Capítulo 45
De minha saga
O Universo das Canções dos Beatles
O cenário para The Beatles, o Álbum Branco
Em pouco mais de 5 anos de carreira, lançaram 138 canções, sendo 114 autorais e 24 de outros autores, filmaram dois Longas Metragens de sucesso mundial, A Hard Day's Night e HELP!, e um de sucesso mediano, reconhecido posteriormente, fizeram 571 shows, sendo 386 no Reino Unido, 94 na Europa Continental, 67 na América, 16 na Austrália e 8 na Ásia, esse número ficou estacionado, e ganharam 4 títulos de Membros do Império Britânico, lançaram 15 compactos, um EP de inéditas, 8 LPs, Please Please Me (LINK), With The Beatles (LINK) A Hard Day's Night (LINK), Beatles For Sale (LINK), HELP! (LINK), Rubber Soul (LINK), Revolver (LINK), e Sgt. Pepper's Lonely Hearts CLub Band (LINK), e um EP Duplo - Magical Mistery Tour (LINK) - todos chegando ao primeiro lugar, com exceção do primeiro e do antepenúltimo (!!!) compactos.
Foram 30 as canções gravadas.
Canções de Lennon/McCartney onde não explicitado
Disco 1
- Back in the USSR
- Dear Prudence
- Glass Onion
- Ob-la-di, Ob-la-da
- Wild Honey Pie
- The Continuing Story of Bungalow Bill
- While My Guitar Gently Weeps (Harrison)
- Happiness is a Warm Gun
- Martha My Dear
- I´m So Tired
- Blackbird
- Piggies (Harrison)
- Rocky Raccoon
- Don´t Pass Me By (Starr)
- Why Don´t We Do It in the Road?
- I Will
- Julia
Disco 2
- Birthday
- Yer Blues
- Mother Nature´s Son
- Everybody´s Got Something to Hide Except For Me and My Monkey
- Sexy Sadie
- Helter Skelter
- Long Long Long (Harrison)
- Revolution 1
- Honey Pie
- Savoy Truffle (Harrison)
- Cry Baby Cry
- Revolution 9
- Good Night
- Foram 5 sobre Garotas
- 3 na Classe Sexo
- 1 na Classe Amor
- 1 na Classe DR
- E 2 com Saudades delas
- Uma na Classe Desespero
- Uma na Classe Tristeza
- São 9 canções em que contam Histórias,
- 4 contos
- 3 engraçadas
- 2 ensimesmadas
- São 8 canções que têm algum tipo de Discurso
- 4 falando para um Grupo
- 4 falando para uma Pessoa
- São 4 canções si mesmos,
- 2 contando sonhos
- 1 sobre seu corpo
- 1 pedindo socorro
- Uma canção sobre Drogas
- Na classe Viagem
- Uma canção se sentido
- Yellow Submarine tem 1 Heart Song (25%, 1 em 4)
- Abbey Road tem 5 Heart Songs (29%, 5 em 17)
- Let It Be tem 2 Heart Songs (20%, 2 em 10 + 1 Cover)
- Past Masters #1 tem 11 Heart Songs (100%, 11 em 11 + 4 Covers)
- Past Masters #2 tem 5 Heart Songs (38%, 5 em 13)
- Aqui, Paul ainda mantém a posição tomada a John em Revolver, mas de novo por uma cabeça, 13 a 12; George tem 4 e Ringo, 1!
- Paul mais uma vez é o esteio das Heart Songs:
- Ele é o autor das 5 canções sobre Garotas, e de uma das duas canções sobre saudade
- Ringo (Bem-vindooooo!) é autor da outra canção sobre saudade
- Nem John nem George falaram sobre garotas!
- John deixa Paul e George pra trás nas Mind Songs, 13x8x4, dentre elas:
- John faz mais Discursos, são 4, com 2 de Paul e 2 de George
- John fala mais sobre si, com 3 canções, sendo a outra de George
- John e Paul dividem as histórias: 4 a 4, George tem a outra
- A única Acid Song é de John;
- A única Nonsense Song é de John;
1. Back in the USSR (Tale Story Song by Paul McCartney)
Paul conta: "Aaaah Voei de Miami pela B.O.A.C.! Não dormi nada na última noite. No avião, o saco de enjoo estava no meu colo. Cara, eu tive um péssimo voo. Estou de volta na USSR!
Você não sabe como é sortudo, menino, de volta à URSS, yeah"
Grande rock de abertura do Álbum Branco, que foi elogiado na mesma linha de Lady Madonna, de retorno às raízes. Em tempo, B.O.A.C. é o nome antigo da Brittish Airways. A canção é uma paródia a uma canção de Chuck Berry, Back in The US, que saudava as maravilhas da Amárica, desta vez sugerindo que era sempre bom voltar pra casa, mesmo para um espião soviético 'Gee is good to back home!'. Esse apanágio às coisas de uma entidade política 'inimiga' da maior potência do mundo foi considerada quase um manifesto socialista pela direita americana. E Paul queria provocar mesmo. E também era uma homenagem a um povo aonde o universo dos Beatles era banido, mas ele sabia que eles eram doidos pelo som deles, mesmo ouvindo de forma pirata. Como muitas canções do Álbum Branco, esta foi começada na Índia, aonde estava Mike Love dos Beach Boys, que foi quem sugeriu que Paul elogiasse as garotas soviéticas, e assim, ele fez:
Well the Ukraine girls really knock me out, They live the west behind
And Moscow girls make me sing and shoutThat Georgia's always on my my my my my my my my mi-ind!
E notem, nesta ponte (que é repetida uma vez), a duplicidade do sentido, porque Georgia, além de ser uma república soviética, é também um estado americano, saudado em canção de grande sucesso de Ray Charles, que também canta "Georgia's always on my mind". Junte-se a isso o fato de o refrão ser cantado em soluços, ma segunda vez, ele diz 'Back in the US, back in the US, back in the USSR!', deixando os ouvintes tontinhos. Note o Beatles Break, nas quatro vezes em que é o refrão cantado, quando todos os instrumentos param, ficando só a voz. Um dos momentos mais felizes da vida de Paul foi poder cantar essa canção na Praça Vermelha (2003).
Uma pausa para um papo sobre rimas. Nesta minha saga, eu venho exaltando a qualidade das rimas encontradas pelos compositores, festejando quando elas são ricas, ou seja, rimam palavras de classes gramaticais diferentes, ou seja, verbo com substantivo, adjetivo com pronome, e assim por diante, e dando menor valor às, por assim dizer, pobres. Um leitor me alertou que talvez esse não seja um critério válido para a poesia em inglês. (aliás, perdi seu contato, amigo! Chama-me de novo!). Fiquei pensativo, pensei em fazer uma auditoria em todos os capítulos pretéritos e apagar essas considerações, mas o próprio leitor me disse pra seguir fazendo assim, porque é muito rico, e ir introduzindo aos poucos o conceito em inglês, e ele até se ofereceu pra dar consultoria. Fá-lo-ei!! Em princípio, vou, ao menos, 'apostrofar' a qualificação, para denotar a imperfeição no uso. Veja aqui, na mesma ponte acima, que parece que eles pensam com esse critério, tal a quantidade de sua ocorrência: duas oportunidades de rimar e vieram com duas rimas 'ricas', por assim dizer, "out-shout" e "behind-mind". E nos três versos, diferentes, ainda algumas outras: "BiOuEiCi-knee" no 1°, "phone-home" no 2°, "farm-harm" e "south-out" no 4°. Ué, não eram três versos? Sim, com letra! O 3° verso é a guitarra-solo de Geprge!!! E não fica por aí! No final de todos os quatro versos, uma repetição que eu até chamaria de refrão, tem mais uma rima 'rica', pois Paul rima a letra 'R', que se pronuncia "ar", com o tempo de verbo "are", de idêntico som. Eles são incorrigíveis!! Isso tudo sem contar o brilhante uso de termos absolutamente 'soviéticos' como o "comrade" (camarada, a saudação do regime comunista, ah como os americanos reclamaram!!) e a balalaika, instrumento estranhíssimo, um violão enorme e triangular, de 3 cordas, que só existe por aquelas plagas.
Bem, como todo bom rock, espera-se que não haja intrusos nos instrumentos, então, veja os instrumentistas envolvidos, com apenas os membros da banda The Beatles:
Paul - Vocais, piano, guitarra base, baixo, bateria, palmas, percussãoJohn - vocais de apoio, guitarra base, baixo de 6 cordas, palmas, bateriaGeorge - vocais de apoio, guitarra solo, baixo, palmas, bateria
Ué!! Cadê Ringo? Pois é, gente, Ringo havia abandonado os Beatles, justamente nos primeiros ensaios da canção, de saco cheio com as exigências de Paul sobre como ele queria que a bateria fosse tocada! Note que os três outros Beatles tiveram que se virar na bateria, sem seu titular!! Felizmente, a triste ausência durou só 10 dias, boa parte dos quais passou no mar da Sardenha, no iate de Peter Sellers, grande amigo dos Beatles, o suficiente pra ele ficar de fora, desta e da canção que a sucedeu no álbum, Dear Prudence, que aliás começa com o som de um jato pousando em fade-out, exatamente como fora no começo de Back In The USSR. Mas voltando à música, Back In The USSR é a primeira do disco, mas foi gravada no terço final do período de gravações, já em 23 de agosto, Ringo foi embora logo no começo, o que fez os outros três se virarem. Notaram que John tocou baixo e bateria além de sua guitarra-base, George tocou também guitarra base, baixo e bateria além de sua guitarra-solo, Paul tocou também guitarra base, e bateria além de sua guitarra-baixo. Muito trabalho no primeiro dia, até quase 5 da madrugada. No segundo, Paul introduziu piano vibrante, ao longo de toda a canção, e seu vocal principal, dobrando em alguns momentos. John aparece no vocal de apoio grave no refrão, mas mais notadamente no "Da Da Da Da" na ponte, seguido de Paul e George no "Uuuu- UUuuu-Uuuu" a la Beach Boys, declaradamente. Note a guitarra estilo despertador no 4° Verso. Além de palmas sensacionais! Finalmente, o já mencionado som de avião estava no banco de sons especiais da EMI. Era uma decolagem e um pouso de um jato Viscont, que foi colocado em vários pontas da canção, além da estonteante introdução e da conclusão.
Como mostra ao vivo, escolho justamente a já mencionada aqui, 2003, Praça Vermelha, Paul McCartney faz as Moscow Girls abrirem sorrisos de orelha a orelha! Aqui, neste LINK.
Pronto!
Considerem-se apresentados ao
Melhor ROCK dos Beatles,
segundo alguns!
2. Dear Prudence (Person Speech Song by John Lennon)
John diz: "Querida Prudence, vem brincar aqui fora, deixe-me ver seu sorriso, o dia está lindo e você também!"
A atriz Mia Farrow e sua irmã Prudence eram companheiras dos Beatles no retiro espiritual em Rishikesh na Índia. Prudence era a mais dedicada à Meditação Transcendental, e não interagia com os outros. John fez a canção pra ela! E ficou linda! Mas ela nem ouviu, estava catatônica, queria ser a primeira a encontrar Deus! A canção começava apenas com John ao violão num dedilhado novo para ele (que aprendeu lá, com o astro Donovan e que viria a utilizar também em Julia, outra do Álbum Branco), e depois vai crescendo ritmicamente, de maneira fenomenal. Paul foi o que mais trabalhou, porque, além do baixo (espetacular!), tocou piano e bateria, sim, porque Ringo havia abandonado os Beatles.... chateado com críticas que recebera de Paul na gravação de Back in The USSR.... mas ele voltou 10 dias depois...
A estrutura da canção é simples, são quatro versos e uma ponte dividindo a canção. Versos 1 a 3 têm letras diferentes (regra Beatle) e o 4° repete a letra do 1°, mas com um arranjo arrepiante, veremos! Cada verso termina como começa, repetindo a primeira frase. As rimas seguem predominantemente 'ricas', 5x1, "play-day", "blue-you, "smile-child", "sing-everything", "chain-again", a única 'pobre' sendo "eyes-skies".
A gravação da canção foi feita fora da EMI, no Trident Studios, que estava melhor aparelhado que a configuração disponível em Abbey Road. Eles já tinham um equipamento de 8 faixas, ao contrário do tradicional, de 4. Eles haviam gravado Hey Jude ali, e resolveram que a linda balada de John seria melhor aproveitada ali. Então, num belo 28 de agosto, John, Paul, George e ... só eles (remember! Ringo estava brigado com eles) se internaram para 14 (catorze!!!) horas de gravação de muuuitos takes, mais precisamente, UM!! (hehe) Explica-se, com a profusão de faixas disponíveis, 100% a mais que o normal, eles foram usando cada uma delas, levando à perfeição um instrumento por faixa, até terminar o exaustivo dia com o lindo dedilhado (e dobrado) de John na Faixa 8, a guitarra distorcida de George na 7 e a bateria de... Paul na 6. Na sessão seguinte, que começou no mesmo dia em que terminou a primeira, as 11 (onze!!!) horas de gravação terminaram com o baixo de Paul e um pandeiro de John na Faixa 5, o vocal principal de John na 3, e depois dobrado manualmente, e finalmente os vocais de apoio, não apenas de Paul e George, mas também dos presentes na sessão (o guitarrista Jackie Lomax, o roadie Mal Evans e até um primo de Paul, John McCartney), em momentos da ponte, e juntamente com palmas, nas Faixas 1 e 2. Ficou registrado o aplauso espontâneo ao final, de todos os presentes, impactados que ficaram com o resultado esplêndido daqueles dois dias! A Faixa 4 foi gravada no terceira sessão (mais tarde no mesmo dia), que durou 'apenas' 4 horas, e tinha mais guitarra de George e o piano de Paul.
Emocionante perceber o crescimento do arranjo instrumental ao longo da canção. Após o avião pousar, o Verso 1 começa leve, com John ao violão chamando a garota "Won't you come out to play?", o baixo do Paul em notas simples, até a terceira frase, quando o próprio Paul começa escorregar o dedo por sobre a corda, e entra a bateria de ... Paul, ainda num galope leve, mas com um marcante prato, concomitante com o "to play" final. No Verso 2, John pede pra garota "open up your eyes" e "see the sunny skies" já com o baixo de Paul em seu esplendor de slides, a bateria já desde o começo, e um apropriado pandeiro, e o vocal de apoio de Paul e George entrando agudo a partir do "skies", e o prato terminando com o último "eyes", e aí se nota a guitarra distorcida de George introduzindo a ponte, em que John convida a garota, que já estaria com os olhos abertos, para "Look around round", e vêm Jackie, Mal e John (o McCartney), os três vocalistas incidentais, no "round round round round round" mais grave. John quer ver o sorriso de Prudence no início do Verso 3 que, além do mesmo arranjo do 2°, tem uma guitarra de George mais acentuada e o ritmo marcado por palmas, quando então vem a apoteose do 4° Verso, com a letra do primeiro, mas no estilo daquele comercial famoso "a minha letra continua a mesma, mas o meu arranjo, quaaaanta diferença!". Primeiro, Paul esquece o burocrático galope e incita subsequentes e intensas viradas na bateria, e ainda tecla um piano agudo em nervosos triplets, e depois com o polegar passeando de cima pra baixo nas teclas brancas, e não satisfeito com tudo isso, John muda o espaçamento das palavras em "The suuun is-up, the skyyy is-blue, It's beeeau ti-ful and sooo are-you", e a guitarra de George responde a suas frases lindamente, além da correspondente mudança na bateria de Paul, um verdadeiro clímax!! Merecedor dos aplausos que espontaneamente surgiram na gravação!! Estavam todos orgulhosos de seu trabalho, com razão! Pena que Prudence Farrow, a homenageada, que teve ninguém menos que um John Lennon entrando em seu quarto tocando violão, acompanhado de um Paul McCartney e de um George Harrison, entoando uma canção especialmente feita para ela, mas não ouviu nada, não abriu os olhos, não foi brincar, não viu o céu, não sorriu, porque estava em transe, e só foi ouvir a canção após seu lançamento oito meses depois, e ficou encantada para todo o sempre. Claro que, com tanta dedicação ao processo, ela virou doutora em Meditação Transcendental e pregou a técnica a vida toda.
Aqui, The Analogues, imitando à perfeição! O som está sobre um vídeo que acomapanhava sua exibição no palco. Aí você pode imaginar que é John no vocal, George na guitarra, Paul no baixo e ... Paul na bateria. O som está idêntico!
Aqui, uma excepcional versão de Alanis Mourisette num tributo a John Lennon, note que palco grandioso, note uma 'slide guitar' magnífica, e note que o guitarrista não fez o dedilhado de John. É difícil!
E aqui, mais um brinde, com a sequencia de baixo, muito similar à de Paul!!
E aqui, um brinde final, Alice Green, com o dedilhado de John, e um pouco da guitarra de George, com uma ótima edição e interpretação!
3. Glass Onion (Self Story Song by John Lennon)
John provoca 'Eu falei sobre a morsa e eu. Você sabe o quanto éramos próximos. Aqui vai mais uma pista pra vocês todos: a morsa era o Paul'
Só pra igualar conhecimentos, 'morsa' em inglês é 'walrus', I Am The Walrus é uma magnífica canção de John, do disco e filme Magical Mistery Tour. A letra é uma sucessão de jogos de palavras e auto-referências a outras canções dos Beatles, como Strawberry Fields Forever, Lady Madonna, The Fool on the Hill, Fixing a Hole, Within You Without You e There's A Place. John e Paul queriam fazer uma canção pra gozar daqueles que enxergam sinais escondidos nas canções deles (e na capa de Sgt.Pepper's), inclusive aquela história de que Paul estava morto. Foi John quem materializou a ideia. Bem, se a intenção era essa, desmistificar, não ajudou um dos muitos significados do título: (1) aqueles caixões que têm um visor de vidro mostrando o morto dentro dele... Glass Onion também pode ser(2)garrafa de fundo largo para uso em embarcações, ou (3) lentes redondas de óculos, ou (4)maçaneta de urna, e tem até uma possível interpretação (5) no mundo das drogas, que vão descascando a mente como uma cebola. Enfim... quem dá mais? John disse, uma vez, que era uma homenagem a Paul ("Você sabe o quanto éramos próximos" ele diz), que segurava as pontas da banda, enquanto ele estava nas nuvens, com Yoko. A ideia, a melodia e o 1° Verso estavam prontos quando John gravou a Demo na casa de George em Esher, onde os quatro se encontraram no final de maio para organizar os alfarrábios das criações produzidas na Índia, eram 18!! Esse 'Esher Tapes é o melhor extra da celebração de 50 anos do Álbum Branco, lançado em 2018! Daquela data até setembro, quando começou a gravação, John criou outros dois versos com alguma ajuda, não especificada, de Paul, que foi chamado para dar uma arredondada! Com tantas referências soltas no final de cada verso, às vezes acelerando as sílabas, de tantas fontes diferentes ("cast iron shore", "dove tail joint", "bent backed tulips", "trying to make ends meet"), que John colocou nas três últimas frases dos versos, as rimas se concentraram nas quatro primeiras frases de cada um, e são bem interessantes, como "fool on the hill... living there still" e ""strawberry fields .... nothing is real", esta replicando a letra de sua própria canção do álbum anterior, e duas vezes rimou o verbo "be" com o pronome "me", mas a que eu mais gosto é a daquela frase da morsa, que era assim em inglês: "Well here's another clue for you all: the walrus was Paul!". John rimou "Paul" com "all", e foi ali que eu soube, nos meus 10 anos de idade, que Paul se falava 'Póu' e não 'Pôu', como eu sempre falara desde que comecei a idolatrar John Lennon e 'Pôu' McCartney, três anos antes!
A música, como sempre, é magnífica! A gravação com a banda durou 4 sessões, de 11 a 16 de setembro, sem a presença de George Martin, que estava de férias! Na primeira delas, foram 34 takes com a base formada pelos 4 Beatles em seus instrumentos tradicionais (John no violão e num guia vocal). Destaque para a abertura da canção (e dos outros dois versos) com a caixa de Ringo, com duas batidas, solo, dobradas, e a seguir botando a gente pra dançar num rock 4x4. No 2° dia, John colocou seu vocal (note que apenas ele canta) e Ringo acrescentou um pandeiro. No dia 3, foi Paul ao piano e uma tentativa de mellotron, que eu não identifiquei na gravação final. O último dia 'de banda' foi Paul na flauta doce, em dupla com um dos engenheiros de som, homenageando o instrumento que fora tão importante na canção mencionada no 3° verso, The Fool On The Hill. Teve mais um dia com John acrescendo uma fita com quatro de sons que, entretanto, foram desconsiderados por George Martin quando retornou de férias, mas o Maestro ofereceu, em seu lugar, um magnífico arranjo de cordas, gravado bem depois, com 8 instrumentistas! Note o destaque dos violinos e violoncelos em glissando crescente na 3ª e 4ª frases dos 3 versos, e todos em stacatto em todos os "Looking through a glass onion". As cordas seguem 'por trás' de toda a canção, mas voltando a ter destaque absoluto na ponte, instrumental, entre os Versos 2 e 3, um crescendo a la James Bond, enquanto John fica no "oh yeah oh yeah oh yeeeeaaah" e perceba ali no final da ponte o polegar de Paul passando pelas teclas brancas. Isso sem contar a conclusão, com violinos subindo e descendo, e violoncelos em pizzicato, com o tempo sendo levemente reduzido até o final, dando a deixa para entrar o piano de John em Ob-la-di Ob-la-da, que seria a 4ª canção do álbum!
Ah, Glass Onion é a primeira canção com a bateria de Ringo no Álbum Branco, na ordem em que a colocaram, pois ela é a terceira do Lado A do Disco 1, após Back In The USSR e Dear Prudence, que foram gravadas no tempo em que ele esteve brigado com os demais, e Paul assumiu as baquetas na última e os 3 na primeira!!
Ao vivo? Viva The Analogues!! Aqui, neste LINK, com direito a dois violinos e um violoncelo!
4. Ob-la-di Ob-la-da (Tale Story Song by Paul McCartney)
Paul conta ''Desmond tem um quiosque no mercado. Molly é a cantora de uma banda. Desmond diz à Molly, garota eu vou com a sua cara e Molly responde pegando em sua mão"
E depois, ele compra um anel para ela, e os dois viram o casal Jones, têm dois filhinhos, que brincam no quintal e seguem sua vida feliz, cantando Ob-la-di, Ob-la-da, seja lá o que isso queira dizer! Mais uma historinha que Paul, nosso maior storyteller, conta! Paul pegou essa frase com Jimmy Scott, um percussionista nigeriano radicado em Londres, que provocava sua plateia com 'Ob-la-di', a plateia respondia com 'Ob-la-da' e ele finalizava com 'Life goes on'. Pois que não é Paul teve a cara de pau de pegar essa frase INTEIRINHA e colocar no refrão de uma canção Beatle, e ainda tentou convencer o amigo a não cobrar direito autoral?! Claro que não conseguiu, mas teve a sorte de que Scott se enrolou com pensão alimentícia a uma ex-esposa, pediu ajuda a Paul, que concedeu mas, em troca, exigiu que desistisse da ação, que ia ganhar, sem sombra de dúvidas, e embolsaria milhões, facilmente. Ah, esse Paul!!!Musicalmente é um ska muito legal, que eu adorava quando pequeno. Eu tinha o compacto (que veio com While My Guitar Gently Wheeps, do George, no Lado B), e ouvia sem parar, nos meus 10 aninhos! Mas eu e milhões de fãs pelo mundo e pelas décadas seguintes éramos (somos) minoria. Incrível como a música é execrada por boa parte dos beatlemaníacos ao redor do mundo! Talvez pela letra bobinha, pelo ritmo quase infantil, não sei, não concordo, e continuo adorando. Fato também é que todos os outros três Beatles também detestaram, e até o engenheiro Geoff Emmerick pediu demissão por causa dela!! Depois, voltou! Quem mais detestava era John, que numa das muitas sessões de gravação, abandonou-a intempestivamente, ficou fora umas horas, voltou chapado, sentou ao piano e disse: 'É disso que esta musiquinha de merda precisa!". E foi aquela abertura que ficou na gravação final! É o gênio consertando as coisas! Notem os ótimos saxofones no meio dos refrões, e também as risadas e os complementos de John e George, após o 'Molly lets the children lend a hand', uma fala 'arm' e o outro 'leg', bem divertido. E note que Paul troca Desmond por Molly e vice-versa, no último refrão. Paul queria trocar, quando percebeu, mas os outros três disseram em uníssono: Não, Paul, chegaaa!.... eu que inventei essa forma, mas o fato é que os três disseram pra deixar assim mesmo. Mas vamos deixar os detalhes sórdidos e passar aos detalhes técnicos.
