Hoje, vou vestir a camisa de, como direi, chato ambiental, pra não usar aquele outro termo, trissílabo, mais chulo. Não pretendo fazer um tratado sobre o assunto, posto que não sou especialista, apenas observo o que vai pelo mundo, estou razoavelmente antenado com o que andam dizendo por aí, o suficiente para traçar umas poucas linhas, como um humilde alerta! Não vou citar números, que não os sei, posso pesquisá-los depois, na internet.
Há gurus da energia que vêm dizendo que o petróleo vai acabar em 25 anos. Só que eu ouço esta previsão desde bem antes de eu entrar neste mundo do petróleo, bem mais que 25 anos. Ocorre que os especialistas se esquecem da evolução das técnicas de extração do ouro negro, que vem sendo encontrado em águas quase abissais, em áreas cada vez mais inóspitas, em rochas cada vez mais próximas do manto. Esqueceram-se de que o petróleo é uma commoddity (esqueci qual o termo em português para isto), negociado em bolsa de mercadorias, com preço regulado pela oferta e procura e que, enquanto os americanos o estiverem procurando, e gastando, e desperdiçando, e continuarem ameaçando guerras, o preço continuará nas alturas, justificando a roda-viva e os custos de se buscá-lo, não importa onde esteja, quietinho, esperando para ver a luz do sol. Tudo com medo de se ver rarear este bem que move o mundo. Hoje, os preços até recuaram um pouco, mas quando passar o pânico, ele retorna a um patamar que justificará todo o esforço. Este temor vem incentivando a procura por energia alternativa, antes considerada inviável: o preço alto para aquisição do bem vem também fazendo valer a pena o investimento. Está-se começando agora a plantar energia, a plantar petróleo, a tirar energia da terra. As empresas de petróleo vêm cada vez mais ampliando seu foco e se orgulham em dizer que, agora, são empresas de energia. Em médio prazo, o álcool e o bio-diesel podem vir a se tornar também commodities. Vai ter alguém precisando, indo ao mercado e pagando o preço que estiver valendo. O fato é que as previsões não vêm dando certo.
O alvo de outros gurus agora é outro. Inesperado, mas sério! Um outro bem da natureza está a abrir os olhos dos especialistas para o seu futuro: a límpida água, cristalina companheira nossa do dia-a-dia. De uns tempos para cá, o pessoal começou a fazer contas, medições, projeções, previsões e, um belo dia, alguém gritou: vai faltar água! E não era o cara da CEDAE, ou um administrador de condomínio, que de vez em quando avisa, um evento puntual, uma escassez momentânea, provocada por algum acidente ou mau funcionamento nas imediações de uma estação de tratamento, com hora certa para começar e terminar, causando um certo transtorno, o enchimento de baldes e panelas, a corrida para o banho, a antecipação de algumas tarefas, enfim, uma certa mobilização para o breve período de seca, para que a falta do bem aquoso não nos incomode muito.
O que esses novos gurus andam alertando é de uma amplitude bem mais preocupante, o buraco é mais embaixo! O crescimento da população mundial está maior que o crescimento da disponibilidade de água tratada, para lavar, dar de beber, cozinhar para esta gente toda que está chegando e que vai necessitar dela. É uma questão de cunho pornográfico, ou seja, é só pôr no gráfico que se vê que, um dia, as duas curvas de crescimento vão ‘estar se cruzando’, como dizem os adeptos do gerundismo explícito. Um pouco antes desse cruzamento, dizem os catastrofistas de plantão, a água terá virado commodity, seu controle estará nas mãos de uns poucos industriais, suas cotações serão conferidas na Bloomberg, enfim, o começo do fim. Hoje, a água custa algo, é verdade, mas é para remunerar os custos de quem a está tratando e disponibilizando em nossas casas. Neste futuro possível, as pessoas estarão fazendo contas diariamente para verificar se poderão ‘comprar’ aquilo que hoje está disponível, de graça, ou quase, e assim seguir vivendo: não há possibilidade de se viver sem este antigamente chamado elemento essencial, juntamente com seus pares, o ar, a terra e o fogo. Hoje sabemos não ser mais elemento, mas continua sendo essencial. E acho que nós, humildes mortais, podemos fazer alguma coisa para que também esta preocupante previsão não se confirme.
