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segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Beatles For Sale For Me For You For Ever

                                                                                                                  Capítulo 39 

Esta é minha saga  

O Universo das Canções dos Beatles


Todos os Capítulos têm acesso neste LINK 

O ano de 1964 vinha sendo ainda mais fenomenal que 1963, quando surgiu a Beatlemania. Os Beatles conquistaram a América em fevereiro, em março viraram atores de um filme de sucesso mundial, gravaram seu terceiro LP, todo com canções próprias, e fizeram uma turnê Mundial, chegando à Austrália e Nova Zelândia, e até deu tempo de tirarem férias, de 30 dias, como todo bom trabalhador! 

O segundo semestre começou frenético como terminou o primeiro, com excursão pelo Reino Unido e Suécia,  e logo voltaram ao estúdio já com vistas ao lançamento do  LP, que seria chamado "Beatles For Sale", objeto do presente capítulo! O nome decerto tinha a ver com o extraordinário sucesso de vendas, de tudo em que metiam a mão: música, cinema, merchandising. Eles estavam, efetivamente,  'A Venda'.

Após as duas primeiras sessões, logo partiram para a primeira grande excursão pelos Estados Unidos e Canadá, de 32 dias. Na volta, mais seis sessões, nos intervalos entre programas de Rádio e TV, e em meio a mais uma excursão pelas ilhas britânicas! Com esse ritmo todo, ficou difícil repetirem o feito de "A Hard Day's Night", e produziram 'apenas' 10 novas canções, todas Lennon/McCartney, sendo oito delas lançadas no LP, e duas em compacto, ambos lançamentos de grande sucesso, indo ao topo das paradas! 

As outras seis canções de "Beatles For Sale" novamente foram tiradas da extensa lista de covers a que estavam acostumados a tocar nos palcos de Liverpool e Hamburgo. Desta vez, entretanto, vieram com pesos pesados do Rock, como Chuck Berry, Carl Perkins, Little Richards e Buddy Holly, seus favoritos.

Nota-se, no estilo das novas canções da dupla, uma maior tendência a assuntos menos pueris, uma mudança decerto influenciada pelo encontro que tiveram com Bob Dylan, em agosto, por quem tinham grande admiração! Em contrapartida, aquele encontro também marcou o bardo americano, que reconheceu que os Beatles haviam mudado o cenário da música, e a partir de então, passou a cantar mais mensagens para a juventude, e a ter uma banda de rock pra chamar de sua, The Band, que também teve uma história própria respeitada. Bob Dylan também apresentou aos Beatles uma outra coisa, que teve alguma influência, eu diria, sobre o processo de criação de canções, e sobre a qual falarei daqui a dois capítulos! 

Musicalmente, o estilo foi bastante orientado pelo country/folk americano. Naquelas sessões de gravação, George Martin começou a perceber que podia dar asas aos rapazes, que já se mostravam mais acostumados ao estúdio, e iniciavam a palpitar mais sobre os arranjos, e a arriscar mais instrumentos, e a dar idéias nas mixagens, e tal, ou seja, começou a valer aquela política de que  "se eles pensaram nisso, deve ter algum valor, mesmo que a princípio pareça estranho". Em outras palavras, o maestro captou o toque de Midas dos Beatles!

Finalmente, vamos às canções do LP! 

Detalhes sobre essas canções mais abaixo. 
As covers em vermelho...
  1. No Reply
  2. I´m a Loser
  3. Baby´s in Black
  4. Rock and Roll Music
  5. I´ll Follow the Sun
  6. Mr. Moonlight
  7. Kansas City/Hey, Hey, Hey, Hey
  8. Eight Days a Week
  9. Words of Love
  10. Honey Don´t
  11. Every Little Thing
  12. I Don´t Want to Spoil the Party
  13. What You´re Doing
  14. Everybody´s Trying to Be My Baby


Agora vamos aos assuntos das originais!

Em termos de divisão John / Paul, há um equilíbrio total, sendo quatro de cada um. 

Antes das canções, eis o nosso já tradicional quadro de Grupos, Assuntos e Classes. Vejam que este álbum também tem uma Mind Song. As demais sete autorais são do Grupo Heart Songs.

Percebam a tabela abaixo. 


Mais detalhes sobre a divisão entre Heart & Mind Song, aqui, neste LINK

Traduzindo
  • São 7 canções que falam ao Coração e uma à Mente
  • São 4 canções no Assunto Garotas e 3 no Assunto Saudadee
  • Das 4 Girl Songs, 2 são de Amor, e duas de DR
  • As Miss Songs relatam Desespero, Retorno e Triseza
Beatles For Sale é, portanto, um 

88% Heart, 50% Girl, 50% Love & DtR Album!

Na tabela abaixo, as evidências, nas letras, do porquê da classificação acima!





Vamos à análise das canções de autoria dos Beatles!!

A estrutura é sempre
  1. Número de ordem da canção no álbum
  2. Nome da canção
  3. Assunto e Classe da canção (com LINK para outras da mesma Classe)
  4. Autor da canção

LADO A

 1. No Reply  (Return Miss Song by John Lennon)

John grita: 'Quase morri, quase morri, porque você andava de mãos dadas com outro homem no meu lugar. Se eu fosse você, eu perceberia que eu amo você mais do que qualquer outro cara'
John d
enota também desespero com a garota evitando encontrá-lo, mas como ele tenta convencê-la a voltar ("and I'll forgive the lies"), deixei como Return Song. A menina não atende o telefone, os pais dizem que ela não está, mas ele sabe que é mentira, pois viu a silhueta dela na janela. Pobre rapaz! E diz que quase morreu quando a viu caminhando de mãos dadas com outro. Sacanagem!  
 
