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domingo, 28 de abril de 2024

No dia seguinte, ninguém morreu.

Em uma reunião hoje pela manhã 
alguém disse sobre a possibilidade de as pessoas viverem para sempre, 
ainda no campo carnal,
imaginavam como seria problemático ter lugar pra todo mundo, 
então, claro, lembrei-me deste livro

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O título desta postagem  é a frase inicial de mais um espetacular livro de José Saramago.

'As Intermitências da Morte' é o seu nome.

Que (sara)mago das idéias e das palavras!!!!

Imagina o mestre como seria se a morte desse um descanso, e ambienta o fenômeno em uma monarquia com dez milhões de súditos, fronteiriça a três países, sem passagem para o mar, como se de repente, as pessoas daquele país, e somente daquele reino, parassem de morrer... E imagina as conseqüências que isso provocaria, nas casas funerárias, nos hospitais, na igreja, nas casas das pessoas que receberiam os moribundos que sobrassem dos hospitais, nas contas pecuniárias do governo, num Estado com um rei eterno, e mesmo no sub-mundo do crime, que certamente se aproveitaria da situação para faturar ainda mais!

E explica-nos a situação com seu estilo todo saramágico de escrever. Aliás, nos brindou nesse livro com uma descrição do seu estilo, de próprio punho, apensa a uma reportagem sobre uma carta escrita pela personagem principal do livro. Da carta, critica-se a caligrafia dispersa, mas

"como um defeito menor à vista de sua sintaxe caótica, da ausência de pontos finais, do não uso de parêntesis absolutamente necessários, da eliminação obsessiva dos parágrafos, da virgulação aos saltinhos, e, pecado sem perdão, da intencional e quase diabólica abolição da letra maiúscula...".
Bem, para qualificar melhor a 'confissão' do autor, a ausência não é apenas de pontos finais, e sim de qualquer outra pontuação que não seja o ponto ou a vírgula, afinal não encontrarás quaisquer pontos de interrogação, de exclamação, nem um mero dois pontos muito menos o simpático ponto e vírgula. E acresceria que a obsessão com a eliminação de parágrafos causa a criação de alguns daqueles entes com duas, três, até quatro páginas, num fôlego só, meandrando diálogos separados por meras vírgulas, causando em alguns momentos a necessidade de se relê-los inteiros para uma melhor percepção de sua idéia. E finalmente, informaria que não apenas as maiúsculas iniciais são eliminadas dos nomes próprios, mas também os números em si, destinados a aparecerem no texto apenas em suas descrições por extenso...

Brilhante!

Como também foi brilhante e emocionante a guinada no texto, em seu quarto final, quando parecia que a coisa fora solucionada, mas é retomada a todo vapor. Incrível como um livro que já estava maravilhoso, consegue ficar ainda melhor. Nesses últimos e surpreendentes capítulos, ele apresenta uma singela, ao mesmo tempo enorme homenagem à música, sua profundidade, sua extensão, seu poder de mudar o mundo. Emociona a relação de um homem com seu cão, de um músico com seu instrumento, de um solitário com sua solidão. Impressionou-me a passagem abaixo ...

"O homem moveu-se, talvez sonhasse, talvez continuasse a tocar as três peças de schumann e lhe tivesse saído uma nota falsa, um violoncelo não é como um piano, o piano tem as notas sempre nos mesmos sítios, debaixo de cada tecla, ao passo que o violoncelo as dispersa a todo o comprido das cordas, é preciso ir lá buscá-las, fixá-las, acertar no ponto exacto, mover o arco com a justa inclinação e com a justa pressão, nada mais fácil, por conseguinte, que errar uma ou duas notas quando se está a dormir."
.... em que descreve, de forma clara, a dificuldade, que eu sempre admirei, que é exprimir-se em um instrumento de cordas sem a providencial ajuda dos trastes, que delimitam os tons, como nos violões.
E só pra terminar, termino dizendo que o livro termina com uma frase terminal que me deixou terminantenmente arrepiado durante vários intermináveis minutos...

Agora entendo a declaração de Felipe ao recomendar o livro a mim: "Quando terminei, deu vontade de abraçar Saramago!".

Junto-me a ele nessa vontade.

