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segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Boleto Para Pasear

Outro dia, destilei meu veneno contra o oportunismo das coletâneas e acabei por elogiar uma delas. Tudo bem que era uma daquelas coisas especiais, muito bem produzidas, uma obra de George Martin (In My Life), em que o ‘quinto beatle’ mostrava a carreira dos outros quatro, nas vozes e interpretações dos mais inesperados artistas.
         E agora, lá venho eu de novo queimar minha língua  ....Ai!
         Bem, na verdade, mais uma vez, é uma produção de George Martin! Aliás, vamos fazer o seguinte: tudo o que eu disse contra coletâneas permanece válido, a não ser que seja criado e produzido pelo genial maestro. Estamos combinados?
         Chega às lojas mais uma coletânea dos The Beatles, chamada Love2006. Tem o mesmo nome, e vem a ser a trilha sonora do mais novo espetáculo do Cirque de Soleil, que estão ‘levando’ em Las Vegas, inspirado na carreira os rapazes de Liverpool.  Estes artistas levam pelo mundo uma proposta diferente de circo, sem animais, com muita música (com letras em uma língua inventada!!!), interpretação, cenários de sonho e movimentos ousados. E não são só um grupo. Estão espalhados nos quatro cantos do planeta encantando multidões, digo, pequenos grupos de privilegiados que têm condições de pagar o caríssimo ingresso, com sua arte. O espetáculo que esteve aqui no Brasil, Saltimbanco, na verdade é o primeiro que seu idealizador, um canadense malabarista de rua (ou seja, há futuro para os nossos garotos!!!) montou em 1984. Com o sucesso do primeiro, ele foi montando outros, cada vez mais criativos e hoje são mais de 10 espetáculos simultâneos sendo levados em 4 continentes, movimentando um império de mais de 1 bilhão de dólares. Como acharam que Saltimbanco já tinha dado o que tinha que dar, abriram uma concessão aos pobres do Hemisfério Sul e vieram acabar a carreira dele aqui.
          A trilha sonora de Love é uma recriação de canções beatle com um quê de diferente. George Martin conhece como ninguém as canções, esteve envolvido em cada uma delas (minto, apenas 95% delas) e percebeu possibilidades de combinações interessantes. Então, você verá em uma faixa, uma música combinada com outra e às vezes com uma terceira, que você nunca imaginou que tivessem algo em comum. Em uma outra, um efeito sonoro utilizado originalmente em uma canção aplicado em outra. Talvez sejam detalhes que só os fãs percebam. Não recomendaria o disco para quem quer começar a apreciar Beatles. Sou partidário de que o melhor mesmo é comprar os discos originais, todos estão em catálogo. E, como todos os álbuns têm mais de 80% de  músicas que agradam, é um ‘good value for the money’.
         As coletâneas beatle tiveram seu auge na década de 70, ainda na era dos LPs, quando o mundo da música estava ainda inconformado com a separação do grupo. Destaco dois  lançamentos temáticos e 2 lançamentos temporais. No primeiro grupo, Love Songs1976 grupava 25 canções românticas (o limite na era dos LP’s era de 40 minutos, no máximo), em álbum duplo, e Rock’n Roll Music1977, um outro duplo com 28 canções de Rock’n Roll (acho que não precisava explicar!). Antes, haviam lançado as coletâneas temporais, dividindo a carreira beatle em 2 períodos: The Beatles 1962-19661973, 26 canções em álbum duplo com a cor vermelha predominante e, na capa, uma repetição da capa do primeiro disco dos Fab Four, Please Please Me1962, uma foto tirada de baixo para cima, na escadaria da EMI Abbey Road Studios, com os rapazes olhando pra baixo, com aquele visual comportado da época; e The Beatles 1967-19701973, 28 canções em álbum duplo com a cor azul predominante e, na capa, uma foto na mesma posição da anterior, no mesmo lugar,  com os rapazes olhando do mesmo jeito, porém com aquele visual rebelde, cabeludo, barbudo, bigodudo, usual da juventude de 1969. A idéia desta última foto não fora, evidentemnte, a de ilustrar um álbum de coletânea, afinal, eles ainda estavam juntos quando tiraram a foto, claro. É que, naquele ano, eles haviam planejado lançar um álbum com o título Get Back, uma volta às origens, com canções gravadas ao vivo, sem muita edição, que eles gravaram no mês de janeiro. A capa do disco seria aquela signifactiva foto, mostrando-os mais velhos, porém tocando como no passado. O projeto acabou não indo pra frente conforme planejado, mas as canções foram lançadas logo após o desmanche do grupo, no álbum Let It Be2000. As duas coloridas coletâneas ficaram popularmente conhecidas como Red Album e Blue Album, em contraposição ao The White Album, como ficou popularmente conhecido o memorável disco The Beatles1968, cuja capa era absolutamente branca, até mesmo o título, que vinha em alto-relevo.
         Na década de 80, em que houve a aparição e popularização dos CDs, o mais notável lançamento foram os 2 álbuns Past Masters #11988 e Past Masters #21988, em que compilam em LP e CD tudo aquilo que havia saído apenas em compactos e em outros lançamentos multi-artistas. Tão importante foi aquele lançamento, que os dois Past Masters foram incorporados ao catálogo oficial da EMI. Nem podem ser considerados como coletâneas, afinal reúnem canções que de outra forma seria impossível de se ter acesso, na era dos CD’s.
