Recebi um presente lá d'outro lado do Atlântico.
Já há 26 semanas que a tripulação do Submarino Angolano recebe a colaboração do Contramestre Homerix, em directo do Brasil.
Durante cinco semanas abrimos espaço a um projecto detalhado e extraordinário de Homerix, o de destrinchar o fenomenal medley do Lado B do LP Abbey Road, o último gravado pelos Beatles, em 1969. Aqui, encontrarão a íntegra deste projecto! Reserve duas horas para o efeito.
Adoro o 'c' mudo que os patrícios mantiveram em suas palavras, mesmo em contrariedade às novas regras da esdrúxula reforma da nossa Língua Portuguesa, que tentou uniformizar o não uniformizável! Eu mesmo aqui, lá atrás, nunca entendi lá atrás, quando deixei de falar "con-tá-qui-to"!
Como ele disse, são quase duas horas! Se estiver disposto para a batalha, prepare um drink, uns snacks, municie-se com fones de ouvido, e viaje comigo, conhecendo as entranhas de uma obra-prima, a última dos Beatles!
É só clicar aqui:
https://m.mixcloud.com/tokeluanda/o-medley-de-abbey-road-em-cinco-cap%C3%ADtulos-por-homerix/
Para facilitar, transcrevo o texto inteirinho pra vocês! Logo a seguir!
Antes, quem prefer ler em capítulos,
é só clicar neste LINK
As Canções do Medley de Abbey Road
John abraçou o projeto, chegou a dar declarações sobre ele (depois, desanimou-se). Ele já tinha duas canções tentadas para o Álbum Branco no ano anterior, e criou mais uma para a montagem de canções, como ele chamou. Paul apresentou logo de cara um sub-medley de quatro canções para abrir a peça, e compôs outras cinco. Total de nove canções. Seis delas, ensaiadas ainda em janeiro, foram engavetadas com as demais do projeto e gravadas oficialmente a partir de primeiro de julho, em Abbey Road.
Das 9 canções, seis foram gravadas em pares, 2 com 3, 4 com 5, 6 com 7, retratando AO VIVO o espírito do medley. As nove canções formam um conjunto uno, que espantou a críticos e ouvintes, ao perceberem que não havia espaço entre elas na bolacha. A coisa é tão bem conectada que é considerada como uma unidade. Por exemplo, a revista Rolling Stone, quando faz o ranking das Melhores Canções dos Beatles, coloca o medley em uma posição, e não cada uma de suas nove componentes. O conjunto é mais forte que cada uma das partes. Um verdadeiro caldeirão!
E agora, vamos a elas.
Canção 1: You Never Give Me Your Money (Paul McCartney)
Trecho inicial de YNGMYMAlém de iniciar o maior medley da história da música, a primeira de 9 canções, não é UMA canção, mas ela própria é um medley de QUATRO canções, cada uma com um assunto diferente, sem conexão temática entre elas. Paul gostou tanto da ideia que fez várias vezes em sua carreira solo. Logo no 2º álbum, RAM, temos Uncle Albert/Admiral Halsey, depois, a própria Band On The Run, que é um medley de 3 canções e finalmente o LP Red Rose Speedway termina com um medley de 4 canções.
Voltemos ao medley em questão, de fato um medley dentro do medley. No 1º trecho, Paul reclama: "Você nunca me dá seu dinheiro. Você só me dá um funny paper. E quando a gente negocia, você cai em prantos. Eu nunca lhe dei meu número, eu só lhe contei de minha situação". A menção a 'dinheiro' e a 'funny paper' que pode ser considerado como 'documento', refletia a época em que eles estavam, discutindo relações comerciais, sendo gerenciados por empresários que não lhes davam o dinheiro, então a "situation" se referia à situação financeira!! A reclamação seria direcionada a Allen Klein, que começava a administrar as finanças da banda.
A 2ª canção interna começa por "Out of college, money spent, see no future, pay no rent, all the money gone, nowhere to go"
Áudio deste trecho "Out of college..."
fala das dificuldades de um recém-formado, sem dinheiro e sem saber pra onde ir, uma observação social. No 3º trecho, que tem nada a ver com os outros dois ele diz: "One sweet dream, pick up the bags and get in the limousine, soon we'll be away from here, step on the gas and wipe that tear away",
Áudio deste trecho "One sweet dream..."
vem a ser uma inspiração de sua esposa Linda, com quem havia acabado de se casar e que gostava quando mais jovem, de sair sem destino, e colocava o pé no acelerador ("step on the gas"), só que a "limousine" que rima com "dream" reflete melhor o estado de milionário do agora maridão. Numa 4ª seção tem a brincadeira infantil rimada "One two three four five six seven, All good children go to heaven",
Áudio deste trecho "One two three four five..."
orientando ritmadamente um pular de corda. Enfim, uma salada, como a que John fez em Happiness Is a Warm Gun, um ano antes. Então, sendo a canção uma montagem de sons, não faz sentido identificar sua estrutura, falar sobre versos, pontes e refrões. No início, até se identificariam dois versos, começando por "You never give me your money" e "I never give you my number", mas como se trata de uma letra que para por aí, nem isso dá pra fazer. Essa é a cara dessa montagem de sons. E, lá adiante no super medley, vem um terceiro verso na linha daqueles primeiros, inserido em Carry That Weight "I never give you my pillow..." numa épica recorrência!
Áudio deste trecho "I never give you my pillow..."
