-

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

The Beatles' 1964 - O 1º EP de inéditas

Neste relato do ano de 1964, a primeira parte contou o que ocorreu até a partida para conquistar América, neste LINK, 

A 2ª Parte contou sobre a Conquista da América e a envoltória do lançamento do compacto Can't Buy Me Love / You Can't Do That, neste LINK.

A 3ª Parte iria até o lançamento do EP Long Tall Sally, que veio com mais uma original dos Beatles, mas estava tão grande (veja neste LINK), que parei antes de destrinchar as 4 canções do EP, o que faço a partir de agora.

O EP (conhecido no Brasil como Campacto Duplo) tinha as canções I Call Your Name, original Lennon/McCartney, e 3 Covers: Long Tall Sally, de Little Richard, Slow Down, de Larry Williams e Matchbox, de Carl Perkins. Elas foram gravadas em meio às sessões de gravação de A Hard Day's Night, o Lado A em 1º de março, ainda antes das filmagens, e o Lado B em 1º de junho, já na volta das férias tropicais dos 4 Beatles! Foram lançadas duas semanas antes do LP. Foi em 19 de junho, enquanto os Beatles, já com Ringo de volta da situação médica, estava no 2º dia de shows em Sidney, Capital de Austrália! Quando eles voltaram da excursão, o EP já liderava a parada inglesa!

Vamos a elas!! Conforme código numérico já combinado entre nós, elas são as canções Nº 35, 36, 37 e 38 e serão apresentadas nessa ordem.


35. Long Tall Sally (by Little Richard)

Paul grita:
I saw Uncle John with long tall Sally
He saw Aunt Mary comin' and he ducked back in the alley
Oh, baby, yeah now baby
Woo baby, some fun tonight
... explicando rapidinho, Tio John, safadinho, estava de trique trique na rua com a alta Sally, quando viu Tia Mary e se escondeu num beco. Mais adiante, dá-se a entender que Sally é um travesti. "Ela tem tudo de que o tio John precisa", ai ai. 
Paul é o vocalista, e ele faz aí uma das melhores gravações de sua vida! Vocal gritado, um tom acima do que cantou seu autor Little Richard. E a banda contribuiu tão bem, que foi necessário APENAS UM TAKE, ao efeito.  George Harrison fez dois solos perfeitos. Até George Martin entrou na onda, lascando seu piano com perfeição. Uma vez só! Quando acabou, todos se entreolharam espantados com a própria performance. Não tocaram mais nenhuma vez, não tem take alternativo, não fizeram nenhum overdub, nenhum ajuste ou edição foi necessário. Era a resposta de Paul para o show de John em Twist and Shout um ano antes, que também fez a proeza.
 
Esse show foi dado num hoje histórico 1º de março de 1964. Não foi à toa, não foi difícil escolher qual seria a primeira cover a se candidatar a entrar no mais novo álbum da então mais famosa banda do mundo, posto que eles haviam acabado de conquistar a América. Long Tall Sally era uma favorita de John e Paul, aliás, desde seu primeiro encontro em 6 de julho de 1957 no pátio de uma igreja em Liverpool. Paul sabia os acordes e a letra (e cantá-la, o que não era fácil) e impressionou John com sua habilidade na guitarra. Tocaram-na ainda como Quarrymen, depois como Silver Beatles, e seguiram tocando-a, já com o nome definitivo da banda, ainda antes da chegada de Ringo, no Cavern Club e em noitadas compridas nas casas noturnas de Hamburgo na Alemanha. E ela estava em quase todos os shows já depois da fama, e também com Ringo. Ela normalmente fechava os shows, e levaram-na em excursões pelo mundo, em todos os 4 anos que durou sua carreira ao vivo da banda, interromperam sua presença brevemente quando chegou I'm Down, de Paul, que passou a fechar os shows, mas retornaram com ela aqui e ali, inclusive no último show em San Francisco, em agosto de 1966. Ela é a primeira canção do Lado A do compacto duplo. Deixo aqui este LINK, na 1º vez que tocaram a canção no Estados Unidos, em Washington, para terem uma ideia.