Nos anos 90, com os CDs bombando e deixando as simpáticas bolachas de vinil no ostracismo, os 3 Beatles sobreviventes e mais a viúva nipônica resolveram que era hora de faturar de novo. Os lançamentos daqueles anos foram basicamente para oficializar a pirataria! Os Beatles tinham uma legião de fãs, certamente a maior de todos os tempos. Alguns deles, mais ousados, conseguiam gravações pirata (ou seja, não oficiais) de todos os momentos beatle, seja de shows antigos, ao vivo, na TV ou radio, seja de momentos de estúdio. Esta iniciativa gerou uma descomunal indústria pirata (‘bootleg’, como é conhecido o termo em inglês). Os fãs mais ardorosos disputavam a tapa tais gravações, saudosos que estavam dos bons momentos da década de 60. Eu mesmo não era muito chegado, apenas fui comprar meu primeiro pirata em 1990, numa feira de rua de Londres, na Portobello Road, um CD com os legendários Decca Tapes, curioso que estava por entender por que o ‘visionário’ produtor da gravadora Decca não gostou do que ouviu dos rapazes, num teste que fizeram no sagrado feriado de 1º de janeiro de 1962, decretando que “esse grupos que tocam guitarra não têm muito futuro”. Gênio!
         O primeiro lançamento anti-pirataria foi o CD duplo Live at the BBC1994. No começo da carreira, os Beatles utilizavam-se muito do veículo rádio para levar os fãs à loucura. Foram inúmeras aparições ao vivo, entre 1962 e 1964, em variados programas da Brittish Broadcast Corporation, estatal da comunicação inglesa, onde eles cantavam, além dos próprios sucessos, clássicos do Rock’n Roll da época e do final da década de 50. No álbum, 69 faixas (56 canções e 13 falas), com uma qualidade muito superior à dos piratas, cujos espertos produtores eram os únicos a faturar e em cima do sucesso alheio.
         Depois, os 3 Beatles remanescentes dedicaram-se a um grande projeto, uma antológica recompilação na carreira, que gerou discos, filmes e livro, o Projeto Anthology. De música, foram 3 CD’s duplos Anthology 11995, Anthology 21996 e Anthology 31996. Está no nome: antológicos!!! Prometo não utilizar mais o adjetivo! A não ser que seja necessário! Um dos chamativos era o lançamento de duas inéditas gravações, do além, com a voz de Lennon, Free as a Bird e Real Love: canções de John Lennon, gravadas em fita que foram trabalhadas, limpadas, melhoradas e até acrescidas pelos outros 3, produzindo um antoló ... digo, memorável revival do grupo, 25 anos após seu fim. Os fãs sentiram, por momentos, que o grupo se reunía novamente, como tanto haviam sonhado, até os tiros covardes de Mark Chapman. Além disso, os 3 albuns são povoados de momentos de fazer os fanáticos babarem. Nós nos deliciamos ao ouvir as primeiras gravações de grandes sucessos, apenas em voz e violão, ou voz e guitarra, ou voz e piano; nos deleitamos em ouvir os out-takes abortados de canções que amamos; nos revoltamos ao ouvir canções inéditas, da autoria deles, que não viram a luz por absoluta falta de espaço nos discos, ao mesmo tempo agradecendo por ter a oportunidade de conhecê-las; nos divertimos em presenciar o bom humor dos rapazes no estúdio; nos aprazemos em sentir a emoção dos fãs que presenciavam os fantásticos desempenhos do grupo ao vivo, em shows de TV. Os 3 CD’s Duplos, que facilmente chegaram ao topo das paradas americanas, têm um total de 155 faixas (!), incluindo algumas memoráveis falas. Venderam, no total, mais de 50 milhões de cópias, fazendo com que The Beatles se tornassem o grupo que mais faturou na década de 90, ou seja, mais de 25 anos após o desenlace.
         Entretanto, a série Anthology é coisa pra fã! Se você nunca teve em casa nada do grupo, não recomendo as compilações antológicas, pois é recomendável conhecimento prévio para melhor apreciá-las. Como já disse, o ideal é ter a coleção completa: são 15 CDs. Entretanto, se a disponibilidade financeira é apenas para 4 CDs, invista em uma das combinações Red/Blue ou Love/Rock, pois são excelentes resumos, cada um do seu jeito. Agora, se a coisa tá preta e o dinheirinho só dá pra um CD, também tenho a solução. Compre 12001! Sim, 1 é o nome de uma compilação com todos os sucessos que atingiram o nº 1 das paradas americanas ou britânicas, em compactos. Foram 27. Ih! Pensando bem, desconsidere a sugestão dos 4 CDs, afinal, têm número parecido de canções (ah!, o poder da gravação digital)! Bem, o próprio 1 também atingiu o topo das paradas, em todo o mundo e rapidamente, aliás, mais um ‘Book of Guinness Record‘ para o grupo: o disco com vendas mais rápidas de toda a história, com 13,5 milhões de cópias vendidas em um único mês, ao redor do mundo (30 milhões até hoje). Claro que, apesar de já ter toda a obra, adquiri 1 e agradeci muito a decisão: o grande lance é o encarte! Nele, estão, entre outras coisas, as capas do compactos lançadas em vários países (infelizmente não nos brindaram com os lançamentos brasileiros). Muito legal é que, nos países de língua espanhola, eles tinham o estranho hábito de traduzir os títulos das músicas (pra quê!). É im-pa-gá-vel! Em outras línguas, português, francês, até japonês, mantêm-se os nomes originais, no mínimo como referência. Solamente los hermanos los ponen solo en español!!  Bem, vou listar abaixo alguns deles, em ordem crescente de divertimento. Primeiro, os títulos das obras de Los Beatles, en español.