A gravação da primeira canção do grande medley foi fora da EMI, no dia 6 de maio, no Olympic Studios, já utilizado antes em outras canções, inclusive Hey Jude. Foram gravados 36 takes!!!… com Paul ao piano, John na guitarra distorcida, George numa guitarra usando mais os tons graves, quase um baixo, e harmonizando com o piano e Ringo na bateria. O piano do terceiro trecho “Oh, that magic feeling” foi amplificado pelo já famoso Leslie Speaker.
Áudio deste trecho “Oh, that magic feeling”
O Take 30 foi considerado bom o suficiente, mas o Take 36 é bem interessante e foi lançado posteriormente, com vocal apenas de Paul, ainda sem a seção infantil, e com uma finalização extensa que vai diminuindo, fading out. Dá pra se notar logo no início o que significa o efeito do Leslie Speaker no piano: após um papo nonsense delicioso, Paul começa a tocar, mas pede à sala de controle: "Leslie out, please!". Incrível!
Áudio deste trecho "Leslie out, please"
Depois de um break de mês e meio, de descanso e projetos pessoais, em que John fez aquele segundo Bed-in, em Montreal, e teve um acidente de carro na Escócia, a canção voltou a receber esforços em 1 de julho, com apenas Paul gravando seu vocal principal. Àquela altura, já se havia decidido que o medley entraria no último álbum da banda, então sem nome. No dia 11, apenas Paul novamente, acrescentando seu baixo estonteante sobre o Take 30, na seção “Out of college...”.
Áudio do baixo de Paul
Quatro dias depois, vocais dobrados de Paul a partir de "funny paper", e ele também acrescentou sinos tubulares reforçando (e até afogando, eu diria) a guitarra de John…
Áudio do trecho instrumental do LINK
You Never Give Me Your Money (Full Instrumental Performance with Guitar) - YouTube
de 1.34 até 1:52
e George dobrou sua incrível guitarra logo a seguir até o começo do 3º trecho, que começa com "One sweet dream".
Áudio da guitarra de Geaorge
A bateria de Ringo não precisou de consertos, estava perfeita!
Áudio da bateria de Ringo
No final de julho, já com várias canções do super medley quase prontas, começou uma série de sessões para conjuminá-las num conjunto espetacular. Então, eles ficavam indo do estúdio para a sala controle e desta de volta ao chão da fábrica para acrescentar sons. Que sessões devem ter sido aquelas! Como eu queria estar lá! Então, naquele dia 30, os três cantores harmonizaram backing vocals para o 1º trecho e para a seção infantil, e Ringo tocou um pandeiro no final das frases. Àquela altura, o take de trabalho já era o 40, após algumas reduções. O trabalho final daquele dia foi discutir e acertar qual seria a transição da canção para Sun King, mas dia seguinte, ainda continuou o trabalho. Paul reforçou sua linha de baixo e foram gravados backing vocals "aaaaahhh aaaaahh" na seção “Out of college...”, e lá mesmo desistiu do efeito Leslie, e tocou ali um piano sensacional,
Áudio do trecho instrumental
ponto alto instrumental da canção, algo que soaria como aquele honky tonk piano, de Rocky Raccoon com os mesmos truques (velocidade reduzida, uma oitava abaixo, e tal). Tão especial, piano, baixo, vocal, sino, letra, que merece um destaque…
Áudio deste trecho completo
Paul ainda não estava satisfeito com a transição para Sun King e acrescentou, no dia 13 de agosto, efeitos sonoros (bolhas, grilos, pássaros, sinos, vozes, grunhidos)
Sons de ligaçãocom Sun King
e uns tape loops que ele trouxe de casa, e, como sabemos, tudo caiu como uma luva. E depois, entre operações de fita, Paul acrescentou aquele vocal "ah, ah, ah, ah, ah" antes da seção infantil.
Áudio deste vocal
Enfim, alguns meses dedicados a uma verdadeira epopeia sonora…. Ouça o resultado!
You Never Give Me Your Money integral
No próximo capítulo, a criação e gravação de Sun King e Mean Mr, Mustard
___________________________
Olá, Viajantes do Submarino Angolano, Aqui é Homero Ventura direto do Brasil!
As Canções do Medley de Abbey Road – Capítulo 2
Pois bem, no Capítulo 1 desta série sobre o Medley, explicamos as razões de sua existência e detalhamos a Canção 1 – You Never Give Me Your Money, que veio ao mundo em 6 de maio de 1969.
Trecho de You Never Give Me Your Money
Este capítulo detalhará as Canções 2 e 3 do Medley, que tiveram suas bases gravadas in tandem, ou seguidas uma da outra, em 24 de julho. As duas eram composições de John Lennon. Vamos a elas!
Canção 2: Sun King
Trecho inicial de Sun King
John anuncia: "Lá vem o Rei Sol! Lá vem o Rei Sol! Todo mundo está rindo! Todo mundo está feliz! Cuando paramucho mi amore de felice corazón. Mundo paparazzi mi amore cicca ferdy parasol. Questo obrigado tantamucho que canite carousel"
Esta é a totalidade da letra, parcialmente traduzida. Resolvi não traduzir as três frases com sequências de palavras nas 'romance languages' que é como os humanos de língua inglesa chamam os idiomas espanhol, italiano, e português, nela empregados. ‘Obrigado' é a única lírica em português da letra, e de toda carreira dos Beatles! E o tal ''cicca ferdy" era uma expressão da cidade natal Liverpool, pra não dizer 'fuck-off'. No Brasil, seria “Vaza daqui!”.
Verso de Sun King (a capella) - YouTube
Essas palavras, assim jogadas, meio sem nexo, quase me fizeram classificá-la como Nonsense, mas elas têm algum sentido, sim, porque é um anúncio da chegada do Sol, como a luz, que abre a mente de quem recebe um incentivo, digamos, estimulante. O clima da canção é etéreo, aquelas harmonias vocais triplas de John, Paul e George, levam a um estado de elevação, de sonho.