Simplesmente amo essa canção, o conjunto da obra, letra, música, clima! Apesar de ter uma estrutura relativamente simples, de verso-verso-ponte-verso, quase padrão dos Beatles daquela época, a qualidade dos ritmos e a dramaticidade da letra elevam-na a um alto estágio! Tão bom que a colocaram para abrir o álbum, mesmo não sendo aquele rock do bom que abriu os primeiros três LPs deles. Acho geniais as mudanças de ritmo, começando com uma espécie de bossa nova, depois dá uma quebra nos gritos 'I saw the light', 'I nearly died', 'No reply', notáveis as batidas sincopadas de Ringo nos pratos também ali, depois volta a bossa nova, e, na ponte, a tensão vai ao máximo, 'If I were you...', com uma batida firme de rock, mais o piano de George Martin, tudo temperado por magníficas palmas, quatro por compasso, inesquecíveis. Uma canção só de violões, e um baixo sem muito floreio, mas com um vocal rouco de John fenomenal, e Paul nas harmonias agudas, nos gritos e em toda a ponte. Aliás, notem que a canção é de John, basicamente, mas é Paul quem canta a melodia principal na ponte, lá no alto, pois o próprio autor não conseguia! Chamou o parceiro para fazê-lo!!! Uma pena que nunca tenham-na tocado ao vivo!! O público certamente teria vindo abaixo na ponte, batendo aquelas palmas 64 vezes! E chorando, junto com o pobre protagonista.
 
No Reply nasceu com John, durante suas férias no Tahiti (com Cynthia e com George e Pattie, sua nova namorada) em maio de 1964, após as filmagens de seu primeiro filme. Na volta, Paul contribuiu, provavelmente com a ponte. Ela poderia ter entrado já em A Hard Day's Night, mas John não gostou do resultado da primeira sessão, em 3 de junho, até porque Ringo não estava presente, internado que fora para operar suas amídalas. Nem Ringo, nem Jimmy Nicol, que havia sido chamado às pressas para substituí-lo na excursão mundial que fariam, e esteve no estúdio para ensaiar, mas quando a canção nova foi ensaiada, já de noite, ele já havia ido se preparar para a viagem, e não há registro de quem assumiu a bateria. O resultado daquele verdadeiro improviso pode ser ouvido no Projeto Anthology, neste LINK, note que ainda não havia aquela riqueza da variação de ritmos, e que ele 'esquece' (forget) em vez de 'perdoar' (forgive), como na letra definitiva, as mentiras que ele ouviu. John instruiu Brian Epstein, o empresário dos Beatles, a oferecê-la para outro cantor, um certo Tommy Quickly que, entretanto, não a gravou! Ela voltou ao estúdio no final de setembro. Na noite do dia 30, cinco takes foram executados, com todos tocando e cantando ao vivo, inclusive George Martin ao piano. Percebendo o poder da ponte, chegaram a repeti-la e o verso final, mas acabaram desistindo. Por sobre aquele Take 5, John e Paul dobraram seus vocais, e estava pronta a canção!! Ouçam como ficou, neste LINK. 
 
No Reply foi lançada em compactos em alguns países do mundo, ou ladeada por Eight Days a Week ou por Rock and Roll Music ou ainda Baby's in Black. A primazia de abrir um álbum Beatle foi ignorada pela Odeon no Brasil, onde foi lançado um LP chamado Beatles 65, com apenas 12 canções, sofríamos aqui....

 

2. I'm A Loser  (Help Self Song by John Lennon)

John grita: 'O que eu fiz para merecer esse destino? Eu percebi que deixei isso muito tarde. E é verdade, o orgulho sempre ca uma queda. Estou te dizendo isso para você abrir o olho. Sou um perdedor, e eu perdi alguém que estava perto de mim, sou um perdedor, e eu não sou o que pareço ser!'  
Em que pese esse desespero todo ser porque ele perdeu uma menina, centrei-me na dúvida interna do autor, se está chorando não por ela, mas por ele (Is it for her or myself that I cry?), punindo-se por ser tão orgulhoso! É uma autoanálise, então, é uma Self Song, ele pede ajuda aos amigos para ele melhore. Paul a considera parte de uma tríade de 'cry for help songs' de John, junto com a própria HELP!, que viria no disco seguinte, e Nowhere Man (de "Rubber Soul", que  por ser falada na terceira pessoa, eu a classifiquei como Story Song)as três escritas no período de um ano. Pelo uso inaugural da palavra clown, eu acrescentaria nessa lista You've Got To Hide Your Love AwayPontos notáveis, o vocal impressionante de John, especialmente atingindo seus mais baixos tons seis vezes durante a canção, e em seis palavras diferentes nos três versos, sim, segue-se a política de não repetirem letras. 
 
Falando em versos, lembrei de falar da estrutura da canção: depois de algum tempo, John volta a usar o refrão como peça, justamente onde ele grita o título da obra. É uma alternância entre verso e refrão, com o acréscimo de um verso instrumental no meio e outro ao final, quando John entoa sua magnífica gaita seguido de George em sua guitarra. Além daquela dúvida transcendental sobre por quem ele chora, o melodrama está firme com suas lágrimas correndo como chuva do céu, o lamento da perda daquela garota ideal, única em um milhão, culminando com uma autocomiseração em: "O que eu fiz para merecer isto?", Oh vida, oh azar! Ela veio à luz em apenas uma hora, da noite do dia 14 de agosto de 1964, a 2ª sessão de gravação para o álbum Beatles For Sale. Foram 8 takes, com todos tocando e cantando ao vivo e variações no arranjo até se sentirem com a base pronta para os overdubs, de Ringo no pandeiro, de George na guitarra preenchendo alguns espaços vazios dos versos, e as dobras dos vocais de John e Paul!  
 
O baixo de Paul não precisou ser melhorado, é magnífico, o pandeiro de Ringo no refrão, fundamental no volume da mensagem, e a guitarra de George A LA Carl Perkins, marcante. I'm A Loser foi uma favorita dos shows, com John e Paul dividindo o microfone no 'Looooser' e levantando a galera no refrão. Muito simpática tam  bém era a gaita que John, A LA Bob Dylan, tocava-a acoplada ao violão. A canção tinha força pra ser lançada em um compacto, e seria, se o mesmo John não aparecesse dias depois com nada menos que I Feel Fine, gente, fico até emocionado! Naquele ano, John seguia realmente dominante na dupla, né Virgínia? 
 
Ela foi tocada ao vivo ainda antes de lançada, gravada em Londres para um programa da TV americana (ver neste LINK), ainda em outubro, apesar de não ser totalmente 'ao vivo' assim como as primeiras após o lançamento, em programas de TV ingleses, onde dublavam a própria gravação, Ao vivo mesmo, só na  temporada de Natal e Ano Novo em Londres, quando apareceu em 38 shows, e seguiu sendo tocada em 1965, até 3 de junho, última vez em que apareceu.