Infelizmente, à época de sua recomendação, ainda poder-se-ia fazê-lo fisicamente, abraçar o escritor pessoalmente.

Agora, só quando nos encontrarmos no nosso lar...... se ele já não tiver voltado...

Um adeus nada violeta pra vocês (pra entender, só lendo o livro...)

Homero Doido Para Ler Mais Saramago Ventura

domingo, 21 de abril de 2024

Vinte e Uns de Abril

Nesta época, todo ano me lembro de um  post meu de 12 anos atrás em que falo de um acúmulo de feriados 'por esses dias'.  Normalmente,  são 'pontes' em profusão, como se chama corporativamente o dia de trabalho enforcado entre um e outro feriado ou domingo, uma 'festa' para a improdutividade... Neste 2024, um deles caiu em um domingo, diminuindo a festa.

Na época de pandemia, tanto fez se era feriado ou não, já estava todo mundo em casa, ou deveria estar, quem pôde, enfim, mas as datas foram celebradas, claro.

Bem, voltemos!

Sobre o primeiro daqueles 'uns' do título, em anos normais, ele tinha dois motivos que sempre me marcaram. O 21 de abril de minha infância ficou marcado pela imagem de um dentista heróico sendo enforcado e esquartejado pela Corte Portuguesa, e tendo suas partes espalhadas pela cidade e sua cabeça barbuda fincada num poste. Até hoje, a imagem impressiona!

O 21 de abril adulto veio quando conheci minha primeira e única futura sogra, que faria anos hoje, e que eu celebrei durante quase 40 anos. Neste ano, ela faria a bonita idade de 102 anos, sendo 55 de dedicação a um filho doente. Agora, ela está em outro plano. A data do documento dela era 22 de abril, mas sempre celebramos junto do Tiradentes. E sempre recebemos, comovidos, mensagens de amigos que se lembram dela, uma heroína! Obrigado!

De qualquer modo, ela deve ainda gostar de ouvir música. 
Portanto, maestro, Música Pra Vovó!!! 
http://blogdohomerix.blogspot.com/2011/01/musica-para-vovo.html

A data também celebra, desde 1961, o aniversário da capital federal, Brasília, magnificamente projetada por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa, na forma de um avião, em que a cabine de comando une os três poderes, que deveriam trabalhar juntos mas independentes, mas hoje em dia sendo vilipendiados...

E, lá do outro lado do Atlântico, a Rainha da Inglaterra completaria 98 anos hoje, mas se foi em 2022, depois de ter trabalhado com 16 Primeiros Ministros, e conhecido 13 presidentes americanos, tendo presenciado o início e o fim de guerras (infelizmente se foi antes de ver o fim desta insanidade no Leste Europeu), tendo presenciado o início e o fim dos Beatles (não viu o fim dos Stones), e passado ao largo de quaisquer pandemias, e sobrevivido até a um obituário equivocado da Folha de São Paulo nesta mesma época dois anos atrás).

Eu, na minha condição de beatlemaníaco explícito, jamais poderia deixar de celebrar também um 21 de abril muito especial. Foi em 1990, foi no Maracanã, e EU ESTAVA LÁ!   Sim, no 1º show de Paul McCartney no Brasil, que garantiu a ele um lugar no livro dos recordes, com 184 mil pagantes num show de artista solo!!!

O segundo dos 'uns' também vem da infância, e vem um uma rima histórica: no ano 1500, em 22 de abril, Pedro Álvares Cabral 'descobriu' o Brasil. Ele e os portugueses que lhe seguiram nos impuseram uma colonização de exploração, expatriando nossas riquezas por séculos a fio, que rima com Brasil e Abril. Mas fora isso, fizeram um bom trabalho expandindo nossas fronteiras e criando este país continental e varonil, que rima com os outros três em nosso céu cor de anil. Em tempo, esse dia nunca foi feriado, nunca entendi o porquê! Nos Estados Unidos e outros países latinoamericanos, é celebrado o Columbus Day, o famoso 12 de outubro (a descoberta se deu em 1492), que aqui também é feriado, por outro motivo. As aspas ali de cima são porque, hoje em dia, se contesta esse 'descobrimento', já que aqui quando chegaram, encontraram os índios, digo, indígenas. Pode ser que a data seja até modificada para 'invasão'.

