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Rock Parceria e Poesia
Uma conversa sobre a Parceria Lennon/McCartney
Parte 1
Entra Ave Maria, de Schubert

Segue Ave Maria, de Schubert
Esta parceria começou graças a um desprendimento de John, claro que associado a uma visão de futuro privilegiada. John, em sua costumeira modéstia, desde pequeno sabia que seria grande. Sempre foi o líder dos grupos em que se metia, para o bem ou para o mal. E líder ele era dos Quarrymen, uma banda de adolescentes ingleses que tocavam rock e skiffle em vários lugares de Liverpool, inclusive em pátios de igrejas.
Entra o primeiro áudio dos Quarrymen
E foi num pátio de igreja, na tarde de 6 julho de 1957, que ele foi apresentado a Paul por um amigo comum (de nome Ivan Vaughn, a quem nós, amantes dos Beatles, agradecemos imensamente).
Entra Twenty Flight Rock de Eddie Cochran
Paul mostrou na guitarra seu conhecimento sobre o rock americano e John se impressionou por Twenty Flight Rock ... ele sabia todos os acordes e todas as letras e cantou também trechos de composições suas.
De imediato, John percebeu que estava diante de um igual. Nas 24 horas seguintes, ficou matutando, com seu imensurável ego, o dilema de continuar como estrela solitária, ou deixar seu brilho ser ofuscado pela presença de um outro talento no grupo.
Quiseram os deuses do rock que ele optasse pela última, e assim criou-se a semente do sucesso dos Beatles.
Entra Something, de George Harrison
Depois, em 8 de fevereiro de 1958, Paul trouxe George Harrison. E, por último, chegou Ringo Starr,
Entra Octopus's Garden, de Ringo Starr.
... em 18 de agosto de 1962, já nas vésperas da gravação do 1º disco.
O resto é história... um pouco da qual, conto aqui!
Antes, um aparte sobre Ivan Vaughn
Entra Michelle,
Ivan era amigo de infância de John e colega de Paul, e tocava aquele escorredor de roupa do skiffle no Quarrymen, mas não era sempre. Os dois Beatles nunca se esqueceram dele, inclusive o colocaram na folha de pagamento da Apple por algum tempo, num projeto que não foi adiante. Outra ligação de Ivan com os Beatles foi por sua esposa Jan, professora de Francês, que foi contratada para sentar-se com Paul e John para ajudar nas partes no idioma francês da canção Michelle, de Rubber Soul, em 65, especialmente a rima para Michelle ... Ma belle... veio dela... não foi pouco, não... Ivan era nascido no mesmo dia/mês/ano de Paul e morreu cedo, aos 51 anos, de pneumonia.
John e Paul começaram a compor juntos e logo viram que, apesar dos estilos diferentes, a afinidade era grande. Tanta que chegaram logo cedo a um acordo de parceria: fosse John ou Paul o verdadeiro autor de uma canção, a autoria oficial seria declarada como de Lennon/McCartney. No começo, Paul tentou sugerir uma ordem diferente, algumas canções chegaram a ser registradas como McCartney/Lennon, mas a liderança de John acabou prevalecendo. A ordem inversa durou até o 2º single, com Please Please Me e Ask Me Why.
Entra Love Me Do,
Voltando um pouco... A primeira Lennon/McCartney que veio ao mundo, ainda na ordem inversa dos compositores, foi a 1ª lançada pelos Beatles, Love Me Do, mas ela era uma canção mais de Paul. A primeira que compuseram efetivamente juntos, de fato, foi I Saw Her Standing There, que abre o 1º LP, Please Please Me. A ideia da canção era de Paul, que começava com: Well she was just seventeen... mas ele ficou encalacrado já com a rima, já nesta 1ª linha, pois a ideia dele era ... never been a beauty queen... não gostava de jeito nenhum, então buscou ajuda ao recente parceiro, e John veio com a DEFINITIVA e ESPETACULAR .... and you know what I mean... e foi muitas vezes assim, um vinha com a ideia, o outro complementava.
