Esta canção é a 3ª canção do Lado B do 1° LP do Álbum Branco
a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK
É uma de 14 canções com Discurso para um Grupo
as demais 13 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK
Atenção, canções com títulos em vermelho
são links que levam a análises sobre elas.
12. Piggies (Group Speech Song by George Harrison)
George revela "Você tem visto os porquinhos rastejando na lama? E para todos os porquinhos, a vida está ficando pior, sempre tendo sujeira para brincarem"
Em sua segunda de quatro canções do Álbum Branco, George dá mais uma mensagem: agora criticando os consumidores ricos (O Grupo), e lembrando the little piggies (os pobres) que chafurdam na lama, com a vida cada vez pior! A canção foi feita cerca de dois anos antes, quando George estava afiado em sua crítica de costumes, vide Taxman arrasando com os homens das finanças. Aqui, é uma magnífica crítica social, com humor satírico da melhor cepa. Em outro trecho da letra, lembra dos 'bigger piggies' com seus colarinhos brancos esgrimando facas e garfos preparando-se para jantar seu próprio bacon. Adotada pela contracultura de imediato. Sua fama acabou prejudicada porque foi também adotada por Charles Manson, como inspiradora de seus crimes, fazer o quê... Pontuada por um magnífico cravo o tempo todo, tem um clima absolutamente barroco! Uma nota adicional sobre a inspiração: se alguém tinha dúvida de que seu xará Owell, conterrâneo de Império, teve parte, por conta da utilização de porcos como gente, como o escritor fez em A Revolução dos Bichos (Animal Farm), a dúvida evanesce quando se tem acesso a uma parte da letra original, que dizia: "Paying piggy thanks – to thee Pig Brother!". Captou? Trocando o P por um B, a coisa vira Big Brother, justamente o ser controlador de 1984, outra obra-prima de George Orwell.
Letra riquíssima, simétrica, com dois versos, uma ponte central, e mais dois versos, sendo um instrumental, onde o astro principal é o cravo citado, e tendo os 3 versos letras distintas. E perceba o 'crescendo' do clima. No primeiro verso, apresentam-se os pobres, os little piggies, chafurdando na lama, com a vida indo de mal a pior; no segundo, os ricos, bigger piggies, limpando a poeira de suas camisas brancas; nos dois versos, a palavra central é "dirt" (poeira), rimando aqui e lá com "shirt" e "worse", respectivamente. A ponte vem a seguir, e segue falando deles, os porcões, que não estão nem aí para os que vem de baixo ("They don't care what goes on around"), têm um olhar vazio e precisam é de uma boa palmada ("In their eyes there's something lacking. What they need's a damn good whacking"), sendo que essa citação veio, segundo George, de sua velha mãe, Elsie, apropriadamente. No verso final, após o monumental cravo, ele continua a espezinhar as classes mais abastadas vivendo vidas de porcos chiques, se locupletando em lautos jantares ("piggy lives... out for dinner... piggy wives ...clutching forks and knives"), onde comem o seu bacon, sendo esta uma citação de John, segundo as más línguas. Brilhante, não somente este final, mas a totalidade da letra!
A canção foi apresentada por George aos demais Beatles em sua própria casa de Esher, em fins de maio, onde se juntaram para organizar os trabalhos do novo álbum. A estrutura da canção já estava pronta, não sua letra definitiva, mas já estava o verso instrumental que, na demo gravada lá, foi assobiada pelo autor (ouvir link no final). Mais de três meses se passaram, até os porcos entrarem no Estúdio 2 de Abbey Road, num 19 de setembro, e então foram 10 takes gravados em quatro faixas, com George ao violão, Paul no baixo, Ringo no bumbo e pandeiro, e George num guia vocal. Sem John, ainda! A ressaltar a alternância de notas de baixo e pandeiro, bem audível no Verso 1, antes de entrar o arranjo de cordas. Quando deram uma parada, surgiu o cravo, que estava 'por ali', no Estúdio 1, para uma outra sessão. O produtor Chris Thomas deu a ideia de tocar o cravo em Piggies, George adorou, mas, em vez de trazerem o cravo, o que era inviável, mudaram-se todos do estúdio 2 para o Estúdio 1 (lembraram-se da fábula de Maomé e a Montanha?), e lá fizeram o famoso Take 11, com Chris tocando magistralmente o cravo por sobre a faixa vocal de George, inclusive o estupendo solo instrumental do terceiro verso. Toque de classe na canção! Aqui, fica patente mais um Fator Crítico de Sucesso dos Beatles: a qualidade dos técnicos da EMI. Mesmo com George Martin, o grande maestro, ausente, aparece um jovem engenheiro em seu lugar, que dá esse show na canção. Tanto que resolvi ilustrar esta análise com uma foto dele, da época, quando tinha 21 anos. Já falei dele aqui, ele era o cara do mellotron em
TCS of Bungallow Bill. Além de Beatles, ele trabalhou com muita gente boa, Pink Floyd, Procol Harum, Elton John, Paul McCartney, Pete Townshend, Pretenders, Sex Pistols.
