-

domingo, 30 de maio de 2021

The Long and Winding Road, triste estrada

 Esta canção é a 3ª do Lado B do LP Let It Be, o último lançado pelos Beatles

a história do álbum, cenário, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 8 canções sobre Saudade, na Classe Tristeza

                                        as demais 7 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

10. The Long and Winding Road (Sadness Miss Song by Paul McCartney)

Paul suplica: 'Na noite selvagem e tempestuosa que a chuva lavou deixou uma piscina de lágrimas chorando pelo dia. Por que me deixar aqui sozinho? Mostre-me o caminho' 

Linda balada, que teve múltiplas versões, só com banda ou orquestrada. Incrivelmente, o plano de Paul era dá-la para Tom Jones lançar, mas ele não pôde aceitar. Ela foi o 20° e último compacto dos Beatles a atingir o N°1 nas paradas americanas, em junho de 1970, já após o fim da banda! 
 
Com estas breves linhas, eu resumi a história dessa canção no alvorecer de minha saga, quando listei as canções tristes, de saudades, que os Beatles embarcaram em sua carreira, como eu disse acima, em oito oportunidades. Chegada a hora de dar um pouca mais de detalhes dessa obra como parte do LP Let It Be, uma boa coisa neste caso, é começar pelo começo, porque a primeira vez que o mundo externo ao mundo particular de Paul McCartney ouviu os primeiros acordes desse monumento foi muito especial. Numa sexta-feira de setembro de 1968, os Beatles terminavam um belo dia de gravações, quando depuraram Piggies de George Harrison, o assistente de Paul, Alistair Taylor, começou a dar boa noite a todos e procurou seu 'chefe' para o efeito, saiu perambulando pelos diversos locais dos estúdios, e quando adentrou ao enorme Estúdio 1, viu uma luz ao fundo, iluminando apenas o piano de cauda, começou a ouvir uns sons, e uma voz que identificou como a de Paul, foi chegando, e ficando encantado, e quando parou já próximo, emocionado por haver testemunhado um momento histórico, disse: 'Paul, que linda canção!' e mencionou que a esposa dele iria adorar. Em seguida, Paul perguntou ao único técnico que sobrou se tinha alguma fita sobrando, pediu pra rodar e fez  primeiro registro da canção, ainda com somente um verso 'The long and winding road that leads to your door will never disappear, I've seen that road before. It always leads me here, lead me to your door', e meia ponte 'many times I've been alone, and many times i've cried', lá nos acordes e tom já definitivos. Dia seguinte, à tarde, Paul foi ao escritório, lá estava Taylor e recebeu do 'chefe' um disco de acetato, ouvindo: 'Leve pra Leslie!' (a esposa dele), aí tirou do bolso um rolo de fita, pegou uma tesoura, desenrolou a fita e a picou, em mil pedacinhos, ao final falou: 'Esse acetato que te dei é a única mostra desta canção na face da Terra'. Paul sabia do valor daquilo. Só que... você, amigo, ouviu aquele som alguma vez? Nem eu, nem ninguém, nunca mais ninguém achou aquela preciosidade, Taylor já morreu, ninguém sabe, ninguém viu, ou melhor, ouviu... Ah, como eu queria ter vivido aquilo, ter incorporado em alguns daqueles técnicos que testemunharam tantos momentos incríveis de criação, naquele assoalho de tacos onde já me ajoelhei e beijei, em 2005. Ao menos se aquele menino, de 6 a 12 anos de idade do outro lado do Atlântico tivesse a capacidade de dupla visão, poderia fazer algumas visitas... Mas chega de reminiscências. 
 
Paul não desenvolveu mais a canção àquela época, então ela não foi considerada para o Álbum Branco, mas chegou a hora dela no Projeto Get Back, em janeiro de 1969, ainda que não se encaixasse no perfil do que se esperava para ele, mais próximo de rock e folk, tanto que a maioria das vezes em que ele a tocou, o fez sozinho ao piano, com eventuais participações de um ou outro companheiro, e a primeira vez que todos participaram, foi já próximo do final, no dia 26, com John no baixo, porque ele estava ao piano, George na guitarra, Ringo na bateria, e Billy Preston no órgão, já agregado ao grupo após o retorno de George de seu exílio voluntário de 10 dias. Àquela altura, os outros versos e a metade final da chorosa ponte ('Anyway you'll never know the many ways I've tried) já estavam prontos, o Verso 2 já traduzido no caput, e o Verso 3, que vem após a ponte e é repetido no final, após uma ponte instrumental, sendo uma corruptela do Verso 1, inclusive colocando o título da canção em outra posição (na linha 2 ao invés de abrir o verso), coisa que só grande letrista consegue, e que termina com mais um apelo 'You left me standing here a long long time ago. Don't keep me waiting here! Lead me to your door'). 
 