Se prestaram atenção em minhas análises pretéritas, repararam que a maioria delas apresenta apenas duas das três peças estruturais, verso e refrão ou verso e ponte, às vezes apenas só versos. Ob-la-di Ob-la-da tem verso, ponte e refrão, e aqui, como um refrão que se preze, ele é repetido quatro vezes, e como cada uma delas tem duas vezes a linha principal com seu título, ouvimos Ob-la-di Ob-la-da 16 vezes, sem contar a versão diminuída da conclusão, decerto são os sons mais ouvidas em uma só canção, descontando, claro, os Na-Na-Na's de Hey Jude!
Em termos de rimas, e se fôssemos manter nosso costume de classificá-las como no português, diríamos que foi uma das pouquíssimas vezes em que a pirâmide social foi invertida: as 'pobres' suplantaram as 'ricas'! Notem "place-face" e "hand-band" e "store-door", todos substantivos, sendo "ring-sing" a única concessão às mais abastadas, com uma combinação verbo-substantivo. Mas Paul não é fácil, ele não ia deixar isso assim barato. Os três primeiros versos têm letras distintas, seguindo o savoir-faire dos compositores Beatle: no 1°, Desmond conhece Molly, no 2°, ele se declara a ela, e no 3°, eles já estão casados e com filhos, e no 4°, repete-se o 3°. Tudo certo, só que note que, no Verso 1 e no Verso 3, que contam histórias distintas, são usadas as MESMAS rimas, "place-band-face-hand", uma variação da rima interplanetária de Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band. É a genialidade expressa de outra maneira. A canção tem uma ponte "In a couple of years they have built a home sweet home" entre os Versos 2 e 3, que se repete antes do Verso 4.
Como todas as canções compostas na Índia, Ob-la-di Ob-la-da ganhou sua primeira versão demo na casa de George Harrison em Esher, no final de maio, junto a outras 17 canções que aparecem Álbum Branco. Ali, era Paul no violão, e num vocal, dobrado mal e porcamente, e mais chocalho e pandeiro e um bongô simulado na caixa do violão. Na ponte, já tinha um galopezinho, simulado num "chakabum-chakabum-chakabum". Só em 3 de julho, eles se reuniram no estúdio, dando início a uma maratona de 42 horas de gravação, constituindo-se na canção com maior tempo dedicado em todo o álbum. Vamos tentar decifrar o andamento:
- Dia 1: foram 7 takes com Paul, john e George em violões, Ringo na bateria, seguindo um guia vocal do compositor;
- Dia 2: Paul grava seu vocal principal, John e George seu vocal de apoio, o "La La How the life goes on", e Paul no "chakabum" da ponte, mais chocalho e cowbell;
- Dia 3: Apenas Paul atuou, para programar os metais, cantando os sons que queria para George Martin transformar em pauta e 3 saxofonistas colocarem seu ótimo trabalho, que, infelizmente, .... conto mais adiante; houve também um trompete piccolo, que no mesmo dia foi apagado por um violão de Paul simulando um baixo eletronicamente, para desespero dos técnicos;
- Numa pausa de 3 dias, Paul ouviu, re-ouviu, pensou, sonhou, e descobriu que não era aquilo que ele queria e resolveu começar tudo do zero, começando a deixar seus companheiros fulos, e o estúdio lamentou a primeira vez que o trabalho de músicos contratados foi jogado no lixo.
- Dia 4: Todos souberam da decisão de Paul, e começaram a trabalhar, chateados, até que, numa bela hora, ocorreu o arroubo de John, acima descrito, e que acabaria por salvar a canção. Ele saiu gritando pela escada acima, Yoko logo atrás (veja bem ele ainda não havia se divorciado de Cynthia), todos se entreolharam, mas seguiram nas tentativas, e quando já não mais se esperava, horas depois, John retornou, apareceu no topo daquela mesma escada lateral, visivelmente alterado, e declarou, agora no original em inglês: "I am more stoned than you have ever been. In fact, I am more stoned than you will ever be! And this is how the f*cking song should go.". E desceu com passos firmes, sentou ao piano e machucou as teclas com aquela maravilhosa introdução. Paul, inicialmente doido com aquilo tudo, acabou se acalmando e disse que estava feliz por John ter dedicado aquelas horas se inspirando para a canção dele. Ademais, aquilo salvou a canção, porque o ritmo da introdução segue até o final, dando o que Paul queria e não estava conseguindo! A partir de então, voltaram ao trabalho, agora com John ao piano, Paul no baixo (fuzz, aquele usado pela primeira vez em Think For Yourself), George no violão e Ringo na bateria, em mais 6 takes. E ainda foram gravados novos vocais, lead and backing, e mais percussão, e mais aqueles trechos, um introduzindo a Ponte 2 e outro aquela sequência divertida no Verso 4, por Paul;
- Dia 5: Paul ainda não estava satisfeito, e gravaram mais 7 takes, sem Ringo, com Paul migrando para a bateria, Ringo não havia sido chamado, e quando chegou, uma nova e definitiva versão, desta vez com Paul, John e George dividindo um microfone, como nos velhos tempos, o que os inspirou a fazer aquelas divertidas inserções no Verso 3, após o "hand" de Paul, veio o "arm" de John, e o "leg" de George, não sabemos se combinado ou improvisado, de qualquer modo, genial. E também as risadas ao final das pontes, e aquele final de John, agradecendo sabe-se lá o quê. Nesse dia, também foi acrescida alguma percussão e também palmas, a destacar aquelas notáveis, logo na introdução, curtinhas, mas marcantes! Ficou tudo tão divertido com esses toques, que cheguei a pensar em consider a canção como uma Funny Story Song, mas resolvi ater-me ao conteúdo da letra;
- Dia 6: Estão de volta os três saxofonistas para gravar suas ótimas partes, a primeira na Ponte 1, decrescente estupenda depois numa estupenda contraparte à melodia cantada por Paul nos Refrões 3 e 4. Note que na Ponte 2 ainda há outra sequência decrescentes, mas de leve, por trás de Paul cantando "Desmond and Molly Jones", e por que eu digo 'de leve'? É porque, em algum take perdido, talvez ainda naquela primeira sessão de metais desprezada, essa parte é bem pronunciada e eu achei genial;
- Dia 7: Você pensa que estava tudo pronto? Paul não achou! Ele quis porque quis melhorar seu vocal, e lá apareceu num funesto 15 de julho para melhorá-lo. E por que 'funesto'? Porque houve um episódio lamentável. Numa bela hora, o George Martin, o grande Maestro, sugeriu lá do aquário, da sala de controle, educadamente, como lorde que era, que talvez Paul pudesse refrasear melhor as últimas linhas dos versos. Paul lá de baixo, não teve dúvidas e disparou: "If you think you can do it better, why don't you f*cking come down here and sing it yourself?" Uau!! Nosso lorde levantou a voz, como nunca fizera, acho que na vida, e começou uma altercação com o cantor, que depois acalmou. Só que o episódio causou uma baixa terrível. Geoff Emmerick, o grande produtor, já ganhador de dois Grammy's simplesmente disse que não iria mais trabalhar com os Beatles! E não produziu mais nenhuma canção do Álbum Branco!!! Ele somente voltaria nove meses depois, para as gravações de Abbey Road!! Ufa! Paul estava impossível!!
Isto posto, na época do lançamento do Álbum Branco, John, George e Ringo não permitiram que Ob-la-di Ob-la-da fosse lançada como compacto, no Reino Unido ou nos EUA. Mas não se incomodaram que fosse feito nos demais países. Que bom, porque chegou aqui no Brasil, como eu contei no começo desta análise! E foi enorme sucesso no mundo todo. É considerada a face popular do Álbum Branco, e tem enorme penetração com as crianças!
Coloco aqui alguns youtubes como referência: (i) AQUI, só nos violões, com o "chakabum-chakabum-chakabum" nas pontes, e com uma interessante harmonia de John e George, nos versos 3 e 4, nada disso sobreviveu na edição final. (ii) AQUI, ainda nos violões, sem o "chakabum", mas com aqueles saxofones no final das ponte, que eu achei bem melhor que o que saiu no disco. (iii) AQUI, como eu não achei o video isolado de The Analogues cantando Ob-la-di Ob-la-da, apenas o àlbum Branco todo, coloque no link uma reportagem sobre eles, pra vocês ficarem babando, com a MELHOR BANDA cover dos Beatles! (iiiv) AQUI, deixei Paul por último, porque ele foi muito chato, numa sensacional performance no Hyde Park em Londres!
5. Wild Honey Pie (Sex Girl Song by Paul McCartney)
Paul grita ''Docinho, Docinho, Docinho, Docinho, te amo!"
- 'Honey pie' é um tratamento carinhoso de homens a garotas, como 'dear', 'baby', 'love', 'bird' ou simplesmente 'honey';
- A letra da canção é apenas o trecho que eu ressaltei na tabela, berrado, nada mais que isso;
- A música é Paul solo no bumbo e tom-tom e guitarras distorcidas sem ritmo definido;
- Esse conjunto seria facilmente definido como uma Nonsense Song, mas como fala em garota, resolvi classificar como Girl Song
- 'Honey Pie' é o título de outra canção de Paul, um vaudeville maravilhoso, no mesmo álbum, em que Paul lamenta que sua torta de mel partiu para tentar a carreira em Hollywood, mas não desmancharam, uma letra que eu classifico como Story;
- A colocação do adjetivo 'Wild', aposto ao título carinhoso, aludiria ao comportamento doido da garota;
- Daí a associar o 'selvagem' ao sexo idem foi um pulo;
- Sem necessidade de analisar rimas, ou estrutura da canção;
- Caramba, acho que eu gastei mais tempo a essa canção do que ela merecia... Se o álbum fosse simples, como queria George Martin, decerto ela seria uma candidata certa à eliminação, mas agora já foi!! Aliás, ela seria mesmo eliminada, mesmo do Álbum duplo, mas Pattie, a esposa de George Harrison, gostava dela, e ela foi deixada lá.... mas como já disse, não faria nenhuma falta.
- Não vou colocar vídeo nenhum. Um absurdo colocar uma coisa dessas e deixar de fora uma Not Guilty, uma canção de George que não chegou a um bom denominador na gravação, mesmo depois de mais de 100 takes. Aliás ouça, AQUI, esta injustiçada.
Quando fui procurar uma imagem para ilustrar o post, apareceu esta abelhinha simpática, voltei ao modo texto, anotei ocorrências com o nome, uma produtora de vídeos (thewildhoneypie.com), um filme de 2018, e alguns outros sites que se inspiraram nesta canção dos Beatles.
Enfim, uma canção dos Beatles, por mais estranha que seja, sempre causará algum efeito em alguma pessoa deste planeta.
6. The Continuing Story of Bungalow Bill (Funny Story Song by John Lennon)
John conta ''Ele foi caçar tigres com elefantes e armas. Pra prevenir acidentes ele sempre leva sua mãe. Ele é aquele típico saxão americano cabeça oca, filho da mãe"
A inspiração para John escrever esse libelo contra a caça de animais inocentes veio de fato e personagens reais. 'Bungallow Bill' era o americano Richard Cooke III, que acompanhou sua mãe ao Ashram do Maharishi na Índia, na mesma época que os Beatles lá estavam para aprender Meditação Transcendental. Ele e a mãe realmente saíram numa caravana de elefantes pela selva ao redor, e realmente apareceu um tigre e realmente 'Bill' atirou nele!! E vangloriou-se! Depois, se arrependeu, pelas reações dos demais, afinal era incompatível você estar num local para aproximar-se de Deus e ao mesmo tempo matar um filho de Deus. Bem, o arrependimento não foi suficiente para John desistir de fazer a canção que havia já começado, irritado com a atitude do co-hóspede. Ele nomeou o infeliz como Bill para rimar com "kill", e o Bungallow era porque todos ficavam instalados em bangalôs naquele retiro. O evento da caçada causou reunião com o Guru, que condenou a 'destruição de vida' de qualquer espécie. 'Bill' encerrou sua carreira de caçador e iniciou outra, de 40 anos, como fotógrafo, inclusive da National Geographic, e a mãe ficou amiga de George até o fim da vida, dele.
A gravação tem uma interessante introdução em música flamenca, que eu achava que era um violão, mas era um trecho de banco de um Mellotron, tocado por um engenheiro de estúdio, Chris Thomas. A canção começa no refrão cantado por todos os Beatles mais Maurreen (esposa de Ringo) e Yoko, depois são três versos (às vezes acompanhado de um som que eu achava que era um bandolim, mas era o Mellotron, desta vez tocado por John) intercalados com o refrão, que ao final é repetido algumas vezes e é acompanhado por um som que eu achava que era um trombone, mas era o Mellotron, de novo tocado pelo engenheiro.
Note duas semelhanças interessantes com canções do próprio John: (i) o refrão é introduzido por três batidas de Ringo, aqui por trás do brado "All the children sing", e você encontra as mesmas três batidas de Ringo introduzindo o refrão de Lucy In The Sky With Diamonds, e (ii) Cante a frase "So Captain Marvel zapped him right between the eyes" desta canção e note a estonteante semelhança com "and curse Sir Walter Raleigh, he was such a stupid git" da canção I'm So Tired, do mesmo álbum. Um verdadeiro, e permitido, autoplágio!
Os versos têm três linhas cada um, rimando entre si, dentro dos versos. Então é "gun-mom-son", com a descrição do filho da mãe, e "lies-surprise-eyes", ZAPPP, entre os olhos do pobre tigre que ele pegou de surpresa e matou, e termina com "sin-in-him", com crianças perguntando a ele se matar não é pecado, mas é a mãe quem responde por ele, justificando que foi necessário, senão eram eles os fulminados! Aliás, a mãe do desgraçado é interpretada por ninguém menos que Yoko Ono, que continuava sua maratona de presenças no estúdio, acompanhando John e deixando os demais incomodados. A linha dela é "Not when he looked so fierce". Aquela participação foi a primeira e única vez que uma voz que não era de nenhum Beatle cantou algum trecho 'lead' de uma música Beatle! Os demais Beatles não tinham o que fazer, afinal, era canção de John!
A gravação da Contínua História de Guilherme do Bangalô ('Guilherme' vem de 'William', que diminui para 'Will' até chegar em 'Bill') foi feita em apenas duas sessões, tendo mais de quatros meses de diferença temporal entre elas. Na primeira, ela estava junto com outras 17 canções do Álbum Branco que tiveram sua demo gravada em Esher, na casa de George, onde os Beatles se reuniram no final de maio para organizar a produção criada na Índia. Era John, voz e violão, e os demais no sing-along do refrão, e batiam palmas e simulavam bongôs nas traseiras dos violões. A segunda e última sessão começou em 8 de outubro, mas a canção em questão começou a ser trabalhada somente à 4 da manhã do dia 9, que era o aniversário de 28 anos de seu autor. Àquela altura, eles já tinham o gravador de 8 faixas instalado na EMI, provendo mais flexibilidade e menos necessidade de 'reduções de fita', que eram aquelas demoradas operações de concentração de gravações de duas ou mais faixas em uma só, para liberar espaço na fita pra gravações adicionais. No Take 1, era John e George nos violões, Paul no baixo e Ringo só nas escovas da bateria, e ainda os vocais de John, principal, e de todos no refrão, e Yoko também gravou sua parte. No Take 2, John alternava "What did you kill?" com "Was it a thrill?", mas isso foi esquecido no take seguinte, que existiu porque Ringo deu uma vacilada no ritmo na entrada do Refrão 3, e o take foi abandonado, mas merece registro o elogio de George à harmonia de John: "Amazing chord changes!", ele disse. Não que sejam complexos acordes dissonantes de sétima ou nona, tipo bossa nova, nada disso, mas não deixa de ser interessante. Veja se não, nas linhas abaixo:
Refrão
C G C Fm C Fm G
Hey Bungalow Bill what did you kill Bungalow Bill
A E7 A D A D E7
Hey Bungalow Bill what did you kill Bungalow Bill
Verso 1
Am C F G
He went out tiger hunting with his elephant and gun
Am C F G
In case of accidents he always took his mom
E G Am Fm
He's the all American bullet headed saxon mother's son
O Take 3 foi definitivo. Os três 'instrumentos' do mellotron (violão flamenco, bandolim e trombone), foram acrescentados, Paul modificou sua linha de baixo, John dobrou seu vocal nas terceiras linhas de cada verso, e acrescentou aquelas chamadas de refrão ("All the children sing"), e todos que estavam disponíveis no estúdio foram chamados para engrossar o refrão (foi aí que entrou Maurreen, a esposa de Ringo), e também contribuir com palmas e assobios, com a animação possível para uma sessão que chegava perto das 8 da manhã, e John ainda termina a canção com aquele "Hey up!!" que, no disco, emenda magnificamente com o pianinho (que é um piano!) da próxima canção, a magnífica While My Guitar Gently Wheeps. Tenho um vídeo aqui, dos perfeitos Analogues tocando a canção com todos os mellotrons e as chamadas de John e a junção com a canção seguinte, mas não é uma gravação oficial, mas de um espectador mal colocado, e sem sensibilidade para focar nos instrumentos necessários, mas é o que temos por hoje! Aqui, neste LINK!
7. While My Guitar Gently Weeps (Group Speech Song by George Harrison)
George expõe: ''Eu olho vocês todos, vejo o amor que aí dorme, enquanto minha guitarra suavemente chora"
A desilusão com as pessoas e a contemplação do estado das coisas são o cerne da canção. A decepção é direcionada a pessoas em geral mas, no particular, certamente a seus próprios companheiros John e Paul, que ele sentia terem voltado da Índia meio que afastados de seu guitarrista, estavam assim-assim com a experiência que tiveram, achando que foi meio perda de tempo, e George os critica por não terem captado o âmago das mensagens, e aproveitado para crescerem como pessoas. A contemplação está nos versos (são dois), e a desilusão está nas pontes (são duas). Nos versos, George observa ("I look") e nota ("I see" e "I notice"), e conclui com um conselho, para si e para os outros ("With every mistake we must surely be learning"). Nas pontes, George lamenta ("I don't know why..." e "I don't know how..."), acusando as ´pessoas' de terem se pervertido e desviado do caminho, e conclui "no one allerted you" e "they bought and sold you". O Verso 1 é repetido em parte na conclusão, quando George olha para todos e vê o amor hibernando, enquanto sua guitarra suavemente chora. É lindo demais! Aquela criação mostrava como George crescera como compositor, abrindo caminho para outras duas obras-primas, Something e Here Comes The Sun, que viriam no ano seguinte. E ele acabou trazendo Eric Clapton para fazer um dos solos de guitarra mais cultuados da história. Mas agora, vamos aos detalhes!
A canção, embora não tenha sido criada durante o retiro na Índia, foi apresentada por George em sua casa, em Esher, no final de maio, juntamente com outras que ele, John e Paul trouxeram de lá. Na demo, que tinha letra levemente diferente, ele a tocou em seu violão, Paul acrescentou um órgão nas pontes e um elogio ao final: "Cool!!", ele disse. Apenas no final de julho aconteceram os primeiros dois Takes, na EMI, apenas com George e Paul presentes, com este último num harmônio. Era opinião de todos que aquela versão apenas acústica estava linda o suficiente, e profissionalmente executada, para ver a luz do sol na edição final, aliás, como acústicas ficaram Blackbird (Paul) e Julia (John), no mesmo álbum. Bem, naquele dia, os outros dois Beatles chegaram e começaram a ensaiar uma versão banda, e o fizeram até a madrugada do dia seguinte. Só em meados de agosto, George decidiu que a versão final teria a presença de todos. Felizmente, um take acústico daquele dia alcançou o estrelato merecido quase meio sécu depois, quando inclusive ganhou um vídeo-clipe maravilhoso, que apresentarei ao final desta análise. Então, em agosto, numa longa sessão, 14 takes aconteceram, com George na guitarra, Paul no baixo, John no órgão e Ringo na Bateria, um em cada faixa da fita, reduzida ao final no Take 15, abrindo duas faixas para acréscimos futuros. E quase outro mês se passou. O 3 de setembro de 1968 viu a primeira sessão de um gravador de 8 faixas nos estúdios de Abbey Road, mas foi por pressão dos Beatles, que exigiram que fosse interrompida a fase de testes, e botaram pra rodar o equipamento. Sendo assim, as duas faixas livres do Take 15 viraram 6, no Take, que foi renumerado para 16, entretanto, aconteceu aquilo que se diz: "Quem nunca comeu melado, quando come se lambuza!". Naquele dia, foi apenas George, usando duas faixas para seu vocal e outra para a guitarra da sessão solo, mas tentando fazer sua guitarra chorar, como na letra, ele quis repetir aquela técnica de gravação reversa, novidade que lançaram em I'm Only Sleeping, e ficou nisso até de madrugada. O dia 5 viu a volta de Ringo, depois do entrevero de Back In The USSR, com sua bateria recheada de flores, e preencheram as faixas com um monte de coisas, tanto que a bateria ficou inaudível! George levou a fita pra casa, ouviu, reouviu e disse: "PARA TUDO!" (ai que vontade de colocar o acento no 'pára'..) E jogou tudo no lixo, e decidiu começar tudo do zero! Tanto que aquele dia 5 nem foi considerado como um dia de gravação, e o Take válido era ainda o 16. No dia 6, entretanto, ele pegou carona para o estúdio com um amigo dele, chamado Eric Clapton, que morava no mesmo bairro, e no meio do trajeto, conversando sobre a dificuldade de fazer sua guitarra chorar, ele o chamou para tocar sua guitarra na canção, ao que ele respondeu: "QUEM, EU? TOCAR COM OS BEATLES?". Não que ele não fosse já famoso, estava dissolvendo a banda CREAM e já era considerado GOD, mas Beatles, como se diz hoje, era OUTRO PATAMAR. Então, ele entregou George no estúdio, e somente se apresentou no meio da sessão. Nesse meio tempo, os quatro Beatles já estavam firmes, com George no Violão, John na guitarra, Paul no órgão e Ringo na bateria. Segundo George, o clima, entretanto, estava ruim, com seus amigos se esforçando pouco, mas quando Eric chegou, o ambiente mudou, todos ficaram animados, inclusive Paul assumiu o piano e criou ali mesmo aquela introdução maravilhosa que ouvimos até hoje, lembrando o que John fizera com Ob-la-di Ob-la-da. E Ringo arrebentou no hit-hat (chimbal), e depois no pandeiro. Então, naquele dia, foram 28 takes, não se sabe quantos com a presença do convidado ilustre. Eric Clapton fez ali o mais cultuado solo de guitarra de uma canção dos Beatles, sua guitarra realmente chorava, com o preciso uso da alavanca. Além da sessão solo, a guitarra 'conversa' com a voz de George nos versos, introduz as pontes, e no final, acompanha os lamentos do cantor com mais lágrimas de sua guitarra, e nós é que lamentamos o fade-out, sempre pensamos que poderiam continuar indefinidamente. No dia seguinte, ainda teve uma sessão final, com George dobrando seus vocais, e Paul acrescentando uma lead guitar nas pontes, Ringo mais pandeiro e John, surpreendentemente no baixo!