Colocando em termos matemáticos bem simples, a equação pode ser resumida assim: a água tratada que se produz é igual à soma da água tratada que se consome com a água que se desperdiça. Não vou entrar no mérito sobre a parte antes do sinal de igual: o que se produz é determinado por muitos fatores macro, que nossa atuação como cidadãos comuns pouco pode contribuir para melhorar. Passa por poluição dos rios, tratamento de esgotos, aquecimento global, e outros da estirpe, portanto longe de nosso alcance. Cientistas seguem pesquisando uma forma econômica de dessalinizar a água dos mares, o que poderá vir a ser a solução em algum tempo futuro. Governos, organizações não governamentais, instituições oficiais ou não, estão a tratar do assunto, ao menos deveriam estar tratando. Já do lado direito da equação, aí sim, temos muito a contribuir.
O foco aqui é a última partezinha da equação, mais à direita: o desperdício. O que se desperdiça é muito maior do que o que se consome, efetivamente. Podemos, sem a menor sombra de dúvida, mudar nossos hábitos e atitudes, nas coisas mais simples do dia-a-dia. E, ainda mais importante, ensinar às outras pessoas como fazê-lo.
Começo pela louça, e sua lavagem. Não vou nem falar aqui da máquina de lavar louça, um poço de desperdício de água e energia elétrica (que, aliás, é hidrelétrica!), em que vinte jatos do precioso líqüido fazem o mesmo serviço de uma boa passagem de esponja com detergente. Vou me ater ao relacionamento entre o ser vivente que encosta o umbigo (ou outras partes) na pia, e aquele conjunto de artefatos e instalações que se colocam à sua frente no momento em que começará o processo de lavagem: a louça suja do almoço, amontoada na cuba de inox (já começou errado!), a torneira, o lixito, a escova, o detergente. O ser ambientalmente inconsciente pensa: “O que faço primeiro?!!”. Ou melhor, nem pensa: ato contínuo, liga a torneira! No máximo! Sccchhhuááá! Aí, pega o primeiro prato, joga o grosso dos restos no lixito (e a água correndo!), bota o prato embaixo da torneira, pega a esponja, coloca o detergente na esponja, passa a esponja com o detergente no prato embaixo da torneira (e a água correndo!); deixa cair a esponja na cuba, enxagua o prato, passa uma mão, e, finalmente, coloca o prato no escorredor; pega o segundo prato (e a água correndo!) e repete os passos acima, sem a necessidade agora daquele passo do detergente, pois ainda tem um pouco na esponja, e coloca o prato a escorrer; pega o terceiro prato (e a água correndo!) e repete, desta vez, todos aqueles passos do primeiro prato, pois percebe: “Ih! Não tem mais detergente na esponja!” e assim segue sua operação (e a água correndo!) até terminar os pratos; depois começa a lavar os copos, quem sabe demorando um pouco mais para repor o detergente, aquele líqüido que “é baratinho!” (e a água correndo!); depois repete tudo do mesmo jeito com os talheres; as panelas; enfim, todo o resto, até ficar o escorredor cheio e a cuba vazia e a água correndo. Aí, somente aí, lembra-se de desligar a água, finalmente, silêncio no ambiente. Notaram que um dos artefatos que estava à frente do indíviduo sequer foi mencionado: a escova. “O que é que eu faço com essa escova?”, pensa o indivíduo!! A escova é fundamental para o processo correto, como verão!
Vocês não acham a descrição acima de arrepiar??! Eu fico arrepiado! Se você não fica, está na hora de ficar! A situação acima descrita é muito comum quando o indivíduo em referência é um empregado, ou, mais comumente, uma empregada doméstica, a quem você entrega seu patrimônio para cuidar. Entretanto, já vi muita gente boa, muito chefe de família de boas intenções, muita dona de casa de mancheias, que faz exatamente daquela maneira acima descrita. Notaram o detalhe do detergente a cada 2 pratos? Há necessidade disso? Pra que deixar o detergente indo embora junto com a água que está passando pela louça? É comum, deste jeito, o dono da casa gastar um vidro de detergente a cada 2 dias. Isto, sem falar na esponja, que vai se desfazendo muito mais rapidamente, com aquela esfregação toda debaixo da preciosa água que se esvai pelo ralo!