E o terceiro 'um' também é feriado, mas só aqui no estado do Rio de Janeiro, que tem São Jorge como padroeiro, e em uns poucos outros estados. Sinceramente, muito respeito pela devoção, mas não dá pra admitir que se deixe de trabalhar mais um dia por causa disso. Coisa de deputado estadual vagabundo, assim como a corja que o aprovou, comandados por pai e filho que foram investigados e presos. Um deles até já morreu.

E 22 também é o Dia da Terra, sim, o Terra Planeta, instituído pela ONU em 2009 pela preservação de nosso astro natal.

O Santo Guerreiro, que também é venerado na umbanda, como Ogum, padroeiro de cidades, como Moscou, Barcelona e Beirute, e países, como Inglaterra, Etiópia Geórgia, e, claro, Portugal, o país que a inspiração também dos outros dois Vinte e Uns.

Eu poderia incluir nas vizinhanças também o Dia do Índio, digo, do Indígena mas ...
o problema é o seguinte: 
19 não é 20 (hehehe). 
... então não se encaixa nos Vinte e Uns.

Vamos ficando por aqui!

Um abraço

Homerix Celebrando o Feriadão Ventura

sexta-feira, 19 de abril de 2024

83 Anos do Cabeludo e Sem Meião


Há quase18 anos, escrevi este texto sobre o Rei...
Estávamos em 2006, logo após a Copa da França,
onde o Roberto Carlos careca fez aquele papelão..
Na era pré-blog, os textos eram looongos...
Hoje, aniversário do Rei, hora de relembrar!!
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A referência do título distingue um do outro. Aquele, o careca depilado que estava arrumando o meião quando mais precisávamos dele, aquele que aprendemos a odiar nos campos sem concentração alemães. Este, o que ficou por aqui, desperta variadas emoções em milhões de brasileiros, da idolatria à indiferença, da admiração ao desprezo, mas nunca, penso, despertou o ódio. Desde que comandava aquelas doces tardes de domingo, vem participando da vida musical brasileira, com menos ou mais intensidade, mas sempre com presença marcante, ostentando a alcunha que lhe deram logo cedo! Décadas se vão desde que subiu ao trono, mas ainda nenhum aventureiro lançou mão.
                        Esse papo todo aí de cima foi somente para introduzir o artista do qual falarei a seguir. Ele mesmo, o Rei, Roberto Carlos. Alguns falarão: pô, cara, logo você, beatlemaníaco e amante de rock progressivo e clássico, entoando odes a Roberto? E eu digo: por que não? O cara tem o seu valor. Naquela sua fala mansa, ele vem dando seu recado há mais de 50 anos, com competência. E aquela voz melodiosa é imbatível!
                        O foco da minha fala é a caixa Anos 70 da coleção lançada em 2005, com a carreira de Roberto Carlos até 1979. Não sei se sabem: quase 40 anos de carreira, divididos em 5 caixas, Anos 60, 70, 80, 90, e uma com a carreira internacional, discos remasterizados, muitos deles pela primeira vez em CD, envolvidos em capinhas que reproduzem fielmente as capas dos LPs, com letras, o que não havia nos primeiros discos. Em boa hora, resolveram fazer esta compilação, já que a primeira década do novo milênio parece ter encontrado a inspiração real em baixa, dificilmente haverá material suficiente para uma sexta caixa. Comprei a dos Anos 60, louco que estava por reviver aqueles bons tempos, em que grudava meus olhos infantis nas dominicais tardes da TV Record, para admirar aqueles que foram meus primeiros ídolos brasileiros, que estavam logo ali, a 60 km da minha praiana Santos, bem mais próximos que aqueles outros, de Liverpool, lá do outro lado do Atlântico.
                        A caixa dos Anos 70 foi presente de aniversário, lá se vão 10 meses. Como andava meio viciado em ouvir notícias no carro, não evoluí muito na esfera musical, só aproveitava a hora da Voz do Brasil (“Em Brasília, 19 horas!”), já falei sobre isso antes. Agora, recentemente, com o hilário eleitoral, aumentou sobremaneira o tempo dedicado à música e comecei então a ouvir os discos que ganhara de presente. E, gostei do que ouvi, fora algumas exceções.
                        Começo tentando transcrever um possível diálogo entre fanáticos por Roberto que, se ninguém explicar, parece conversa de loucos: “- Cara, ouvi o disco Roberto Carlos e está sensacional”, ao que um outro retruca: “Eu também ouvi, mas prefiro o disco Roberto Carlos!”, quando então entra um terceiro fã, e diz:”Que nada, vocês estão doidos, o melhor mesmo é o disco Roberto Carlos!”. Pois é, fica difícil distingui-los pelo nome, já que o Rei optou por nomear TODOS (são pouquíssimas as exceções) os seus discos com o seu próprio nome, não sei se por absoluta convicção, ou pela dificuldade de destacar alguma das canções, galgando-a à condição de canção-título, ou ainda pela falta de um tema que unisse algumas canções o suficiente para nomear o disco todo. Que nada, acho que foi mesmo por teimosia, ou superstição, afinal ele é o supersticioso mais famoso destas plagas: “Comecei assim, deu certo, não mudo uma vírgula!”. Ah, e se quiserem referir-se às capas, nada feito: TODOS os discos estampam a foto de sua majestade, sob os mais variados ângulos. O jeito, então, é referir-se ao ano em que foram lançados.