Antes do final, acrescento aqui uma outra razão para George ter chamado Eric. Veja as palavras de George sobre o amigo e veja quem entra, do nada, na revelação:
"I admired him as a guitar player and I had no confidence in myself as a guitar player, having spent so many years with Paul McCartney. He ruined me as a guitar player. I rated Eric as a guitar player and he treated me like a human...I had been through this sitar thing. I had played sitar for three years, and I had just listened to classical Indian music and practiced sitar, except for when we played dates, studio dates, and then I'd get the guitar out and just play, you know, learn a part and play for the record. But I had really lost a lot of interest in the guitar.”
Pobre George!
Não se sabe por que Eric Clapton não foi creditado no álbum. Isso causou um constrangimento considerável, porque os fãs escreviam para o guitarrista solo dos Beatles, não entendendo como ele soava tão bem, tão blues., aonde ele havia desenvolvido essa técnica, e tal, ai, ai, ai... O que não impediu que fizessem juntos um show histórico no Japão, quase 25 anos depois, quando Eric conseguiu se superar e sua guitarra ganhou a alcunha 'Psycho Guitar' de seu amigo, ao final da apresentação, ouça o porquê neste LINK, uma pena que não há vídeo de qualidade! A força da canção sobrevive até hoje: um music video maravilhoso, de 2016, tem uma versão voz e violão incrementada com um arranjo de cordas de George Martin, que acompanha uma bailarina que brinca com a letra da música, que sai do papel, as notas saem da pauta, e ganham vida num personagem que dança com ela e passa por portas e janelas desenhadas no mundo real, que já foi visto por quase 60 milhões de pessoas. Lindo, lindo, lindo! Deixo aqui o LINK, para seu deleite! E note nele uma letra diferente no último verso, genial. Se você achou que "I look at the world and I notice it's turning", ou seja, estou contemplando tão profundamente que percebo o mundo girar, era o cúmulo da contemplação, dá só uma olhada na linha final desta versão:
As I'm sitting here doing nothing but aging,
still my guitar gently weeps...
É ou não é o ápice da contemplação, do dolce-far-niente?
'não estou fazendo nada... apenas envelhecendo'
Bem, não é tão nada assim, porque além de ele fazer AQUILO TUDO, afinal,
sua guitarra ainda choraaaaaava...
LINDAMENTE!!!
8. Happiness is a Warm Gun (Funny Story Song by George Harrison)
John conta 'Quando eu te seguro em meus braços e seguro meus dedos em seu gatilho, eu sei que ninguém poderá me fazer mal, porque ..'
A inspiração para John escrever esse libelo contra as armas foi de uma propaganda que tinha os dizeres do título e mostrava um revólver fumegante, após disparar um tiro. Mas a música foi banida das rádios por causa da conotação sexual de algumas palavras... e John admitiu que pensava em Yoko, hehe. O que interessa é que é uma genial canção, mix de três partes. Começa com uma balada sobre uma garota (She's not a girl who misses much tchurururururu oh yeah'... até ...'a soap impression of his wife that she ate and donated to the National Trust'), aí vem uma guitarra magnífica, distorcida, com a melodia do início do segundo trecho, seguida do próprio ('I need a fix, cause I'm going down' ... até... 'Mother Superior jump the gun'), e finaliza num sensacional clima de anos 50, com os backing vocals de Paul e George, acompanhando o 'Happiness is a warm gun' de John com 'Bang Bang Shoot Shoot'. Simplesmente perfeito! Tudo em menos de 3 minutos, com variações frequentes de tempo (Ringo teve trabalho). Complexa estrutura, premiada com, além do banimento inicial, o elogio da crítica (consideraram-na a segunda melhor do álbum, apenas perdendo para While My Guitar Gently Weeps), e os corações de todos os quatro Beatles, que declararam ser ela a canção em que tiveram mais prazer em trabalhar! E nela não houve (quase) outros instrumentos senão duas guitarras, baixo e bateria, puro Beatles, na veia!!
Bem, à análise! Vocês se acostumaram ao apontamentos de versos, pontes e refrões, como partes das estrutura da canção. Aqui, esqueçam! São três canções diferentes juntadas numa peça, só. Vocês se acostumaram à análise das rimas, sua qualidade, sua engenhosidade, posicionamento, enfim, o que desse para ser ressaltado na poesia. Aqui, esqueçam! O Trecho 2 tem uma, "down-uptown" e o Trecho 3, outra, "arms-harm" falada, mas o Trecho 1 é uma profusão de frases desconexas, até mesmo pela forma como John a formou. Dele mesmo, apenas a primeira frase que termina com o "tchurururururu oh yeah'." e a garota que não desperdiça nada é Yoko. Agora, as demais, que falam em toque de veludo, em lagarto na janela, espelhos multicoloridos, botas de pregos, impressão em sabão, e outras coisas aparentemente sem relação umas com as outras, realmente não têm absolutamente nenhuma relação umas com as outras. Foram frases saídas de um 'brainstorm' entre John e seus amigos, Derek Taylor, Neil Aspinal, Pete Shotton, numa noite movida a LSD em uma casa em Surrey, propriedade do então 'cunhado' de Paul McCartney, olha a salada, em que John provocou os demais pra falarem frases que viessem na cabeça, John ia anotando, escolheu algumas, e colocou na letra. Mérito para o compositor que conseguiu colocar aquilo tudo numa métrica agradável de ser ouvida.
A primeira vez que Happiness is a Warm Gun foi mostrada aos demais foi no final de maio, na casa de George em Esher, mas ali ainda não havia essa definição de felicidade, havia apenas o segundo trecho "I need a fix 'cause I'm going down, down to the bits that I left uptown .... Mother Superior jump the gun!, sendo que a Madre Superiora seria a Yoko, e o gun que ele pedia para ela jump (sacar), o tal fix que John estava needing, ser uma picada de injeção de heroína, droga que os dois embarcaram, coisa que nenhum dos outros três Beatles experimentou. John jura de pés juntos que não tinha nada a ver com Henry, the Horse (remember Being For The Benefit Of Mr. Kite). Bem, o fix podia ser também um drinque, aprendi isso em I'm So Tired. Enfim ... O trecho final da canção, que dá o tom de humor que me fez defini-la como Funny Story Song, veio já no período que estavam já em estúdio, quando John leu um artigo de uma revista de George Martin com essa manchete, ele achou aquilo o máximo do absurdo, e resolveu colocar mais um trecho na canção que finalmente ganhou seu nome, acompanhado pelos deliciosos bangs e shoots. E aquele trecho maravilhosamente gritado entre os 'refrões', por assim dizer, "When I hold you in my arms (oooh yeah!) and I feel my finger on your trigger (oooh yeah!), I know NOBODY can do me no harm" teria um duplíssimo sentido, uma conotação sexual, pois you pode ser a garota, e o trigger, além de ser o gatilho do revólver, pode ser aquele órgão sexual, que dispara sensações femininas. Enfim, neste parágrafo, destaquei os dois motivos pelos quais a canção foi banida das rádios, isso porque à época não desconfiaram que a segunda parte veio de uma viagem alucinógena em grupo.
Após aquela mostra inicial de Esher, quase quatro meses se passaram, até que se encontraram no estúdio para ensaiar a canção, em 23 de setembro. E foi duro! Foram 45 takes, em oito horas, muito por causa da variação de tempo entre os três trechos, bem complexo. Note que o tempo passa de 4/4 no Trecho 1 para uma valsa (3/4) no Trecho 2, volta ao 4/4 no começo do Trecho 4 e migra para a valsa novamente, na fala gritada de John, com os "Ooo Oooo Oh yeah". Os entendidos notam outras micro-variações, para um 5/4, um 6/4 e até um 6/8, mas meu ouvido não é treinado o suficiente para identificá-los e passar aqui pra vocês. John também tinha dúvidas quanto ao seu próprio dedilhado no Trecho 1, igual ao que usou em Julia e Dear Prudence. Os quatro estavam em seus instrumentos tradicionais (duas guitarras, baixo e bateria). Entretanto, nada se aproveitou daquele dia! Depois de horas de sono, voltaram à batalha, e foram mais 25 takes, dois dos quais foram considerados apropriados para seguirem adiante! Uma bolha em John fez com que interrompessem a sessão, e decidissem por juntar as melhores partes daqueles dois takes selecionados, e no dia seguinte, estava pronta a base da canção, com o mix dos Takes 53 e 65. Dá até pra notar, percebam um resto de down antes de "I need a fix...", quando entra o outro take. Até essa falha é charmosa! E depois vieram os overdubs, John, em seu extraordinário vocal principal, Paul harmonizando na parte final do Trecho 1 a partir de "Lying with his eyes while his hands are busy..." e em n-1 "Mother Superior jump the gun...", Paul e George 'conversando' com John no "Hapinness" e nos "Ooo Oooo Oh yeah" (enquanto John dá show nas falas gritadas com voz alterada dos "arms, finger and trigger"), e nos "Bang Bang Shoot Shoot", ai, ai, ai, é a terceira vez que eu falo neles, mas é que são tão especiais. E teve um órgão de John logo no começo, pouco audível, e nova linha de baixo de Paul, que também acrescentou um piano na hilário trecho final, e destaca-se um maravilhoso fuzz box de George (remember Think For Yourself) introduzindo o "I need a fix...", e mais pandeiros de Ringo, no clima! Eu já elogiei o vocal de John? Já, mas repito e acrescento e amplifico, não há adjetivos suficientes para qualificar! Que final apoteótico é aquele "Guuuuun"??!! A sessão daquele dia foi eleita pelos quatro Beatles como a mais divertida das sessões do Álbum Branco! O clima estava tão bom que Paul até arriscou uma tuba que estava por ali, mas pouco se a identifica.
Sempre termos a salvação de The Analogues para ver canções dos Beatles ao vivo, e aqui se pode notar a grandeza que foi o vocal de John no Álbum Branco. Apesar de o vocalista que emula o John ser de grande competência, não chega aos pés do que John fez!! Veja aqui, neste LINK.
Desculpem derrubar o nível mas não pude deixar de notar uma triste relação da arte com a vida real.
Ironia do destino... 12 anos depois...
Uma arma ficou muito quente...
cinco vezes fumegante...
às 22:30 h de 8 de dezembro de 1980...
na portaria do Edifício Dakota,
72 Central Park West, New York, NY, USA...
Mark Fucking Chapman estava feliz...
9. Martha My Dear (Dtr Girl Song by Paul McCartney)
Paul discute "Martha, minha querida, você sempre foi a minha inspiração, por favor, seja boa comigo, Martha, meu amor, não se esqueça de mim, Martha, minha querida"
Quando Paul deixou de viver 'de favor' na casa dos pais da namorada Jane Asher, e abriu o bolso para se mudar para sua primeira (de muitas) propriedade, uma ótima casa em Cavendish Street, muito próxima dos estúdios de Abbey Road, em 1966, ele enamorou-se de outra garota, uma sheep dog, a quem deu o nome de Martha, seu primeiro animal doméstico. Quando estava em seu retiro na Índia junto com o companheiros já em 1968, ele pensou nela, e escreveu no papel "Martha, my dear" e "silly girl", mas não escreveu nada além disso. Só lá perto do final das gravações do Álbum Branco, ele transformou Martha numa silly girl, humana, e escreveu uma letra inteira de DR com ela. A única parte da letra que poderia ser direcionada a um animal é na Ponte 1 (na segunda vez em que aparece) seria "Hold your hand out, you silly girl, see what you've done", tipo "dá a patinha" e "olha a bagunça que você fez". Todo o resto da letra é direcionada a uma garota de verdade, hipotética, ou não. Ademais, se fosse dirigida a um cachorro, seria desnecessário o apelo "Don't forget me!!": um cachorro JAMAIS se esquece de seu dono! Escolhi esta foto, dentre as centenas que existem da linda cadela de Paul, pois assim, John aparece nesta análise, já que não contribuiu com NENHUMA letra, NENHUM som, fosse voz u instrumental.
A canção vem com quatro versos, sendo dois instrumentais e dois com letra, e duas pontes, coisa rara na carreira Beatle, uma delas repetida. Entendendo, o verso é o que tem a melodia principal, e a ponte é uma melodia secundária, que 'leva' um verso a outro, só que no caso, a Ponte 1 'leva' a uma Ponte 2, com uma terceira melodia, que por sua vez 'leva' a um outro verso, instrumental, e depois, volta a Ponte 1, para 'levar' ao verso final. E os versos aqui, ou a melodia principal, são mais curtos que as pontes, normalmente é o oposto. Normalmente, eu separo estas minhas análises em letra e música, mas aqui, vou fazê-las concomitantes.
A gravação de Martha My Dear foi fora do padrão de outras do mesmo álbum, pois empregou pouquíssimo tempo de estúdio, mas isso devido a um trabalho prévio. Paul preparou uma demo da canção ao piano, entregou a George Martin e encomendou um arranjo de cordas e metais, aqui e ali, assim e assado. Então, no dia 4 de outubro, Paul, George e Ringo foram cedo ao estúdio (Trident, não EMI), e gravaram, rápida e primorosamente, uma base, com piano, guitarra e bateria, respectivamente. Mais tarde, após um tempo dedicado a outra canção, entraram os instrumentistas, sendo 6 dos metais e 8 das cordas, receberam as pautas de George Martin, receberam as orientação de Paul e George, e acabaram tudo o que precisava ser feito naquela mesma noite. No dia seguinte, apenas Paul veio para gravar seu vocal principal e sua magistral linha de baixo. Aqui, uma palavra sobre o belíssimo piano de Paul. Ele já era o melhor pianista entre os quatro Beatles (depois, John, depois George, depois, Ringo), sempre acompanhando um vocalista, com muito brilhantismo, mas aqui foi a primeira vez que fez um piano solo, com igual esmero, depois de muita prática em casa. Vamos à análise, passo a passo, peça a peça!
Trident Studios - Martha My Dear - Metais
1. O piano começa sozinho a canção, com o primeiro verso instrumental, em que faz a melodia do vocal na primeira frase (até o equivalente ao "be good to me", e depois uma variação, um floreado diferente do vocal, na parte final do verso ("conversation" ou "inspiration").
2. A voz de Paul entra no segundo verso, com o mesmo piano, mas com violinos e violas dobrando as notas do piano, ipsis-"nottilis", e violoncelos marcando.
3. Aí, vem a Ponte 1, ("Hold your head up, you silly girl") com violinos em staccato, junto com piano, mas com o auxílio luxuoso da maravilhosa dupla tuba/trombone a cada dois tempos, magistral, e um flugelhorne ao final, junto com o "silly girl".
4. Ele introduz a Ponte 2, que traz, finalmente, os outros dois Beatles, George na guitarra marcando devagar no começo e acelerado no final ("were meant to be"), e Ringo num tempo 2/4 estilo polka, até quase o final quando dá um break, e uma virada, enquanto ao fundo, trompas e trompetes acompanham, com cordas aparecendo aceleradamente junto com a guitarra, uma riqueza!
5. Aquela mesma linha no flugelhorne introduz agora um verso instrumental, onde uma trompa faz a melodia de Paul e dobra o floreado do piano, tudo acompanhado por palmas marcando cada compasso, note o atraso no meio do verso, e Ringo aparecendo só no final, com uma virada.
6. A Ponte 1 agora é repetida, com uma leve mudança na letra "Hold your hand out" e a presença de um trompete agudo em nota única em sua primeira metade.
7. O verso final, em que Paul fala que a cadela, digo, a garota, sempre foi sua inspiração, e pede pra ela ser boa pra ele, vem com a mesma instrumentação do primeiro verso vocal, com a diferença dA uma linha de baixo que é dobrada artificialmente (Authomatical Double Tracking), e estendida ao final, nota a nota, acompanhando a conclusão das cordas!!!
É bom ou quer mais?!
Ok, tem mais, graças a The Analogues, tem sempre mais. É uma gravação de um espectador, de longe, ma dá pra perceber o apuro dos instrumentos entrando em cada uma das 7 peças da canção. Neste LINK!
10. I´m So Tired (Body Self Song by John Lennon)
John reclama "Estou tão cansado, não preguei os olhos, tão cansado, minha mente está acesa, acho que vou levantar e tomar um drink'"
E em outra tentativa, ele acende um cigarro e pragueja com quem trouxe o fumo à Inglaterra, pobre Sir Walter Raleigh, estava lá quieto há séculos. Escrita na Índia, a insônia foi causada pelo intenso treinamento em Meditação Transcendental, e a lembrança de Yoko Ono, então apenas um caso dele, não o deixava dormir. É pra ela que ele diz "my mind is set on you, I wonder should I call you but I know what you would do!" e também "You know I'd give you everything I've got for a little peace of mind". Musicalmente, o destaque é para o vocal de John e seu murmúrio final, falado em reverso, que foi considerado mais uma peça da conspiração de que Paul estaria morto. Um perfeito relato da insônia, mesmo assim, num envólucro agradável, como só John poderia fazer!
Estruturalmente, são três versos, todos com letras e estados mentais diferentes, entremeados e finalizados por dois refrões com letras iguais. Muito interessante é que o título da canção não aparece no refrão, mas sim nos versos, sempre começando suas duas primeiras linhas, cada um acrescendo um nível de tensão. No primeiro atesta-se a insônia do autor, sem pregar os olhos, com a mente desperta, e pensando na bebida como solução, daí as rimas, wink-blink-drink, seguidinhas, estrutura que se repetiria nos outros dois versos. No segundo, vem o desespero, ele não sabe o que fazer, e pensa em ligar pra ela, mas ele sabe o que ela faria, com as rimas do-you-do. Vem o refrão, com 7 frases, onde bate o desespero, pois são três semanas sem "stop my brain" e ele acha que "I'm going insane" (a única rima) e declara que daria tudo o que tem por "a little peace of mind". Pobre John! No Verso 3, a seguir, ele se sente "upset", procura a solução num "cigarrette", e pragueja contra o cara que trouxe aquela praga, chamando-o de "stupid git", um ofensa ("estúpido idiota") que, no sotaque de Liverpool, rima com as duas primeiras linhas. No refrão final, repete-se o clamor por um pouco paz na mente duas vezes. Um verso que foi abandonado dizia "When I hold you in my arms..." e completava a regra da rima tripla com frases terminando em "charms" e "farm" foi abandonado, e era bem esquisito mesmo, sem graça, forçado, mas a primeira linha em questão foi usada em outra canção do álbum, Happiness is a Warm Gun.
I'm So Tired era uma das canções apresentadas aos demais Beatles no final de maio, e que tiveram uma demo gravada. Ela tinha mais versos, que não chegaram à versão final. Ali, foi John ao violão, seu vocal, e depois dobrado, e chocalho e pandeiro tocado por algum ou alguns deles. Ela ficou hibernando por quatro meses e veio à tona no sprint final, faltando uma semana para o fim das gravações e, até por isso, foi tudo resolvido em apenas uma sessão de gravação, naquele mesmo 8/9 de outubro em que gravaram TCS Bungallow Bill. Já com o recurso do gravador de 8 faixas, usaram as 4 primeiras para a base rítmica, que foi Beatles-Raiz, ou seja, John-Paul-George-Ringo tocando guitarra-baixo-guitarra-bateria, sendo o vocal de John já quase o definitivo, numa faixa, e as duas guitarras agrupadas em outra. John começa de leve, com aquela voz cansada, durante o Verso 1 e segue assim nas duas primeiras frases do Verso 2, para depois explodir uma oitava acima em "I wonder should I cAAAll you, but I KNOW what you'd DOOO" com o final em falsete. Depois dos clamores do refrão, com o pedido forte de paz mental, ele volta a relaxar no terceiro verso, sem exaltações, para depois gritar novamente, e repetidas vezes! Depois vieram os overdubs, John dobrando seu vocal principal, Paul no backing vocal agudo nos refrões, George com mais guitarra ritmo e algumas umas partes de lead, Ringo com mais bateria, Paul num piano elétrico (que se ouve bem no final do derradeiro refrão). George e Paul chegaram a fazer um ooooh no primeiro verso, mas não foi aproveitado, bem como as parte de guitarra que preenchiam 'buracos' nos vocais. Destaque para os diversos Beatles Breaks, entre Verso 2 e Refrão1 e também, entre as repetições ao final do Refrão 2. A sessão terminou às 4 da manhã, bem apropriado para uma canção sobre insônia, mas paradoxalmente, com um vocal perfeito de John, no dia de seu aniversário de 28 anos, que certamente mereceu os parabéns, duplos, de todos!
Ao vivo, claro, apenas The Analogues para nos salvar! Aqui, neste LINK.
11. Blackbird (Group Speech Song by Paul McCartney)
Paul convoca "Pássaro negro cantando na calada da noite, pegue essas asas quebradas e aprenda a voar. Durante sua vida toda você só estava esperando este momento para decolar'"
Paul diz às garotas negras, ou blackbirds (O Grupo), que mesmo com suas asas quebradas, aprendam a voar, este é o seu momento! Bird é como os jovens ingleses chamavam as garotas, e Paul lembrou do que ocorria do outro lado do oceano, com a luta pelos direitos civis! Quando elegerem uma canção para mostrar como os Beatles estavam começando a se separar, decerto que Blackird é uma candidata prominente. Apenas Paul, sua voz, suas mãos e seus pés, cujas batidas foram captadas e gravadas na linda canção. Ah, sim, e o canto de blackbirds de verdade. Um conjunto de acordes maravilhoso! Está entre as 10 canções mais regravadas da história. Ah, sim, Paul tem outras 3 nessa lista, sendo Yesterday a campeã. As outras são Eleanor Rigby e And I Love Her.
Letra curtinha, mensagem profunda. Pena que ele não deixou claro esse significado à época, ao menos que eu tenha notícia. Dois versos e um refrão, e depois repete o primeiro verso e o refrão. Em cada verso, a convocação "Blackbird singing in the dead of night" e o tempo "all your life" são repetidos. Muda o conselho: no Verso 1, diz pra aprender a voar, mesmo com as asas quebradas, esse é o momento de decolar ("fly-arise"), e no Verso 2, pra aprender a ver, mesmo com os olhos cansados, esse é o momento de ser livre ("see-be free"). E no refrão, incita a voar mesmo na noite escura! Muito bom!
Blackbird foi apresentada aos demais na casa de George em Esher junto com as demais que vieram do retiro na Índia. Ela foi foi feita em sua casa de campo na Escócia (é... Paul resolveu abrir a mão e compras umas propriedades), no hoje famosíssimo Mull of Kintire, para o qual Paul fez uma canção linda, com centenas de gaitas de fole, que foi recorde de Guinness por décadas, de venda de um compacto no Reino Unido. O aroma do campo foi inspirador! Os companheiros de banda devem ter ficado espantados com os acordes no violão. Só na segunda linha do refrão, que tem apenas três sílabas ("Black-bird-fly"), tem 6 acordes!
Dá só uma olhada na sheet music ao lado, na qual tomei a liberdade de riscar o nome do "co-autor" da canção, pelo tamanho
nulo de sua colaboração na composição: são 28 acordes! Não sobrou uma nota com inveja. Estão todas lá: C-D-E-F-G-A-B ou DO-RE-MI-FA-SOL-LA-SI, para os leigos. Até me lembrei de quando a nota MI teve inveja por não aparecer no metafísico acorde inicial de A Hard Day's Night, para depois voltar triunfalmente no acorde maior poderoso que finaliza A Day In The Life e o álbum Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band. Bem, chega de divagação!