3. Baby's In Black  (Dispair Miss Song by John Lennon)

John clama: 'Eu penso nela mas ela só pensa nele e apesar de ser só um impulso, ela pensa nele. Ah, quanto tempo vai levar pra ela perceber o erro que cometeu?'  
John não se conforma que sua garota está vestindo preto, porque ele sabe que assim, ela está pensando no antigo namorado... ô sina! Ok, a canção é daquelas tipo fifty/fifty entre John e Paul, mas eu a atribuo a John, primeiro por causa do jogo de palavras logo no refrão inicial "Oh, dear, what can I do? Baby's in BLACK when I'm feeling BLUE', duas cores, porém com significados figurados, vocês devem se lembrar de "Please PLEASE Me like I PLEASE you", e "It won't BE LONG till I BE LONG to you", uma recorrência de John.  
 
Astrid e Stuart
Além disso, havia uma suspeita de que a garota em questão fosse Astrid Kircherr, a fotógrafa alemã, namorada de Stuart Sutcliffe, ex-companheiro de banda que morreu em Hamburgo, de aneurisma cerebral. Então, o "dressed in black" era pelo luto, e John tinha uma quedinha por ela, "but she was allways in black, thinking of him!". Seu ritmo é uma novidade, deliberadamente uma valsa - Pum pa pa Pum pa pa. A principal contribuição de Paul seria na ponte, que eleva a tensão do lamento lá no alto ("Oh how long will it take till she sees the mistake she has made?") e, claro, na constante harmonia alta com o grave de John ao longo de toda a canção! Uma coisa interessante é essa sílaba final da ponte (madejá é a 1ª sílaba do verso que vem a seguir, no lugar 'oh' da letra original. Belo recurso!
 
Baby's In Black foi a primeira canção gravada para o "Beatles For Sale" ainda em agosto, dia 11, antes mesmo da excursão aos Estados Unidos. Foram necessários 14 takes, durante três horas noturnas!!! Apenas cinco deles foram completos. Era John no violão, Pauk na guitarra baixo, George na guitarra solo, e Ringo na bateria. John e Paul cantam juntos a canção toda e por vezes se fica em dúvida de qual é a melodia principal da canção. A maior dificuldade foi a de George acertar o breve riff inicial de dois compassos, que fez 5 takes abortarem logo no início. Ele se repete em vários pontos da canção e também na conclusão. Além disso, aqueles choros da guitarra que aparecem espalhados pela canção toda necessitavam da alavanca do trêmolo com que George não estava se dando bem. A coisa só acertou no final quando John se ajoelhava em frente ao parceiro para operar a ferramenta, George confessou anos depois. Os overdubs vieram sobre o último take, com Ringo no pandeiro, John e Paul dobrando seus vocais, e John acrescentando uma guitarra nas ponte e versos subsequentes.
 
Foi tocada inúmeras vezes ao vivo, até o último concerto, no Candlestick Park, San Francisco, agosto de 1966, e uma das apresentações foi lançada como Lado B do single Real Love, do Projeto Anthology. Deixo aqui um LINK com umaq delas. Note que George não faz ao vivo aqueles tremiliques na guitarra!


4. Rock And Roll Music (Chuck Berry)

Esta era um clássico de Chuck Berry, que John considerava o Rei do Rock. "Não me venha com jambo, mambo, tango, o que eu quero ouvir é Rock And Roll".  Desde 1959, eles tocavam essa canção em shows, então não foi difícil escolhê-la para o álbum. E também não foi difícil gravá-la! Quer dizer, ficou fácil porque eles era The Beatles!! Relembrando a histórica gravação de Twist And Shout, John não precisou de mais que UM TAKE para finalizar o trabalho, de uma também histórica sessão de 9 horas de duração, em que gravaram outras SETE canções, sendo SEIS delas aproveitadas no álbum, uma eficiência impressionante. Era a penúltima sessão em que se dedicaram a "Beatles For Sale", no profícuo 18 de outubro de 1964. Então havia pouco tempo para se gravarem poucas canções, mas os rapazes não decepcionaram, inclusive George também fez sua cover de Carl Perkins em um take só!!! Estavam afiadíssimos!!! O vocal de John foi mais que perfeito! Existe uma dúvida se o piano que se ouve é de George Martin tocando ao vivo junto com os rapazes, ou se acrescentaram alguma partes posteriormente e se foi Paul ou John, ou há ainda uma versão de que os três se sentaram juntos, uau! Ela é a primeira Cover do LP, na posição 4 do Lado A. Eles tocaram a canção na BBC, na TV e em vários shows até 1966, último ano das apresentações ao vivo. Bem, se quiserem ouvir o piano, é neste LINK, se não fizerem questão, ouçam ao vivo, este outro LINK, bem mais curto que no disco! John canta uns dois tons mais alto que Chuck Berry! Impressionante tenor! 

5. I´ll Follow the Sun   (DtR Girl Song by Paul McCartney)

Paul aconselha: 'Um dia você vai descobrir que fui emboramas amanhã poderá chover então vou seguir o sol. Algum dia, saberá que fui o único, mas amanhã poderá chover então vou seguir o sol"
Esta é canção que Paul escreveu muito antes dos Beatles, e que estava guardada em algum lugar de sua memória de adolescente, foi feita quando ele tinha 16 anos, tão jovem e já fazendo canções de DR entre casais. Ela foi ressuscitada para encher o álbum, mas foi bem além disso. Por exemplo, era a Lennon/McCartney preferida de George Martin naquele álbum. Três versos  com alguma variação das letras em suas primeiras metades, onde avisa a garota pra ficar esperta, e nas metades finais ele diz o que pode acontecer, sempre "... tomorrow may rain, so I'll follow the sun". A ponte, com tensão mais elevada, ele concretiza a ameaça, dizendo que chegou a hora de ir embora "...I must go". Dramático aquele rapaz!
 
I'll Follow The Sun veio ao mundo no último dia reservado para gravaçã
o do álbum Beatles For Sale, um longo 18 de outubro, quando foram gravadas 8 (!!) canções. E foram também 8 takes até atingir o ideal... E também graças à maestria de George Martin! No começo, Paul não estava satisfeito com a bateria, achava que não era o acompanhamento ideal, e sugeriu que Ringo batesse nas pernas, e é esse o som que ouvimos até hoje.  O guitarrista George estava insatisfeito com sua participação no simples solo, afinal eram apenas 8 (de novo) notas, e apenas acompanhando a melodia, então o Maestro George bateu o martelo sugerindo os ótimos 4 slides, com seu xará escorregando os dedos nas primeiras 4 notas até a nota final do par. Finalmente, George Martin ensinou a John 
o magnífico backing vocal descendente, na ponte, logo após lindo acorde de 7ª ("And now the time has come so my love I must go, and though I lose a friend in the end you will know, oh"). Nos overdubs, Paul dobrou seu vocal nas metades iniciais de todos os versos.
 