A canção surge delicada, aparecendo lentamente após You Never Give Me Money.
Importante, o título original da canção era Here Comes The Sun King, o que inspirou George a escrever a magnífica Here Comes The Sun, daí resolveram tirar o anúncio da chegada do Rei Sol do nome, e ficou apenas Sun King. John trouxera a melodia, ainda incompleta, nas primeiras sessões do Projeto Get Back, em pleno inverno de janeiro de 1969.
Sun King do Projeto Get Back
Sun King é curtinha, mas tem estrutura, sim, com certeza. Ela começa com a melodia do verso, apenas instrumental, lenta, acalmando os espíritos, você se imagina tendo acordado cedo, ouvindo grilos e pássaros (que foi a transição escolhida por Paul no final da canção anterior), e de repente aparece o Rei Sol, e você, juntamente com outras dezenas de vizinhos, testemunhando sua real chegada, une-se a eles na saudação das quatro primeiras frases ali de cima, que se constitui no refrão em coro da canção,
Refrão de Sun King (a capella)
E então você, inglês raiz, extasiado, começa a exprimir sua felicidade com as palavras em outros idiomas que não o seu, no aparentemente sem sentido verso final, o único com letra!
Foram três as sessões de janeiro em que, ainda em seu estado embrionário, num total de 10 vezes, sendo a última no mesmo e fatídico dia 10, em que George Harrison abandonou a banda, retornando 10 dias depois. Mais de seis meses depois, no mês sete, ela retornou ao chão de fábrica assoalhado do Estúdio 2 da EMI, com a intenção de integrar o famoso medley, quando os registros ainda a chamavam de "Part Two...Here Comes The Sun-King", mas já definida na posição 2 do medley.
Naquele 24 de julho, começaram cedo, uma sessão muito inspirada, quando John, muito animado, chamou Paul para um canto do estúdio para completar a letra com aquele palavreado latino, dizem as más línguas, depois de fumarem umazinha… Depois, liderou seus companheiros em 35 takes, cantando um guia vocal, com sua guitarra ligada no Leslie Speaker, Paul no baixo, George na guitarra solo, e Ringo em sua bateria, mas com a diferença importante de que ele, ao invés das baquetas comuns, municiou-se daqueles pesados batedores de tímpano de orquestra que têm uma esfera na ponta, vigorosos, para tocar os pratos. John estava tão animado que investiu-se da filosofia do medley e resolveu ensaiar logo em seguida, em cada take, a canção seguinte da montagem, que também era dele.
Versão Original de Sun King na íntegra
Canção 3. Mean Mr. Mustard
Trecho inicial de Mean Mr. Mustard
John comenta 'Que velho malvado! Sua irmã Pam trabalha numa loja, nunca para, sempre vai junto, leva-o pra dar uma olhada na Rainha, um lugar que ele sempre foi, sempre gritando algo obsceno, mas que velho sujo!'
Mean Mr.Mustard foi feita na Índia e tentada para o Álbum Branco, mas foi deixada de lado.
O tempo não mudou a persona do mendigo que esconde dinheiro, dorme no parque, se barbeia no escuro. Só que, como ele tem uma irmã que vem passear com ele, eu não diria que é uma canção sobre solidão. Preferi deixar como funny story, porque é um personagem risível, mas muito também por causa do clima da música, ajudado por um sensacional fuzzy bass de Paul, que acompanha a canção toda, parece uma tuba, e tuba is very funny!
Mean Mr. Mustard BASS ONLY
A canção viera à sua mente de artigos de jornal que ficaram em sua mente, que falavam sobre um certo John Mustard, que era um marido malvado pão-duro, que se barbeava e ouvia rádio no escuro para economizar luz. John o apresenta num primeiro verso, com toda sua avareza, e num segundo, sua irmã Pam, que o leva para ver a Rainha. Haveria um terceiro onde seguiria contando sua história, mas foi abortado. Outra coisa que viria era uma ponte, entre os Versos 2 e 3, a gente percebe isso na demo que John gravou em Esher, naquelas sessões na casa de George quando organizavam o material para o Álbum Branco.
Mean Mr Mustard (Esher Demo)
Notou que a irmã dele mudou de nome? É, porque a canção faria uma ótima combinação com a canção que a segue no medley, Polythene Pam!! E por causa dela, a irmã do Senhor Mostarda não seria mais Shirley, mas Pamella, ou Pam, para os íntimos.
Foram quatro as sessões, de 8 a 25 de janeiro, em que Mean Mr. Mustard, foi ensaiada no Projeto Get Back, uma delas já em George, nas outras três ele tocava sua guitarra, com John no piano, Paul no baixo, Ringo na bateria.
Mean Mr. Mustard do Projeto Get Back
E voltamos agora para a genial sessão de sete horas, para sempre gravada nas memórias de todos os envolvidos, como a de melhor ambiente daqueles tempos problemáticos no relacionamento! Felizmente, um daqueles 35 takes sobreviveu e foi lançado na celebração dos 50 anos de Abbey Road.
Sinta-se no estúdio, participando de uma memorável sessão de Abbey Road. Note as deliciosas falas de John antes de Sun King, chamando os FAB Gear de volta ao trabalho, após uma jam session em que cantaram o clásssico Ain't She Sweet e outras, pois "...aquilo não vai sustentar o pessoal do estúdio e suas famílias"! Fiquei arrepiado aqui ao ouvir, aliás, já do começo, com Ringo batendo suavemente no prato de sua bateria...