Paul estava ansioso para ouvir sua canção com qualidade de estúdio e ela foi a primeira que ele apresentou para ser gravada no Álbum Branco, logo no 4° dia de gravação, um glorioso 11 de junho que viu nascer, e ser finalizada, a primeira canção solo de Paul McCartney Os três primeiros dias haviam sido dedicados a John, em versões de Revolution. Blackbird não foi a primeira canção solo de Paul em discos dos Beatles, ele havia cantado uma, ao violão, mas estava acompanhado de uma pequena orquestra, em Yesterday, mas aqui, é ele, só ele. George e Ringo, inclusive, estavam fora do país. John ainda apareceu na gravação, ficou meia hora lá pensando em como poderia contribuir, chegou a acompanhar no violão e no piano, mas logo partiu pra outro estúdio, carregando o produtor Chris Thomas, e, claro, Yoko Ono foi atrás, para se dedicar àquela salada de sons que seria Revolution 9. Não foi aquela a única vez em que isso aconteceu, de dois (ou mais) compositores trabalharem em separado no mesmo dia em Abbey Road. E falando em Yoko no estúdio, prática que se repetiria bastante amiúde, Paul também trouxe a namorada a tiracolo, uma certa Francie Schwartz, dias após terminar um relacionamento de quatro anos com Jane Asher. Bem, Paul pediu a Emmerick que a canção soasse como se estivessem ao ar livre, ao que o produtor respondeu: "Então, vamos lá pra fora!". E foram a uma pequena área livre, com jardins, mas com espaço apenas para o banquinho para Paul sentar, e assim foi! Estava uma bela noite de verão e, inclusive, uma pequena porção dos sons que se ouve, de pássaros, são realmente naturais, apesar de os mais fortes terem sido mixados depois. Paul só encontrou a perfeição, de voz e violão, após tentar 32 takes, sendo 11 deles completos!! Lá pelo meio, você nota que a canção para, e recomeça, isso foi ideia de George Martin, que tinha a intenção, e era vontade inicial de Paul, de colocar ali um arranjo de cordas. Depois, decidiram deixar assim mesmo! Enquanto Paul tocava, ele acompanha batendo o pé no chão e Emmerick decidiu microfonar a batida, que se ouve perfeitamente na gravação final! Por sobre o take final, Paul ainda dobrou seu vocal no refrão, e estava terminada a canção, magistral. A canção ainda tem um verso apenas tocado e dedilhado, e também uma ponte, com melodia diferente, que vem após a parada, aquela que introduziria um arranjo de cordas, mas acharam melhor deixar as cordas apenas do violão. A se notarem as constantes variações de tempo, 4/4, 3/4 e 2/4 permeiam por toda a canção, às vezes mudando de um compasso para o outro, numa mesma linha lírica. Um primor! Como final, perfeito, Paul repete duas vezes a última linha do refrão, como um reforço da mensagem: "You were only waiting for this moment to arise".
Siiiiim, aqui não precisaremos recorrer a The Analogues para ver uma apresentação ao vivo da canção! Blackbird é uma favorita de Paul, ela está nos set lists de seus shows desde a época de Wings, em 1975 (vejam que voz suave, ainda novinho, 33 anos, aqui neste LINK), e depois frequentemente desde 2002, é só procurar, mas eu escolhi este aqui, neste LINK, mais recente, de 2018, até como um contraponto com o primeiro, pra se ver o efeito do passar dos anos em sua voz aos 76 anos, inexorável!
12. Piggies (Group Speech Song by George Harrison)
George revela "Você tem visto os porquinhos rastejando na lama? E para todos os porquinhos, a vida está ficando pior, sempre tendo sujeira para brincarem"
Em sua segunda de quatro canções do Álbum Branco, George dá mais uma mensagem: agora criticando os consumidores ricos (O Grupo), e lembrando the little piggies (os pobres) que chafurdam na lama, com a vida cada vez pior! A canção foi feita cerca de dois anos antes, quando George estava afiado em sua crítica de costumes, vide Taxman arrasando com os homens das finanças. Aqui, é uma magnífica crítica social, com humor satírico da melhor cepa. Em outro trecho da letra, lembra dos 'bigger piggies' com seus colarinhos brancos esgrimando facas e garfos preparando-se para jantar seu próprio bacon. Adotada pela contracultura de imediato. Sua fama acabou prejudicada porque foi também adotada por Charles Manson, como inspiradora de seus crimes, fazer o quê... Pontuada por um magnífico cravo o tempo todo, tem um clima absolutamente barroco! Uma nota adicional sobre a inspiração: se alguém tinha dúvida de que seu xará Owell, conterrâneo de Império, teve parte, por conta da utilização de porcos como gente, como o escritor fez em A Revolução dos Bichos (Animal Farm), a dúvida evanesce quando se tem acesso a uma parte da letra original, que dizia: "Paying piggy thanks – to thee Pig Brother!". Captou? Trocando o P por um B, a coisa vira Big Brother, justamente o ser controlador de 1984, outra obra-prima de George Orwell.
Letra riquíssima, simétrica, com dois versos, uma ponte central, e mais dois versos, sendo um instrumental, onde o astro principal é o cravo citado, e tendo os 3 versos letras distintas. E perceba o 'crescendo' do clima. No primeiro verso, apresentam-se os pobres, os little piggies, chafurdando na lama, com a vida indo de mal a pior; no segundo, os ricos, bigger piggies, limpando a poeira de suas camisas brancas; nos dois versos, a palavra central é "dirt" (poeira), rimando aqui e lá com "shirt" e "worse", respectivamente. A ponte vem a seguir, e segue falando deles, os porcões, que não estão nem aí para os que vem de baixo ("They don't care what goes on around"), têm um olhar vazio e precisam é de uma boa palmada ("In their eyes there's something lacking. What they need's a damn good whacking"), sendo que essa citação veio, segundo George, de sua velha mãe, Elsie, apropriadamente. No verso final, após o monumental cravo, ele continua a espezinhar as classes mais abastadas vivendo vidas de porcos chiques, se locupletando em lautos jantares ("piggy lives... out for dinner... piggy wives ...clutching forks and knives"), onde comem o seu bacon, sendo esta uma citação de John, segundo as más línguas. Brilhante, não somente este final, mas a totalidade da letra!
A canção foi apresentada por George aos demais Beatles em sua própria casa de Esher, em fins de maio, onde se juntaram para organizar os trabalhos do novo álbum. A estrutura da canção já estava pronta, não sua letra definitiva, mas já estava o verso instrumental que, na demo gravada lá, foi assobiada pelo autor (ouvir link no final). Mais de três meses se passaram, até os porcos entrarem no Estúdio 2 de Abbey Road, num 19 de setembro, e então foram 10 takes gravados em quatro faixas, com George ao violão, Paul no baixo, Ringo no bumbo e pandeiro, e George num guia vocal. Sem John, ainda! A ressaltar a alternância de notas de baixo e pandeiro, bem audível no Verso 1, antes de entrar o arranjo de cordas. Quando deram uma parada, surgiu o cravo, que estava 'por ali', no Estúdio 1, para uma outra sessão. O produtor Chris Thomas deu a ideia de tocar o cravo em Piggies, George adorou, mas, em vez de trazerem o cravo, o que era inviável, mudaram-se todos do estúdio 2 para o Estúdio 1 (lembraram-se da fábula de Maomé e a Montanha?), e lá fizeram o famoso Take 11, com Chris tocando magistralmente o cravo por sobre a faixa vocal de George, inclusive o estupendo solo instrumental do terceiro verso. Toque de classe na canção! Aqui, fica patente mais um Fator Crítico de Sucesso dos Beatles: a qualidade dos técnicos da EMI. Mesmo com George Martin, o grande maestro, ausente, aparece um jovem engenheiro em seu lugar, que dá esse show na canção. Tanto que resolvi ilustrar esta análise com uma foto dele, da época, quando tinha 21 anos. Já falei dele aqui, ele era o cara do mellotron em
TCS of Bungallow Bill. Além de Beatles, ele trabalhou com muita gente boa, Pink Floyd, Procol Harum, Elton John, Paul McCartney, Pete Townshend, Pretenders, Sex Pistols.
No dia seguinte, vieram os overdubs, por sobre o Take 12, uma fita de 8 faixas, com quatro delas ocupadas com o conteúdo do Take 11. George fez o seu vocal principal, em três estilos: (i) nos dois primeiros versos, parecia um menestrel medieval, dobrando em "to play around in", (ii) na ponte, com um efeito especial, fazendo com que sua voz parece saindo de um alto falante, anasalada, efeito que foi conseguido pelo engenheiro Ken Townsend (outro astro do time da EMI), note que George dobra o vocal em "damn good whacking" e (iii) no último verso, em coro, com Paul e John harmonizando, com o último fazendo uma voz duas oitavas abaixo, ótimo efeito! John também foi o responsável por colocar os grunhidos dos porcos. Ele estava animado com a técnica, por causa das suas maluquices em Revolution 9, e se encarregou de fazer a gravação. Finalmente, 10 dias depois, já com George Martin de volta, oito músicos (quatro violinos, duas violas e dois violoncelos) gravaram seu magnífico arranjo, ocupando as últimas duas faixas da fita, entrando no Verso 2 duas notas longas por compasso, e dou um destaque para os violoncelos em staccato na ponte, harmonizando com o cravo no verso instrumental, e de volta ao normal no último verso e, claro, no grand finale, após o "One more time!". Simplesmente impecável!
George Harrison passou mais de 20 anos sem tocar qualquer coisa que havia lançado como Beatle após o Concerto para Bangladesh em 1971. Mas na excursão que fez ao Japão em 1992, ele tocou várias, entre elas estava Piggies. E ele introduziu algumas letras novas, mas respeitou os arranjos, claro que os instrumentos de orquestra foram sampleados. Mas ficou ótimo. Então vo Vejam aqui, neste LINK. Mesmo tendo esse auxílio luxuoso do próprio compositor, não poderia deixar de mostrar o desempenho dos Analogues. Então, eu vou mostrar Piggies em três momentos
- Como Piggies era, na primeira DEMO de Esher, aqui neste LINK
- Como Piggies ficou, reproduzido fielmente por The Analogues, neste LINK..
- Como George a tocou, em 1992, neste LINK. Note o verso adicional com a letra do Pig Brother!!
13. Rocky Racoon (Funny Story Song by Paul McCartney)
Paul conta "Rocky invadiu o quarto dizendo: Danny Boy, agora acabou! Mas Daniel foi mais rápido, sacou primeiro e atirou, e Rocky caiu num canto.."
É Paul McCartney em seu melhor estio: um contador de histórias da melhor qualidade, consolidando sua posição de maior storyteller dos Beates. Aqui, é uma história hilária ambientada no Velho Oeste americano presentada por Paul num magnífico sotaque de Dakota do Sul, sobre um cowboy com apelido Guaxinim, que vê um certo Daniel se engraçando com sua 'namorada' Lil McGill, mas é Nancy seu 'nome de guerra', aquilo foi como um soco no olho do rapaz, que se hospeda no Saloon, e vai ao quarto onde eles estão, e acontece o fato narrado em português, mas não se preocupem, foi só um arranhão. Acho que fiz um ótimo resumo da letra
D-I-V-E-R-T-I-D-Í-S-S-I-M-A!!!
E é uma monumental gravação! Note os instrumentos entrando aos poucos, Paul ao violão descreve a cena, e quando volta ao sotaque inglês, começa, primeiro a gaita (de John), depois o pandeiro (de Ringo), depois o baixo (também de John), depois a bateria e depois volta a gaita firme, e quando Rocky collapses in the corner, entra o incrível, fantástico, extraordinário George Martin replicando o vocal de dã-dã-dãs e tchu-ru-rus de Paul, com um mais-velho-oeste-impossível honky tonk piano, que dá vontade de ouvir repetidas vezes! A música não é lá muito considerada pelos críticos (ô gente exigente!), mas é uma de minhas favoritas, se perigar, está nas minhas Top Ten! Olha, eu gosto tanto daquele pianinho que disponibilizo aqui o LINK para você ouvi-lo. Venha deliciar-se comigo!
A estrutura é simples, ao mesmo tempo, inusitada, simples porque é apenas verso-refrão-verso-refrão, inusitada porque os versos são muito longos e porque os refrões não tem letra. Isso tudo sem contar uma introdução falada dizendo onde se passa a história (Dakota-USA), seu personagem principal (Rocky Racoon), o mottif (a suspeita de que sua namorada o estava traindo), sua decisão ("I'm gonna get that boy."), e o primeiro movimento (hospedar-se num quarto no Sallon). Só então vem o Verso 1 tem três partes de quatro linhas cada uma, que conta sua desventura, encontrando a garota no ato, saca o revólver, mas falha, e é alvejado pelo algoz mais ligeiro. No Verso 2, com duas partes de mesmo tamanho, após o refrão tocado no piano, chega o médico bêbado, vê que não é nada e nosso herói guaxinim volta com o rabo entre as pernas para seu quarto para afogar as mágoas na Bíblia.
Notável é a disciplina do autor na colocação das rimas. Analisando cada uma das 5 partes, Paul é minucioso e atento! A figura ao lado pode ajudar a entender.
Vejam: perceba que cada linha tem dois compassos de tempo (conte 1...2...3...4, enquanto canta mentalmente a letra, pra entender o que é um compasso)
- a Linha 1 de cada parte tem duas rimas cada, palavras oxítonas, posicionadas no meio e no final, uma em cada compasso, representadas por A.
- A Linha 3 é o mesmo esquema, mas com a rima C.
- As Linhas 2 e 4 rimam ao final com palavras paroxítonas, representadas por BB.
Listando as ocorrências abaixo, em outra figura!
Paul escreveu boa parte da canção na Índia, no retiro do Maharishi, e, segundo ele, John e Donovan contribuíram aqui e ali para a letra! Ele a trouxe à casa de George em Esher no fim de maio, e gravaram uma demo, que tinha ele no violão, George tocando guitarra no estilo country nos espaços vazios, e Ringo no pandeiro. John não contribuiu. Na época, Rocky era Sassoom. A letra ainda não tinha o verso sobre o médico bêbado, nem a introdução falada de Paul. Essa introdução (e o Raccoon) somente apareceu no dia da gravação, 15 de agosto, mas o estado americano era diferente, falava em "little town in Minesotta". Já com o doutor aparecendo, eles gravaram a base, desta vez, sem George, que ficou na sala de controle. George Martin estava no chão do estúdio ao piano, Ringo na bateria, e John assumiu o baixo, pois o autor Paul estava no violão. E no vocal, claro, a partir de Take 5, com uma faixa exclusiva, a que estava sendo usada pelo piano pois decidiram que o instrumento entraria depois. Ele demorou a acertar a introdução, foram 9 takes. Ela era mais comprida e foi mudando a cada take, até chegar à final que ouvimos hoje. Destaque-se a bateria de Ringo, apenas no hit-hat (chimbal) nos versos, com algumas viradas, mas entrando firme no refrão. Depois, houve uma redução para duas faixas, liberando outras duas para overdubs, criando o Take 10. Entrou John tocando gaita em vários pontos do Verso 1, dando um clima fantástico de velho-oeste, e ele também tocou acordeão (ecléticos os Beatles!) no meio do Verso 2. John e Paul acrescentaram vocais de apoio e, mais importante, George Martin voltou ao chão de estúdio para dar o toque de classe à canção, o piano honky tonk. Só que, mais uma vez, como aconteceu em In My Life, Martin o tocou na metade da velocidade que ouvimos no disco, e acelerou a fita na gravação, para dar aquele efeito de Saloon. Foi genial lá em 1965, foi repetido aqui, mas igualmente genial! Como viram, George, nosso guitarrista solo, ficou a ver navios. Paul não sentiu necessidade...
Ao vivo? Nem Beatles nem mesmo Paul! Mas Habemus The Analogues, felizmente! Vejam aqui, neste LINK. E deixo também um dos primeiros takes, com a fala de Paul bem estilo cow-boy americano, um erro na letra, o segundo verso bem diferente, e o refrão cantado apenas sem o sensacional piano. Apreciem, neste LINK. Note que John arrisca uma gaitinha na primeira parte, ainda sem o baixo, mas depois ele se concentra no instrumento, deixando a gaita pra os overdubs!
14. Don´t Pass Me By (Dispair Miss Song by Ringo Starr)
Ringo implora "Não me deixe de lado, não me faça chorar, não me deixe triste, porque você sabe, querida, que eu amo apenas você. Você jamais saberá o quanto me dói, como eu odeio vê-la partir. Não me deixe de lado, não me faça chorar"
Olha aí nosso Ringão, tão adorado, finalmente com sua primeira produção. Eu não considero o crédito dado a ele em What Goes On como sério! De qualquer maneira, é a primeira só dele. Ele tentou algumas vezes apresentar algo aos maiorais, algumas composições de três acordes, que era o máximo que conseguia, mas logo eles notavam que seriam acusados de plágio! Don't Pass Me By passou nos testes, só que demorou muito para se materializar. Apenas Paul e Ringo tocam na gravação final, além de um violino sensacional ao longo de toda a canção!!! Mas, vamos à história!
Ringo vinha trabalhando nessa canção desde 1962, no ritmo country, chegou a apresentar um esboço aos bambambans da banda, logo no começo dos Beatles, mas não havia meio de ele completá-la, então ela foi ficando. A imprensa às vezes pressionava, principalmente depois que George lançou a sua, Don't Bother Me, já no segundo álbum da banda, e ele mencionava sua existência. Afora ela, Ringo tentava, com sua limitada habilidade, de três acordes no violão e três ao piano, apresentar alguma coisa e era logo rechaçado. Don't Pass Me By não fugiu da regra: só três acordes, C-F-G, ou seja DO-FA-SOL, com no máximo uma preparação em F7 e G7 no refrão! A letra foi variando ao longo do tempo, e eu até acho que ela foi mais interessante ao longo do caminho, veja ao lado um rascunho anterior, bem mais apropriado ao estilo irônico do Funny Beatle (C.O.D. é acrônimo para Cash On Delivery, uma forma de pagamento de encomendas). Até que, finalmente, chegou o momento, em 1968, quando os Beatles lançariam 30 canções num álbum, uma salada bem temporada de ritmos, assuntos e estilos, decerto ia ficar inexplicável Ringo ficar de fora. John e Paul finalmente deram seu apoio, e ela nasceu. E olha que a demora valeu porque parece que Ringo aprendeu a lição dos maiorais: mesmo que seus versos não sejam assim brilhantes, ele cuidou para que fossem diferentes entre si. São três versos distintos e mais um refrão. No Verso 1, Ringo está em crise, extrapolando a ausência da amada achando que ela já não o ama. No Verso 2, ele entra em desespero, não vê as horas passarem, ele está convencido que ela o abandonou. E vem o refrão com o apelo, descrito no caput. O Verso 3 é redentor, ela aparece, diz que estava no trânsito, ele pede desculpas por ter sido tão injusto e desconfiar dela. Inseguro, o nosso Ringo! As rimas são razoáveis, afora as vezes em que rimou "myself" com ... "myself" e "footsteps" com ... "footsteps". E, para rimar com "unfair", ele se lembrou de "hair" e criou "You were in a car crash, and you lost your hair", que parece estranho, mas lembre-se que mesmo aqui a gente fala que está tão nervoso a ponto de arrancar os cabelos. É na mesma linha, mas soou estranho!
Jack Fallon - violino Don't Pass Me By não passou pela sessão de Demos de Esher, casa de George, mas foi logo a segunda a entrar em estúdio, cinco dias depois. E foi meio chocante para o pessoal do estúdio que uma canção de Ringo entrasse tão cedo assim no mapa do novo álbum. John abrira os trabalhos, com Revolution 1, como já era tradição nos últimos anos. John abriu com I Am The Walrus em Magical Mistery Tour, com A Day In The Life em Sgt. Pepper's, com Tomorrow Never Knows em Revolver e com Run For Your Life em Rubber Soul. Aliás, é interessante como Paul aceitava essa tradição, uma questão de respeito para o grande John Lennon, o criador daquilo tudo! Bem, esperava-se, na sequência, uma canção do outro grande compositor da banda, Paul McCartney, ou mesmo de George Harrison, mas quem aparece é Ringo Starr. Ninguém entendeu nada! E Ringo achou aquilo uma distinção muito especial, e foi mesmo, e ele estava radiante!! A estupefação era tanta que no seu primeiro dia de gravação, a canção não foi registrada com seu nome, mas por "Ringo's Tune"! Uma celebração! Bem, aliás, eu desvio tanto do assunto que para retornar eu tenho que usar este recurso.... aliás .... Bem, a base da canção foi gravada por Ringo aos 3 acordes do piano, e Paul na bateria!!! O piano de Ringo, aliás (ólheuaquitraveis!) recebeu outra distinção, a de passar por um Leslie Speaker, a trapizonga que levou a voz de John às alturas em Tomorrow Never Knows e também a bateria de Ringo na canção. Foram necessários apenas três takes para se chegar a uma base aceitável para overdubs, Ringo parecia um veterano!!!
Ainda no mesmo dia, Paul gravou algumas linhas de baixo, e tocou mais bateria, Ringo tocou mais piano e gravou seu vocal, e Paul tocou um guizo (sleigh bell) o tempo todo da canção! No dia seguinte, um outro vocal de Ringo foi considerado melhor, e ainda foi dobrado. Em um outro take vocal, Ringo conclui a canção com uma fala, com alguns trechos da letra, mas termina com um "This is some friendly!", sem sentido, mas considerado genial por John, que estava presente, afinal era mais um "Ringoism", mais um malapropismo de Ringo (remember Tomorrow Never Knows)! John e Paul chegaram a sugerir que esse fosse o nome da canção!! Acabado o segundo dia, a canção ficou em compasso de espera, até que, quase um mês depois, chegou 'a cereja do bolo': um fiddler (violinista tocando estilo country ou grass muda de profissão) foi chamado para criar livremente sobre a canção, e ele o fez lindamente! Que toque de classe aquele Jack Fallon deu à primeira incursão de Ringo no mundo dos compositores. Foi tão marcante que escolhi seu semblante para ilustrar esta análise! Thank you, Mr. Fallon! Ah, aquele pianinho intrigante no começo não é Ringo, mas Paul!
Aliás, aquele violino (ou fiddle, pelo estilo da música) causará uma atrocidade de minha parte: Ringo, com sua All Star Band normalmente toca Don't Pass Me By, e normalmente eu abriria com um vídeo para vocês, fá-lo-ei, mas antes, vou abrir com nossos indefectíveis (no sentido de sem defeito) The Analogues, pois como é a norma da banda, eles colocaram uma violinista sensacional para tocar igualzinho à gravação original! Veja, aqui, neste LINK. Pena que a pouca sensibilidade do cinegrafista nos faz perder uma parte de seus graciosos movimentos! Damn you!
E, agora, claro, super Ringo Starr, neste LINK, cantando sua primeira composição, com um arranjo legal, com gaita e bandolim, com refrões extras e uma frase a mais depois deles...
Don't make me blue!!!