         Leiam e tentem entender do que se trata:


·         Socorro
·         Lluvia
·         Ocho Días A La Semana
·         Sally La Longa
·         No Puedes Hacer Eso
·         No Puede Comprarme Amor
·         Me Siento Bien
·         Todo Lo Que Necesitas Es Amor
·         Es Una Mujer
·         Um Camino Largo Y Sinuoso
·         Si, Esto Es
·         Vuelve 
·         Anochecer De Un Día Agitado
·         Quiero Coger Tu Mano
·         Por Ti, Tristeza
·         Nene, Eres Un Hombre Rico
·         Déjalo Ser
·         Podemos Solucionarlo
·         Vacación De Un Día
·         Novelista

E, para terminar com Chave de Ouro,
     

Boleto Para Pasear


         

Bem, agora, os títulos originais em inglês:


                        Divirtam-se!!!



·         Help
·         Rain
·         Eight Days A Week
·         Long Tall Sally
·         You Can’t Do That
·         Can’t Buy Me Love
·         I Feel Fine
·         All You Need Is Love
·         She’s A Woman
·         The Long And
Winding Road
·         Yes, It Is
·         Get Back 
·         A Hard Day’s Night
·         I Want To Hold Your Hand
·         For You Blue
·         Baby, You’re A Rich Man
·         Let It Be
·         We Can Work It Out
·         Day Tripper
·         Paperback Writer

E, para terminar com Llave de Oro,

                     Ticket To Ride