Início de Sun King (Take 20) Abbey Road
Como as canções eram tocadas sem interrupção, Paul e Ringo tinham que ser rápidos, entre uma canção e outra, o primeiro tinha que ligar a Fuzz Box ao baixo, e o último largar suas baquetas de tímpano (de orquestra) e pegar as normais, John e George seguiam em suas guitarras, sim, John teve que abandonar o piano que tocara nas sessões de janeiro por causa disso. Então o que se ouve no disco é a reedição do que foi feito em estúdio, apenas melhorado por posteriores edição, mixagem, e overdubs. Note como John incluiu divertidas respostas, a cada frase, "Yes, he does!" e "Yes, he is!" e "God save the Queen!", e além disso, que a irmã de Mr. Mustard ainda era a Shirley da letra original.
Mean Mr. Mustard (Take 20) Abbey Road
Note na versão final como a métrica fica muito melhor com Pam do que com Shirley, "pa-para-RA pa-para-RA pa-para-RA", veja "His-sister-PAM works-in a-SHOP, she-never-STOPS". Se fosse Shirley, não ia dar certo
Adicionalmente admire a rima da última linha "She's a go getter" lá com a mesma linha correspondente do Verso 1, "trying to save paper", viajei? E tem uma última viagem deste admirador. A escolha de "Mister" para colocar entre "Mean" e o "Mustard" que estavam na reportagem propiciou um efeito sonoro interessante, com o triplo M em três palavras. Além disso, o "Mister" do Verso 1 rima com o "sister" do Verso 2. Nossa, de viagem em viagem acho que já estou na Lua.
Bem, no dia seguinte, (qual era mesmo? Ah, sim, 25 de julho), vieram os overdubs, primeiro dos vocais, tanto o de John, principal, como o dele, com Paul e George harmonizando em "Aaaaaah, here comes the Sun King" e na sequência de palavras latinas, todos arranjados magnificamente por George Martin, que também tocou um espertíssimo órgão, no refrão, e Ringo acrescentou maracas e certificou-se de que seus pratos acentuavam um a um cada compasso, muito lindo.
Sun King - Isolated Organ + Percussion
Em Mean Mr. Mustard, primeiro vieram os vocais, tanto o de John, principal, já com o nome da irmã trocado para Pam, como o de Paul harmonizando com John no "mean old man" do Verso 1 e no Verso 2 inteiro, e claro, John se lembrou do piano que tocara lá em janeiro, e acrescentou o instrumento, fundamental! Mais três dias, e os dois vocalistas dobraram seus vocais, e Ringo acrescentou aquele pandeiro maneiro a partir da metade do Verso 1 até o final da canção.
Mean Mr Mustard - Isolated Vocals + Piano
Houve mais um dia de esforços de overdubs pontuais em várias canções do medley no dia 30, não especificados, mas desconfio fortemente que Paul deu uma reforçada no espetacular Fuzz bass, de Mean Mr. Mustard que está muito mais sonoro na versão gravada do que no take disponibilizado. E aquela 'tuba' disfarçada é very very funny, um ponto fundamental da instrumentação.
Mean Mr.Mustard integral
O PRÓXIMO CAPÌTULO falará de
Polythene Pam e She Came In through The Bathroom Window
Um abraço aos ouvintes da LAC - Luanda Antena Comercial e até para a semana
Sun King e Mean Mr.Mustard integral
__________________________________________________________
Este é o 3º Capítulo da série O Medley de Abbey Road.
O 1º o 2º Capítulos estão lá ao final
O novo áudio, Medley 4 5 está aqui, neste LINK
Abaixo, o texto do 3º Capítulo!
__________________________
Olá, viajantes do Submarino Angolano,
Aqui é Homero Ventura direto do Brasil!
As Canções do Medley de Abbey Road – Capítulo 3
Pois bem, no Capítulo 1 desta série sobre o Medley, explicamos as razões de sua existência e detalhamos a Canção You Never Give Me Your Money. No Capítulo 2, comentamos Sun King e Mean Mr. Mustard.
Este capítulo detalhará as Canções 4 e 5 do Medley, que tiveram suas bases gravadas in tandem, ou seguidas uma da outra, em 25 de julho de 1969. Vamos a elas!
Início de Polythene Pam
Canção 4: Polythene Pam
Terceira e final presença de John no espetacular medley de Abbey Road.
Tem a mesma 'carreira' de sua antecessora Mean Mr. Mustard, em quatro estágios:
- foi feita na Índia, durante o retiro espiritual dos Beatles,
- não vingou no Álbum Branco,
- não aconteceu no Projeto Get Back,
- pra acabar, gloriosa, no medley de Abbey Road.
Apesar de John se inspirar numa menina que conheceu numa quente noite a três, que realmente se vestia em polietileno, macacão e botas (somente!), não poderia deixar de associar sua imagem ao humor. E quando soube que o nome Pam foi tirado por similaridade a uma garota de Liverpool, que tinha o apelido Polythene Pat, porque literalmente 'comia' polietileno, aí confirmamos o meu diagnóstico. E aí surgiu uma de quatro Funny Stories da carreira de John, sendo as duas primeiras lançadas no Álbum Branco (TCS of Bungallow Bill e Happiness Is A Warm Gun), além de sua companheira de medley, a do Malvado Sr. Mostarda!