                        Não vou expressar a opinião disco a disco, para não encher a paciência, o plano é dar uma linha geral, comportamental, melódica, estrutural. Começo logo quebrando a promessa, falando do primeiro disco da caixa (1970), não que ele seja nada de especial. Apenas porque marca um espécie de transição entre o rapaz, líder da juventude, com mensagens rebeldes, que cantava rock, com uma voz forçadamente anasalada, falava sobre a garota papo-firme e entrava na Rua Augusta a 120 por hora, querendo que tudo fosse para o inferno, na década de 60, e o homem, quase aos 30, mais intimista e solitário, com declarações românticas, que entoava baladas, com uma voz naturalmente macia, falava sobre (e para) a mulher e procurava um lugar além do horizonte da década de 70. Sintomaticamente, na canção “120... 150 ... 200 km Por Hora70 ele foge do passado, na última menção a velocidade  em sua obra.
                        Os discos da caixa têm, em sua maioria, 12 canções, das quais entre 5 e 7 da dupla Roberto e Erasmo Carlos. Como é sabido, num certo momento a dupla adotou a mesma estratégia de Lennon e McCartney. Todas as canções de um e de outro seriam lançadas como composições da dupla, sendo que no caso beatle, os dois se beneficiaram mutuamente, pois eram iguais, o que não acontece com a dupla tupiniquim. Então, nos discos de Roberto, as canções Roberto/Erasmo são predominantemente só dele, com algumas sugestões do amigo. E, de um modo geral, são muito superiores às canções de outros compositores convidados. Com honrosas exceções, de que falarei mais adiante.
                        Não vou falar só bem, claro, paro um pouco a exaltação para comentar sobre letras. Não vou falar exatamente mal, apenas ressaltar um aspecto um pouco negativo de sua composição: Há muitos versos simples, e rimas pobres! Não sei se lembram, lá do ’ginásio’, rimas pobres são aquelas que rimam palavras de mesma classe gramatical, substantivo com substantivo, adjetivo com adjetivo, verbo com verbo. Então, nas letras do Rei encontrarão uma profusão de “passando” com “caminhando”, “momento” com “pensamento”, “amou” com “sonhou” e “falou”, enfim. Não que isto prejudique a mensagem, ou a linha melódica, é que, às vezes, choca; acho que ele não investia muito tempo para procurar algo melhor. E, na verdade, às vezes não dá pra escapar. Até mesmo o grande Chico, que conseguiu fazer uma letra só rimando proparoxítonas (rimas esdrúxulas) em sua obra-prima ‘Construção71, teve que apelar para a rima pobre, em diversas ocasiões. Não seria justo exigir versos decassílabos perfeitos (como mencionou Caetano em sua genial ‘O Quereres84) de um poeta popular. Não vamos crucificar o Rei por esses, como direi, detalhes tão pequenos .....
                        Aliás, aproveitando o gancho, logo no disco seguinte, em 1971, Roberto lançou aquela que seria, na minha modesta opinião, sua “masterpiece” romântica: “Detalhes tão pequenos de nós dois são coisas muito grandes pra esquecer e a toda hora vão estar presentes, você vai ver!”. Que hino! Alguns poderão classificar ‘Detalhes71 como um primor da “corno music”, mas não fica claro em lugar nenhum que a amada o abandonou por outro. E é uma sucessão de pragas rogadas pra ela nunca se esquecer dele, como em “antes de dormir você procura o meu retrato, mas na moldura não sou eu que lhe sorri, mas você vê o meu sorriso mesmo assim e até nesse momento você vai lembrar de mim”. Naquele mesmo disco, ele abria ‘Traumas71 com uma declaração chocante: “Meu pai um dia me falou pra que eu nunca mentisse, mas ele se esqueceu de dizer a verdade!”. A mesma citação foi relançada, com grande repercussão, pelos Titãs, na década seguinte, em declamação na magnífica ‘32 Dentes89.                       
                     Como já mencionado, os títulos dos discos não eram lá muito imaginativos. Entretanto, o disco de 1974 poderia ter sido considerado um “Concept Album“, com o título de ‘Férias Conjugais’ ou ‘Dando um Tempo’, ao menos no conjunto das 6 composições de Roberto ali presentes. Senão, vejamos:

1.   Em ‘Despedida’, ele vai embora dizendo: “Só me resta agora dizer adeus, e depois o meu caminho seguir”;
2.  Ela foi acompanhando-o, então, até ‘A Estação’ onde “ela sorriu, me olhou nos olhos, me beijou, depois saiu, .... me acenou mais um adeus depois seguiu”;
3.   Já só, ele se arrepende em ‘Você’, dizendo “Você, que eu não encontro mais, os beijos que já não lhe dou, fui tanto pra você e hoje nada sou”;
4.    Depois, percebe que ‘É Preciso Saber Viver’ e partir pra outra
5.   E, em ‘Eu Quero Apenas’, adota uma vida frugal, querendo apenas “.. olhar os campos, ... cantar meu canto .... ter um milhão de amigos...”.
6.   Mas depois de algum tempo, se cansa de tudo,  sente saudade da vida antiga (e do cachorro, que “.... sorriu latindo”) e, em ‘O Portão, diz: “Eu voltei, agora pra ficar, porque aqui, aqui é meu lugar, eu voltei pras coisas que eu deixei ....!”. Aliás, nesta canção tem uma das maiores pérolas poéticas do cancioneiro popular, quando ele diz: 'Eu abri a porta devagar ... mas deixei a luz entrar primeiro."

               Bem, reconheço que foi um pouco de apelação, uma tentativa de encontrar alguma linha de criação, as canções nem estão naquela ordem, enfim, mas acho que valeu o exercício.
                       
                     Não encontrei em mais nenhum disco algo com alguma tendência marcante, mas é notória a sucessão de pérolas com a temática romântico/erótico/sensual, bem diferente dos ingênuos olhares, abraços e o “pegar na mão”  da década de 60, em que o máximo de ousadia era o beijo que fazia “... splish-splash ..... nela dentro do cinema!”. Roberto trouxe para seu cancionário a imagem que tinha, de um amante conquistador.

                      Sigam o roteiro daquilo que poderia ser intitulado ‘24 Horas de Amor com o Rei’:
1.   Ele começa, logo após um jantar a dois: “Eu te proponho, nós nos amarmos, nos entregarmos, ....., eu te proponho te dar meu corpo ....”.
2.    Ela aceita a proposta e meia hora depois, ouve ele dizer: “Os botões da blusa que você usava e, meio confusa, desabotoava, iam pouco a pouco, me deixando ver, no meio de tudo, um pouco de você!”.
3.   Então, ele mostrava confiança no taco: “Vou cavalgar por toda a noite, por uma estrada colorida, usar meus beijos como açoite e a minha mão mais atrevida”.
4.  E, depois da cavalgada, “No seu corpo é que eu encontro, depois do amor o descanso e essa paz infinita, no seu corpo, minhas mãos se deslizam e se firmam numa curva mais bonita!”.
5.      Não satisfeito, depois do descanso, ele promete: “Amanhã de manhã, vou pedir o café pra nós dois, te fazer um carinho e depois, te envolver em meus braços  ..... pensando bem, amanhã eu nem vou trabalhar  ... quando, mais tarde, nos lembrarmos de abrir a cortina, já é noite e o dia termina, vou pedir o jantar!”.