Poxa, brincando, brincando, acabei reproduzindo quase a totalidade da linda e rica letra, com muitas rimas idem way-day-away, tears-here, door-before. Bem, foram 16 ensaios nesse primeiro dia de fato, e o destaque foi a luta de John para acertar o baixo, como se sabe, que não é seu instrumento de origem. Paul o orientava na busca do baixo perfeito. O take final do dia ficou quase perfeito, ouça neste LINK, note o trabalho sutil da banda, especialmente o chimbal de Ringo, de levinho, acompanhando toda a canção, as entradas de George na guitarra distorcida preenchendo eventualmente um que outro espaço entre letras, e de vez em quando o órgão de Billy. Olha, se o John errou algo, e consta que errou uma ou outra nota, não percebi. A versão foi usada tanto na tentativa inicial de fazer LP Get Back ainda em 1969 por Glyn Johns, como quando Phil Spector pegou a missão em 1970. Nos dias 27 e 28 de janeiro, outras sete vezes foi ensaiada a canção, porém nenhuma melhor que a versão do dia 26. No último dia do Projeto, dia 31, retornaram ao estúdio para filmar 3 canções para aparecerem no filme Let It Be, sendo nossa linda balada tentada 19 vezes, em meio a falhas de todos pelo meio do caminho, inclusive nesta última, quando quem falhou foi o próprio autor, cantando letras levemente diferentes. Só que já estavam cansados, ainda teriam que filmar a canção Let It Be, e aceitaram a versão. Só quem viu o filme, percebeu, e também após 2003, quando finalmente saiu em disco, no Let It Be Naked. Hoje, o vídeo está disponível, e eu mostro aqui, neste LINK. Note a delicadeza de Paul ao piano, sempre olhando para a câmera, os dois guitarristas sentados, John prestando uma atenção enorme ao baixo que estava tocando, Yoko ali ao lado, quietinha, Billy no teclado, especialmente na ponte instrumental, mas perceba um concentrado Ringo, sentindo a canção e quase que permanentemente acionando o chimbal com o pé.
 
O banho de orquestra de Phil Spector veio no dia 1º de abril de 1970, desta vez ele criou sua Wall of Sound colocando a versão lá de 26 de janeiro de 1969 nos Canais 1 a 5, todas as cordas (27 músicos, incluindo uma harpa) no Canal 6, os metais (8 músicos) e uma nova bateria de Ringo (único Beatle presente) no Canal 7 e o Coral (14 cantores) no Canal 8 do gravador de 8 faixas. Paul foi o único Beatle que não gostou da orquestração, preferia a versão básica, como ficou Let It Be. Porém, junto-me aos outros 3 Beatles e, decerto, à grande maioria dos ouvintes: a orquestra e coral ficaram excelentes, encaixaram perfeitamente! Ouça aqui, no terceiro LINK deste post, verdadeira overdose de 'longuenduaindinroud' pra vocês, metais e cordas entrando firme logo no segundo compasso, em quatro chamadas (pa-pa pa-pa), depois levemente acompanhando o vocal do primeiro verso, com o coral entrando após 'that road before'. No Verso 2, o arranjo já aparece mais, e tem aquelas quatro notas descendentes famosas dos metais depois que a chuva lava o caminho. Pra mim, o mais arrepiante acontece na ponte que vem em seguida, com aquelas quatro espirais crescentes sucessivas das cordas nos quatro primeiros compassos, e tudo subindo uma oitava nos quatro últimos, o coral acompanhando no agudo ao longo dos sete primeiros compassos e entrando em transe épico no oitavo. No Verso 3, o arranjo muda um pouquinho e depois repete-se a ponte, e agora, sem a voz de Paul, percebe-se melhor a grandeza do arranjo. Na repetição do Verso 3, tudo cresce, e arrepie-se com a harpa ao final, ao longo do yeah yeah yeah yeah de Paul. 
 
Paul rejeitou tanto a versão que impediu o lançamento do single com ela! Felizmente, não impediu o lançamento nos Estados Unidos, ladeada com For You Blue, de George, no Lado B, onde ficou duas semanas no topo da parada, constituindo-se na 20ª ocorrência do binômio Beatles Single / Topo da Parada Americana, um recorde! Foi lançada em várias coletâneas, das mais conhecidas, como o Blue Album a outras menos conhecidas, como o Reel Album, que eu nem conhecia, coletando as principais canções dos filmes dos Beatles. Achei tão interessante a ideia que montei a imagem abaixo para ilustrar este post, o track list da coletânea, que vendeu mais de 500 mil cópias... tudo gerava dinheiro para os Beatles!

 


 

2 comentários:

  1. Maravilhoso!! Indivisível!! Paul no auge da criatividade, só não digo que estava no auge de sua performance vocal pois o mesmo sempre esteve impecável no quesito. A melhor música do Let It Be,me arrisco a dizer que está entre as 5 melhores dos Beatles!! Ótima análise, as always, dear!!

    ResponderExcluir
  2. Uma canção que equilibra com extrema leveza e suavidade o tormento angustiante de um coração partido, proporcionando um verdadeiro presente ao mundo naqueles finais de tempos Beatles. Como todas as canções daqueles gênios ainda é atual e ao meu ver será eterna.

    ResponderExcluir