Há registros de que I'll Folow The Sun foi tocada pelos Beatles ainda sem a ponte, e sem Ringo na banda. Ela foi tocada ao vivo pelos Beatles apenas uma vez, num programa de rádio na BBC. E Paul a incluiu em muitos de seus shows solo, uma delas a deste LINK, em Moscow.
 
Pra finalizar, notem a instrumentação da canção em um artigo que li, o que é que Ringo toca!! 


6. Mr. Moonlight (Roy Lee Johnson)

Eu disse ali em cima que os Beatles trouxeram pesos pesados do Rock, e citei quatro nomes. Pois bem, este é um quinto nome! E a exceção! Seu autor é Roy Lee Johnson, você conhece? Nem eu! Quem a lançou foi um tal Dr. Feelgood, você conhece? Nem eu! Estou mais para Feelbad! Fraquinha, na minha opinião, mas eles sempre fazem do limão uma limonada. Finalizada na enorme sessão de 18 de outubro,  John manda muito bem, abre a canção com um grito primal, tem uma harmonia vocal tripla magnífica, Paul toca um órgão Hammond, Ringo inova num tambor africano, então dá pra engolir. O que não me conformo é saber que, para colocar Mr. Moonlight, eles engavetaram uma muito melhor, gravada quatro dias antes, chamada Leave My Kitten Alone, ouça bem neste LINK, mas prepare-se para balançar na cadeira!! Rock da melhor qualidade, incomparavelmente superior à escolhida, em verdade uma música caipira, letrinha breeeega, como pode ser conferido neste trecho da versão brasileira: "- Senhor Luar, olhe pra mim! Aqui'stou de joelhos, implorando..."!! Se há uma escolha que eu reprovo dos Beatles, é essa! Infelizmente, ela é a sexta canção, do Lado A do LP! Mas em respeito ao estupendo vocal de John, mostro-a aqui, neste LINK, onde ele nos brinda com DOIS de seus gritos primais!! 

Esta versão foi o Take 4, gravado na 2ª sessão de gravação para o LP Beatles For Sale, constituindo-se Mr Moonlight, tremendo Lado B, pouco conhecido, na 1ª cover a ser
proposta para o LP, por incrível que pareça. Nela, ouve-se ainda a estranha guitarra de George que era a proposta da seção solo da canção, John gostava dela, mas era o único. Na versão final, que foi gravada naquela mesma extensa sessão de 18 de outubro, onde George foi relegado a tocar uma percussão e quem fez o solo foi Paul, em overdub, num órgão Hammond.


7. Kansas City/Hey, Hey, Hey, Hey (Lieber/Stoller/Penniman)

Esse medley já era cantado assim pelo autor da segunda, Pennyman, o real nome do gênio do Rock and Roll Ricardinho, ou Little Richard. A primeira do medley é da dupla Lieber/Stoller. Favorita de Paul, eles a cantavam desde 1962, quando conheceram o roqueiro pianista americano e se tornaram seus amigos.  Na busca por canções para encherem as noites em Hamburgo, eles usaram o roqueiro pianista americano como fonte de outras 11 canções. Após uma parada de sua performance em shows no início da carreira dos Beatles, ela foi revivida na excursão aos EUA, justamente em Kansas City, onde foi devidamente aclamada, e foi então considerada para sair no novo LP. Foi a vez de Paul entregar seu ONE-TAKE-Song e no mesmo vigoroso 18 de outubro em que John entregara sua Rock And Roll Music e George sua Everybody's Trying To Be My Baby, ambos com a mesma eficiência! Incrível sessão! Ela é a sétima canção, fechando o Lado A do LP! 

Kansas City/Hey Hey Hey Hey foi a primeira canção nova a ser gravada naquela famsa sessão, onde foram completadas 9 canções, todas lançadas, ou em LP ou em compacto, produtividade impressionante. Após terminarem Eight Days a Week,
dedicaram apenas meia-hora ao medley, tamanha era a experiência do quarteto com ela. Tentaram mais um take, mas o primeiro foi o melhor, e por sobre ele, vieram os overdubs das palmas dos quatros Beatles e do piano de George Martin. Notável é que foi a primeira vez que Ringo se juntou aos seus companheiros no canto Hey-Hey  Bye Bye Baby Bye Bye, de resposta ao chamado de Paul, fato repetido na carreira em vezes que não enchem uma mão! Deixo aqui uma das muitas vez em que esse dançante medley foi cantado ao vivo.
 


LADO B

8. Eight Days a Week   (Love Girl Song by Paul McCartney)

Paul declara: 'Eu amo você todos os dias, garota, sempre na minha mente. Uma coisa que eu posso dizer, garota, eu amo você o tempo todo! Abrace-me, me ame, abrace me, me ame. Eu não tenho nada além de amor, querida, oito dias da semana'
Sabe quem deu a inspiração para a canção? Foi um motorista! Paul estava sem poder dirigir por ter perdido a carteira, e teve um transporte arranjado pela EMI para levá-lo à casa de John e, no trajeto, perguntou ao motorista: "How's life?" e o cara respondeu "Pretty fine! Working eight days a week!!". Ele nunca havia ouvido a expressão, achou-a perfeita e, ao chegar, Paul disse a John: "I've got a title for our new song!", e começaram a compô-la! Na verdade, deve-se admitir que o título é a parte mais forte da letra, preenchida com clichês de holdme's e loveme's, mas maravilhosamente bem colocados e que ficam grudados na nossa mente. John sempre desconsiderou a canção porque ele já estava no mood de escrever letras mais densas! A ideia básica foi de Paul, os dois fizeram a letra e é John quem faz o vocal principal, com Paul no backing, um verdadeiro trabalho de parceria. Estruturalmente, era o básico do básico da época da banda, verso-verso-ponte-verso, sem refrão ou solo, depois repete ponte e verso, letras diferentes nos versos, que aliás, eram razoavelmente complexos, com 3 seções, cada um, com os primeiros 8 compassos contando a história acompanhado do lindo 'walking bass' de Paul, os 4 compassos seguintes com os apelos holdme-loveme, e os últimos com o título da canção, em conjunto com Paul, tudo temperado por palmas deliciosas. O título volta na ponte, harmonizada totalmente com Paul. Aliás, o título é falado muitas vezes na canção, o que não era normal, é uma vez em cada verso, 4 vezes, mais duas em cada ponte, mais 4 vezes, mais duas na conclusão, total 10 vezes. É muito, né? Inda vou fazer uma estatística Beatle sobre o tema. Viajei!  
 