                      Caramba, haja energia! É claro que aquela maratona  durou uns cinco anos, de 1973 a 1978, e as canções ‘Proposta’73, ‘Os Seus Botões’76, ‘Cavalgada’77, ‘Seu Corpo’75 e ‘Café Da Manhã’78 nem estavam nesta ordem, mas deu pra perceber como estas imagens povoaram as cabeças dos românticos da década. Hoje, um quarto de século depois, as ‘canções’ andam bem mais explícitas, onde o romântico sedutor pergunta à sua egüinha pocotó se ela quer bolete, mandando ela sentar na boquinha da garrafa!!!
                     
                Sempre, numa longa carreira, chega a hora em que o compositor homenageia seus entes queridos. Algumas dessas obras foram grandes sucessos: o grande amigo Erasmo, em ‘Amigo 77, a mãe, em Lady Laura78 e o pai, em ‘Meu Querido, Meu Velho, Meu Amigo 79. Em outra homenagem, o sucesso não foi lá muito grande, mas a canção ‘Minha Tia 76 é simplezinha, mas bonitinha: ele faz menção ao começo de sua carreira,  em que participava de shows de calouros, em que foi hospedado, na Tijuca, por sua Tia Amélia. Interessante é ver o famoso bairro carioca mencionado na letra, assim como a metrópole Niterói, onde ele morou! Deve ter sido naquele período que ele, natural de Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, adquiriu a parte boa do sotaque carioca, os r’s aspirados, deixando, sabiamente, os s’s chiados para os demais nativos. Outra homenagem importante, mas não explícita, está em ‘Debaixo dos Caracóis de Seus Cabelos’ 78, em que ele homenageia Caetano Veloso, na época, no exílio.
                        Uma linha recorrente é a temática religiosa, que começou com ‘Jesus Cristo 70 (“... quem poderá dizer o caminho certo é você, meu Pai!”) e teve ainda ‘Todos Estão Surdos71 (“... vem olhar pelo meu povo ... vem dizer tudo de novo!”), ‘A Montanha72 (“..por isso eu digo, obrigado Senhor!”), ‘O Homem73 (“Tudo que aqui Ele deixou, não passou e vai sempre existir!”) e ‘78 (“Você pra mim é tudo, você é meu escudo, minha fé me leva até você!”). Na década seguinte, ele seguiria firmemente nesta linha.
                        Quanto aos outros compositores, o grande destaque vai para Isolda, que quase nunca apareceu em público, mas presenteou o Rei com a mais bela canção cantada por ele, ‘Outra Vez77 (“Só assim, sinto você bem perto de mim, outra vez!”), rivalizando com ‘Detalhes71. Roberto gravou outras cinco canções de Isolda, com destaque absoluto para “Um Jeito Estúpido De Te Amar76, que fez grande sucesso também na voz Maria Bethânia. Outro grande presente foi a linda ‘Como Vai Você72, que já havia sido gravada pelo compositor Antônio Marcos, mas que teve o sucesso catapultado na voz do Rei. Entre os demais, nada que emocione muito, a não ser a presença de Caetano Veloso, com 3 canções medianas, ‘Como Dois E Dois71, ‘Muito Romântico77 e ‘Força Estranha78. Não poderia deixar de dar destaque também a dois sucessos do passado, magnificamente regravados por Roberto: ‘El Día Que Me Quieras73, de Carlos Gardel (já cantei essa música num bar em Dubai!) e ‘A Deusa Da Minha Rua74, de Newton Teixeira e Jorge Faraj, uma pérola romântica (“Ela é tão rica e eu tão pobre, eu sou plebeu, ela é nobre, não vale a pena sonhar!”).
                   Fechando a caixa, dois extras interessantes. O primeiro, Roberto Carlos narra ‘Pedro e o Lobo’70, música clássica de Sergei Prokofiev (uau!), regida pela Orquestra Filarmônica de New York (uau uau!) regida por Leonard Bernstein (uau uau uau!).  Uma combinação improvável de talentos, com um resultado surpreendente. Finalmente, San Remo 1968, lançado em 1976, com uma compilação de compactos gravados entre 1968 e 1973, incluindo a linda ‘Canzone Per Te’68, de Sergio Endrigo, com a qual Roberto ganhou o Festival de San Remo, naquele ano na Itália, cantando em italiano.
                      Bem, como sempre, não consigo ser objetivo. Também fica difícil resumir 10 anos de carreira em poucas linhas. Meu plano com relação a esta coleção era apenas a primeira caixa, como disse. Ganhei a segunda caixa e gostei de ouvi-la, lembrei-me de bons momentos da adolescência. Estou ainda pensando se parto para a terceira com a década de 80, já que a qualidade da composição real diminuiu bem, pelo que pude acompanhar de longe, andou caminhando perigosamente pelo universo mais brega. Por outro lado, lembro-me de algumas canções muito boas daquela época.
Enfim, quem sabe?!
Afinal, são tantas ‘Emoções81!

