustrar, com imagem (ruinzinha) e som (razoável), peguei este vídeo AQUI pra vocês (note a fã animada traduzindo a letra para os surdos).
Para finalizar, eu tenho aqui outra interpretação para o título da canção. A notar pela qualidade, inovação, evolução, revolução, especialmente nos álbuns Rubber Soul, depois  Revolver, e então Sgt. Pepper's, eles próprios, The Beatles estavam sempre...

GETTING BETTER ALL THE TIME 

8 comentários:

  1. Uma das
    Minhas favoritas do disco e do grupo

    ResponderExcluir
  2. Sgt Peppers tem músicas únicas, tão opostas entre si mas q se interligam de uma forma estranha
    Essa faixa é grandiosa..obra prima por excelência!!

    ResponderExcluir
  3. Puxa vida, agora preciso ouvir a música de novo prestando atenção em tudo que foi dito. E veja que já perdi a conta das vezes que escutei o album inteiro...Desde 1967. Gosto muito de ler essa parte de seus textos nos informando de tudo que foi gravado.
    O mais bacana é saber que tudo isso acontecia porque queriam assim. Eles queriam as músicas com tantos detalhes que a enriqueciam. Por isso, para mim, as músicas são dos Beatles principalmente. Muito mais que apenas Lennon/McCartney ou Harrison. Talvez outras bandas fizessem ( e ainda fazem) o mesmo. Mas penso que não...porque ali os quatro se envolviem em tudo. Cada som era bem cuidado e entrava com um propósito.

    Sobre a fofoca acrescento que John tinha tomado o LSD por engano! Tinha confundido com outra coisa. E Paul resolveu tomar tambem, e pela primeira vez com John ( já tinha experimentado uma vez com Tara Browne) para fazer companhia... para entender o que se passsava. Dizem que ficaram horas olhando um para o outro e diziam " I know, I know",.. Paul sentiu que John era algo superior...não lembro o que. Immperador do universo? Algo assim. Se prostou a seus pés...
    Eu pensava que tinha acontecido em Cavendish. Não sabia que tinha sido em Weybridge. Tem certeza que Paul não achou mais fácil levar John para sua casa ali mesmo pertinho?
    Sim...estou achando estranho ele tomar o LSD enquanto dirigia para Weybridge totalmente alucinado. Se ele se preocupou tanto com John não o colocaria em risco poucos minutos depois. E ele mesmo em risco. E ainda voltando em seguida dirigindo. Olha, posso garantir que Paul levou John para Cavendish. E só lá dentro ele tomou a droga. Ha um relato grande disso dizendo que certa hora Paul resolveu ir deitar...Mas não conseguiu dormir, claro. Acho que estava em casa com John. Não posso afirmar mas não faz sentido ele drogado dirigindo para o suburbio e voltando depois. Foram horas juntos viajando no ácido. E isso é fato.

    ResponderExcluir
  4. Valeu pelas informações e pela fofoca!

    ResponderExcluir
  5. Essa música é uma obra Prima, merecia até ser mais longa, jamais seria cansativa. Ficou aí um legado de Jimmy Nicol na Banda.

    ResponderExcluir
  6. Incrível as histórias existentes por trás de cada canção, mesmo as que não fizeram estrondoso sucesso. Não sei se acontece só comigo, mas mesmo me virando bem no Inglês, tenho uma certa dificuldade em entender plenamente algumas letras, sem acompanhá-las escritas umas 3 vezes. Depois disso , fica mais fácil o entendimento. Então , esta dificuldade acaba fazendo com que eu foque mais na melodia do que na letra, até resolver lê-la. Eu nunca tinha tido tal curiosidade em relação a esta música, o que mudou agora com esta análise . Obrigado amigo por mais esta história.
    Forte abraço
    Roberto Bazolli

    ResponderExcluir
  7. Grande análise dessa obra prima! Parabéns Homerix!

    ResponderExcluir