36. I Call Your Name (Retun Miss Song by John Lennon)

John chora 'Eu chamo o seu nome, mas você não está lá. Será que eu estou sendo injusto?
Ah, eu não consigo dormir à noite desde que você se foi. Eu nunca choro à noite, assim não dá mais'

Essa canção foi feita por John em 1957, e provavelmente é a primeira composta por ele.  Ela foi terminada em 1963 (somente aí veio a ponte) para ser dada para o grupo Billy J Kramer and The Dakotas gravarem. Eles o fizeram e gravaram uma outra de Lennon/McCartney chamada Bad To Me, e lançaram as duas em compacto de grande sucesso, que chegou ao Nº1 das paradas. Só que cometeram um pecado: lançaram a canção de John no Lado B. John, então, resolveu promovê-la com sua gravação pelos Beatles! E ela sem dúvida merecia fazer parte do catálogo beatle! É ótima!! Eu adoro!! I Call Your Name chegou a ser sugerida para a trilha sonora de A Hard Day's Night, em 1964 quando ainda não havia surgido a canção título. Uma vez composta a nova canção, I Call Your Name acabou relegada e não entrou nem na trilha do filme (as 7 canções do Lado A) e nem no Lado B do próprio álbum de mesmo nome. Uma pena, porque caberia perfeitamente, e completaria as 14 canções que foi a regra dos primeiros álbuns dos Beatles de 1963 a 1966. A Hard Day's Night foi exceção à regra, com 13. E poderia muito bem ser cantada por Ringo, que ficou sem vocal no LP, e ele provou isso ao cantá-la em sua carreira solo. Bem, a canção não poderia ser abandonada e acabou sendo lançada num EP (Extended Play), ou compacto duplo, com duas canções em cada lado da bolachinha de vinil, que foi nomeado Long Tall Sally EP, que tinha, além da canção título, também Slow Down e Matchbox, das quais falo em post separado. 
 
O assunto da canção merece uma discussão à parte. Quem lê assim de pronto, como eu, define como o nome como de uma garota que está dando um gelo para o autor. Assim fiz eu e a classifiquei como Miss Song, Return Class, ou seja, uma canção de saudade em que o abandonado quer o retorno à condição antiga. Só que ele poderia estar se dirigindo a uma de duas figuras importantes de sua vida: sua mãe Julia, que o deixou para ser criado com a irmã,  mas estava com ele à época e morreu atropelada em 58, uma verdadeira tragédia. Ou seu pai Fred que o abandonou logo cedo, depois voltou para pegá-lo, mas John preferiu ficar com a mãe.,.. e talvez venha daí a  parte em que pergunta se foi injusto... São traumas da vida de John que ele voltou a tratar em canções de 1968 e 1969, especialmente Mother, das mais pungentes canções da história da música. Só que John nunca disse, nem para seu parceiro Paul, quem era o alvo de seu lamento, então, sigo com minha interpretação. Em tendo percebido essa outra conexão, eu a teria classificado como Self Song, ou ainda, Speech Song (para uma pessoa).... mas deixa como está. 
 
A gravação foi feita em 1º de março, o último dia antes de começarem as filmagens de A Hard Day's Night, e ela dormiu aquela noite como parte da trilha sonora. Foram 7 takes, com todos cantando e tocando ao vivo, houve variações na introdução com relação ao que havia sido lançado um ano antes. Em 1º de junho veio um overdub com um instrumento fundamental da canção, e quem o trouxe foi Ringo Starr: o cowbell. Adoro aquele som! E ele está lá na canção toda. Ele havia utilizado o simpática percussão cinco dias antes na gravação de You Can't Do That, e voltaria a usá-la na canção título do filme, e depois em I Need You do filme HELP! em 1965 e em outras 4 canções da carreira! Gosto tanto que é a imagem dele que eu uso para ilustrar o post! Eu tenho até mesmo a tara de contar quantas vezes ele é acionado! Aqui, foram 201 vezes! Mas por que não é um múltiplo de 4, como se esperaria, afinal ele é acionado a cada tempo dos compassos, que são de 4 tempos? É que, quando vai começar o verso instrumental, Ringo bate apenas uma vez no 1º compasso e para, voltando apenas quando volta a ponte. Aliás, estou falando em verso pra lá, ponte pra cá, e o leitor pode não estar identificando. 
 