Kardec

Ontem, 18 de abril, foi celebrado o Dia Nacional do Espiritismo.

Somente soube dele no final do dia.

Foi apenas a segunda vez em que foi celebrado nacionalmente, 

em homenagem ao lançamento do Livro dos Espíritos, 

em 18 de abril do Ano da Graça de  1857.

Bom motivo pra republicar meu poema sobre a vida seu escritor..

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O menino nasceu em Lyon, França.

Mil Oitocentos e Quatro, o ano.

Na Suíca, aprendeu com Pestalozzi.


Da Educação, foi ponta de lança.

Dedicado, sensível, humano.

Contador, pedagogo, virtuose.


2

Seu conhecimento era variado,

E mais de 20 livros escreveu.

Mas toda essa sapiência foi antes


De sentir-se como que convocado,

No momento em que ele se rendeu

Ao fenômeno das mesas girantes.


3

Isso foi aos quase 50 anos.

Ele viu que um efeito inteligente

Implicava causa de igual valor.


Então, mudou de sua vida os planos,

Empreendeu rotina diligente:

Tornar-se-ia O Codificador!



4

O seu nome real era Hippolyte

Deu-se o nome ‘de guerra', Allan Kardec.

Na realidade, era um nome de Paz.



A sua missão é um real convite

Para que se ponha o passado em xeque,

E que se deixe o que é ruim para trás.



5

É nascer, morrer, renascer ainda,

Progredir continuamente é o lema.

Deixar comandar o coração.



A nossa vida real é infinda!

E muito direta é a lei suprema:

Sem caridade, não há salvação


6

Não se atribua ‘caridade’ ao ato

De dar o que se tem a quem não tem.

É muito mais abrangente e geral.


É amar a seu próximo de fato,

É mais fazer o bem sem ver a quem,

É doutrina puramente moral!


7

Em cinco livros, ele resumiu

Inovadora fé raciocinada,

Que foi ditada pelo outro mundo.


E se dedicou de forma febril,

Porque sabia que era tudo ou nada,

Para deixar um impacto profundo.


8

Foram três anos de intensa pesquisa

Empregando método da Ciência

Porque mão na cumbuca ele não mete.


Do Espiritismo, vestiu a camisa.

E veio o ano da Luminescência:

Mil Oitocentos e Cinquenta e Sete!



9

Os Espíritos, mostrou no primeiro.

Os Médiuns, explicou no Livro 2.

O Evangelho, traduziu em seguida.


No quarto livro, seguiu altaneiro

Destrinchando Céu e Inferno e, depois,

Trouxe a Gênese, origem da vida.


10

O pentateuco foi grande sucesso,

Mas também foi pesada a sua cruz:

Sobre ele, ouviu lagartos e cobras,


Mas logrou pavimentar no processo

A mensagem deixada por Jesus:

A cada um, segundo suas obras!



11

Em 12 anos de dedicação,

Conseguiu gerações de seguidores

Da doutrina espírita racional,


Trazendo a Terceira Revelação.

E enfrentou com garbo os detratores

Deixando-nos um legado sem igual.


Obrigado, Allan Kardec!