No dia seguinte, vieram os overdubs, por sobre o Take 12, uma fita de 8 faixas, com quatro delas ocupadas com o conteúdo do Take 11. George fez o seu vocal principal, em três estilos: (i) nos dois primeiros versos, parecia um menestrel medieval, dobrando em "to play around in", (ii) na ponte, com um efeito especial, fazendo com que sua voz parece saindo de um alto falante, anasalada, efeito que foi conseguido pelo engenheiro Ken Townsend (outro astro do time da EMI), note que George dobra o vocal em "damn good whacking" e (iii) no último verso, em coro, com Paul e John harmonizando, com o último fazendo uma voz duas oitavas abaixo, ótimo efeito! John também foi o responsável por colocar os grunhidos dos porcos. Ele estava animado com a técnica, por causa das suas maluquices em Revolution 9, e se encarregou de fazer a gravação. Finalmente, 10 dias depois, já com George Martin de volta, oito músicos (quatro violinos, duas violas e dois violoncelos) gravaram seu magnífico arranjo, ocupando as últimas duas faixas da fita, entrando no Verso 2 duas notas longas por compasso, e dou um destaque para os violoncelos em staccato na ponte, harmonizando com o cravo no verso instrumental, e de volta ao normal no último verso e, claro, no grand finale, após o "One more time!". Simplesmente impecável!
George Harrison passou mais de 20 anos sem tocar qualquer coisa que havia lançado como Beatle após o Concerto para Bangladesh em 1971. Mas na excursão que fez ao Japão em 1992, ele tocou várias, entre elas estava Piggies. E ele introduziu algumas letras novas, mas respeitou os arranjos, claro que os instrumentos de orquestra foram sampleados. Mas ficou ótimo. Então vo Vejam aqui, neste LINK. Mesmo tendo esse auxílio luxuoso do próprio compositor, não poderia deixar de mostrar o desempenho dos Analogues. Então, eu vou mostrar Piggies em três momentos e um bônus!
- Como Piggies era, na primeira DEMO de Esher, aqui neste LINK..
- Como Piggies ficou, reproduzido fielmente por The Analogues, neste LINK..
- Como George a tocou, em 1992, neste LINK. Note o verso adicional com a letra do Pig Brother!!
Bônus!!
Olha que legal! Meu amigo Beto Neves da banda Beatles Again de Araraquara mandou isso aqui! O cara é um craque!!! É um médico que toca Beatles nas horas vagas.... ou seria o contrário?
- Homerix, Boa história de Piggies. Recentemente fiz essa música no estúdio tocando todos os instrumentos (baixo, percussão, Vozes, e cravo e cello + violas no sintetizador)
Eu pedi, ele mandou, eu achei maravilhoso e publico aqui!
Curtam neste LINK
Muito bom saber que George não era insensível às grandes diferenças sociais que via à sua volta. Comparando os pobres a porquinhos (_piggies_) chafurdando na lama, George arrasa na canção sensação do álbum branco.
ResponderExcluirAdmirável texto, como sempre, Homerix. Meus parabéns, abraços!
ResponderExcluirEu sei que a música era uma crítica social mas tenho pavor de porco
ResponderExcluirAnimal diabólico...
A música é ótima mas evito ouvi lá por receio ou o título..
´grandiosa, para dizer o mínimo. Triste lembrar que aquele que não digo o nome entendeu que era um pedido para sair matando ricos. Eu tenho uma teoria. Na verdade, tenho diversas teorias sobre os Beatles que nem me atrevo a dizer porque podem pensar que estou falando seriamente. E não estou. Sao minhas fantasias beatlenianas.
ResponderExcluirEu vejo George livido ao saber que escreveram o título de sua canção na pareda da casa onde ocorreram os assassinatos com o sangue das vítimas. Eu vejo George cabisbaixo pensando algo assim. "A mania agora foi longe demais." Ele de fato disse algo parecido sobre a mania. Loucos usando a mania ( ele não falava Beatlemania, só mania) parfa fazerem todo tido de loucura. Então o que penso a seguir? Geore achando que era hora de parar. EStavam levando para outro lado. Hora da separação. Este teria sido o principal motivo para ele aceitar a separação. Claro que não adiantaria porque vemos a "mania" saudável até os dias atuais. E ele não ficou à salvo dos loucos de plantão tendo sido esfaqueado após a separação. Apenas tenho essa sensação que aquele triste episódio deu medo, deu preocupação, deu tristeza. Bom saber que anos depois ela a tocou ao vivo, indicando ter conseguido se libertar daquele horror. Se é que o que imagino tenha alguma ponta de verdade.
Mick Jagger teria sentido algo assim com Sympathy for the Devil após a violencia de Altamont.
Obrigada pelos links e pela foto de Chris. O cara merece o reconhecimento.