16. I Will (Sadness Miss Song by Paul McCartney)
Paul implora "Quem sabe quanto tempo eu te amei? Você sabe que eu ainda te amo. Será que terei que esperar uma vida inteira sozinho? Se você quiser que eu espere, eu espero"
As palavras acima compõem o Verso 1 da canção, e dão o tom que meu levou a classificá-la como uma triste canção de saudade. Dá a impressão de que ela já o amou. E ele tem esperança de que ela volte pra ele e ele a esperará até o infinito. Já no Verso 2, dá a impressão de ela ainda não o conhece "I didn't catch your name" mas isso não importa "I will always feel the same". A partir de agora, comentarei também rimas, além da estrutura. E começo com a principal, que rima o designador de futuro de verbo "will" com o advérbio de tempo "still", e o interessante aqui é a inversão da ordem que o autor fez para causar a rima, colocando "I love you still", incomum, ao invés de "I still love you", que é a prática. O "still" vem depois apenas de verbos auxiliares, como "can" ou "be". Claro que licenças poéticas são permitidas em letras de canções. Em português, é indiferente, podem ocorrer as duas formas, o advérbio pode vir antes ou depois do verbo, pode ser "ainda te amo" ou "te amo ainda". Bem, de volta à vaca fria! Na ponte, uma melodia diferente que vem a seguir, todas as linhas começam com o verbo "Love", e então vêm as promessas de amor eterno, seja ela um namoro antigo ou ainda a acontecer, fica no ar, e ele usa rimas manjadas em love songs, tipo "heart" com "apart" e "forever" com "together". No verso final, ele prevê o que vai acontecer quando ele a encontrar, a canção estará no ar. Mais do que achar que as rimas seriam fracas porque repete-se quatro vezes o pronome "you", atenção maior deve ser dada às verdadeiras rimas, internas, o advérbio "near" cercado dos verbos "hear" e "endear", que vêm antes do "you", isso sim, uma rima bem criativa.
Foi a primeira balada, a primeira canção de amor de Paul em quase dois anos, a última havia sido Here There and Everywhere, em Revolver. Embora a canção tenha sido iniciada no retiro da Índia, e com participação nas letras do amigo Donovan, ela não foi trazida por Paul para o encontro na casa de George, em Esher. Ela só apareceu no primeiro dia de gravação, e chegou já sem as letras do amigo, um 16 de setembro, que traria uma sessão jamais vista. E sem a presença de George! Apenas John e Ringo, ambos em percussão, acompanhando voz e violão de Paul. Você acredita que foram 67 takes? Mas calma, muitos foram o que eles chamam de 'false starts', que começam e logo terminam com risadas ou com falhas, numa vez Paul cantou "I won't" e John respondia "Yes you will", e lá se ia mais take. E teve inclusive outras canções, de Elvis Presley, de Fred Astaire, ou mesmo do próprio Paul, como Step Inside Love que ele deu pra Cilla Black gravar. E Paul de repente pegava um trompete, eles estavam em um bom clima, e brincaram muito, parecia uma jam session. Numa delas até houve uma menção a Garota de Ipanema, pois Paul queria que a canção soasse como em "Latin America", e lá se ia outro take. Houve muitas falas (ad-lib), tanto de Paul como de John, uma delas com este último apresentando a bandinha ali formada dos três Beatles como "Los Paranoias", e lá se ia mais outro take. E o tempo foi passando, e os takes iam se avolumando, até que chegaram ao Take 65, considerado bom, e mais dois vieram, piores. Um destaque antes de passar adiante: num dos takes, Paul apresentou uma melodia nova, em que cantava "Can you take me back where I came from?",que quem conhece a obra das Beatles reconhece, mas em outra canção: ela seria usada ao final de Cry Baby Cry. Ao final da sessão, as quatro faixas gravadas foram passadas a uma fita de 8 faixas, que seria o Take 68, pronto para overdubs no dia seguinte, ou melhor, na noite do mesmo dia, já que era plena madrugada. Alguns overdubs vieram na mesma linha, com mais violão de Paul naqueles riffs que são ouvidos entre versos ou entre verso e refrão, mais chocalho de Ringe Paul foi dobrado automaticamente, e teve mais vocal de Paul, desta vez harmonizando com ele mesmo na ponte e no tchu-ru-ru final, mas o mais interessante foi o de Paul, no baixo, mas não com sua guitarra baixo e sim, com a voz! Sim, ele tocou as notas de baixo em charmosíssimos dum-dum-duns ao longo de toda a canção.
Paul a tocou ao vivo, várias vezes voz e violão, nas sessões acústicas de seus shows solo, deixo aqui uma delas, neste LINK. The Analogues a gravaram, claro, inclusive com o baixo nos dum-dum-duns, mas não a encontrei isolada, apenas juntamente com as demais, quando tocaram o Álbum Branco inteiro!. Podem procurar que vale a pena!
16. Why Don´t We Do It in the Road? (Sex Girl Song by Paul McCartney)
Paul propõe ''Por que nós não fazemos na estrada? Ninguém irá nos ver! Por que nós não fazemos na estrada?"
O 'it' do título é claramente 'sexo', que ele quer fazer na estrada, porque ninguém os estará assistindo! Paul fora inspirado por um casal de macacos 'doing it' tão naturalmente nas ruas de Rishikesh, na Índia. Uma interpretação ampliada seria uma incitação à liberdade, tipo 'por que não fazemos o que queremos fazer?', enfim. Não haverá necessidade de comentar sobre rimas, pois só há duas frases na canção, com o título cantado três vezes em cada um dos três versos. Sem pontes, sem refrões.
No dia 9 de outubro, em que John celebrava seu aniversário de 28 anos, Paul carregou Ken Thousend, para o Estúdio 1, que estava vago, e começou a gravar 'aquela' 'complexa' canção. Como Ken não fosse um produtor de carteirinha, era um engenheiro eletrônico (celebrado, inventor do ADT - Authomatic Double Tracking - dois anos antes), sem prática de produção, esta poderia ser creditada ao próprio autor, e Ken ficou ajudando aqui e ali. Lembrando que aquele era o estúdio destinado a gravação de orquestras, ficou esquisito ver aquilo tudo ocupado apenas por Paul e seu violão, que foi a base de 5 takes, e de vez em quando Paul ocupava uma faixa da fita com batucadas no instrumento, especialmente na introdução, que era apenas percussiva, e que são ouvidas na versão final, juntamento com todo aquele eco conferido pelo cavernoso estúdio. No final do dia, Paul carregou o microfone para perto de um piano e preencheu uma última faixa disponível. Só esclarecendo que John não estava celebrando nada, mas estava em Abbey Road, trabalhando em outra canção deles, assim como George, além de os dois participaram de suas mixagens. No dia seguinte, Paul ocupou o Estúdio 2, onde havia uma bateria montada, e chamou apenas Ringo, para tocar bateria e ajudar nas palmas! Acrescentou também sua linha de baixo e aquela que se ouve antes de "No one will be watching us" do primeiro verso, e depois segue direto palmas! John teria ficado chateado por não ter sido chamado para contribuir! Assim eram aqueles tempos...
Finalmente, ao vivo e como sempre, temos The Analoques para nos salvar, repetindo fielmente todos os detalhes instrumentais, todas as variações vocais. Aqui, neste LINK.
17. Julia (Dream Self Song by John Lennon)
John lamenta: "Metade do que digo não faz sentido algum, mas eu digo só para que você ouça, Julia. Julia, Julia, filha do oceano, me chama, então eu canto uma canção de amor, Julia!'"Mulher do mundo, Julia Lennon teve seu filho John e deixou com sua irmã Mimi, para criar, quando ele tinha 5 anos de idade! Aos 15 anos, John voltou a conviver com Julia, e tinha nela, não só uma mãe, mas uma amiga, com seu espírito jovial. Amante do Rock and Roll, que começava a despontar nos USA, ela ensinou a John os primeiros acordes musicais em um banjo. Extrovertida, andava com o filho para todos os lados e os amigos dele a adoravam, inclusive Paul.
Ela fazia coisas do tipo andar com óculos sem lentes, parar um transeunte e, no meio da explicação, começar a coçar os olhos através do aro... John a adorava! Tudo ia muito bem, até que o destino deu um duro golpe no rapaz: em Julho de 1958, quando atravessava a rua da casa de sua irmã, Menlove Avenue, para pegar um ônibus, Julia foi atropelada por um policial bêbado, de folga, sendo lançada a metros de distância, e morrendo instantaneamente, aos 44 anos de idade. John nunca se conformou e, 10 anos depois, fez esta primeira homenagem a ela, durante seu retiro espiritual na Índia, que materializou-se no Álbum Branco, com John tocando um lindo dedilhado no violão, que aprendeu lá, com o companheiro Donovan, e também usou em Dear Prudence, do mesmo álbum. Nenhum outro Beatle toca na canção. John faria outras duas canções no tema, e que foram lançadas em sua carreira solo, Mother (ma-ra-vi-lho-sa!!) e My Mummy's Dead (uau!).
Julia foi a primeira canção que John escreveu no retiro da Índia, no ashram do Maharishi em Rishikesh. À época, ele começava um relacionamento com Yoko Ono, e imediatamente viu nela uma figura matriarcal. E juntou na letra a expressão "Ocean child", que é o significado do nome da artista. Ela escrevia cartas a ele com imagens que o levaram a viajar na imaginação e escrever coisas como "seashell eyes" e "windy smile". Outra influência foi Kahlil Gibran, cujos poemas o inspiraram a escrever as lindas frases da introdução em nota única "Half of what I say is meaningless.." e de sua repetição melódica (Intro 2) em "When I cannot sing my heart, I can only speak my mind" lá no meio da canção. Após a Intro 1, que termina em "Juuuliia", o primeiro verso começa com uma sobreposição deste último "a" de "Julia" com o primeiro "Ju" de "Julia, Julia, ocean child, calls me". Essa mesma sobreposição ocorre também entre Verso 1 e Verso 2, e na segunda vez que a melodia da introdução é cantada, emendando com o penúltimo verso. Isso causou a necessidade de 3 linhas de vocal de John. Entre o Verso 2 ("Julia, seashell eyes, windy smile, calls me") e o Verso 3 ("Julia, Julia, morning Moon, touch me"), há uma breve ponte "Her hair of floating sky is shimmering, glimmering, in the Sun", depois vindo a citada Intro 2, e depois os versos finais, 4 ("Julia, sleeping sand, silent cloud, touch me") e 5(murmurado)! O resultado lírico é de chorar. A ocorrência de poucas ou quase nenhuma rima não impede a emoção do relato, brilhantemente desempenhado por um John emocionado. Fiz questão de colocar a letra toda, maravilhosa, que é completada com esta linda conclusão, de cada um dos 5 versos:
"So I sing a song of love, Julia"
Em que pese ter sido a primeira canção a ser escrita, Julia foi a última a ser gravada! Por incrível que pareça, ela só entrou no jogo porque duas canções, uma do próprio John (What's The New, Mary Jane?) e outra de George (Not Guilty) não chegaram a bom termo em suas gravações, e o álbum precisava de sua 30ª canção, então Paul incentivou John a oficializar a linda canção, ele não queria por ser muito lenta!! Além disso, Paul o convenceu a ir sozinho, sem mais ninguém, nem ele mesmo, que havia arriscado uma harmonização na demo que eles gravaram no fim de maio na casa de George em Esher, já com a letra definitiva. E foi assim, num domingo (!!), 13 de outubro, que a EMI estava a postos às 7 da noite para receber John e seu violão. Paul (que morava perto) esteve lá pra dar apoio e ficou um tempo indeterminado na sala de controle, o suficiente para ser decisivo. A canção era difícil. John ficou ensaiando mais de 4 horas (!!) até se sentir seguro para começar a gravar takes oficiais, que começaram perto de meia-noite. No meio do caminho, ele teve dificuldades, pensou em tocar de pé, e chegou a propor desistir do dedilhado e fazer o chakundum, imagina o desastre, perder aquele movimento tão delicado, que Paul disse que apenas John, entre eles, conseguia fazer. Então, começaram os takes, interessante que todo o ensaio fora feito em C (DÓ maior), mas os takes oficiais foram tocados em D (RÉ maior) com a colocação do CAPO no 2°traste do violão. Em meio a elogios de Paul lá da sala de controle, John fez um Take 2 quase perfeito, mas errou um pequeno trecho, chegou a sugerir que apenas se repetisse o trecho e depois a edição juntaria as partes boas, mas Paul o incentivou a tentar mais uma vez, e o Take 3 veio perfeito. Em faixa livre da fita desse take, John fez 3 linhas de vocal, por causa das três sobreposições de sílabas de "Julia", acima explicados. Por sobre seu violão original, John dobrou um segundo violão, a partir do Verso 1, o que mostra sua tremenda capacidade e, claro, o efeito das 5 horas tocando a mesma música! O efeito foi estrondoso! Outro efeito ótimo foi a dobra de seu vocal, em partes selecionadas. Um primor! O vocal de John, normalmente áspero, e aqui tão doce, rivaliza com os melhores de Paul, e Julia disputa com galhardia o título de melhor balada dos Beatles. E quase ia ficando de fora!!
Mais uma vez, recorro a The Analogues para ter uma ideia de como seria Julia ao vivo, só que, e-xa-ta-men-te, é im-pos-sí-vel, por causa das sobreposições no vocal de John. Mas The Analogues têm dois cantores que simulam John Lennon, então o efeito é muito bom. Neste LINK, tem o show todo deles tocando o Álbum Branco todo, então se quiserem ir direto vão até o 46:50, e apreciem!
18. Birthday (Person Speech Song by Paul McCartney)
Paul celebra: "Você diz que é o seu aniversário, É o meu aniversário também, sim. Eles disseram que é o seu aniversário. Nós vamos nos divertir. Que bom que é o seu aniversário. Feliz aniversário para você!"
Ô letra simples e direta!! Pouco a ser dito sobre ela! Apenas que foi feita no estúdio, uma vontade de Paul de fazer uma coisa 'pra cima'. E que foi George quem tocou o baixo, ficando Paul na guitarra. E que Yoko fez backing vocal e bateu palmas, e também Pattie, a esposa de George. Ah, sim, a música é contagiante!!
Só isso? Não!! Este foi o texto resumo que ilustrava o capítulo sobre as canções de mesmo assunto e classe, na primeira fase de minha saga! E não tem nada de 'pouco' a ser dito sobre ela!!! Trata-se de um pérola de rock 'n roll. Aliás, parece que tinha uma regra no manual Beatle, um mandamento, ao menos entre 1966 e 1968:
Sempre abrirão um LP com um Rock do bom!
Afinal, vejam:
1966 - Revolver abriu com Taxman,
1967 - Sgt. Peepper's LHCB abriu com Sgt. Peepper's LHCB,
1967 - Magical Mistery Tour abriu com Magical Mistery Tour,
1968 - Álbum Branco LP1 abriu com Back In The USSR
Vamos a mais detalhes sobre ela. Nem vou analisar letra, rimas, muito aprofundadamente, pois ela foi literalmente jogada, por sobre uma base que foi feita sem pensar em letra nenhuma, de puro rock'n roll, duas guitarras, baixo bateria! A coisa começou (e terminou) num dia inusual, porque os Beatles queriam ver de noite na TV Inglesa um filme com vários astros de rock americano. Então, eles chegaram às 5 da tarde no estúdio, ou seja, duas horas antes do usual, pararam às 8:30, foram pra casa de Paul ali perto, viram o filme, voltaram ao estúdio e foram até as 5 da manhã seguinte, já com a canção pronta!! E a canção não existia até às 5 da tarde do dia anterior! Paul chegou um pouco mais cedo que os demais e se sentou ao piano com a música na cabeça. Quando os outros chegaram, ele a mostrou, passou ao baixo, John e George pegaram de suas guitarras, e Ringo de sua bateria, cada um plugado numa faixa de uma fita de 4 canais, e prepararam 20 takes, as guitarras tocando o mesmo som, uma oitava acima da outra em boa parte da canção, e a bateria com um destaque solo, coisa que Ringo detestava! O último take foi considerado bom, e caminharam para a casa de Paul. Na volta, já estava pronta a nova fita, de 8 canais, Take 21, por sobre o qual apuseram vocais e novos instrumentos. O maior destaque instrumental foi para o piano de Paul, ligado ao já famoso Leslie speaker, a trapizonga que fez aquele enorme efeito na voz de John e na bateria de Ringo em Tomorrow Never Knows. O som ficou especial, reverberado.
Agora é uma boa hora pra falar da estrutura! O começo é um verso, mas instrumental, com Ringo abrindo para as guitarras oitavadas de John e George, depois a bateria de Ringo pa-pa-pa-pa, repetindo-se a dupla guitarra-bateria, 5 vezes, em tons diferentes, e Paul no baixo, espelhando as guitarras anteriores nos compassos de Ringo. Entra o segundo verso, onde aqueles pa-pa-pa-pa's acompanham os vocais principais de John e Paul, com este harmonizando lá no alto, ("You say it's your birthday! It's my birthday too, yeah, They say it's you birthday, We're gonna have a good time, I'm glad it's your birthday, Happy birthday to you"). Agora, vem uma sessão de preparação para a ponte, e dá pra ouvir Paul contando os compassos de 1 a 8, acompanhando o solo de Ringo, para designar a hora da volta das guitarras, e elas voltam pesadas, junto do pandeiro de George e das palmas de Ringo e de Mal Evans, o gigante sempre ponto a ajudar, enquanto John entra com "Yes, we're going to a party, party”, depois ele repete o chamado, com George um tom acima, e os dois, uma terceira vez, com Paul entrando lá no alto, lembrando os bons tempos de Twist And Shout cinco anos antes, rock do bom, com Ringo continuando seu show!
E então vem a ponte, que mais parece uma montanha-russa na guitarra de George, subindo e descendo, enquanto John e Paul chamam as meninas para dançar, e elas respondem "Birthday", sendo 'elas', no caso, Yoko Ono e Pattie Harrison, e a coisa se repete duas vezes, até Paul externar seu "daaaaance yeah" lá no alto, e quase invadir o próximo verso, de novo instrumental, mas com o pa-pa-pa-pa de Ringo sendo acompanhado pelo piano altamente reverberado de Paul, e pelo pandeiro de George. Agora vem outra ponte, mas com uma introdução solo das 3 guitarras, ou seja, o baixo de Paul, a guitarra de John uma oitava acima e a de George uma outra oitava acima, espelhando as me
smas notas, e vêm novos convites dos rapazes "I would like you to dance" e as mesmas respostas das meninas, três vezes novamente, e mais um berro de Paul, extenso, super-animado, aliás, todos estavam muito animados, adentrando ao verso final com tudo o que tinham direito: a bateria de Ringo, os vocais de John e Paul, pandeiro de George, as palmas de Ringo e Mal, e o piano doidão de Paul, num final apoteótico para um show de rock'n roll!!! Exuberimpressionante, se eu puder criar um neologismo qualificativo ao som que eles criaram em 12 horas de trabalho, com direito a um intervalo de duas horas pra ver TV!
Paul McCartney desejou Feliz Aniversário várias vezes em sua carreira solo, uma delas na Praça Vermelha, veja aqui neste LINK.
19. Yer Blues (Help Self Song by John Lennon)
John berra: 'Nuvem negra passa em minha mente, bruma azul em minh'alma, sinto tanta vontade de morrer, até odeio o meu Rock'n Roll. Quero morrer, siiiim, quero morrer'
Pronto fiz um desafio lá em HELP! e agora, perdi. ESTA, sim, é um 'cry for help' da melhor espécie! Só que não! Bem, ele realmente estava se sentindo assim, sozinho, no acampamento na Índia, quase se separando de Cynthia e já obcecado por Yoko, mergulhando na Meditação Transcendental, e queria falar com Deus! John usou a canção para fazer um pastiche sobre a onda de Blues na Inglaterra, vocês sabem, 'Blue', além de 'Azul', quer dizer 'Triste', e o Blues, como estilo musical, é invariavelmente, um lamento! E John quis elevar esse lamento à mais elevada potência, colocando o máximo lamento, que é a vontade de morrer.
Musicalmente, o vocal de John é impressionante, transmite a angústia, perfeitamente. Muito do clima sombrio da música foi conseguido por causa do local aonde gravaram, uma sala pequena de Abbey Road, que tinha espaço só pra bateria, um gravador de quatro faixas, os guitarristas e os amplificadores, que ficavam voltados para a parede do cubículo. Eles adoraram gravar assim, e decerto foi a chama para embarcarem no Projeto Get Back, de volta às origens da banda.
Yer Blues foi apresentada aos demais nas famosas sessões de Esher, casa de George, com John ao violão e George também, já pensando em partes do solo que faria depois, Paul e Ringo na percussão. A letra estava ainda diferente da definitiva, inclusive ela dava diferentes 'nacionalidades' de sua mãe e pai, que ali eram, respectivamente, da 'terra' e do 'céu', rimando "sky" com "why", mas na versão final trocou "mother" por "father", e ficou muito melhor, com a rima mais elegante, de "earth" com "worth". Um ou outro, o fato é que a imagem envolvendo "sky" e "earth" foi inspirada nos poemas de Yoko. Também John não estava tão dramático: na demo, ele estava apenas "insecure" como o Mr. Johns de Bob Dylan, já na versão final, ele estava "suicidal", o que seria o extremo do 'feeling blue'. No estúdio, foi em 12 de agosto, e lá se foi a parafernália de instrumentos e amplificadores para uma sala 2x5 metros, um almoxarifado sem acústica, em que tinham até que ter cuidado para não esbarrar guitarras, e lá ocorreu uma sessão bem produtiva, cada um com seu instrumento tradicional captado por um canal da fita. Nunca os Beatles trabalharam tão unidos. Lembraram-se da época do Cavern Club. Foram 14 takes, mas os melhores foram o 5 e o 6, e fizeram uma junção das melhores partes deles, criando o Take 15.
Não há pontes ou refrões na estrutura, são 9 versos direto, sendo 4 deles instrumentais, e os outros 5 sempre terminando com a mesma frase "If I ain't dead already, oh girl you know the reason why". Versos 1 e 2 têm métricas similares, com as frases de John "Yes I'm Lonely", "gonna die", (repete), "In the morning", "gonna die", "In the evening", "gonna die", são entremeadas por riffs chorosos da guitarra de John e de trios de uma nota só da guitarra estridente de George, e as duas se juntam em harmonia descendente antes da frase final. O baixo de Paul nessa sessão é bem blues básico, sem firulas. Cada frase de John é introduzida por uma virada da bateria de Ringo que, aliás, está impossível na canção, com aquele prato insano durante toda a canção. O Verso 3 ("My mother was of the sky" e mais três frases), o Verso 4 ("The eagle picks my eye" e mais três frases) e o Verso 5 ("Black cloud crossed my mind" e mais três frases) são diferentes dos primeiros. É notável a sucessão de Beatles Breaks, com John cantando as três primeiras frases sem qualquer instrumento por trás, seguidos por glissandos descendentes das duas guitarras de John e George e do baixo de Paul, movimento que felizmente pudemos testemunhar VISUALMENTE no Rock And Roll Circus, o qual explicarei mais adiante. Os três versos também terminam com John e George em harmonia descendente antes da frase final. No verso 5, quando John declara um surpreendente "even hate my rock and roll!", o ritmo deixa o blues básico, e passa a ritmo diferente, mais batido, mais animado. Os Versos 6 e 7 são puramente instrumentais eguem integralmente no ritmo final do Verso 5, e têm destaques para a guitarra sincopada de John no primeiro (com a de George no background) e para a guitarra estridente de George no último (com a de John no background), trabalho de equipe. Depois com uma sensacional virada da bateria de Ringo, volta ao ritmo inicial, com o Verso 8 só instrumental, ouvindo-se a voz de John ao fundo, entoando a letra do Verso 1, e segue o Verso 9, que começa mas cai em fade-out até terminar a canção. Estes dois versos finais não são tocados na base, apenas são cópias do Take 5, mas com o vocal abafado. No dia seguinte, John gravou seu estonteante vocal principal, e Paul acrescentou um vocal de apoio no segundo e no terceiro "girl, you know the reason why", os engenheiros dobraram as guitarras dos Versos 6 e 7, e acrescentaram aquele eco na voz de John! Ô coisa boa!!