Então, se me permitem, vistam a carapuça ou não, vou descrever uma série de passos, que poderão ser seguidos por vocês, ou ensinados a seus ajudantes domésticos, ou a quem se encarregará desta nobre arte de lavar a louça. É do jeito que eu faço!!! Modestamente, sou um ótimo lavador de louça!!! Não vou exagerar e dizer que se lave a louça numa bacia, como eu já vi algum daqueles catastrofistas (será?) recomendar. Afinal, temos água corrente, vamos utilizá-la, sim, mas de forma inteligente. Senão, vejamos:
1. Não acumule as louças na cuba da pia! A bancada, de granito, ou mármore, está lá para isto! Deixe a cuba livre! (parece até propaganda política ou, ainda, um drink dos anos 60 e 70!);
2. Pegue os pratos, um por um, jogue os restos no lixito, empurrados com os garfos sujos, e vá empilhando, num lugar vazio da bancada;
3. Pegue o primeiro prato com a mão boba, pegue a escova (lembram-se dela?) com a mão boa e ..... o que fazer agora? ..... Ah, sim, veja que não falei ainda na torneira. Agora, sim, ligar a torneira com o que sobrar da mão boa! E não é necessário ligar ao máximo com aquele jato turbulento! Deixe o jato a meio pau, quando ainda se nota a água em toda sua translucidez!!! Escove, com a escova (sic), o resto que sobrou do prato, debaixo da água corrente, na frente e atrás; a escovada úmida deixa-o quase limpo; empilhe-o em outra sobrinha da bancada (sempre há!), repita o procedimento para os demais pratos e desligue a torneira!! Ah, antes de desligar, dê uma molhadinha na esponja!
4. Notou que eu nem falei de detergente ainda? Somente agora, com os pratos quase limpos, é que se pensa nele! Passe o detergente na esponja, poucas gotas são suficientes! Pegue o primeiro prato com a mão boba, a esponja já está úmida e ..... o que fazer agora? ..... Ah, atenção, não precisa ligar a torneira de novo! Passe a esponja nos pratos e vá empilhando, aí sim, a seu critério, na cuba, ou mesmo num outro lugar vazio da bancada (haja bancada!). Você notará que aquela carga de detergente inicial dura muito, afinal, os pratos estão quase limpos!
5. Só então, ligue a torneira novamente, enxague os pratos e coloque-os no escorredor, desligando a torneira ao final!!
6. Repita os passos acima para copos, talheres, panelas, vasilhas, tudo o mais!
Note que você diminuiu, entre uma atitude e outra, a quantidade de água escorrendo, de início, uns 30% a 40%, ao não abrir a torneira toda. Depois, só se ouve o doce som da água corrente durante os breves segundos em que ela é realmente necessária. A economia total entre um procedimento e outro é superior a 95%, eu garanto. Isto, sem contar a esponja e o detergente. Você deverá ter re-alimentado a esponja com o produto umas 2 ou 3 vezes, no máximo. Talvez um pouco mais no caso de panelas reticentes. Esta última economia entra no capítulo, não da água, mas da racionalização dos produtos de limpeza, que impacta diretamente no nosso bolso e que, na maioria das vezes, é difícil fazer uma ajudante doméstica entender: não é a quantidade do produto que limpa, é a força, o empenho, coisa que é difícil obter. Produto demais até estraga, às vezes.
A ênfase de minha mensagem foi na lavagem de louça. Fiquem tranqüilos que não vou ficar aqui ditando normas e procedimentos detalhados para os demais usos aquáticos. Isto aqui não é um manual. Exagerei na dose aí em cima, pois eu fico chocado com aquele jeito, eu diria, burro, estúpido, boçal, de agir! Vou passar pelas demais facetas do desperdício assim, de passagem.
O banho, aquele que é o maior gerador de desperdício de água doméstica, requer uma sugestão muito simples: use a água apenas quando precisar molhar as partes do corpo! O normal é o sujeito (a) ligar a água, no máximo, e ficam lá 10, 20 minutos com aquela água toda caindo sobre o corpo, ou direto ao chão, enquanto se ensaboa aquele último. Pense bem, é necessário? Há uma maneira mais simples, direta, econômica, rápida, consciente: molhe a cabeça, desligue a água, pegue o shampoo, passe na cabeça, esfregue quanto tempo quiser e só então ligue a água de novo (ih, lá estou eu com meu passo a passo, não resisti!). Depois, molhe o resto do corpo e desligue de novo a torneira, curta aquele momento de limpeza corporal no silêncio de seu banheiro, sem o barulho da água correndo, se esvaindo, sendo desperdiçada, indo embora à toa. Admire o som da esfregação explícita! Vá pensando na vida, quem sabe até cantando, e só quando acabar gire de novo a torneira. Se for mulher e tiver trocentos cremes a passar no cabelo e no corpo, repita trocentas vezes o ligar/desligar da água. É simples! Aqui, também a economia é perto de 90%. Aliás, tem casos em que é próxima de 100%, no caso dos adolescentes, por exemplo: já notaram quanto tempo aqueles seres incompreendidos demoram no banho? Trinta, quarenta minutos, às vezes! Compare com os 30 ou 40 segundos (um pouco mais, vá lá!) de água corrente que são realmente necessários. Os meus já foram doutrinados! E até implementaram a tática do patrulhamento ostensivo. E os seus? Pense bem: aonde você encontra um nível de economia desses com uma simples decisão estratégica? Sei que você vai reclamar do friozinho, mas um pequeno sacrifício não mata ninguém e é muito bem-vindo. Ah lembrei de outro ponto: e o banho quentinho? É bom, não, dá vontade de ficar sentindo a água atingir todos os meandros do corpo, que gostoso! Tudo bem que no inverno, é meio difícil, vá lá, mas no verão, faça um bem pro seu corpo: banho frio nele!!! E no inverno, faça o seguinte, pegue uma bacia e acumule a água fria que seria desperdiçada até ficar quentinha. Mais adiante, eu explico porque! Se você agir, ao menos em parte, conforme recomendado aí em cima, você acaba o banho com a sensação do dever cumprido. E a Terra agradece!