Este tipo de acordo foi repetido por inúmeras duplas famosas,
Jagger/ Richards...
Entra Satisfaction, de Jagger/Richards
... mas Paul e John ajudaram logo no começo. Conta a história que, num encontro com Mick e Keith, eles perguntaram a John e Paul se não tinham nenhuma canção sobrando, então um olhou pro outro e disseram: "Chama a gente pro estúdio!" Diz a lenda que os dois se retiraram do ambiente por 10 minutos e, ao retornarem, entregaram a Mick aquela que seria o primeiro sucesso dos Rolling Stones: I Wanna Be Your Man.
Claro que a canção está longe de ser uma obra-prima, ela não tem mais que 20 palavras ma letra, e nem poderia se exigir mais. Ringo gravou a canção em With The Beatles e a cantou em dezenas de shows.
Entra Quero que Vá Tudo Pro Inferno de Roberto e Erasmo Carlos.
Deste lado do Atlântico, teve outra parceria desse estilo, um faz a canção, o outro assina junto, a nossa tupiniquim Roberto e Erasmo Carlos, recentemente desfeita, com a passagem deste último para o andar de cima.
Mas, voltando ao início, novamente. Os dois amigos tinham uma capacidade para compor invejável. Inúmeros canções foram feitas olho no olho, em quartos de hoteis, em viagens daquele começo insano. Um belo exemplo foi From Me To You...
Entra From Me To You
Quer outra dos hotéis? Paul veio com She loves you.... John respondeu Yeah...Yeah...Yeah, SIMPLES E BRILHANTE!
Entra A Hard Day's Night,
Em outro episódio, à época da filmagem de seu primeiro longa-metragem, deram outra mostra dessa capacidade. O filme tinha o título baseado num suspiro de Ringo Starr após um dia intenso de filmagens, ele disse: Well, it's been hard day...’" e quando viu que era noite, complementou " 's night! Os produtores ainda tinham título. John falou o tradicional: É esse, deixa comigo! …. E foi para casa. Na manhã seguinte, mostrou o que tinha conseguido a Paul, que cantou o a ponte “When I’m home, everything seems to be right …”. pois ele, John, não conseguia cantar tão alto E entregaram A Hard Day’s Night, aquela que seria um de seus maiores sucessos. A canção abre o Lp de mesmo nome, a melhor abertura de todos os tempos, que choca o mundo com aquele acorde intrigante, que leva todas as notas em sua descrição, menos o MI
Entra o acorde inicial de A Hard Day's Night
Lennon/McCartney assinam todas as canções de A Hard Day's Night, após dois LPs em que mesclavam com covers de artistas americanos
Quer mais um episódio (há dezenas deles): Paul conta que sonhou com a melodia de Yesterday, acordou, e achou tão linda que duvidou da própria arte, e foi conferir, com John, com George, com o outro George, o Martin, até que se convenceu que era uma McCartney original, e foi buscar a letra. Ocorre que, a única coisa que lhe vinha à mente, ao invés do famoso “Yes-ter-day .... All my troubles seemed so far way ” não, ainda não era isso, era “Scram-bled-eggs .. oh my darling how I like your legs....”. Claro que, rapidamente, ele colocou uma letra mais apropriada e concluiu aquela que seria a canção mais re-gravada de todos os tempos. Nesta última, John pouco contribuiu, parece que a única contribuição foi que ela tivesse nome único, o que não deixou de ser uma fundamental sugestão!
Aquele acordo de parceria fez com que muitos pensassem que todas as canções com o rótulo Lennon/ McCartney fossem compostas sempre por John e por Paul em um trabalho conjunto. Isso, na verdade, somente aconteceu nos primeiros anos da dupla e mesmo assim, somente em algumas poucas canções como She Loves You, I Wanna Hold Your Hand, From Me To You, Do You Want To Know A Secret?, Please, Please Me, This Boy e outras), e uma ou outra quando estavam mais maduros (With a Little Help From My Friends e A Day in The Life).