A música também notabilizou-se por ser a ÚNICA num período de mais de dois anos, em que um Beatle aparece tocando uma canção dos Beatles ao vivo! Foi por conta de um projeto de Mick Jaegger para a TV, chamado Rock And Roll Circus, em que John tocou numa superbanda, com Eric Clapton na guitarra, Keith Richards no baixo, e Mitch Mitchells (Cream) na bateria, uma banda que levou o nome de Dirty Mac. O espetáculo não foi ao ar, mas pode ser conferido neste LINK. Peço especial atenção para o momento 'My father was of the sky', note os 3 guitarristas num 'glissando' pelos braços dos agudos aos graves de suas guitarras, e mais um depois de 'My mother was of the Earth'. Notável!
20. Mother Nature´s Son (Self Story Song by Paul McCartney)
Paul se coloca na pele de um camponês: 'Nascido como um pobre rapaz do campo, filho da Mãe Natureza, o dia todo canto canções pra todo mundo'.
Iniciada na Índia, inspirada num texto do guru Maharishi, e complementada em Liverpool, na casa do pai. Uma canção pastoral. O mesmo texto inspirou Child of Nature, de John, que posteriormente teve a letra trocada para a linda Jealous Guy, e foi lançada na carreira solo. Era uma época em que os Beatles começavam com seus trabalhos pessoais. Paul estava num estúdio gravando esta canção, enquanto John e Ringo estavam em outro, terminando Yer Blues. Nesta canção, Paul tocou violão, bumbo e tambor. George Martin fez arranjo de metais (trompetes e trombones).
Caramba, o resumo acima foi o que apresentei quando apresentei as canções dos Beatles que contavam histórias na primeira pessoa, e realmente não em muito mais do que isso pra comentar..... ah, sempre tem, né...
O 'iniciada' em verdade constituiu-se apenas nas três primeiras frases, que estão traduzidas no caput, que vem a ser o Verso 1, depois vem um Verso 2 versando (!) sobre as águas da montanha, e depois um refrão que Paul preferiu deixar sem letra, ficando apenas no tchu-tchu-tchu-ru, e depois mais um verso falando das flores sob o sol, bem pastoral, mesmo, concluindo com outro tchu-tchu-tchu-ru, e mais um verso, desta vez apenas murmurado. Um total de apenas nove frases, bem simplesinha, mas bonitinha. Decerto, estaria entre as canções dispensáveis do Álbum Branco, caso fosse seguida a sugestão do Maestro George Martin, que disse que o material que tinham à disposição dava pra encher, com qualidade, apenas um LP com 16 canções, e olhe lá. O sucesso do LP mostrou que o Maestro estava errado! Aliás, coloquei-me esse desafio, de listar quais seriam essas canções, em minha opinião, e voltarei ao tema quando concluir este capítulo. Já venho matutando, e vejo que terei que cortar 'na carne'.... mas a presenta canção, sem dúvida, poderia estar entre as 14.
Ela foi apresentada por Paul aos demais no final de maio, na casa de George e, tão simples que era, não inspirou a nenhum acompanhamento dos amigos. A demo gravada tinha apenas Paul ao violão, e dobrando, tanto voz como instrumento, que também teve o fundo da caixa batucado, como percussão. Ela foi ensaiada no estúdio ainda em junho, sem compromisso, mas é digna de nota essa ocasião, pois foi a mesma sessão em que Blackbird foi gravada, e John, sem utilidade como instrumentista na gravação, ouvia lá da sala de controle e sugeriu que nela cabia uns metais, leves. Paul agradeceu a sugestão lá de baixo, mas disse: "Quem sabe nesta aqui..." e entoou Mother's Nature Son. Estava decidido o toque final da canção. Paul a trouxe oficialmente no estúdio apenas em agosto, finalizando o dia 9, solitário, ao seu violão, durante as últimas quatro horas da sessão, quando a tocou 25 vezes, quase todas completas, e se decidiu pelo Take 24 como base. Ao final, encomendou o arranjo de metais a George Martin, que somente se materializou em 20 de agosto. Eram dois trompetes e dois trombones, que tocaram sob a supervisão de Paul no chão do estúdio mas atentos à pauta escrita por Martin. Os metais entram a partir do Verso 2, e notáveis são os trombones em 5 notas por sobre o baixo, introduzindo as terceiras linhas dos versos a partir dali. Em seguida, em um canal ainda livre, Paul dobrou seu vocal em alguns trechos, e também seu violão em outros, e acrescentou as percussões, que incluíam, além do bumbo, um singelo livro, batucado, que, na linha do "Seu desejo é uma ordem!", teve seu som microfonado e capturado e registrado na gravação final. Ouvem-se esses tapinhas, a partir do Verso 2, mas mais evidentes nos refrões, duelando com o bumbo!
Sendo uma canção de Paul, havia alguma chance de ela ser reproduzida ao vivo, e ela foi! Foi na excursão "Back to the US", mas ele não a tocou quando eu vi o show, em Houston, ano que vem completa 20 anos, caramba, o tempo passa! Veja como foi, aqui, neste LINK. No acordeão, Wix Wickens, mago dos teclados que está com Paul até hoje! Aliás, escrevi sobre essa magnífica experiência que eu tive em 2002, aqui, neste LINK, pra quem quiser conhecer!
21. Everybody´s Got Something to Hide Except Me and My Monkey
(Trip Acid Song by John Lennon)
John viaja: Quanto mais fundo você desce, mais alto você voa. Quanto mais alto você voa, mais fundo você desce. Então, vamos lá, vamos lá. Vamos lá, é tanta alegria! Vamos lá, é tanta alegria! Pega leeeve! Pega leeeve! Todo mundo tem algo para esconder exceto eu e meu macaco..
John está eufórico, um dos estados possíveis da mente alterada. Ele sempre dizia que era referência ao momento do relacionamento dele com Yoko e a reação dos outros com a constante presença dela nas gravações, que ele e ela não tinham nada a esconder. Entretanto, 'monkey' é também referência a heroína (em que o casal havia embarcado), pois era um apelido à droga nos anos 40, o 'higher' e o 'deeper' não deixam a menor dúvida, e o 'take it easy' é um autoconselho, ele mesmo se recomendando pegar mais leve. Musicalmente, ela é frenética, gritada, e tem um sino alucinante, em vários momentos, tocado por Paul, que também entra no clima e dá uns gritos ali no meio. Não é preciso ressaltar que é a canção de maior nome dentre as 186 da autoria dos Beatles. Sabe o que isso significa? Naaaada!! O que interessa é que a energia que eles dispensaram na gravação deve ser proporcional ao número de caracteres do título!! E no canto, John ainda acrescenta mais 3 caracteres! A gente fica até cansado de ouvir! Coração acelera!! Ufa!! Vamos aos detalhes.
EGSTHEFMAMM (vou adotar o anagrama pra economizar tinta) é simples, estruturalmente, na linha do casa/separa do Jô Soares, ou seja, verso/refrão /verso/refrão verso/refrão, tendo o refrão uma introdução, com "Take it easy" ou "Make it easy", ao bel-prazer do autor, e o título modificado da canção. E a modificação é aquela da letra em vermelho do anagrama. O 'F' é de "for" que John canta, "...except FOR me and...", corretamente, respeitando a gramática inglesa, mas não está no título impresso na capa do álbum nem nos registros de Abbey Road, erradamente. Provavelmente, deve ter sido descuido do sujeito que registrou o título pela primeira vez, já no terceiro dia de gravação, John deve ter ditado o longo título, e o carinha se esqueceu do "for". Cada verso é diferente do outro em seu início, no Verso 1 John apenas convoca para a 'viagem' e explica como vai ser bom "Come on it's such a joy", mas vem o refrão e ele aconselha 'pegar leve'. Nos Versos 2 e 3, ele usa dois compassos a mais para expressar ideias com causa/efeito alternando para efeito/causa, note, no Verso 2 é : "The deeper you go, The higher you fly! The higher you fly,the deeper you go! So come on", e no Verso 3 é : "Your inside is out. Your ouside is in. Your outside it in. Your inside it out. So come on", para depois concluir com o mesmo elogio e alerta, cada um dos versos!
EGSTHEFMAMM estava no conjunto das canções que foram apresentadas mutuamente no final de maio, na casa de George, mas ao contrário das demais, que foram escritas no retiro do Maharishi na Índia, provavelmente esta foi escrita por John depois da volta deles porque, declaradamente, inspirou-se em seu novo relacionamento com Yoko, que começou, mesmo, só após a volta dele da Índia, onde estava ainda com Cynthia. Decerto, porém, que algumas frases foram lembradas da época do retiro, inclusive o título, que ouviu numa palestra (sem o 'macaco', claro!), bem como o "Come on it's such a joy" que era um mantra do Guru, e ele entoava em várias ocasiões. Já na demo acústica de Esher, vislumbrava-se o ritmo que John queria impor. E todos ficaram animados a gravá-la, tanto que foi a quinta (entre as 30 do Álbum Branco) a entrar no estúdio, ainda no primeiro mês de gravação. E tão animados estavam, que ficaram mais de seis horas ensaiando, cada qual em seu cada qual em seu próprio canal, ou seja, John-George-Paul-Ringo em guitarra-guitarra-baixo-bateria na faixa 1-2-3-4, da fita de quatro canais, plain vanilla. Foram embora às 3 da manhã, com a intenção de escolher depois qual seria a melhor parte para virar uma base, mas ao chegarem de volta ao estúdio, naquela mesma noite, resolveram começar do zero, e gravar por cima, na mesma fita (Nããão!! Pecado!!!) do trabalho da noite anterior.
Apenas este dia, 27 de junho, foi considerado oficial, e teve tanto trabalho como o primeiro, só que conseguiram produzir seis takes, com uma particularidade: não havia linha de baixo na base escolhida! Paul desistiu de competir com o alto volume das guitarras de John e George, que estavam ensandecidos, nos máximos volumes possíveis de seus instrumentos, e decidiu deixar o baixo para os acréscimos (overdubs). John abre a canção com os três acordes junto com Ringo, em dois bumbos e uma caixa na introdução, à qual se adicionariam palmas. Posteriormente, John segue seu papel de guitarrista de fundo, tocando os mesmos três acordes da introdução. George está estupendo com riffs durante os versos, mas especialmente, também com dois riffs intrigantes em Breaks entre versos, acompanhados da caixa de Ringo, à razão de quatro vezes para cada riff.
Porém, Paul não queria ficar atrás, e também ficou ensandecido quando encontrou um inusitado sino de bombeiro no banco de instrumentos do estúdio, e que ele balançava loucamente ao lado de Ringo, tanto que seu braço ficou cansado, e ele alternou, nos melhores takes, o tal sino com um chocalho, bem brasileiro, que aparece no Verso 2, ensanduichado com o sino exuberante nos Versos 1 e 3 e na apoteose final, com um efeito espetacular! A partir do Take 6, não houve mais performance de banda, mas ações individuais em overdubs. Paul acrescentou sua linha de baixo, que em nada deveu ao desempenho das guitarras dos animados companheiros, floreado durante os versos, e em notas repetidas durante os refrões. Depois, John gritou seu vocal fenomenal, lá no alto, e ainda com um dificílimo falsete no refrão, em "to hiide". Não houve harmonização em backing vocals, mas Paul acrescentou fantásticos gritos, e até alguns uivos, em vários pontos da canção, especialmente como introdução aos versos. John ainda dobrou vocais e também usou um canal livre para gravar o vocal final, com uma sucessão desenfreada de "Come on Come on Come on"s, na conclusão, que interrompe para uma ótima combinação das três guitarras, e volta firme regravado por cima inúmeras vezes, no fade-out da canção, completando o Take 12, que iria para mixagem e prensagem final.
Sino / Chocalho
Gente, como é que uma canção de menos de três minutos leva quase 20 horas de dedicação?! Estavam todos no ápice de suas capacidades mas, principalmente, com vontade de fazer história, mais uma vez! É muito profissionalismo! E também, do meu lado, como é que eu dedico mais de 4 horas para detalhar essa efeméride?! Podem estar certos de que foi com um sorriso constante no rosto e emoção no coração...
EGSTHEFMAMM nunca foi tocada ao vivo, por Beatles, ou por John, mas sim por The Analogues, Thanks God!! Conseguiram honrar o vocal de John, o sino de Paul, a guitarra de George, a bateria de Ringo, e nos brindam com um final estendido, como John queria. Vejam aqui neste LINK, que é o show inteiro do Álbum Branco, e, se quiserem ouvir a canção, vão direto ao começo da segunda hora, em 1:00:20 e os desafio a ficarem parados!
22. Sexy Sadie (Person Speech Song by John Lennon)
John acusa: "Sexy Sadie, você quebrou as regras, o mundo esperava por você, o que você fez?"
Na verdade, o tal sádico sexual seria o Maharishi Mahesh Iogi, o guru que encantou a todos os Beatles a ponto de irem se internar em seu ashram em Rishikesh na Índia para aprenderem Meditação Transcendental . John se desencantou com ele quando Mia Farrow, a atriz, irmã de dear Prudence, o acusou de assediá-la sexualmente. John queria dizer: "Maharishi, what have you done, you made a fool of everyone!" mas foi demovido por George e os outros, e trocou por 'Sexy Sadie'. A canção é maravilhosa! John no seu melhor, Paul e George perfeitos, Ringo, preciso, sem reparos!
Depois dessa impressão sobre o caso, que até fez os Beatles restantes deixarem a Índia, outras houve que reduziram a suspeita ao que hoje chamamos de fake news. Pois é... É que eles se relacionavam naquele momento com um certo Alexis Mardas, que também era visto como um guru por John. Segundo consta, ele foi lá resgatá-los do 'outro' guru e plantou a notícia sobre o assédio, John acreditou e foi embora. Antes de sair, John escreveu a canção com o ataque direto ao Maharishi. Quem demoveu John da ideia foi seu companheiro George, que inclusive sugeriu a substituição pelo nome que conhecemos até hoje. E que deixou por muito tempo a impressão de que a letra se referia a uma garota de programa muito sexy, porque vários trechos da letra combinavam com esse sentido, especialmente pelo uso constante do pronome "She" e do qualificativo "Lover".
A estrutura da canção parece ritmo de valsa, verso-verso-Ponte verso-verso-Ponte (mas o ritmo de verdade não é). Interessante que a formação de todos os versos é a mesma, na métrica ABBA, que nada tem a ver com a banda sueca, apenas cada letra representa uma frase. Cada verso chama o Sexy Sadie e abre com uma questão, ou acusação ou mesmo uma ameaça (A) estabelece um complemento (B) depois reforça o complemento (B) e reforça a inicial (A). Mais especificamente,Verso 1 - A: What have you done? e B: You made a fool of everyone!Verso 2 - A: You broke the rules e B: You layed it down for all to see!Verso 3 - A: How did you know? e B: The world was waiting just for you!Verso 4 - A: You'll get yours yet e B: However big you think you are?
A cada Verso par tem uma Ponte, portanto são duas, e uma é diferente da outra e cada uma apresenta um sermão, como todos esperávamos por ela, sentamos à sua mesa, bastava um sorriso seu (e você nos decepcionou). E a canção fecha com outro verso, mas apenas instrumental.
Sexy Sadie foi apresentada aos demais em Esher, na casa de George, ainda com letra incompleta. Interessante a posição dela no álbum logo após EHSTHEFMAMM (um singelo anagrama), porque, em contraposição à energia que entregaram nesta gravação, os Beatles demoraram a acertar as coisas na nova canção, talvez pelo clima sugerido na letra. Foram 3 sessões, espaçadas vários dias entre si. Houve 21 takes na primeira, mas decidiram jogar tudo fora e começar do zero, e foram mais 23 takes na segunda, mas decidiram jogar tudo fora e começar do zero. Nesta sessão, houve uma tensão entre o George da sala de controle e o George do chão do estúdio, mas passou. Na terceira sessão, 10 dias depois, pra afastar o desânimo, e zerar o climão, começaram até num número redondo, que foi logo para os 3 dígitos. O primeiro Take do dia foi o Take 100! Afastada, portanto, a fama de que Sexy Sadie teve mais de 100 takes, na verdade, pularam algumas dezenas de numerais. Fizeram, finalmente, meia-dúzia de takes ótimos, todos de acordo, onde acabaram por definir que o piano de Paul, temperado com eco e com um pandeiro de Ringo posterior, seria o instrumento a abrir a canção, e não a guitarra jazzística de George, que era uma outra opção que também foi tentada. Depois, foram fazendo sucessivas reduções de fita (aquele processo de liberar um canal para futuros overdubs), até chegaram no Take 117, final, que tinha, cada um em seu canal, a bateria de Ringo num 4x4 firme, com muitas viradas, e tinha o baixo floreado, nada básico, de Paul, e tinha o lead vocal perfeito de John, dobrado em pontos isolados, mas no canal 3, havia uma verdadeira salada de sons: tinha 3 pianos de Paul, e tinha um órgão Hammond de Paul nas pontes, e tinha 3 guitarras, sendo as básicas de George e a de John, mas especialmente a de George, chorosa, no estupendo instrumental final, além dos backing vocals de John, Paul, e George, aqueles deliciosos "wah-wha-wha-wha" e "see-see-see-see" dos versos e também "Seeeexyyyyysaaaaadiiiiie" e "She's the latest and the greatest of them all" nas pontes.
Ao vivo? Hail The Analogues!!! Encontrará neste LINK, em 1:03:15!!
23. Helter Skelter (Sex Girl Song by Paul McCartney)
Paul grita: "Você vai ou não vai querer que eu te faça? Estou chegando rápido, mas não me deixe te interromper. Diga-me, diga-me, vamos, diga-me a resposta! Você pode ser uma amante, mas não é nenhuma dançarina! Cuidado! Confusão!!!"
Helter Skelter é uma canção que ninguém classifica como Sex Song, mas eu, sim.... "ele só pensa naquiiilo?" ... não, nada disso! Lá vamos nós de novo... Paul fala com uma garota, em ritmo alucinante, de montanha russa (que é o que um dos significados do título), perguntando num sobe e desce, se ela não quer que ele a 'faça', e ele está descendo rápido, mas não quer quebrá-la, aguenta aí, diz que ela é melhor amante que dançarina, ah sei lá, senti esse clima, e defini assim, e pronto!! Vale aqui o destaque sobre o produto final, pois a canção é considerada a precursora do Heavy Metal e ela é tocada tão intensamente pela banda, que Ringo, ao final, berra "I've got blisters on my fingers!!", que foi tão representativo que foi deixado na gravação final. Outro destaque, esse bastante negativo, é de que ela foi, juntamente com Piggies, de George, no mesmo álbum, inspiradora de Charles Manson para cometer os bárbaros assassinatos de Sharon Tate e amigos, na Los Angeles de 1969, dizendo que os Beatles eram os cavaleiros do apocalipse, uma bobagem sem tamanho... Esse episódio me marcou muito, em meus 11 anos. Felizmente, Tarantino fez uma versão alternativa no cinema (minha resenha, neste LINK), em 2019, e em respeito aos Beatles, nem mencionou aquela absurda associação. Paul McCartney, de uns anos pra cá, a tem tocado em seus shows solo, mesmo arriscando sua voz, que hoje não é a mesma!
Bem, a inspiração de Paul veio como uma resposta a um desafio a que ele mesmo se impôs: um artigo de Pete Townsend, guitarrista do The Who, dizendo que eles haviam feito a canção mais pesada do rock, algo assim. E Paul pensou: "Os Beatles podem fazer melhor!", e fizeram... na verdade ele fez, porque compôs a canção sozinho, mas ... na verdade, foram eles fizeram, pois materializaram aquela loucura. Helter Skelter é um brinquedo de parques de diversões do interior da Inglaterra, uma torre estilo medieval, com uma escada interna que, em seu topo abria para uma rampa em espiral externa ao redor da torre, um gigante escorregador, mas, em sentido figurado, quer dizer confusão, bagunça, labirinto, ou ainda, pressa, muita pressa. Tudo isso é vivenciado ao ouvir a eletrizante canção, do jeito que foi interpretada, pelo cantor e pela banda. Primeiro, porque ela começa lá no alto, com uma introdução cantada, antes do primeiro verso, bem, minto, ela foi berrada! Vou tentar expressar na escrita, com cores e tamanhos crscentes, aquilo que a gente ouve...
When I get to the bottom, I go back to the top of the slide
Where I stop and I turn and I go for a ride
Till I get to the bottom
AND I SEE YOU AGAAAIN
YEAH YEAH YEAH
Consegui? Eu fiz questão de colocar o ápice em caixa alta, porque, o próprio Paul escreveu seu esboço de letra em caixa alta, para denotar que a canção seria gritada. Note que ele estava em dúvida entre a rima escolhida e a desta versão inicial, em que ele leva a garota ao alto da colina ("Hill") e dá a ela um arrepio ("Thrill"), o que denotaria ainda mais o contexto sexual. Quando vi o manuscrito, não pude deixar de lembrar de um episódio de minha vida profissional, porque eu corrigi um péssimo hábito em um chefe meu, que me agradece até hoje o conselho. Ele escrevia seus e-mails em CAIXA ALTA. E eu perguntei: "Por que você está gritando comigo?" A caixa alta é muito desagradável de ler. Normalmente, eu nem leio! PARECE QUE A PESSOA ESTÁ GRITANDO, e eu não quero conversar com quem grita comigo!! Quando ele adotou a prática normal, outras pessoas vieram elogiar e disseram que nunca haviam falado isso pra ele, por vergonha!!
Mas vamos voltar ao que interessa, seguindo na estrutura, letras e rimas. Depois da introdução, vem o primeiro verso, com um convite "Do you, don't you want me to love you? I'm coming down fast,...." e vem o refrão, com três vezes o título, e vem o segundo verso, com a proposta "Will you, won't you want me to make you? I'm coming down fast,...." onde o "make you" leva todo o jeito de "make you come", que tem o segundo sentido de levar ao orgasmo! Depois, mais uma vez o refrão e novamente a introdução doida, que pode ser interpretada como sucessivos atos sexuais, indo ao topo e ao fundo repetidas vezes, um astro na cama!! Depois, segue o terceiro verso, repetindo a proposta do segundo (que fôlego!!), e mais um refrão, e a conclusão, que deixa os músicos exaustos, Ringo sangrando, e a garota, chegando ao ápice da relação "She's coming down fast"! Rimas? Algumas, que eu comento por causa de duas correções de pronúncia que eu experimentei ao longo da vida "love you" com "above you" no Verso 1, verbo com advérbio, eu falava "above" com o "o" fechado, mas pra rimar com "love", vi que é aberto; e o verso termina rimando "answer" com "dancer", que me fez perceber outra falha de minha infância, pois eu pronunciava "énsuer", só que o correto é esquecer o som de "u", que aliás, é "w". O Verso 2 tem uma rima fraquinha, dois verbos, "make you" com "break you", e depois repete a rima final de todos os versos.