A canção foi trabalhada muitas horas no estúdio, era a 5ª sessão de gravação para Beatles For Sale, um 6 de outubro de 1964!  Foram apenas 6 takes até chegar à base, mas embatucaram um pouco para definir o início, que começou com uuu's em vocal, e uns falsetes colocados (ouça este LINK, que saiu no projeto Anthology), mas acabou sem eles e com um inédito fade-in  com a introdução da ótima guitarra de George e o baixo de Paul repetindo numa nota só, saindo do zero até chegar ao volume ótimo para a entrada triunfal de John "Oo, I need your love, babe, Guess you know it's true". Sensacional! Como também são 'um estouro' as palmas todo o tempo e dobradas no "Hold Me pa-pa Love Me pa-pa". Notável também o trabalho de equipe nos backing vocals de Paul e de George em momentos diferentes da canção: de Paul, nos agudos "Hold Me! Love Me!", (apenas a partir do segundo verso) e de George na ponte "Eight days a week, I lo-o-ove you, eight days a week is not enough to show I care". Depois de estabelecida a base, foram mais 7 takes com overdubs, basicamente para as fundamentais palmas e os vocais dobrados de John. A definição da introdução ideal veio somente 12 dias depois, e foi ideia de Normam Smith, perfeito para se abrir um Lado de LP, que foi o caso!! Deliciem-se aqui neste LINK. 
 
Magnífico, tão magnífico que, apesar de ser apenas uma canção de álbum no Reino Unido, preterida que foi pela estupenda I Feel Fine para o efeito de lançamento em compacto, Eight Days A Week acabou sendo assim lançada nos EUA para subir ao topo da parada, tendo I Don't Want To Spoil The Party no Lado B. Pra finalizar, sua posição no álbum: com o recurso do fade-in, nada mais natural que colocá-la para abrir o Lado B de "Beatles For Sale". Ironia interessante foi que o nome da canção foi escolhido por Ron Howard como título de seu sensacional documentário sobre o insano ritmo da excursão americana (LINK), apesar de ela nunca ter sido tocada em NENHUM show ao vivo! Por outro lado, não há dúvida de que o nome foi absolutamente apropriado ao tema, afinal, os Beatles estavam envolvidos na excursão 'oito dias por semana'!!

 

9. Words Of Love (Buddy Holly)

A canção está na posição 2 do Lado B do LP e é uma fundamental homenagem a seu autor Buddy Holly, genial líder dos Crickets, que morrera num desastre de avião aos 19 anos, em 3 de fevereiro de 1959, conhecido como O Dia Em Que A Música Morreu, sobre o qual falo, neste LINK. Todos sabem da predileção de John por Chuck Nerry, da de Paul por Lottle Richard e da de George por Carl Perkins, mas acima de todos eles, está Buddy Holly. A identificação dos Beatles com Holly era enorme, porque o jovem astro americano, compunha Rock and Roll, era branco, cantava e tocava guitarra enquanto cantava, inclusive os riffs. Foi essa inspiração que os levou a serem do jeito que eram. E tinha um apelo ainda maior a John, pois usava óculos, hehehe, já que o Beatle era 'blind as a bat' como declarou George na década de 1970. A reverência a Holly era tanta que é dele o primeiro registro em gravação de John, Paul e George, ainda no Quarrymen, em 1958, a canção That'll Be The Day, tendo no Lado B uma canção de Paul chamada In Spite Of All The Danger. Foi ótimo que os Beatles optaram por Words of Love, menos conhecida que a já citada, ou que Peggy Sue, ou ainda Maybe Baby, dando a possibilidade ao grande público conhecer mais a fundo o lindo poema, "Deixe-me ouvir você dizer as palavras que eu quero ouvir, querida, quando você está perto, umm, umm, palavras de amor que você sussurra, suave e sincera, querida, te amo", rimando lindamente em inglês. 

Assim como as outras três covers descritas até agora, Words Of Love foi também gravada na já antológica Sessão Mamute de 18 de outubro e ainda viria outra. Ela foi a última a ser gravada, todos já cansados, e foi na meia-hora final da sessão de longas 18 meias-horas, que terminou a meia-hora do dia 19. E foram apenas dois takes, o segundo considerado ótimo, com todos em seus instrumentos usuais, e vocal triplo imbatível de John/Paul/George na harmonia tripla em um mesmo microfone. É de John o vocal mais grave que se nota bem nas palavras estendiiiidas, como em "tell how you feeeeel" ou "darling,z when you're neeeeeear". Eu disse todos em seus instrumentos usuais? Minto! Ringo batucou também em um estojo de guitarra que veio em overdubs por sobre o Take 2, assim como os vocais dobrados dos 3 cantores  Eles a cantaram ainda como Quarrymen, desde 1959 e já como Beatles, até 1963, quando a gravaram na BBC, bem antes da gravação no LP, ouçam como foi, e notem neste LINK que está muito parecido com a versão que conhecemos oficialmente, claro que sem o guitar case de Ringo, e notem que a harmonia parece que é dupla, mas com George fazendo a parte aguda.

10. Honey Don't (Carl Perkins)

A canção abre o reinado de Carl Perkins em "Beatles For Sale", logo a seguir, na posição 3 do Lado B do LP. Ela era o Lado B de Blue Suede Shows, compacto lançado em 1956. Na voz de Ringo, Perkins quer conhecer melhor sua 'Honey', um dos mais famosos qualificativos de 'Amorzinho' na língua inglesa. Ele é o único autor a ter duas canções gravadas pelos Beatles num único álbum! E foi a oportunidade para Ringo brilhar! Era John quem cantava a canção nos shows (ver aqui neste LINK,  em show da BBC) em Liverpool e Hamburgo, mas ele considerou que o range vocal de Ringo estava OK para ela, e a partir de então, foi o baterista quem a cantou ao vivo, nos shows subsequentes. 
 