Entra With a Little Help From My Friends
Nas demais, o trabalho é mais de 3/4 individual, e chega o outro e dava um palpite num verso aqui, uma ponte ali uma sugestão de rima ou harmonia acolá. Havia uma disputa saudável entre os dois: um usava o outro como estímulo para compor cada vez mais e melhor e não ficar para trás na preferência dos fãs.
Uma característica de qualidade da dupla é que, com exceção de duas canções logo no início da carreira, eles nunca mais compuseram canções com versos repetidos na base, quer dizer, um verso ou outro poderia ser repetido mas somente após uma ponte, ou um refrão, como finalização da canção.
Outra pausa para Estrutura Musical...
Versos, em composição musical, são aqueles conjuntos de duas ou mais frases que fazem a narrativa principal logo no início. Um 2º verso complementa a história. Normalmente vem uma ponte ou um refrão depois de dois versos. Um bom exemplo de versos, que contam a narrativa está em No Reply. Os verso vêm mornos,
This happened once before
When I came to your door, no reply
They said it wasn't you
But I saw you peep through your window
I saw the light I saw the light
E Ponte? Ponte é um elemento de ligação, como toda boa ponte, entre um verso e outro ou entre verso e refrão. Normalmente, a ponte aumenta a tensão do clima, quando os versos são mais mornos, ou diminui a tensão quando os versos são mais intensos. Na mesma No Reply, logo depois do Verso 1, tem outro verso e vem a Ponte, ameaçadora:
If I were you, I'd realize that I
Love you more than any other guy
And I'll forgive the lies that I
Heard before, when you gave me no reply
Bem, ainda sobre estrutura, tem os Refrões, você já deve saber o que é, chamamos aqui também de estribilho ou coro, é aquela normalmente mais curtinha, vibrante, que cola no ouvido, uma mensagem forte, normalmente com o título da canção
Entra She Loves You
Entra Can't Buy Me Love
Entra Ticket To Ride
Entra You've Got To Hide Your Love Away
Entra Yellow Submarine
Interessante que Refrões são muito mais conhecidos que Pontes, mas não eram primordiais para Lennon/McCartney! Mais da metade das canções têm apenas Versos e Pontes.
Em tempo, George Harrison bebeu daquela fonte, integralrmente, apendeu com os maiorais e em nenhuma de suas composições ele repete Versos. O mesmo para Ringo Starr, em todas as suas DUAS composições na época dos Beatles.
Em tempo (2), as duas canções que repetem versos no início da carreira foram Love Me Do e Do You Want To Know A Secret, pode reparar, um único verso é repetido duas vezes, se bem que esta última tinha uma peça estrutural diferente, uma introdução fenomenal
Entra Do You Want To Know A Secret
Nas próximas semanas mais sobre a Parceria Lennon McCartney!
Um abraço para os ouvintes do Submarino Angolano,
na rádio LAC - Luanda Antena Comercial
ATÉ PARA A SEMANA!!!
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Brilhante como sempre.Parabéns pela excelência do conteúdo.
ResponderExcluirO comentário acima é meu!!!
ResponderExcluirLeila Fischer
Aguardando a próxima semana.
ResponderExcluirDivulgando para os admiradores dos Beatles e de suas postagens
Comentário de Gilda Maria Rolim
ResponderExcluirVocê foi claro na explicação sobre versos e pontes. Conseguiu selecionar bem o que mostrar da dupla. Eu nunca tinha percebido que não repetiam os versos.
ResponderExcluirAqui é especulação minha. Penso que o motivo de optarem por apenas Lennon/McCartney foi por soar melhor que McCartney/Lennon. Não tinham como seguir a ordem convencional, porque os dois compunham letra e musica. Nos Estados Unidos havia, não sei se ainda existe, uma ordem certa para os nomes. Letristas na frente. E o nome do compositor da melodia viria no final. Hal David/Burt Bacharach, por exemplo. Se bem que, ocasionalmente, trocavam a posição. Ex: Rogers/Hart. Era Hart quem fazia as letras. No Brasil era sempre assim. Baden Powell/Vinicius de Morais. Isso queria dizer que Vinicius tinha composto a letra. Nada tem a ver com dar maior importância ao nome que vem primeiro. E não interfere em nada, pois Bacharach, mesmo como o nome em segundo lugar, é muito mais conhecido que Hal David. Porém, Paul e John compunham melodias e escreviam letras. Quebraram esta regra. Criaram um tipo novo de parceria, com os dois dando sugestões tanto na letra quanto na melodia.