Helter Skelter não estava entre as canções apresentadas em Esher, na casa de George no final de maio, não teve nada a ver com o período da Índia! A primeira vez que alguém além de Paul ouviu a canção foi já na EMI, mas informalmente, no meio de uma sessão de Blackbird, em 11 de junho, com Paul no violão tocando um trecho dela, sob os olhares e ouvidos atentos de John e de George Martin, em outra parte do estúdio. Os joelhinhos que balançam ao som da canção ao lado de Paul são de Francie Schwartz, sua nova e breve namorada (entre Jane Asher e Linda Eastman) e, ao lado de John, vê-se Yoko de costas, não muito sensibilizada com a nova canção de Paul. E isso tudo se sabe porque sobreviveu um trecho raríssimo de filme do momento histórico, que felizmente eu encontrei e coloco aqui, pra vocês, neste LINK. Adorei!!! Depois disso, somente em 18 de julho entraram todos dispostos a materializar a ideia de Paul, foi uma longa sessão, em que produziram apenas três takes, com Paul na guitarra solo, George na guitarra base, Ringo na bateria e John .... no baixo! Sim, sim! Uma interessante inversão! E olha que peculiar duração dos takes: 1 - 10:40, 2 - 12:39, e 3 - 27:11, ou seja o último foi quase meia-hora! Jamais visto! Toda a sessão foi considerada como ensaio, mas saiu uma novidade: a voz de Paul foi gravada com eco, e era novidade porque o eco era normalmente introduzido posteriormente. Paul gostou daquilo e pediu que fosse mantido. Somente em setembro, eles voltaram para gravá-la e eles estavam em estado alterado. Mantiveram a configuração instrumental e gravaram mais 18 takes, Paul pedia mais volume para as guitarras, mais volume para a bateria e ensinava John como deveria tocar o baixo, o pessoal do estúdio se entreolhava, mas seguia a política do "seu desejo é uma ordem", e faziam tudo o que Paul pedia. O Take 21, último da noite foi considerado bom e é nele que se ouve o brado de Ringo ao final "I've got blisters on my fingers", seus dedos estavam realmente em petição de miséria, sangrando, tamanha energia que colocou na bateria, e todos estavam exaustos. Seguiram lá, e Paul gravou seu vocal principal, e todos estavam estupefatos, inclusive George entrou no clima e correu pelo estúdio com uma lata de lixo pegando fogo na cabeça. Estavam todos doidos! A sessão havia saído do controle! Mas eles eram The Beatles! Voltaram no dia seguinte, mais calmos, para overdubs, de guitarra, de Paul, sobre a guitarra de George, John acrescentou um piano, os três gravaram seus vocais de apoio, com variados "aaaaaa"s e "da da da da" e o sempre presente, algumas vezes atuante roadie Mal Evans tocou aquele trompete estridente na conclusão!!
Mas deixa eu detalhar só um pouquinho da montanha-russa de emoções sonoras que é esta precursora do heavy metal. Começando pela introdução, que tem 6 compassos, quaternários, no primeiro só a guitarra de Paul, com duas palhetadas a cada tempo, num E7 (Mi com 7ª), Paul entra no vocal no 2° compasso, Ringo entra no 3° com Paul crescendo para E6 (Mi com 6ª) dissonante, e no 4° em Eaug (Mi aumentado) mais dissonante ainda, e tanto ele como Ringo já estão lá no alto, a guitarra em G (Sol) e a voz em AGAAAAAAINNN, e no 5° Ringo já está batendo naquele prato como se não houvesse amanhã, Paul desce no Yeah Yeah Yeah em A (La), e à essa altura entre o resto da banda, com John num baixo batido, forte, em sequências de uma nota só, também duas por tempo, e George numa guitarra base propositalmente desafinada. que vai seguir em toda a canção! Tudo isso com tudo o que o estúdio poderia oferecer de pesado, como ecos, reverbs, ADT, distorção, e escambau. Paul queria assim! O Verso 1 então entra com tudo, e logo na 2ª linha vêm o backing AAAAAA e mais AAAAAA na 3ª linha, e vem um Beatles Break, com tudo parando para Paul cantar, ou melhor, gritar You may be a lover but you ain't no dancer , aí com Ringo dando uma virada, e o backing agora no DA DA DA DA DA DA DA e vem Paul no refrão gritando quatro vezes Helter Skelter, sendo duas em G (Sol) e duas em A (La), entremeadas por seu próprio riff na guitarra solo, sensacional! UFA!.... não não vou seguir nesse detalhe todo, deixo vocês curtindo, mais um verso e outro refrão e nova intro no meião, e outro verso e outro refrão, até chegar ao final, preste atenção na conclusão que entra em fade-out, parece que acaba, mas não desista!! Do nada, ela volta, com todos insanos, para mais preciosos segundos de um jam incrível, até finalmente terminar com as mãos de Ringo em sangue, com as bolhas já estouradas!! Cansei até para descrever a efeméride, coração batendo!! Sabe o que pareceu? Lembra daquele take de 27 minutos? Parece que eles começam a conclusão, mas como não podem colocar em disco aquilo tudo, vão sumindo, o tempo para, por uns 20 minutos, mas eles seguem tocando, e eles voltam para o final, só que fica transparente para nós. Gostei de minha suposição, de minha própria lavral!
Bem, como eu disse lá em cima, Paul tocou Helter Skelter muitas vezes em sua carreira solo, chegou a ganhar um Grammy em 2011, como melhor desempenho de rock, na categoria melhor gravação ao vivo da canção feita em 2009 num show em New York. Foi o 14° Grammy dele (foram 10 com os Beatles), eu poderia pegar esse vídeo, mas preferi anexar aqui um em que ele toca com Ringo, ou seja, temos metade dos Beatles no palco,em julgo de 2019, Paul em seus 77 anos, Ringo acabando de completar 79! Eles tocam Sgt. Pepper's Reprise e, depois, para surpresa geral, vem o acorde inicial de Helter Skelter! Plateia vai à loucura! Imperdível! Aqui, neste LINK!! Os tempos têm um delay estratégico para dar tempo de Paul recuperar o fôlego, e o final é um pouco diferente, mas nada que perturbe a magia de vê-los juntos! E faltou também o berro de Ringo, mas eu posso dizer, que após escrever esta resenha .....
I've got blisters on my fingers!!
24. Long Long Long (Dream Self Song by George Harrison)
George conversa: "Já faz muito, muito, muito tempo. Como eu poderia ter perdido você quando eu te amei. Levou muito, muito, muito tempo. Agora eu estou tão feliz que te encontrei. Como eu te amo!!"
Repararam na dúvida se o pronome é O ou A? Em inglês, que é uma língua 'deSgenerada', no sentido de não ter gênero (escrevi sobre isso, aqui), não há essa dúvida, pois ele fala 'How could I ever have lost YOU'. Então, quem lê ou ouve a letra pela pela primeira vez, acha que ele está lamentando a perda de uma garota que amava. Eu pensava assim... por isso a classifiquei pela primeira vez como uma 'I Miss Her' Song. Só recentemente eu soube que George declarou que o YOU que ele queria encontrar de novo era DEUS. Tudo se encaixou melhor, com o período de vida de George, cada vez mais imerso em seu interior, a canção foi escrita na Índia e tal. Musicalmente, quer dizer, como vou confessar isso, eu acho ela chatinha, chatinha, arrastada, e sempre declarei isso em conversas com beatlemaníacos. Entretanto, não é assim que os críticos a consideram. Em uma enquete sobre quais músicas do Álbum Branco sobreviveriam se ele tivesse apenas 12 faixas, essa de George estaria lá, e outras duas dele, que eu considero muuuito melhores, Piggies e Savoy Truffle, não estariam!! Recentemente, eu a tenho ouvido mais e tenho-a sentido um pouco melhor! Beatles na canção? Apenas George, Paul e Ringo! John optou por não participar!
Bem... um pouco mais sobre a letra e sua estrutura. George estava num clima de auto-revelação, e quando percebeu ter encontrado seu 'eu' começou lançar mensagens ao mundo, como Love You To, mas mais forte em Within You Without You, pregando o amor em seu maior significado! Aqui, ele revelou que encontrou seu Deus, mas não quis revelar explicitamente, e deixou apenas no pronome 'Você'. Foi caso pensado, ele achou que se fosse mais explícito, não seria bem recebido, nem por seus companheiros, nem por boa parte do público em geral. Quando foi à carreira solo, desembestou, a começar pelo seu grande sucesso My Sweet Lord. Em sabendo do real significado, a gente tem que entender o sentido amplo, por exemplo, no Verso 1, quando ele diz "How could I ever have lost You, when I loved You?", tem que se pensar que ele sabe sabe que veio de outra vida, em que certamente ele terminou já com a parceria de Deus, mas ao reencarnar na nova vida, sem memórias da outra, e teve que passar décadas até encontrá-lo novamente nesta nova vida, lamentando-se por ter demorado tanto. e no Verso 2, ele diz que "Now, I'm so happy I found You". Na Ponte, curtinha também, ele lamenta quantas lágrimas desperdiçou até encontrar Deus. E no Verso 3, com alguns compassos a mais que os versos iniciais, ele declara seu amor, não entendendo como ele colocou tantas coisas no ludar de Deus e declara: "How I want You, oh, I love You, you know that I need You".
Long Long Long também foi Long Long Long na gravação. Ao contrário de seus companheiros compositores maiorais, George não usou seu tempo de retiro na Índia para compor. E também demorou para trazer esta canção para gravação. Pesou a demora sua preferência por outras três canções que apresentou e não chegaram a bom termo, Sour Milk See, Circles e Not Guilty (todas ótimas!), especialmente esta última, em que levaram mais de 100 takes, antes de desistir. Foi traumático para George. Paul e Ringo estavam lá e foram apresentados a ela (ver foto), e se dedicaram desde o começo a entregar uma boa gravação. Já John, bem, ele nem foi ao estúdio, sem qualquer motivo aparente. Os primeiros takes começaram com George no violão, Paul no baixo e Ringo na bateria, e ele estrava novo equipamento com duplo-baixo, mais apropriado a trabalhos em estúdio, que era só o que eles faziam. Até então, ele usava baterias destinadas a shows. E dá para perceber a diferença. Bem, após 15 tentativas, Paul resolveu deixar seu baixo para os overdubs, e deixar-se ao órgão, pois percebeu que aquele seria o instrumento primordial da canção. E a gente percebe que é mesmo. George ficou contente com a decisão. Mesmo assim demorou muito até acertarem. A introdução chegou a um ponto bom no Take 29, mas o resto ainda demoraria muito. No Take 48, George começou a desanimar, no 53, chegou a desistir, mas Paul o animava. E três tentativas depois, decidiram que Ringo deveria entrar antes, já durante os versos, o que se mostrou ótimo, e George chegou a se animar de novo. Quase no final (Take 65), um barulho apareceu na gravação, que fez o produtor Chris Thomas (lembre-se do cravo em Piggies) descer ao chão do estúdio e identificá-lo: era uma garrafa com um resto de vinho que estava em cima do Leslie Speaker (lembre-se de Tomorrow Never Knows) que estava conectado ao órgão de Paul. Todos adoraram e o repetiram e captaram seu som, que aparece na gravação final, juntamente com acordes dissonantes de órgão e guitarra, e Ringo com batidas de suspense na caixa, e George se esmerando num longo lamento, que mais pareceu uma alma penada, dando um efeito bem temático, para uma conversa com um ser superior! E isso já era 7 da manhã do dia seguinte, e mais à noitinha, eles voltaram e George acrescentou seu vocal, Paul sua linha de baixo, inaugurando um instrumento recentemente comprado, ele e George acrescentaram backing vocals. No dia seguinte ainda houve mais um acréscimo importante, o piano tocado na ponte por Chris Thomas, aquele mesmo, o cravista que captou a garrafa!
George nunca tocou Long Long Long ao vivo, então mais uma vez usamos os Análogos! Aqui, neste LINK tem a visão de um espectador que está próximo ao alto falante da bateria então ela está fooooorte! Mas é bom, ela foi importante para a canção!
25. Revolution 1 (Group Speech Song by John Lennon)
John avisa: "Você me pede uma contribuição. Bem, você sabe, nós todos estamos fazendo o que podemos (Oh shoo-be-do-a, oh shoo-be-do-a), mas se você quer dinheiro para pessoas com ódio na cabeça, bem, tudo que posso lhe dizer é que, irmão, terá que esperar"
O mundo conhece mais o grande, enorme, magnífico hard-rock de John, que seria um Lado A em qualquer outra oportunidade, menos quando a outra canção em questão é Hey Jude. O compacto foi lançado antes do Álbum Branco e teve enorme sucesso. Só que quando ele a criou, era em ritmo mais lento, mais blues. Nesta versão, que foi considerada lenta para lançar como single, há três importantes mudanças: (i) Na letra, quando John diz que se o caso é destruição, podem considerar ele fora ("You can count me out"), ele complementa com um 'Ou não!' (IN!!!), o que acende uma chama de esperança de poderem contar com ele; e (ii) 2. No vocal, Paul e George entoam um delicioso "oh schoo-bee-doo-wa oh schoo-bee-doo-wa" e (iii) nos acompanhamentos, não tem o piano elétrico nem as 'handclaps', mas tem uma magnífica sessão de metais. Além disso, John havia concebido a canção com uma longa série adicional, de mais de 8 minutos, de sons aparentemente sem nenhuma relação com o tema, mas que ele considerava parte da Revolução! Imediatamente, viram que não caberia, mas concordaram que se tornasse outra faixa do mesmo disco, que se chamou Revolution 9!!! Aliás, seria interessante se conhecêssemos as outras, Revolution 2, Revolution 3 ... até Revolution 8, para tentar entender como seu raciocínio foi evoluindo até chegar àquela salada vanguardista de sons de Revolution 9. Brincadeira, eu sei que não foi assim!
Os Beatles, mais John que os demais, queriam abrir a boca sobre política desde sempre, mas eram refreados por seu empresário Brian Epstein, que não queria confusão.... mesmo assim não conseguiu evitar os transtornos com a declaração do astro sobre a popularidade de Jesus Cristo. John queria muito, por exemplo, falar contra qualquer guerra, especificamente, contra a Guerra do Vietnã, mas nunca pôde, ou quando falou, o fez disfarçadamente! Depois que Brian morreu, a coisa ficou liberada! E Revolution foi a primeira canção a tratar de política, era uma mensagem contra o 'establishment', mas mesmo assim com muitas ressalvas. Em resumo, "Se é pra fazer com violência não contem comigo". Ele fez a canção na estrutura verso-refrão-'treis'-'veis'. Todos os versos têm igual configuração:
Linha 1: uma proposta deles
Linha 2: Well, you know
Linha 3: um consideração de John
Linha 4: outra proposta deles
Linha 5: Well, you know
Linha 6: uma outra consideração de John
Linha 7: um alerta de John
Linha 8: uma ação resposta por John
Todas as propostas do povo rimam com "Revolution". Os Versos 2 e 3 têm um complemento delicioso após as considerações de John, os famosos "oh schoo-bee-doo-wa oh schoo-bee-doo-wa" que não sobreviveram na versão mais pesada. Elas aparecem nos refrões também. As Linha 7 e 8 de cada verso são como que introdutórias para o Refrão "Don't you know it's gonna be (em falsete) Oh schoo-bee-doo-wa Allright? Oh schoo-bee-doo-wa", também três vezes. Aqui, é John lembrando-se de um mantra do Maharishi, que aprendeu em seu retiro na Índia!
Revolution (ainda sem o 1 qualificador) foi a primeira canção a ser gravada na maratona para o Álbum Branco, aliás, já contei em outra resenha mas não custa repetir, criou-se o hábito de ser sempre uma canção de John a abrir os trabalhos de um álbum, desde 1965. Então, I Am The Walrus abriu Magical Mistery Tour, A Day In The Life abriu Sgt. Pepper's, Tomorrow Never Knows abriu Revolver e Run For Your Life em Rubber Soul. Veja bem que abriram as gravações, mas coincidentemente, cada uma foi a última canção colocada em suas respectivas bolachas (1 EP e 3 LPs). Neste caso do Álbum Branco, a segunda rotina não se repetiu, mas foi por uma! A última canção, muito apropriadamente, foi Good Night, uma linda canção de ninar de John para seu filho Julian, que Ringo materializou, com espetacular arranjo de cordas. Antes daquele 30 de maio inaugural, a canção foi apresentada aos demais dois dias antes, e foi materializada num dos já famosos Esher tapes, na casa de George. John ao violão e seus vocais dobrados, Paul e George em já ótimas harmonizações, Ringo no pandeiro e todos nas palmas. Ouçam que legal, aqui, neste LINK. Notem que o Verso 3, aquele do Chairman Mao, ainda não existia. No Dia D, ou melhor, 30 de maio, os Beatles fizeram 18 takes da canção, não sem tensão. Paul estava meio acabrunhado, provavelmente com aquela rotina de sempre ser uma canção de John a abrir as gravações, e John também não estava bem, chegou a ser ríspido com Geoff Emmerick, por conta de um som sujo que ela queria extrair do seu violão, e pressionou o técnico para fazê-lo. George não estava, Paul ficou ao piano e Ringo na bateria. Aquele foi o primeiro (de muitos) dia em que John trouxe Yoko, apresentava-a para todos, e tal, e ela chegou chegando, trouxe uns sons eletrônicos gravados em fita, pegou do banco de instrumentos uma tábua de lavar roupa, e a 'tocou', e muito do que ela fez, ficou na versão final. O último take do dia foi estendido em mais de 5 minutos do qual algo se aproveitou para Revolution 9, felizmente os primeiros quase 5 minutos estavam ótimos para overdubs, que vieram, naquele mesmo dia (já era madrugada) à noite.
O primeiro acréscimo foi o vocal de John, com várias tentativas, inclusive alterando letras, especialmente o "count me out" que virava "in" e de volta a "out", até que ele se decidiu por "out in". Na mesma tomada, ele e Yoko acrescentaram aqueles gemidos ao final. E vieram os ótimos shoobedoa's de John, Paul e George. E Paul e George duelando ("Don't you know it's gonna be") com John ("All right"). E Paul afinal introduziu seu ótimo baixo. Aliás, pra não ficar atrás, Paul também trouxe sua nova namorada Francie Schwartz!! No terceiro dia, mais vocal de John (em que inclusive ele tentou cantar deitado no chão do estúdio, sempre buscando um som diferente) e, finalmente, a ótima guitarra distorcida de George, na introdução e outras partes da gravação, especial participação. Os metais chegaram dois dias adiante, com saxofones, trompetes e trombones, gravando pautas criadas por George Martin!
A introdução tem o violão de John e a guitarra de George e a tábua de Yoko. Ringo, na batida de blues na caixa, tem pouco destaque, e o baixo de Paul é tradicional até chegar nas frases finais dos versos, onde se floreia um pouco. Os saxofones e trompetes aparecem no alerta do Verso 1, e repetem a dose nos Versos 2 e 3, e estão nos refrões em triplas duelando com a guitarra distorcida de George (note um em cada lado de sua cabeça, ao ouvir no fone de ouvido). Os trombones seguem em triplas, numa mesma nota, acompanhando os Verso 2 e 3 em suas primeiras 6 linhas. Fundamentais são os metais para a sonoridade da canção. Notáveis, não se pode esquecer de notar, as viradas do violão de John introduzindo cada verso (e que já estavam presentes em Esher), e os glissandos de George na guitarra dos refrões. O refrão final se estende em fade-out com John no All right repetidamente, e juntando-se a Yoko nos gemidos, e esta última no reco-reco da tábua de lavar roupa.
Ao vivo? Revolution 1, não. O que tem é Revolution, inclusive com um video-clipe, mas na versão mais rápida e áspera do compacto, que foi gravada d pois e lançada antes. Agora, felizmente, sempre temos The Analogues para nos redimir. Aqui, neste LINK.
26. Honey Pie (Love Girl Song by Paul McCartney)
Paul pede: "Ah, Docinho, você está me deixando maluco. Estou apaixonado, mas tenho preguiça, então, por favor, volte para casa"
Honey Pie, expressão, faz parte do conjunto de termos carinhosos com que enamorados se referem mutuamente, mormente, do homem para a mulher, junto de Honey, Love, Sugar, Sweetie, Babe, Dear, Darling, etc.
Honey Pie, canção, faz parte do conjunto de canções fofas que Paul McCartney fez durante seu tempo nos Beatles. Confira: When I'm Sixty Four, Your Mother Should Know, Maxwell's Silver Hammer, vaudevilles, All Together Now, canção infantil, além de Yellow Submarine e Ob-la-dia Ob-la-da, embora não sejam propriamente infantis, fazem muito sucesso com as crianças, e são porta de entrada para futuros fãs quando crescerem. Paul é demais! Vaudeville é aquele estilo dos salões do início do Século XX nos Estados Unidos, e conhecido como Music Hall na Inglaterra. É muito delicioso ouvi-las, com seus clarinetes. E Paul declara sua predileção pelo estilo na própria letra, quando diz "I like this kind of, hot kind of music. Play it to me, play it to me!" e eu corroboro, ADORO esse tipo de música, toque pra mim, toque pra mim, Paul!!
Desta vez, é o lamento de um pobre enamorado que vê sua amada (North of England way - entenda-se Liverpool) partir para o outro lado do Atlântico, aliás chegando ao Pacífico, atingindo a fama (Now she's hit the big time) nas telonas (You became a legend of the Silver Screen) de Hollywood. Quase isso tudo é mostrado numa introdução falada-cantada, que não mais é repetida, como fizeram antes em Here There and Everywhere e Do You Want To Know A Secret. Ela abre espaço para três versos (mais um repetido) e duas pontes, todas com histórias diferentes (obedecendo ao Padrão Beatles de Composição), em que o coitado apela para seu estado depauperado, "my position is tragic!" e "making me crazy" e "driving me frantic", pede que ela "please come home" e "to be where you belong", implorando aos berros "Come back to me, honey pie".
Paul apresentou a canção a seus amigos nas sessões de Esher e lá fizeram uma demo muito divertida, todos participaram, a letra estava bem incompleta ainda, vejam, aqui, neste LINK, mas somente mais de 4 meses depois, ela entrou em estúdio, e não foi na EMI, mas nos Trident Studios, que os Beatles haviam usado algumas vezes. Foram horas de ensaio, até chegarem no único take do dia, já de madrugada, e a base era Paul ao piano, George no baixo (!), John na guitarra solo (!!) e Ringo na Bateria. Dia seguinte, vocal de Paul, Ringo acrescentou mais pratos e John, mais um solo de guitarra elogiado por George. Mais duas sessões foram necessárias. A terceira foi para a espetacular contribuição de metais (5 saxofones) e madeiras (2 clarinetes), típicos para o som que Paul desejava. Tão importante, que Paul e George Martin reservaram para os sopros 3 (três) versos instrumentais. A quarta e última sessão foi apenas para Paul comandar um efeito em seu vocal, na verdade, na única fala da canção. Ele queria um som de disco velho e riscado quando se ouve o anúncio do 'locutor' Now she's hit the big time. Ficou muito legal!
Vou deixar aqui, neste LINK, o instrumental completo, para ouvir o ótimo piano de Paul, a guitarra de John, a 'cozinha' de George e Paul mas, especialmente os 7 instrumentistas clássicos, sem deixar de ressaltar o responsável pelo arranjo, o grande Maestro George Martin!