John apresentara sua canção ao grupo no final de maio de 1968, nas famosas sessões de Esher, casa de George, onde combinaram os trabalhos para o Álbum Branco. Ali, ela já tinha aquela mesma estrutura, dois versos apenas, com quase a mesma letra que vemos na versão final, o Verso 1 apresentando "Polythene Pam, good looking but she looks like a man", e no Verso 2 dando-lhe mais características, "de salto alto e saiote escocês, vestida para arrasar" e notando como ela era bem torneada.
Esher Demo de Polythene PAM.
As linhas em que afirmava que "a garota por si só é notícia", da versão final, só viriam depois. Na verdade, o News of The World era um tabloide da época, de fofocas. Devo destacar que é preciso ter um inglês acima da média para cantar aquela metralhadora de sílabas, me enrolo todo. "Yes you could say she was attractively built… yeah yeah yeah". Difícil!
O fato é que ela não vingou para o Álbum Branco e foi ensaiada em apenas uma sessão, em 24 de janeiro, no projeto Get Back, mas nem John nem os demais, todos em seus instrumentos tradicionais, sentiram firmeza na canção nesse estágio, e ela foi para a prateleira. Mas teria a glória de integrar o famoso medley, na posição 4.
Na posição 5, viria uma canção de Paul.
Canção 5: She Came In Through The Bathroom Window
Primeira de um sprint de cinco canções de Paul que fecham o fantástico medley, ela é recebida por um 'Look out' de John ao final de Polythene Pam.
Trecho descendente da guitarra de George com o Look Out de John
A imagem de alguém entrando pela janela do banheiro é de um humor fenomenal. O movimento de invasão ocorreu. Uma das Apple Scruffs, que cercavam os Beatles, encontrou uma brecha pela escada de incêndio da casa de Paul, literalmente entrando pela janelinha, e abriu a porta da frente para as demais. Há entrevistas com a invasora, que se orgulhava do ato. Paul vinha 'cantando' essas fãs invasivas desde Fixing A Hole, dois anos antes, em Sgt.Pepper's.
Na letra, Paul dá à ocorrência outra interpretação, numa estrutura básica de verso-refrão-verso-verso-refrão. A garota seria alguém que chegou na vida do sujeito, assim, de paraquedas, pra agitar sua vida. No caso, ela, uma dançarina batalhadora e ele um oficial da polícia.
Outra interpretação doida rola: 'protected by a silver spoon' do 1º verso, a tal 'colher de prata' é equivalente ao nosso 'berço de ouro', a mulher em questão já seria rica, mas mimada pois ainda 'chupava o dedo' em 'but now she thucks her thomb and wanders', o que se encaixaria com sua esposa Linda, herdeira da família Eastman, e que teria, na ocasião, invadido o mundo de Paul, que no refrão pergunta “Didn't anybody tell her?” ... ninguém contou a ela?, e os Sundays e Mondays ao telefone seria Linda reclamando onde havia se metido!! Uau! A imaginação vai looonge!!
No Verso 2, ele volta à dançarina que trabalha muito, e emenda, sem repetir o refrão para diminuir a duração da canção por estar em um medley, o Verso 3, cuja ideia veio de uma viagem de Paul a New York, quando leu o crachá do motorista de táxi, que dizia "Eugene Quits, New York PD", e então criou o "And so I quit the Police Department and got myself a steady job", muito engraçado, e foi a deixa pra rimar com um "She could steal, but she could not rob", voltando às garotas invasoras, que teriam furtado, mas não com violência. É até uma aula de inglês, com a mesma diferença entre furto e roubo, que temos aqui.
A canção foi tentada também no Projeto Get Back, sendo ensaiada mais de 20 vezes em cinco sessões, com John num piano acústico, depois elétrico, e os demais em seus instrumentos usuais.
SCITBW do Projeto Get Back
Mesmo assim, não sentiram firmeza na canção nesse estágio, e lá se foi mais uma pra prateleira. Quase seis meses depois, e já no último mês de gravação de Abbey Road, as duas canções retornaram ao chão de fábrica assoalhado do Estúdio 2 da EMI, rumo à glória de integrarem o famoso medley, nas posições 4 e 5.
Foi no dia 25 de julho, numa tarde muito inspirada, quando John e Paul, lideraram, cada um em sua canção, seus companheiros, em 39 takes. Era John no violão 12 cordas, Paul no baixo, George na guitarra solo, e Ringo em sua bateria. Após duas horas de discussões sobre arranjo, embrenharam-se em genial sessão. Um daqueles takes foi lançado na celebração dos 50 anos de Abbey Road. Ouça aqui, e participe de uma memorável sessão. Note as falas de Paul incitando os demais a fazerem suas partes.
Take 27 inteiro com PP e SCITTBW
Entretanto, dessa feita, John não ficou satisfeito com a bateria de Ringo e pediu para melhorá-la. Paul ajudou o amigo, e Ringo passou as duas horas seguintes aperfeiçoando a tocada nos tom-tom's. No mesmo dia, de noite, a caminho da madrugada, vieram os overdubs iniciais, primeiro do vocal principal de John, acrescentando o "Yeah Yeah Yeah" entre versos, e Paul melhorando sua linha de baixo.
Mais três dias e vieram mais overdubs, com George melhorando a transição para a próxima canção em sua guitarra e Ringo acrescentado pandeiro, maracas e cowbell na canção 4,
Trecho com maracas e cowbell logo antes do fim
e a canção 5 também teve Ringo acrescentado pandeiro, maracas, algumas palmas, e também George e John refazendo suas guitarras.
Só no dia final dedicado ao medley, 30 de julho, dentre vários overdubs em várias canções, John, Paul e George acrescentaram vocais aos versos da Canção 4, e harmonias com John nos "Yeah Yeah Yeah", e também harmonizaram no refrão da Canção 5. Foi ali que John gritou aquele "Oh Look out!!" aceito de imediato como ótimo, e mantido na versão final,
O resultado final foi estonteante!