E tem aquela história que, quando começaram a compor juntos, ao terminarem, Paul escrevia: “Mais um original Lennon/McCartney”. Então, começaram. muito antes do sucesso, com o nome de John em primeiro lugar. A mudança veio foi depois de começarem a gravar. Não pegou bem. Tinha mesmo de ser uma ordem única. Eles diziam que queriam ficar tão famosos quanto Rodgers/Hammerstein. E nunca ouvimos nada de Hemmerstein/Rogers. Para pegar, tinham de escolher uma das formas de colocar seus nomes. Tinha de ser Lennon/McCartney. Parece-me que o nome de mais sílabas fica melhor depois do nome de apenas duas sílabas.
Ivan Vaughan. Que figura. O carinha que apresentou Paul para John. Tinha de estar no texto. Merece nossa gratidão eterna. Olha, eu fiquei sabendo que estava à cargo dele a criação da escola Apple. Seria uma escola com uma filosofia hippie! Eles sonharam com isso. Escola para crianças. Os Beatles entrando na área da educação.
Ele era professor em Liverpool e começou a trabalhar nisso. Parece que não deixou nada escrito, pelo menos nada nunca foi publicado. Vou até ver por ai se tem alguma coisa. Tenho muita vontade de saber como funcionaria essa escola.
Claro que um dos pontos altos foi você cantando com eles. rs rs rs. Fica ótimo. A gente entra na sua vibração, e sente sua entrega ao texto com total paixão pela causa. E o que acontece quando ouvimos? Cantamos também! Eu, pelo menos, faço isso.
Eu li em algum lugar que John teria sugerido o título para “Yesterday”. Agora fiquei sabendo que ele apenas disse que deveria ser uma única palavra. E não necessariamente Yesterday.
Eye ball to eye ball... Tinham de ter registrado isso. Ainda bem que tivemos a chance de ver um desses momentos mágicos da dupla funcionando. Está no “Get Back”. Ali, naquela improvisação de Paul sobre a Commonwealth. John tocando. Pois, de repente, responde um “Yes” mais engraçado do mundo na hora certa. Paul prende o riso e segue. Na letra, diz que “It’s much to wealthy for me.” John, sem interromper, joga outra frase, much too commom for me, querendo dizer que ficaria melhor que a usada por Paul. Ele joga assim, do nada, sem fazer pausa alguma. Na repetição, Paul já usa a frase de John. John sugeriu, ele aceitou, sem falar nada. Apenas acatou a sugestão. Foi lindo demais. Que privilégio ver Lennon/MacCartney em ação.
Bom saber que vai continuar com Lennon/McCartney. É um tema muito rico.
Comentário de Virginia Abreu de Paula.
Dear Homero, os ingleses realmente precisam descobrir essas coisas incríveis que você escreve...Quem vai traduzir pra eles? Não é justo que eles fiquem por fora...Está pra nascer no planeta outra parceria dessa magnitude...I'm still under your spell...It won't belong...Good morning, Good morning...Dyll
ResponderExcluirE um roteiro de teatro, com texto claro, excitante e fundos musicais definidos. Parabéns, Homerix!
ResponderExcluirMuito bom Homero. Sempre aprendo uma novidade linguística no seu blog, com a vantagem de conhecer esta fantástica história dos Beatles. E o fato do Paul só conseguir encaixar na melodia de Yesterday, “Scram-bled-eggs .. oh my darling how I like your legs....”. É sensacional . Vai ser difícil escuta-lá sem lembrar disso. Forte abraço. Roberto Bazolli
ResponderExcluirMaravilha!! Caprichou e os comentários da Virgínia deram um grande finale!! Abrs.Gerson
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