Vamos lá! Os versos de I Call Your Name são provavelmente os mais curtos da carreira dos Beatles, apenas duas frases cada um:
Verso 1: 
I call your name, but you're not there
Was I to blame, for being unfair?
Verso 2: 
Oh I can't sleep at night since you've been gone
I never weep at night, I can't go on 
 
A Ponte é mais generosa, com quatro frases e ainda apresenta uma guitarra em gangorra fenomenal com 8 puxadas por compasso. O amigo beatlemaníaco notará uma semelhança desse riff com Hold Me Tight, que foi gravada 6 meses antes: 
Don't you know I can't take it?
I don't know who can
I'm not going to make it
I'm not that kind of man

Depois da ponte, vem um verso, com letra um pouco diferente e, em seguida, um verso sem palavras, apenas instrumental e magnífico, porque introduz um ritmo novo para os Beatles, um ska, ou reggae, defina como quiser. Talvez por causa dessa mudança foi que Ringo desistiu de pulsar o cowbell nesse setor! Depois dele, vem mais uma vez a ponte e um verso final, que termina com o título da canção repetido várias vezes em fade-out. 

I Call Your Name nunca fez parte de shows ao vivo, mas os Beatles a tocaram ao vivo na BBC, ouçam neste LINK, claro que sem o cowbell. Notem o riff da ponte um pouco modificado e também que John erra a letra do verso final. Mas é sensacional!

Bem, a ligação de Ringo com a canção, com sua bateria precisa, o desafio de fazer um novo ritmo no verso instrumental, e a decisão pelo cowbell, foi muito forte, tão forte foi que ele veio nos salvar, em sua carreira solo, com uma performance da mesma, tendo como companheiros Jeff Lynne, Joe Walsh e Tom Petty nas guitarras. Como Ringo está na bateria, um terceiro teria que se encarregar do cowbell, então veja um sujeito, um outro baterista famoso, Jim Keltner, ali atrás, encarregado do instrumento! Valeu, Ringo!!! Vejam e deliciem-se aqui, neste LINK! 

37. Slow Down (by Larry Williams)

John implora:
Well, come on pretty baby, won't you walk with me?
Come on, pretty baby, won't you talk with me?
Come on pretty baby, give me one more chance.
Try to save our romance!
Slow down, baby, now you're movin' way too fast.
You gotta gimme little lovin', gimme little lovin'
  
 
Ow! if you want our love to last
... nos outros dois versos, Larry, na voz de John, dá ainda mais argumentos para a garota dar mais uma chance pra ele
Pois é, John é o vocalista, e entrega um magnífico desempenho vocal, es-pe-ci-al-men-te no 3º verso, ele faz aí uma das melhores gravações de sua vida! Sua voz rouca se encaixou como uma luva no clima desse magnífico rock'n roll americano. São 5 vezes um 12-bar-blues duplo, pode contar, você vai ver que vai contar até 24 em cada um. O primeiro deles é instrumental, com piano e floreios de guitarra, depois dois versos são cantados (com direto a um sensacional "Brrrrr, if you wan your love to last"), e vem mais um verso instrumental, com solo de guitarra de George e, finalmente, o verso matador de John, não deixem de ouvir. Isso foi conseguido, não em um, mas 3 takes, dedicados à base, sem a voz de John, só com os instrumentos tradicionais.  Depois, vieram o piano de George Martin e o vocal inicial de John, e depois seu vocal dobrado, onde ele erra algumas vezes a letra, mas com direito a uma harmonização dele com ele mesmo no último 'slow down' da letra, percebam. vale a pena vale a pena, neste LINK!! Era 1º de junho. Slow Down fazia parte do set list do Cavern Club e de Hamburgo, mas não viu a luz do palco na era dos shows do Beatles, com exceção de uma participação num programa da BBC.

 38. Matchbox (by Carl Perkins)

Ringo se resigna:.
  1. I ain't got no matches, but I sure, Got a long way to go
  2. I'll never be happy, cause everything I've ever did was wrong  
  3. I got news for you, baby, Leave me here in misery 
  4. And when your big dog gets here. Watch how your puppy dog runs

 A numeração corresponde à finalização de cada um dos versos diferentes da canção, naquela estrutura comum dos lamentos do blues, uma frase, depois ela é repetida, e depois vem a conclusão. O 1º verso é repetido na finalização da canção.