Ela foi gravada na última sessão de gravação do LP, em 28 de outubro, em 5 takes, com todos tocando seus instrumentos nos primeiros, mas com John mudando para o violao nos últimos, e Ringo cantando ao vivo! Depois, em overdubs, Ringo seguiu seu papel de astro da canção e gravou pandeiro ao longo de toda canção! Deixo aqui, uma performance de nosso querido baterista ao vivo, mas já em carreira solo, num histórico encontro com Carl Perkins, o lendário autor da canção, neste LINK. 

11. Every Little Thing   (Love Girl Song by Paul McCartney)

Paul declara: 'E você sabe que as coisas que ela faz ela faz para mim, uh! Quando estou com ela, eu me sinto feliz só de saber que ela me ama. Sim, eu sei que ela me ama agora
Aqui vou inverter o esquema: falo primeiro da parte musical! E por causa de UM instrumento: os Tímpanos! Não sabem o que é? E se eu disser TAMBORES DE ORQUESTRA com notas definidas. Aí, ok, né?! E é uma outra inversão porque os tímpanos foram introduzidos em over-dub posterior, e esse tipo de informação eu normalmente deixo por último. E por que eu dou essa importância toda a um simples tambor? Bom, primeiro eu peço que ouçam a canção e me digam se não é aquele som que reverbera, ali, duplo,  ton-don, em notas diferentes, no meio do refrão, que ficam na sua cabeça? Como aqueles tímpanos insanos na clássica de Strauss, claro, na introdução de Assim Falava Zarathustr, a gente não se esquece. E há que se destacar que é o primeiro instrumento 'de orquestra' que aparece na carreira Beatle, e quiçá na história do rock, mas isto eu não posso garantir! No álbum seguinte, as cordas entrariam triunfais, em Yesterday, e depois em Eleanor Rigby, mas até ali, nunca. Além disso, foi um instrumento de orquestra tocado POR um Beatle! Ufa, é muita ode a um instrumento, não? Ouça no LINK, se não vale esse destaque todo que eu dei! 
 
Bem, seguimos na música: aqui, quem toca a guitarra solo, é John, e ela aparece com destaque, na introdução, no solo, e na finalização. George fica no ritmo, mas há controvérsias quanto a essa inversão de papéis, Paul no baixo e Ringo na bateria (além do ton-don). Paul também toca os baixos de piano, juntamente, na mesma faixa com os ton-don's do Ringo nos tímpanos no refrão. O vocal principal parece-me de John, mas os registros dizem que ele e Paul cantaram juntos! Paul, com certeza, pega a harmonia aguda no refrão. 
 
A canção é mais de Paul que de John, ele se lembra de tê-la esquadrinhado na casa da namorada Jane Asher, onde morava, junto com os pais dela... ai esse Paul... querendo economizar uns trocados. Provavelmente ele e John a terminaram em Atlantic City, num intervalo da tempoda de shows nos Estados Unidos. Paul preza muito as 'things she does for him' do refrão. E como ele, bem como seus colegas de banda, não eram lá muito fiéis com suas parceiras, ele admite: "Yes I know I'm a lucky guy!" Muito sortudo! Essa satisfação vem expressa em dois pares de versos, entremeados pelo refrão. No primeiro par, além da sorte declarada de tê-la aguardando sua volta, ele se lembra de quando era só, sem ela. Depois do 1º refrão, a felicidade de estar com ela e a declaração de amor eterno ("I will love her forever")! Depois do 2º refrão, vem a seção solo, na guitarra, com os mesmos acordes, reprisando a melodia no início e variando na parte final. Finaliza com mais um refrão e a entonação do título duas vezes em fade-out, sumindo no horizonte... 
 
Every Little Thing veio ao mundo na 3ª sessão de gravação para Beatles For Sale, em 29 de setembro de 1964 em quatro takesmas só terminou com mais cinco no na sessão do dia seguinte. Em principio, e para sempre em discussão, era John quem pilotava a guitarra solo, George na guitarra rítmica, com Paul no baixo, Ringo na bateria e os vocalistas cantando ao vivo. Os notáveis e inesquecíveis tímpanos vieram nos overdubs sobre o Take 9, juntamente com passagens da guitarra solo de John e o piano de Paul que se ouve na parte final dos versos, onde ele também acrescentou duas passagens de seu baixo. 

12. I Don´t Want to Spoil the Party   (Sadness Miss Song by John Lennon)

John lamenta: 'Embora nesta noite ela tenha me deixado triste, eu ainda a amo. Se eu achá-la, ficarei feliz. Eu ainda a amo. Eu não quero estragar a festa, então vou embora. Eu não quero mostrar a minha decepção'
Esta seria uma canção feita para Ringo cantar, só que não! O estilo country rock era adequado a Ringo, mas a letra acabou ficando muito mais introspectiva, triste, e Ringo tinha o astral mais pro alto e não estava pra ficar lamentando que a garota não veio à festa, ou saiu sem avisar, não se sabe bem! Então, foi John quem a cantou, em lead, com participação em harmonias de George e Paul nos versos e de Paul nos agudos da ponte, dramática, como ocorrera em No Reply

I Don´t Want to Spoil the Party abre com uma bela introdução com o violão de John e a guitarra de George, depois entram Paul no baixo e Ringo na bateria, e a história é contada nos dois primeiros versos e na ponte, depois repetem-se os mesmos dois versos, entremeados por uma seção instrumental e mais uma vez a ponte, e conclui com a repetição da ótima introdução, agora com todos os instrumentos. Na letra, John não quer estragar a festa com sua tristeza por uma garota não estar lá, diz que não há nada pra ele e se pica (“I will disappear”), toma um drinque ou dois, não sabe o que deu errado (“I wonder what went wrong”), diz que não tem sentido continuar ali, e vai embora procurar por ela. A ponte traz o clímax da canção, com o vocal principal bem agudo, com o lamento de sua tristeza e a declaração de ainda a ama “III stiiill looove her”. 

A canção de trabalho se materializou no 1ª sessão da retomada da gravação do LP Beatles For Sale, após o retorno da 1ª excursão aos EUA, em 29 de setembro. Levou 19 takes para tomar forma, todos tocando e cantando ao vivo, com apenas 5 deles completos. John canta a harmonia alta nos versos e a baixa na ponte, Paul e George harmonizam com uuuu’s na 3ª seção dos versos, e Paul entrega sua usual harmonia aguda na ponte, tudo ao vivo. Existe uma dúvida muito discutida sobre quem faz a harmonia baixa nos versos. Uma primeira versão diz que é o próprio John, em overdubs, ou seja, a harmonia grave do próprio John em três das quatro seções dos versos. E uma outra, de que é Paul mesmo. Este excepcional especialista italiano, chamado Frudua, diz que é isso, ouçam aqui, neste LINK! Importantíssimo, também é o pandeiro de Ringo, fundamental para a tensão da ponte!  