Polythene Pam e She Came In Through The Bathroom Window
PRÓXIMO CAPÌTULO falará de Golden Slumbers e Carry That Weight
Um abraço aos ouvintes da LAC Luanda Antena Comercial e até para a semana
______________________
Olá, viajantes do Submarino angolano,
Aqui é Homero Ventura direto do Brasil!
As Canções do Medley de Abbey Road – Capítulo 4
Pois bem, nos Capítulos anteriores detalhamos as Canções 1 a 5 do Medley
Este capítulo detalhará as Canções 6 e 7 do Medley, que tiveram suas bases gravadas in tandem, ou seguidas uma da outra, em 24 de julho. As duas eram composições de Paul McCartney. Vamos a elas!
Canção 6. Golden Slumbers
Trecho inicial de Golden Slumbers
A inspiração veio numa visita à casa de seu pai James, próximo a Liverpool, que Paul o presenteara já em 1964, aonde ele foi morar com sua nova esposa Angela e filha Ruth. Se ainda não sabem, Paul ficara órfão de mãe em 1956, o nome dela era Mary, a quem Paul se referiu em Let It Be ("Mother Mary comes to me"). Estava ele ao lado de sua meia-irmã, e viu uma pauta de uma canção, que ele não sabia passar para o piano (ele não sabia 'ler' música), mas viu a letra, e compôs sua própria melodia, com pequenas variações na letra aqui e lá. Ali nasceu o refrão: "Golden slumbers fill your eyes, ...." As rimas não são de Paul... já estavam lá. Depois, ele juntou um pedaço que veio à sua mente, e que tinha a ver com estar ali, tão próximo a Liverpool e criou o único verso da canção: "Once there was a way to get back homeward...." e seguiu com as duas últimas frases do refrão! Depois do refrão, na gravação, repete-se o primeiro verso. A idade da canção original, superior a 300 anos, afastou de Paul o receio de acusação de plágio de letra.
Golden Slumbers viu a luz do sol, ou melhor, do inverno londrino, no dia 7 e janeiro de 1969, quando Paul a trouxe ao Twickenham Studios como proposta para o Projeto Get Back. Só ele estava presente e cantou verso-refrão-verso-refrão-verso-refrão. No dia 9, mais ensaios, agora com Ringo, mas ele não sentiu firmeza para seguir, e lá se foi ela para a prateleira por quase seis meses.
Canção 7: Carry That Weight
Trecho inicial de Carry That Weight
Paul diz "Menino, você vai ter que carregar esse peso por muito tempo'
Na verdade, o 'menino' seria ele mesmo e cada um dos outros três Beatles, sendo o sucesso, aquele peso citado! Concorria o fato de que começavam os problemas comerciais que acabariam por levar ao fim da banda, e Paul previa que iriam durar os problemas de relacionamento!
Carry That Weight veio ao mundo no dia 6 de janeiro de 1969,no Projeto Get Back. Ela tinha alguns versos quase prontos e o refrão traduzido acima, e tinha um ritmo country-western e sua intenção era dá-la para Ringo, relembrando o sucesso que foi Act Naturally com a mesma pegada!
Paul McCartney mostra Carry That Weight para Ringo Star, jan.69
Fizeram quatro ensaios, com George no baixo e Ringo já cantando o refrão! Mas já no dia seguinte, desistiu dos versos e anexou apenas o refrão a Golden Slumbers. Só Paul estava presente e cantou verso-refrão1-verso-refrão2. No dia 9, mais ensaios, agora só com Ringo, mas ele não sentiu firmeza para seguir, e também lá se foi ela para a mesma prateleira.
Voltaram às duas canções já com a decisão de comporem um medley no último álbum da banda, já em 2 de julho. Ainda sem John, desta vez por conta do recente acidente de carro que teve com a família (John dirigia muito mal). Paul no piano, George no baixo e Ringo na bateria, fizeram 15 takes da canção, já composta com a peça seguinte do medley, Carry That Weight. Inclusive, esta última era considerada nos registros como parte de Golden Slumbers, como se fossem as duas uma só canção. O Take 15 foi um dos poucos em que o vocal de Carry That Weight foi até o fim, mas claro para ser melhorado mais tarde, para ficar do jeito que conhecemos.
Os Takes 1 a 3 foram recuperados e lançados na celebração dos 50 anos do álbum, claro, ainda sem orquestra, só a voz de Paul, o baixo de George já bem colocado, e perceba que Paul se lembra de A Fool On The Hill, nos acordes iniciais do piano.
Takes 1 a 3 Golden Slumbers / Carry That Weight
No dia seguinte, e em mais duas vezes no final do mês, Paul apenas melhorou seu vocal. Ele fazia questão de ter aquela forte e rouca emissão no refrão ("smiiiiiiles awake you when you arise ..."), até mesmo para alternar com a doce leveza da canção de ninar! Paul e Ringo adicionaram vocais no refrão de Carry That Weight, ou melhor Ringo e Paul, com mais foco na voz do baterista, obedecendo ao desejo do autor de que Ringo a cantasse. Ringo acrescentou passagens de bateria e George acrescentou uma breve guitarra amplificada num Leslie.
Já nessas sessões, os registros de Abbey Road mostravam Golden Slumbers e Carry That Weight, com status de canções separadas.