27. Savoy Truffle (Tale Story Song by George Harrison)
George conta 'Creme de tangerina e Montelimart, um drinque de gengibre com um coração de abacaxi, uma sobremesa de café, sim, você sabe que cai bem, mas você tem que arrancar todos os dentes após a trufa de sabóia'
Não pude deixar de lembrar de Forest Gump sentado num banco de praça, e dizendo que a vida é como uma caixa de bombons, você nunca sabe que sabor vem no próximo que comer. Bem, isso não ocorria naquela caixa de bombons que o amigo amigo Eric 'Is God' Clapton comia com voracidade, um atrás do outro, na casa dele, e que o levou a escrever Savoy Truffle em sua homenagem. O amigo guitarrista estava em sério tratamento dentário naquele momento. E como um alerta pra cuidar dos dentes no "But you'll have to have them all pulled out after the Savoy truffle"), em ótimos falsetes de George, harmonizados por Paul. Esta frase é a chave da canção, ela fecha cada um dos versos da canção, inclusive o instrumental, e ainda é repetido no final, portanto ouve-se 6 (seis) vezes o conselho que doces fazem mal aos dentes, é até profilático! Naquela década, os homens ingleses não primavam por cuidar de suas arcadas, vide David Bowie 'eu era assim e fiquei assim'. Good News era uma tradicional caixa de bombons Mackintosh, cuja imagem eu recuperei abaixo pra ilustrar. Note os sabores todos da letra dos dois versos ali, com seus formatos, de forma que não haveria surpresas, e inclusive como perdeu-se a oportunidade de ter Brazil numa letra Beatle, se George tivesse escolhido o sabor do canto inferior esquerdo!!
Na duas pontes, aquele doce todo esá na cabeça de George, e ele ameaça, na primeira, que se Eric abusar dos doces, "The sweet is going to fill your head, when it becomes too much, You're going to shout aloud", ou seja, você vai gritar de dor, e filosofa na segunda, dizendo que a gente é o que come (sugestão de Derek Taylor), e para rimar com "What you eat you are", ele se lembrou de Obla-di Obla-da, que ele e os demais Beatles detestaaaram, para dar uma cutucada em Paul, seu compositor!l Aliás, pensando melhor, acho que classifiquei erradamente esta canção: ela é muito mais uma Person Speech Song do que uma Tale Story Song. Enfim.... deixa assim!!
A canção foi (bem) recebida como a volta de George ao maravilhoso mundo da guitarra, após dois anos de paixão pela cítara indiana! E que volta foi essa, gente, que rock espetacular, a guitarra está ótima, sim, mas o destaque absoluto é para os metais, fazendo a gente balançar a cabeça do começo ao fim!! Não deixem de ouvir os LINKS que vou providenciar mais adiante! John não esteve presente em nenhum momento de Savoy Truffle (atitude que repetiria em Long Long Long, também de George, na semana seguinte). Na primeira sessão, após extensos ensaios com George na guitarra e também já no vocal, que foi aproveitado na versão final, Paul no seu baixo, e Ringo em sua bateria, que ele varia durante toda a canção, usando todos os recursos, finalmente um take único foi gravado. No dia seguinte em overdubs, George dobrou seu vocal em alguns pontos, Paul acrescentou backing vocal e uns gritos esparsos, Ringo, pandeiro, George tocou ótimos stacattos nas pontes, note uma guitarra distorcida tocando uma variação da melodia durante o verso instrumental, e Chris Thomas, aquele mesmo que tocara um cravo espertíssimo em Piggies, tocou órgão Hammond e piano elétrico ali na introdução e no meio, mas seu nome estará marcado mesmo na história Beatle como o arranjador dos metais que conseguiu fazer algo ainda superior ao que fora feito em Got To Get You Into My Life, dois anos antes. É realmente arrebatador! Thanks, Chris!! Os 6 instrumentistas, sendo 4 sax tenor e 2 sax barítono, vieram na última sessão, seguiram as instruções de Chris e deram um show, foram aplaudidos, e tal, mas George queria mais. Na sala de controle, ele disse: "Distorce isso tudo"! E assim foi feito. Conta-se que chamaram alguns dos saxofonistas para ouvir e eles não gostaram, mas cá entre nós, ficou ótimo! Ouçam aqui neste LINK e se espantem.
Ao vivo, nem Beatles, nem George solo, apenas The Analogues fizeram o bem à humanidade, com a propriedade de sempre! Savoy Truffle em toda sua grandeza aqui, neste LINK! Note o tamanho do sax barítono.
28. Cry Baby Cry (Tale Story Song by John Lennon)
John conta: 'O rei de Marigold estava na cozinha cozinhando o café da manhã para a rainha. A rainha estava na sala de estar tocando piano para o filho do rei. Chore Baby Chore, faça sua mãe suspirar pois ela é velha o bastante para entender'
É um conto de fadas. O título, John pegou de um anúncio, que incentivava "Cry baby cry, make your mother buy" que ele trocou para um mais poético 'make your mother sigh'. Nesse quesito, ela se iguala a Good Morning Good Morning, quando ouviu um comercial de Kellogs na TV. E John seguiu, inspirado em canções que ouvia de Donovan, seu companheiro de missão à Índia, e imaginou ser um novo Lewis Carrol, seu autor preferido, que já o havia inspirado em Lucy In The Sky With Diamonds. É uma sátira da realeza! Os reinos de Marigold e Kircaldy saíram de lembranças de sua infância. Musicalmente, além dos instrumentos usuais, é notável o harmonium, que parece um acordeão, tocado pelo Maestro George Martin, sempre presente para incrementar as canções! Ao final da canção, no disco, aparece a voz de Paul cantando 'Can you take me back?', que ele havia gravado na sessão de outra canção (I Will), mas que coube bem ali, com o pedido para levar de volta, a um passado, da época dos contos de fada!
Cry Baby Cry foi mostrada aos demais em Esher, em 28 de maio, e a primeira gravação foi uma demo solo, com John ao violão, e apenas um outro Beatle não determinado no pandeiro. As letras finais já estavam todas lá. E elas compunham quatro versos, um com letras diferentes dos outros, todos entremeados pelo refrão "Cry baby cry, make your mother sigh. She's old enough to know better, so cry baby cry". O Reino de Marigold está nos Versos 1 e 2, com o Rei fazendo café para a Rainha e pega flores no jardim, enquanto ela pinta retratos e toca piano para o filho, que é só do Rei. No dois dois versos finais, o foco é no Ducado de Kircaldy, onde acontecem sessões espíritas ("seance"), mas os ruídos são produzidos pelas crianças brincalhonas ("children for a lark"), mas antes houve uma sessão de chá em que a Duquesa chegou atrasada, sorrindo sem jeito, e aonde o Duque nem foi pois estava preocupado com as fofocas no bar local ("Bird and Bee")! Dava um filme, né?
O primeiro dia de gravação oficial de Cry Baby Cry, 15 de julho, foi (quase) totalmente inútil. Eles ficaram 6 (seis) horas buscando uma base para a canção, e desistiram às 3 da manhã, sem estabelecer nenhuma das tentativas como um take oficial. E os inúmeros carretéis de fita produzidos foram posteriormente reutilizados, portanto (quase) apagando o conteúdo toda daquela demorada sessão, afinal, apesar de eles serem OS BEATLES, a EMI não iria ficar acumulando estoque de fitas caríssimas, sem uso. O "quase" que usei duas vezes, foi porque, 50 anos depois, para fazer a celebração de meio século do Álbum Branco, um ser inteligente foi buscar no arquivo, pelo número da fita, e encontrou no final de uma delas um resquício (18 minutos) da sessão, uma verdadeira garimpagem, chego a chamar de esforço arqueológico. Então, pôde-se perceber que algumas tentativas foram feitas com John num órgão e no vocal, George na guitarra, Paul no baixo e Ringo na bateria, e que John declarou desistir de tocar órgão pois estava muito pesado. Quem tiver a curiosidade de ouvir, deixo aqui o LINK, pra você notar uma versão mais lenta, com órgão, guitarra, e realmente, inferior ao que veio depois!
O dia seguinte foi marcante, porque antes de a sessão começar, atrasada porque os Beatles não chegavam, Geoff Emmerick declarou a George Martin que iria 'puxar o barco'! Ninguém entendeu! Quando John chegou, tentou convencer, não houve jeito. Emmerick estava abalado com os eventos da gravação de Ob-la-di Ob-la-da, também no dia anterior (ver lá em minha análise o que ocorreu) e se foi. Para somente somente voltar seis meses depois! Ufa! Então Cry Baby Cry foi produzida por Ken Scott. Com John no vilão e George no órgão, os outros em seus instrumentos oficiais, fizeram 10 takes oficiais, sendo o último destinado às reduções e aos overdubs, que foram ainda no mesmo dia, com John no piano, George Martin no harmônio, sendo que a melodia linda no refrão inicial fora cantada por Paul e substituída por Martin. No final da sessão,os outros três Beatles gravaram os sons de seção de chá que se ouvem no Verso 3. No dia seguinte, estavam todos na estreia mundial de Yellow Submarine, o filme!! Mais um dia e vieram as dobras de John no vocal dos refrões, e vieram os excelentes vocais agudos de Paul em "old enough to know better, so cry baby cry", em falsete perfeito, e variando de refrão a refrão a partir do terceiro, e finalmente chegou à canção a ótima guitarra de George! Somente dois meses depois, resolveram coloca aquele trecho adicional de Paul "Can you take me back where I came from", que fora gravado nas sessões de I Will. E com a chegada do gravador de 8 canais, acrescentaram otras cosita mais, como o piano baixo de Paul, com eco, e um pandeiro de Ringo!
Pattie, George, Ringo, Maurreen, Yoko, John, Paul, Jane
Ao vivo, com The Analogues, aqui, neste LINK. E eles fazem até o adicional de Paul ao final!!
29. Revolution 9 (Nonsense Song by John Lennon)
Ouve-se: "Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... Número 9... ''
A canção (?!) tem muito mais letra que isso, mas é só isso que a gente lembra, fica na nossa mente, como um loop eterno. E tenho certeza que John (e Yoko) não queria passar nenhuma mensagem nessa colagem de sons, loops, barulhos, gritos, sussurros, lamentos, instrumentos musicais e de percussão, tiroteio, buzinas, sons de rádio, e de TV, e de peças de teatro, tudo o que encontrou nos arquivos da EMI, ele colocou tudo junto e misturado e ao mesmo tempo agora, dezenas de fontes de sons, em mais de 8 minutos de faixa, a maior da carreira Beatle. Era John fazendo vanguarda, música concreta, chame lá o como quiser. O que não dá é usar esse espaço todo e deixar de fora as ótimas Not Guilty, de George, e What's The New Mary Jane, do próprio John, ou mesmo Child of Nature, também de John. Essa é minha opinião! Paul também não ficou nada impressionado e tentou, como tentou, demover John dessa ideia, apesar de ter sido ele Paul, bem mais antenado na vanguarda londrina em sua vida de solteiro (vide Good Morning Good Morning), que apresentou Stockhausen e John Cage ao amigo, mas decerto que não era para colocar numa gravação beatle. John até queria lançá-la como single!! Aliás, deixo aqui, como ilustração, a própria explicação do autor:
Revolution 9 was an unconscious picture of what I actually think will happen when it happens; just like a drawing of a revolution. All the thing was made with loops. I had about 30 loops going, fed them onto one basic track. I was getting classical tapes, going upstairs and chopping them up, making it backwards and things like that, to get the sound effects. One thing was an engineer’s testing voice saying, ‘This is EMI test series number nine’. I just cut up whatever he said and I’d number nine it. Nine turned out to be my birthday and my lucky number and everything. I didn’t realise it: it was just so funny the voice saying, ‘number nine’; it was like a joke, bringing number nine into it all the time, that’s all it was.
A voz do 'Number 9' é de um engenheiro da EMI fazendo teste de som, que John cortou e repetiu à exaustão. A razão do 9, é porque é importante na vida de John, nasceu num dia 9, morava num n° 9, de uma rua (Newcastle), num bairro (Wavertree), numa cidade (Liverpool) com nomes de 9 letras; o álbum que gravavam era o número 9 na carreira deles em UK. John foi um Beatle durante 9 anos (de agosto de 1960, a criação do nome da banda a abril de 1970, o fim oficial da banda). Quer mais? O primeiro show no Cavern Club foi num dia 9 (fevereiro de 1961), Brian Epstein se encontrou com os Beatles, num dia 9 (novembro de 1961), o contrato com a EMI foi confirmado num dia 9 (maio de 1962), os Beatles conquistaram a América num dia 9 (fevereiro de 1964, Ed Sullivan Show), e John conheceu Yoko num dia 9 (novembro de 1966). Aliás, seu sobrenome tinha 6 letras, mas quando adotou, oficialmente, o sobrenome de Yoko, em 1960 e 9 (hehe), ficou Ono Lennon, que soma 9 letras. A coisa continuou no mundo pós-Beatles. Na carreira solo, ele faria uma linda canção #9 Dream, isso foi voluntário, mas continuavam as ocorrências, por exemplo, uma de nascimento, outra de morte: seu segundo filho Sean, com Yoko, nasceu num dia 9 (de outubro de 1975, o mesmo de seu 35° aniversário), e John foi assassinado às 22:30 horas de um dia 8, em Manhattan, New York, então naquele momento, em Liverpool, onde nasceu, já era um dia ... 9! Se quiser mais coincidências, outros nomes ligados a John tinham 9 letras: Manhattan, The Dakota (o edifício onde morreu), McCartney, assim como Sutcliffe, seu melhor amigo, morto antes do sucesso. Sabe o que tudo isso quer dizer? NADA, mas só sei que foi assim! E os Beatles embarcaram na onda, mesmo depois da passagem de John, e marcaram o aguardado lançamento dos remasters da carreira deles para o dia 9 de setembro de 2009, ou seja, 09/09/09!
A origem foi uma canção que ele fez para o Álbum Branco, chamada Revolution, que ele terminava com uma Revolução de Sons, uma colagem que durava 6 minutos. O grupo resolveu separar as duas partes, acelerou a primeira para lançá-la em compacto, com Hey Jude, mudaram o nome da original para Revolution 1, e John estendeu a parte final para 8 minutos e nomeou-a Revolution 9, e as duas estão no LP, aliás, no mesmo e último lado do último LP. John tem frases faladas, especialmente o Allriiight Allriiight, George tem umas falas, e também Yoko, ficou notável o 'You become naked!'
Claro que não dá pra analisar estrutura, letras, rimas, não há versos ou pontes, mas até dá pra considerar os Number 9's como refrões! E dá pra analisar sessões, mas que não se espere nada como guitarras, pianos e baterias. Revolution 9 foi atacada em 4 sessões (não, não é um número divisor de 9), a primeira delas, num 6 de junho, onde Ringo e George invadiram a sala de tapes e escolheram aleatoriamente uma fita, de onde John ouviu e se apaixonou pelo Number 9 e levou para a 'canção'. Nos dias 10 e 11, mais tapes foram coletados e trabalhados por John e Yoko, pois Ringo e George estavam nos EUA, e Paul estava presente, neste último dia, mas dedicado à sua Blackbird. No dia 20, George estava de volta, gravou algumas falas, mas o grande astro foi John, em um dia jamais visto em Abbey Road. Todos os estúdios da EMI estavam sob o comando do Beatle. Dez gravadores com fitas carregadas e um técnico posicionado com um lápis em frente a cada um (sim, lembram-se do lápis para enrolar fitas cassette?), que o operavam sob o comando de John, sentado em frente à mesa de mixagem, escolhendo o que ele queria que ficasse gravado. Horas e mais horas nisso, e as horas avançando na madrugada, para não muita satisfação dos técnicos, mas John era um Beatle!!
Podemos listar aqui alguns dos sons ouvidos em Revolution 9, graças a Mark Lewisohn, que foi fundo e foi aos tapes originais para saber os detalhes: trechos de A Day In The Life repetidos em sequência e tape loops de Tomorrow Never Knows tocados em reverso. Trechos de sinfonias de Beethoven, Schumann, Lizst, canções arábicas. Barulho de torcida, vidro quebrado, pratos de bateria, coros com violinos tocando em reverso, tiros, buzina, crianças, risadas dementes, uma verdadeira salada. E também John falando frases desconexas, em princípio, mas interessantes de se ouvir em sua voz alterada, como: "personality complex", 'onion soup", "economically viable", "industrial output,'", "financial imbalance", "the Watusi", "the twist", "Take this brother, may it serve you well.' E George em "Eldorado" e "There ain't no rule for the company freaks!". Além da já mencionada "You become naked!", de Yoko.
Ao vivo? Por incrível que pareça, sim!! The Analogues? Sim, claro, mas como não poderiam jamais fazer ao vivo, eles criaram um vídeo de suporte ao som. Ficou genial! Acho que conseguiram de vez em quando pegar o vídeo original do som. E, quem fala dubla os Numbernines são os membros da banda!! Aqui, nest LINK!!
Pra finalizar, deixo um desafio. Qual percentual de fãs dos Beatles, ao serem instados com a questão. 'Que música dos Beatles você quer ouvir?' responderia Revolution 9?
30. Good Night (Person Speech Song by John Lennon)
Ringo diz 'Hora de dizer boa noite, durma bem, sonhe doces sonhos pra mim, sonhe doces sonhos pra você!'
Imagine que você vem ouvindo o Álbum Branco e vai ouvir a última faixa, após ter ouvido Back In The USSR, Happiness Is a Warm Gun, Everybody's Got Something To Hyde Except (For) Me And My Monkey, e Yer Blues, e acabou de ouvir Revolution 9, e sabe que vem aí mais uma Lennon/McCartney, e ouve uma orquestra abrir lindamente e ouve a inconfundível voz de Ringo Starr cantando "Now it's time to say good night, Good night Sleep tight! Now the sun turns out his light, Good night Sleep tight! Dream sweet dreams for me! Dream sweet dreams for you." Rola uma lágrima, e você imagina: "Mais uma linda balada de Paul McCartney! Ele é demais!"... Certo?
Errrrrooooouuuuu!
Vamos aos esclarecimentos!
A canção é de John Lennon colocando o filho dele, Julian, então com 5 anos, para dormir, numa liiinda canção de ninar. Caramba, John, VOCÊ é que é demais!! O momento, entretanto, em que escreveu a canção, não era aquele mar de rosas nas relações familiares. Era junho de 1968, e ele estava virtualmente separado de Cynthia, a mãe de Julian. Paul inclusive estava em processo de criação de Hey Jude, como consolo para Julian, a quem chamava de Jude. John devia estar com remorsos por deixar o menino. Interessante é que Julian somente soube que a canção era de John para ele, apenas aos 30 anos, portanto, 25 anos depois de sua composição, e órfão já há 13 anos, no meio de uma entrevista! E Julian chorou! Enfim, coisas de John Lennon... A letra ressaltada é a do primeiro conjunto verso-refrão da canção, em seguida vem mais um verso, "Close your eyes and I'll close mine .... Now the moon begins to shine...", e mais um refrão igual, depois vem uma sessão instrumental, e finalmente se repete o primeiro conjunto verso-refrão ao final (com uma pequena confusão, que depois revelo). Esses instrumentos são de orquestra, tocados por 26 músicos contratados, que acompanham a voz de Ringo desde o início, em um magnífico arranjo de cordas criado por George Martin, que trouxe também um coral de 8 vozes para ressaltar algumas partes do vocal.
Ao terminar sua composição, John decidiu que não a gravaria e a ensinaria a Ringo. E o fez na primeira sessão, em 28 de junho. Cantou a canção algumas vezes acompanhado ao violão, sob o olhar atento de Ringo, esse vocal foi registrado em fita, depois entregou a letra ao baterista que começou a praticá-la ali mesmo, mas ao final, LEVOU A FITA PRA CASA para praticar direito, e NUNCA MAIS ninguém ouviu a voz de John Lennon cantando sua linda canção. Chegou a rolar uma lágrima no meu rosto quando eu soube disso, e mais ainda quando vi a declaração de Paul, que estava presente naquele momento de treinamento, e disse que a voz de John estava perfeita, carinhosa, melosa, terna, como deve ser a voz de um pai cantando uma canção de ninar ao filho. Uma verdadeira lástima! Bem, ainda naquele dia, John gravou 5 takes de sua base na guitarra, usando o mesmo dedilhado que usou em Julia e Dear Prudence, depois dobrou, e depois triplicou, para dar mais volume.
Três dias de prática em casa foram suficientes para Ringo captar bem o vocal, e no dia 2 de julho, todos ao estúdio, colocam o Take 5 pra tocar, e fizeram mais 10 takes, com Ringo no vocal principal e John, Paul e George fizeram backing vocals, graves, note os "Dream"s repetidos ao longo dos refrões. Achei muito legal, e coloco neste LINK o Take 10, considerado o melhor! Próxima data, 22 de julho, já foi com a orquestra no Estúdio 3, aquele enorme, só que antes de todos chegarem, Ringo fez mais 7 takes, desta vez acompanhado ao piano de George Martin e um leve backing de Paul ao fundo, como guia para Ringo, e a novidade de Ringo começar cantando com o refrão (caso queiram, eis o LINK). A orquestra tinha as cordas de 12 violinos, 3 violas, 3 violoncelos, contrabaixo e harpa, e os sopros de 3 flautas, clarinete e trompa, mais um vibrafone, e tinha um arranjo de Martin que ia crescendo ao longo da canção e Ringo cantou junto com eles mais 10 takes. Depois, vieram os cantores do coral de 8 vozes(4 masculinas e quatro femininas), e 4 deles já haviam tido a honra de gravar com os Beatles, em I Am The Walrus. Depois que foram embora, super profissionais, resolveram tudo rapidamente, Ringo voltou a gravar seu vocal!
Agora, uma nota sobre os vocais. Notem a sensacional soprano na introdução sustentando uma nota lá no alto. No primeiro verso, Ringo está só, mas já no refrão, eles entram respondendo com "dream...sweet...dream", movimento que repetem nos outros dois refrões. No Verso 2, eles cantam a melodia junto com Ringo, e na sessão instrumental, apenas Ringo murmura. Eles voltam no Verso 3, também na melodia, só que Ringo se engana e canta a primeira linha do Verso 2, "Close your eyes and I'll close mine", quando deveria ter repetido o Verso 1 "Now it's time to say good night" que é cantada pelo coral. E foi isso que foi para o disco! Eles poderiam ter dado mais umazinha para corrigir? Decerto que sim! Só que ficou ótimooo! A métrica era idêntica. E, afinal, um erro de um Beatle vale mais que mil acertos de pobres mortais! Ringo estava perfeito, terno, como um pai cantando a um filho, e ele tinha dois, decerto se imaginou cantando pra eles. Ao final da gravação, Ringo ainda nos brinda com sussurros “Good night, everybody...everybody, everywhere, good night.” desejando, nos últimos segundos de uma maratona de 30 canções com que nos presentearam no Álbum Branco, um maravilhoso Boa Noite, a todos nós...todos nós, em todos os lugares do planeta!!! Como se sussurrasse a nós, filhos da arte deles, e que estamos órfãos há 51 anos, completados hoje! Chorei de novo, quando ouvi, agora. Boa Noite!!
Bom, gente, eu venho mostrando em muitas das análises até aqui, momentos ao vivo dos The Analogues, e não poderia deixar de finalizar esta maratona de análises com o Gran Finale do show, em que reproduziram, em 1 hora e 40 minutos, sem sair de cima, as 30 canções do Álbum Branco, e, claro, finalizaram com Good Night. Resolvi colocar o LINK do show, vocês avancem para 1:35 e se emocionem. Colocaram no palco o número possível de instrumentos de orquestra, inclusive uma harpa, e os demais aparecem nos telões, bem como o coral feminino. O coral masculino foi desempenhado por 4 dos 5 membros da banda, que são todos vocalistas excelentes, e o quinto vocalista ficou no solo ao microfone, como no papel de Ringo Starr. E a voz até se pareceu com a de nosso baterista. Fiquem até o final, notem os closes que deram nos instrumentos, e chorem, como eu chorei, quando ele dá o Boa Noite final, igualzinho ao Ringo! É demais!! O respeito pela obra dos Beatles é patente em cada movimento dos The Analogues.
Lançamento, Recepção e Legado
Atenção, canções com títulos em vermelho
são links que levam a análises sobre elas.
Bem, o quadro branco acima tem uma razão de ser.
THE BEATLES
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