Como quase todas as originais de Beatles For Sale, I Don´t Want to Spoil the Party nunca foi tocada ao vivo. Ela teve, entretanto a distinção de sair como Lado B de um compacto nos Estados Unidos, tendo do outro lado a espetacular Nº1 Eight Days a Week, e essa proximidade fez com que aquela humilde canção de trabalho galgasse a honraria de ser a ÚNICA Lado B a atingir as paradas americanas. Veja bem, refiro-me a um VERDSDEIRO Lado B, onde é clara a distinção de importância entre as duas canções. Diferente dos compactos Duplo Lado A. Curta esse ótimo som, neste LINK.

13. What You´re Doing    (DtR Girl Song by Paul McCartney)

Paul questiona: 'Por favor, pare de mentir, você me fez chorar, garota. Por que seria demais lhe perguntar o que você está fazendo comigo?'
Nada como uma DR! É Paul reclamando da amada, que mente pra ele e o faz chorar (seria Jane?). Não coaduna muito com a época, porque ele e os amigos não podiam reclamar nada de suas parceiras, porque da parte deles era uma sacanagem só, ai se as paredes daqueles quartos de hotel das excursões falassem... Paul capricha nas rimas ricas irregulares, rimando , como ele faria em You Won't See Me e Hey Jude em anos posteriores. 

A curta letra percorre três versos e uma ponte, como a maioria das canções da época, sem refrão, mas com um interessante jogo de compassos, tendo o primeiro verso uma incomum quantidade ímpar deles, raros 9, e com o requinte de o segundo verso baixar a 8 para emendar com a ponte. Depois mais um verso com 9, e um instrumental com 8, e uma nova ponte! Sempre inovando! Voltando à letra, se eu tivesse que eleger uma palavra para resumi-la, seria INCONFORMISMO, o cara está triste e solitário, perguntando o que a garota está fazendo com ele, e tentando convencê-la de que ele á o cara certo para ela, e tudo gira por aí!!

A canção demorou três sessões de gravação para ser concluída, na volta da 1ª excursão aos EUA, aliás ela foi composta em Atlantic City, numa folga de três dias. Em 18 de setembro foram sete takes, e no dia seguinte, mais cinco, sendo o Take 11 (neste LINK) guardado para o dia 1º de outubro, último dia disponível para trabalhar no álbum, sendo que na terceira, decidiram começar do zero. Note que a versão abandonada tem John harmonizando nos versos, não tem os Uuuuu's, dão uma modulada para um tom acima,  e tem a bateria usual de Ringo. O principal problema foi acertar a introdução, que veio só nos últimos sete takes daquele 3º dia. Paul queria que a introdução soasse como um grupo de cantoras americanas. O resultado, entretanto, mostra que valeu a pena refazer tudo. Ela começa com a bateria de Ringo, sozinha durante quatro compassos, em batida incomum, e entra o riff de guitarra de George, com o violão de John, e o baixo de Paul, e só começam os quatro juntos no 1º verso, já com a bateria regular, Paul no vocal principal, com John e George na harmonia vocal, reforçando apenas as primeiras sílabas dos versos ("Look", "I'm", "You've", "Please", "And"), inclusive com direito a um erro na interjeição final do 3º verso, muito interessante, e com os tradicionais e deliciosos uuuuu's em parte dos versos. Eles voltam ao reforço harmônico nos três "me"s finais dos versos. Na sessão solo de guitarra, Paul acrescenta um piano insano. A conclusão, inovadora, repete a batida inicial de Ringo, sozinha, mas depois ainda retornam a guitarra e o piano e o lamento vocal em fade-out. Perceba tudo isso, as variações nos compassos, o erro na 6ª interjeição, as indeléveis harmonias, a ótima bateria, no começo e no final, neste LINK. Não espere encontrá-la ao vivo. The Beatles nunca a tocaram em shows!!

 

 
 
14. Everybody´s Trying to Be My Baby (Carl Perkins)

A canção tem a distinção de fechar "Beatles For Sale" e consolida Carl Perkins como campeão de todos os tempos da carreira dos Beatles com a segunda canção num mesmo LP. E com Matchbox lançada no mesmo ano cantada por Ringo em um EP, Perkins se consolida como o compositor com mais canções originais gravadas pelos Beatles, mais mesmo que o próprio Ringo (estou desconsiderando What Goes On, em que ele apenas ajuda). George a canta, como fazia nos primórdios e voltou a fazer após o lançamento, na BBC (ouça beste LINK), na TV e nos shows de 1965. A letra reflete o que acontecia com cada um dos quatro Beatles à época, todas queriam ficar com eles! George era o maior admirador do guitarrista americano, em quem se inspirou para seu próprio estilo na guitarra. Ela foi gravada na mesma sessão em que John e Paul gravaram suas ONE-TAKE-Songs, o fabuloso e épico 18 de outubro de 1964, e George não ficou atrás: apenas um take foi necessário para a conclusão da faixa, com John no violão e os demais em seus instrumentos usuais (acho que já escrevi isso!).  

 

Lançamento e Recepção de Beatles for Sale 


Terminadas as sessões, as mixagens, chegou a hora da capa. Para o efeito, e para não se mexer em time que está ganhando,  chamaram de novo Robert Freeman, responsável pelas duas últimas capas, ele os levou ao Hyde Park, agasalhados pelo frio de outono, orientou que não sorrissem, o que combinava com o 'mood' das canções, e tirou  fotos,  desta vez coloridas, colocaram numa capa com o nome do álbum pequenininho, para desespero da chefia da EMI. A novidade maior foi a primeira capa sanduíche (gatefold sleeve) que repetiriam algumas vezes, com fotos da banda em atuação e montagem com artistas de Hollywood, alguns deles que conheceram durante a excursão aos Estados Unidos. 