O toque de classe veio em 15 de agosto na já famosa sessão no enorme Estúdio 1, em que 5 canções de Abbey Road ganharam os arranjos orquestrais, pelas geniais mãos de George Martin, duas normais de George, e as três 'de medley' de Paul, a estas últimas sendo dedicadas três horas de gravação, com Paul atuando como produtor de suas faixas. As primeiras cordas se ouvem juntamente com a ótima nota forte do baixo de George, após "Once there was a way", e depois numa linda melodia entre frases. As notas de George são ponto alto, em todas as vezes que aparecem. As notáveis viradas de Ringo, com suaves pratos vêm no refrão.
1º minuto orquestral de Golden Slumbers / Carry That Weight
As cordas acompanham o refrão, com 12 violinos, 4 violas, 4 violoncelos e um baixo, acompanhando os refrões cantados em coro uníssono pelos quatro Beatles, sim, porque John fez questão de acrescentar o seu vocal só ali, afinal o recado da letra de Paul era pra eles 4.
Porém, o ponto alto da orquestração desta canção são os metais, primeiro tocando a melodia de um verso de You Never Give Me Your Money, que aqui funciona como uma ponte, depois acompanhando o solo de guitarra de George que veio em 31 de julho, com Ringo também acrescentou o sempre vigoroso tímpano de orquestra. Depois vem a ponte lindamente harmonizada por Paul e George "I never give you my pillow, I only send you my invitation, " , mas o mais marcante é o anúncio dos refrões a seguir, com quatro toques de todos os metais (as 4 trompas, os 3 trompetes, os 2 trombones) num compasso inesquecível...
conte mentalmente 1-2-3-4
junto dos metais Pa - - PaPaPa
e agora cante com Ringo-George-Paul-John
Boy, you're gonna carry that weight,
Trecho instrumental foco em Carry That Weight
e depois repetindo, brilhantemente.
O trio final de Paul (Golden Slumbers/Carry That Weight/The End) virou frequente presença nos shows de Paul em sua carreira solo, e eu tive a honra de ouvi-lo na primeira vez que ele a fez, na excursão em que veio ao Brasil, em 1990.
Paul não menciona isso em suas entrevistas, mas
acho que aquele tal 'peso' foi demasiado para dois deles...
John, que foi assassinado por um lunático,
e George, que morreu de câncer mas, um ano antes,
foi atacado por um invasor em sua casa, levando 10 facadas!
Enfim, venha se ninar em Golden Slumbers e profetizar em Carry That Weight
Golden Slumbers e Carry That Weight, na íntegra
______________________
Olá, viajantes do Submarino Angolano,
Aqui é Homero Ventura direto do Brasil!
As Canções do Medley de Abbey Road – Capítulo 5
Pois bem, nos Capítulos anteriores detalhamos as Canções 1 a 7 do Medley
Este capítulo detalhará as Canções 8 e 9 do Medley. As duas eram composições de Paul McCartney. Vamos a elas!
Canção 8: The End
Trecho inicial de The End
É a famosa Equação do Amor, que diz que, no final, o amor que você leva é igual ao amor que você faz!
Só que a ideia original da canção era pra ser apenas uma seção instrumental, com a bateria de Ringo e os solos de guitarra dos 3 Beatles, que terminaria ali, abruptamente, antes do famoso pianinho de Paul! Via-se o pouco que se esperava da seção pelo nome, que nos registros de estúdio se a identificava apenas por: "Ending"... Felizmente, a coisa evoluiu para o que temos hoje, espetacular, com uma letra curta mas de enorme significado.
A parte instrumental foi toda gravada no dia 23 de julho, e começou pelo convencimento de Ringo a fazer a seção solo. Não era a praia dele, não queria de jeito nenhum, foi convencido pelos demais, inclusive por George Martin, que desceu da sala de controle para orientá-lo, junto com Paul, na contagem dos compassos. Geoff Emmerick fez de tudo para captar bem o som daquele que seria o único solo da carreira de Ringo, e colocou 12 microfones um para cada item do equipamento, o que proporcionou aquele sensacional som estéreo que se ouve quando se usa fones de ouvido. Para o efeito, o produtor destinou dois canais só pra ele, olha a distinção.
Bateria isolada de The End
John e George em suas guitarras distorcidas e Paul no baixo, utilizaram um canal cada um, naquela que foi a base da canção. Antes dos 7 Takes oficiais de gravação, eles ensaiaram mais de 30 vezes. Veja como era a base ANTES de vocais, ANTES de solos de bateria, ANTES de solos de guitarra, aqui,
Base original de Ending
E era pra terminar assim!, abruptamente, sem letra!!
Felizmente, nos 12 dias seguintes, Paul teve a inspiração! E, no dia 5, a cantou, não apenas o trecho da equação mas aquele logo antes do solo de bateria em que ele pergunta, lá no alto:
Vocal inicical isolado de Paul em The End
"Oh, yeah, all right, are you gonna be in my dreams tonight?".
E no dia 7 aconteceu uma sessão histórica. Estavam todos na sala de controle, discutindo como fazer o preenchimento de 18 compassos da seção instrumental, e naturalmente, George sugeriu um solo de guitarra. John, animado, ofereceu-se para fazê-lo, com um sorrisinho. Ele gostava de solar, mas sabia ser menos habilidoso que George ou Paul. Ele brincava, mas não tanto, pois logo após sugeriu: Por que não todos nós?. Espanto geral, mas Paul achou legal, e disse que seria o primeiro, por ser o autor, e John disse que tinha uma ótima ideia para concluir. George resignou-se a ser sanduichado. E partiram para o chão de fábrica, os três.
Todos adoraram! Os três reviveram a velha camaradagem, ensaiaram, e fizeram tudo em poucos takes, num canal só, sem edições. Foram nove trechos, três cada um, na ordem combinada, Paul, George, John, verdadeiramente ao vivo, um verdadeiro show!