Escovar os dentes e fazer a barba, mesma coisa: nada de água correndo o tempo todo. Liga quando precisa / desliga / segue em paz. Também aqui sugerem usar um copo com água e deixar a torneira fechada o tempo todo. Não requer o exagero! Ainda no âmbito banheiral, as descargas têm que estar reguladas: é um absurdo o que vai embora de água a cada aliviada, seja para a Número 1 ou para a Número 2. Tem gente pensando numa medida radical, de adaptar o sistema dos aviões, de pressão zero, às residências, mas isto requeriria um enorme investimento, de mudança das instalações. Quem sabe nos novos, por vir! Enquanto não vem, faça o seguinte: lembra daquela aguinha acumulada numa bacia enquanto a água esquenta durante o banho? Jogue-a na privada que vai tudo embora, e você nem apertou aquela válvula de descarga normalmente desregulada. Às vezes, uma bacia dá pra dar duas, rapidinhas! Exagero? Pode ser, mas faz sentido!
Saindo de casa, mas não indo tão longe, tem o condomínio onde você mora. E a conta do condomínio, que você paga todo mês. Se você não é síndico, ao menos preste atenção no balancete que ele lhe manda, todos os meses. Note que a despesa com água está lá entre os 2 ou 3 itens mais caros, atrás de despesas com pessoal, rivalizando com a eletricidade e elevadores, representando de 10% a 15% dos gastos mensais, dependendo do número de unidades habitacionais. Fique de olho, converse com o síndico, observe como são lavados os queridos carros, convença-o a proibir a lavagem com mangueiras: no máximo, um ou dois baldes d’água por carro. Duas vezes por semana, pra quê? Uma vez é suficiente: um carrinho levemente empoeirado da cidade é até charmoso! Lavar garagem toda semana, pra quê? Uma vez por mês é mais do que suficiente para um chão que está lá só para sentir o peso dos carros; nem visita recebe! Jardins?! Espere a chuva; as plantas não vão morrer! A grama pode até não ficar tão verdinha, mas morrer, não morre. Já viu floresta morrer? Nada, sofre, fica murchinha, mas volta à vida com a primeira borrifada, logo fica viçosa novamente. Apele para a água só depois de muitos dias de estiagem. Aos privilegiados que têm aqueles tanques de 4 metros cúbicos batizados de piscina, ou mesmo quem tem aquelas de verdade, mantenham-nas bem cloradinhas e tratadinhas, que a água pode ficar sem ser trocada por 3 meses, ou mais.
Se não for para preservar o futuro de seus filhos e dos filhos deles, que seja para preservar o seu presente, o seu bolso: uma diminuição consistente no consumo de água pode levar a assembléia do seu condomínio (que você nunca vai!) a decidir por uma diminuição da cota condominial (que você nunca viu!). Pode acontecer! Quanto à conta, é bom também dar uma calibrada nos hidrômetros, vez por outra, esvaziando e enchendo as caixas d’água, medindo as leituras antes e depois. Eles podem estar medindo a passagem de ar: Já é duro pagar pela água, muito mais doloroso pelas volumosas bolhas de ar, que também é precioso, porém inútil neste caso!
A grande economia, entretanto, seria se todos os queridos condôminos, pais, mães, filhos e agregados agissem conforme as boas práticas da consciência aquático-ambiental. Uma boa campanha, bem humorada, que leve mesmo aqueles mais espírito-de-porco a pensarem, pode levar a uma mudança de atitude. Cada um pode fazer sua parte, como o passarinho da história do Betinho, ajudando a apagar o incêndio da floresta com o pouquinho de água que carrega no bico, em incontáveis vôos. Bom, pensando bem, a contribuição do passarinho era nula, porém muito simbólica. A nossa contribuição, já que somos um pouco mais racionais, tem um efeito muito maior que zero, e pode fazer a diferença.
Enfim, inaugurei minha fase de chato ecológico, mas, estou seguro, é por uma boa causa! Minha próxima manobra será conseguir um posto no Ibama! (HeHeHe)