"Beatles For Sale"
foi lançado em 3 de dezembro de 1964 e foi direto para o topo , como todos os LPs dos Beatles (bem entendido, eu me refiro aos LPs lançados como LPs, com oito ou mais canções autorais, o que exclui o EP de "Magical Mistery Tour", que somente depois virou LP e o "Yellow Submarine", com a trilha sonora do filme, que tinha apenas quatro canções novas). Diferentemente dos três anteriores, o LP ficou 'apenas' 11 semanas no topo, e elas não foram consecutivas, pois foi uma boa briga com o segundo álbum dos Rolling Stones, que tomou o lugar dele duas vezes. O compacto lançado no mesmo dia do LP, com as canções I Feel Fine e She's A Woman, canções gravadas em sessões do álbum, também foi para topo, mas falarei delas no capítulo dedicado ao álbum Past Masters #1.

Nos Estados Unidos, seguia fenomenal salada... Não se sabe por quê, mas a Capitol Records era rebelde e insistia em lançar coisas diferentes. Só em Revolver, dois anos depois, resolveram adotar o catálogo britânico da empresa mãe, a EMI. Lançaram um tal Beatles '65, que tinha apenas 6 das 8 originais de Beatles For Sale, apenas duas das 6 covers, e tinha as canções do single britânico, e, pasmem, I'll Be Back!!! Coisa de doido! No Brasil, a confusão era menor, mas seguia diferente do original. Foi lançado também um Beatles 65, mas com apenas 12 canções, e tiraram justamente duas originais, nós ficamos sem conhecer Baby's In Black e Every Little Thing, que foram lançadas em separado!! E ainda colocaram como capa uma imagem de um show ao vivo, nnum disco que não tinha NENHUMA canção ao vivo. Vai entender!!

Para terminar, não poderia deixar de registrar as proféticas palavras de Derek Taylor, assessor de imprensa dos Beatles, nas notas de capa, quando disse:

Há uma história inestimável entre essas capas. Quando, em uma geração ou mais, uma criança radioativa fumante de charuto, fazendo um piquenique em Saturno, perguntar a você sobre o que foram os Beatles, não tente explicar tudo sobre o cabelo comprido e os gritos! Basta tocar algumas faixas desse álbum e ele provavelmente entenderá. As crianças do AD 2000 extrairão da música a mesma sensação de bem-estar e calor que fazemos hoje.

Ele somente se enganou na tecnologia e no 'Anno Domini 2000'.

Já estamos 20 anos além, ainda não estamos em Saturno mas com relação aos Beatles, segue sendo assim!

8 comentários:

  1. Homerix,

    Impressionante a extraordinária riqueza das suas postagens, sobretudo sobre os Beatles. Alcance digno de um PhD no assunto. Parabéns!

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  2. Um LP muito interessante onde a personalidade da dupla LM fica bem explicitada. A profética frase de Derek Taylor resume bem o momento da banda. Mais uma vez, excelente postagem

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  3. John cada vez mais autêntico e confessional. Imagine uma Beatles song, dois anos antes, começando com "Sou um perdedor e não sou o que pareço ser"...
    John também mostra seu lado possessivo em "No replay", onde espia pela janela a mulher amada com outro. Mas, magnânimo, a perdoaria se ela voltasse...
    John disse que essa canção era o "Silhouttes" dele. Só que, na Silhouttes, o traído vê apenas sombras, mas John espia pela janela...
    Também gosto muito de No replay.
    Detalhe: "alguém" atendeu o telefonema e disse que a garota não estava em casa. Ele foi conferir...

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  4. PhD em Beatles, com certeza!!!

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  5. Imagino que existam textos para cada música em separado...Ou não?

    Só vi a conhecer este disco agora no século 21. Eu conhecia um parecido chamado Beatles 65 lançado aqui exatamente em 65. A Odeon ainda estava na onda da Capitol lançado tudo diferente para nós. E bem diferente porque nem mesmo a capa foi a mesma. Que capa terrível aquela...Eles de longe ...de costas num palco. Acho que do show em Washington. Eu levei um susto, ou melhor dois sustos. Porque a capa do anterior era bem caprichada. Com todas as músicas deles. De repente vem essa coisa assim maletosa cheia de covers. Cheguei a pensar que estariam em decadência sem saber que o mal jeito era só no Brasil. E nos EStados Unidos.
    É verdade que o Beatles for Sale também estava cheio de covers, mas pelo menos a capa é show!
    Eu o comprei em Belo Horizonte durente as férias na casa onde residia uma senhora inglesa. Eu ouvindo inglês o tempo todo. Foi aquela senhora quem esceveu minha primeira carta para Paul. Ela passou a carta para o inglês.
    Duas músicas tocavam sempre nas rádios. Rock n roll music e Eight Days a Week. Um dia tocaram What you're doing. Vibrei. Bem Beatles.

    Claro que gostei do disco, mas ...faltava algumas coisa. Faltava as músicas deles. E, para mim, a escolha das músicas de outros não foi tão boa quando as escolhas dos primeiros discos. Por mais bonitinha que seja Words of Love...não era igual. E eu me pergunta o motivo.

    Pois é, ficaram trabalhando demais em viagens para shows e filme. E tinham por contrato de entregar novo Lp.
    Mr. Moolight...eu também pensava como Homerix a principio. Era apenas bonitinha. E tinha aquele grito extraordinário no início. No entanto algo aconteceu. Nem sei se saberei dizer. Havia um programa na Tamoio chamado Músicas na Passarela. Seis horas da tarde por aí. Eu o ouvia sempre esperando a noite chegar olhando o céu e as primeiras estrelas. No alpendre. Pois colocaram Mr. Moonlight na programação. Tocava sempre. Comecei a associar a música com a lua chegando...

    De uns anos para cá venho com esse desejo insano de achar uma máquina do tempo e passear em 1965. Percebi ter sido um ano especial para mim. Um ano de esperança. E então, sempre que me dá esse desejo e fecho os olhos para me sentir lá...vem a musica Mr. MNoonlight...E dou de chorar de emoção. Com isso essa música acabou sendo a melhor de todas para m mim. A que mais toca minha alma. Ficou sendo a música mágica que quase me transporta para outros tempos. Quase. Ainda quero ser transportada de verdade e voltar. Que nem Woody Allen fazia no filme Paris a Meia Noite.

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  6. Corrigindo o nome do filme graças a Homerix: Meia noite em Paris. Hoje mais do que nunca quero e preciso dar um passeio até 19655. Ao som de Mr. Moolight. rs rs rs.

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  7. Trabalho fantástico Homero
    Essa obra merece parabéns

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