Duelo de guitarras 18 compassos de Paul, George, John
Ao final, sabedores de que haviam feito história mais uma vez, trocaram sorrisos, se autocumprimentando, mas claro, sem a efusão de outros tempos, sem tapinhas nas costas, muito menos abraços, o ambiente nunca mais fora o mesmo dos tempos da Beatlemania. Foi a última vez em que os três tocaram juntos, para todo o sempre.
Ainda dois movimentos foram feitos nos dias seguintes. Paul, e somente Paul, gravou aquela sucessão de "Love you, Love you, Love you..." que vem após o solo de bateria genial de Ringo e antes do solo de guitarra dos outros três gênios.
Love you love you, vocal de Paul em várias vozes
E eu ressaltei o "apenas" porque percebem-se várias vozes, mas são todas de Paul, uma por cima da outra, talvez até porque fosse difícil chamar os colegas ao estúdio, e ele morando ao lado, teve a ideia e apareceu para gravar. E, finalmente, teve a famosa sessão de 15 de agosto no enorme Estúdio 1, em que 5 canções de Abbey Road ganharam arranjos orquestrais, pelas geniais mãos de George Martin, inclusive as três últimas 'de Paul, que atuou como produtor de suas faixas, durante 3 horas!
Em The End, apenas se ouvem as maravilhosas cordas (12 violinos, 4 violas, 4 violoncelos e um baixo), no épico e apoteótico final. A espetacular conclusão, Da música, Do medley, Do Lado B, Do disco, Da carreira dos Beatles, começa com o pianinho agudo de Paul, 16 notas em dois compassos, e ele canta solo "And in the end..", e George faz um breve riff na guitarra e John e George para harmoniza com Paul o lado esquerdo da equação "...the love you take..." e logo depois seu complemento "is equal to the love", em que Ringo muda o tempo da canção, de 4/4 para 6/8, e juntamente com este último "love", o staccato do piano se transforma em acordes melódicos e entra a orquestra, e vem Ringo em ótima virada, e Paul termina cantando solo a equação que criou, "you make", e voltam os três juntos harmonizando os "A-AAAAA",
Vocais isolados de Paul, George e John
acompanhados da orquestra e de outro lindo riff de guitarra de George.
Riff final de George em The End
Estava concluída, decifrada, resolvida, a linda Equação de Amor, resolvida pelo MateMúsico Paul McCartney. E somente no final de tudo, a canção ganhou seu nome: The End!
Só que ela não foi THE END
A travessura de um técnico de estúdio impediu que o ÚLTIMO LP gravado pelos Beatles tivesse como ÚLTIMA canção do disco uma canção chamada THE END. Seria lindo, majestoso, mas aí apareceu uma certa majestade travessa... . E surgiu no disco a
Canção 9: Her Majesty
Trecho, ou melhor, 100% de Her Majesty
Her Majesty (com J) surgiu à mente de Paul em seu retiro de Mull of Kintire, na Escócia, apenas um único verso, que compôs ao violão. Ele a ensaiou em janeiro, para o Projeto Get Back, sozinho no dia 9, e depois com Ringo, e John numa guitarra havaiana, no dia 24. Pela falta de substância para uma canção 'inteira', deixou-a na prateleira, para ressurgir para a vida em maio, quando se decidiu montar o medley, e ela se encaixou perfeitamente no novo projeto, do jeitinho que ela estava. E foi gravada logo no segundo dia de maratona final de Abbey Road, em 2 de julho. E assim, foi muito rápido, apenas Paul estava presente, apenas Paul era necessário, ele e seu violão, apenas três takes, ao longo de uma hora,
Três Takes de Her Majesty
O ‘com J ‘ que eu disse ali em cima foram por causa de um pobre novato operador de fita encarregado da gravação naquele dia. Estava nervoso, porque foi chamado a trabalhar com os Beatles, de repente, e corria a fama de que o ambiente não estava bom, e quando Paul lhe disse o título da canção, deu um branco e teve que perguntar como se soletrava. Com J!
Mas a história mais importante dessa canção de menos de meio minuto, 23 segundos, pra ser mais exato, é a colocação dela no LP. A ideia original era que fizesse parte do medley, posicionando-se entre Mean Mr. Mustard e Polythene Pam, duas canções de John, porque a primeira falava que a irmã de Mr. Mustard o levava para ver a Rainha, razoável motivação, mas musicalmente não se encaixou bem, e acabaria sendo descartada, inclusive levando com ela um resto de acorde de violão de Mean Mr. Mustard. Errado, mas mantido, para nossa alegria.
Colocação original de Her Majesty no Medley
Ocorre que um certo operador de fita, chamado Kurlander, não obedeceu a ordem de descarte, e lembrou uma orientação da EMI de que nada Beatle se jogava fora! E, na calada da noite, e já após as capas dos LPs já estarem impressas, recolocou-a no final de The End, após um silêncio de 14 segundos. Então, os que compraram o LP em sua primeira tiragem, ouviram, e ficaram embasbacados com o que acabaram de ouvir, aquele medley maravilhoso, estáticos, paralisados, perceberam que o disco voltava a tocar, uma canção que não estava listada!!! E não entenderam nada! Mas gostaram, claro. E se ouviram em fones de ouvido, adoraram perceber o som da canção passeando na cabeça de um ouvido para o outro e de volta… Brilhante!
E então, finalizamos os 5 Capítulos da história do medley, que ouviremos agora, na íntegra!!!
O Medley, na íntegra
______________________
UFA!