A letra, de autocomiseração, "ó vida, ó azar!", é típica das preferências de Ringo, que adorava esse tipo de declaração, de dar essa conotação de sad and lonely poor boy que viria em várias de suas outras 10 participações como vocalista na carreira dos Beatles, duas delas com autor da canção. E também seria a physique de role de seu papel como ator Beatle, em 3 dos 5 filmes da banda, abrindo com a sensacional cena de A Hard Day's Night, que é  acompanhada por uma This Boy instrumental, depois sendo O CARA que é perseguido por uma seita maluca em HELP!, e mesmo na animação Yellow Submarine, sendo O CARA que aperta o botão errado e é ejetado da nave que viajava por mares psicodélicos. Grande Ringão! 
 
A sessão de gravação ocorreu no mesmo 1º de junho de Slow Down, acima descrita, e Matchbox foi a primeira gravada. E foram 5 takes, dos quais 3 completos, e com tudo dentro, todos tocando, inclusive George Martin ao piano, e Ringo cantando, em sua bateria. O curioso é que foi John quem fez o solo na guitarra, entre o 3º e o 4º versos. Posteriormente, Ringo dobrou seu vocal, depois triplicou seu vocal, o que dá pra ser notado explicitamente em algumas ocorrências do "Weeeell" no começo de alguns dos versos, que se ouve 3 vezes claramente. Uma figura ilustre estava nos estúdios, o próprio autor Carl Perkins, então em excursão pela Inglaterra, que foi convidado para testemunhar a primeira de 3 composições que ele autorizou, com muita satisfação, que os Beatles regravassem, as outras sendo Honey Don't, tambem com Ringo e Everybody Is Trying To Be My Baby, com George, outro admirador do roqueiro americano. 
 
Nos EUA, as duas canções do Lado B do EP foram lançadas em compacto simples, com grande sucesso, tendo inclusive a de Ringo alcançado melhor posição que a de John nas paradas americanas. Ringo era o mais popular dos Beatles naqueles tempos, terra de Tio Sam, sendo inclusive lançado para Presidente dos EUA! Hehehe!


 


2 comentários:

  1. Sempre aprendendo. Essa do Ringo mais popular dos Beatles na Terra do Tio Sam até parece piada.

    ResponderExcluir
  2. Eu sabia que Ringo era o mais popular. Sempre disseram isso desde os velhos tempos. Não me parece piada. Acho super natural ele ser tão popular porque ele é adorável mesmo. Aqui em Montes Claros, na minha turminha de meninas, ele também era popular. Os Beatles todos eram populares, a bem da verdade. Mas tinha aquela coisa de " meu beatle preferido", o que sempre achei bobagem. Tive de escolher um porque me disseram que era preciso. Bom lembrar que, naquele tempo, ter um Beatle preferido não significa não gostar dos outros. Não era como atualmente com tanta gente dizendo coisas incompreensíveis como " eu gosto dos Beatles, menos de Paul". Se não gostam de Paul então não gostam dos Beatles.
    George Harrison era o campeão aqui na turma. Era o preferido da maioria. Depois vinha Paul e depois vinha Ringo. Está em terceiro lugar não significava não ser popular. Era muito popular. John era o único que não era o preferido de nenhuma das minhas amigas Beatlemaníacas. Mesmo assim, todas nós, gostavamos dele. Só não era o numero um. Eu gostava tanto deles que sonhei me casando com os quatro. Não poderia ser com apenas um. Beatles tinha de ser Ringo, John, Paul e George.
    Ringo também, ouvi dizer, era o mais popular na França.
    Agora...eu juro que não sabia que Long Tall Sally era um transexual. Que interessante.
    A informação que eu tinha sobre aquele dia do encontro oficial entre John e Paul era que a música tocava por Paul para John logo na chegada foi Twenty Flight Rock, ou algo assim. Não sei se o nome é esse, mas é parecido. Letra imensa. E Paul sabia toda sem errar. Ele tocou outras depois, mas foi essa que causou a primeira impressão devido a Paul saber a letra. Não Long Tall Sally. E com certeza Paul a escolheu de propósito para mostrar isso pois já tinha percebido que John tinha problemas com letras. No show na praça da igreja ele inventava as letras na hora.

    ResponderExcluir