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quarta-feira, 30 de junho de 2021

Rain... I don't mind!

 Esta é a 4ª canção da coletânea Past Masters #2, 15º Álbum Oficial dos Beatles

a história do álbum, assuntos e canções, aqui neste LINK

É uma de 6 canções que falam sobre o estado da Mente

                                        as demais 5 canções de mesmo Assunto e Classe, neste LINK

Atenção, canções com títulos em vermelho 

são links que levam a análises sobre elas.

4. Rain (Self Mind Song by John Lennon)

John conta 'Chuva, eu não ligo. Brilhe, o tempo está bom. Você pode me ouvir que quando chove ou brilha o sol é só um estado da mente. Pode me ouvir, pode me ouvir?
 
Chuva ou sol é só um estado da mente. Não importa, o que vale é seu estado mental. Inspirada por uma chuva torrencial na Austrália, onde estiveram em turnê, que fez John pensar, Rain é considerada o melhor Lado B dos Beatles. Veja bem, apesar de terem inaugurado a era dos Double A Sides no ano anterior com We Can Work It Out e Day Tripper, o lançamento de Rain junto com Paperback Writer no Lado A não é considerado um deles. Rain é Labo B mesmo, e ela merece a alcunha de melhor de todos. Tem ótimos desempenhos do baixo de Paul e da bateria de Ringo, tem a inovação técnica desenvolvida intramuros Abbey Road, de sigla ATOC, que faz com que a voz de John fosse ouvida mais alto, e foi também a primeira vez em que se ouvem trechos tocados em reverso na história da música, que ficou marcante na canção. Além de harmonias vocais sensacionais! Além disso, seu vídeo promocional era uma coisa inédita, a ponto de George dizer, anos depois: 'Nós inventamos a MTV!'.  Nota-se no vídeo um Paul com uma cicatriz no lábio, proveniente de um acidente de moto uns meses antes, que foi o gerador do boato 'Paul is Dead' que se desenvolveu ao longo dos anos seguintes, com evidências 'claríssimas' de que ele era um sósia, especialmente nas capas de Sgt. Peppers e Abbey Road. Ai ai ai... 
 
Bem, o que está escrito até este ponto foi o que eu encontrei no capítulo de minha saga que listava as Self Mind Songs. Não me arrependo de classificá-la assim, embora analisando melhor, poderia muito bem tê-la colocado no grupo das Speech Songs, na Classe Pessoa ou Grupo, porque lá no meio ele se dirige a alguém, como no Verso 3: "I can show you that when it starts to rain, everything's the same, I can show you, I can show you." e no Verso 4: "Can you hear me that when it rains and shines, it's just a state of mind, can you hear me, can you hear me?", explicando o que ressaltei no começo. Não adianta reclamar se chove, 'Aproveite cada momento! Está tudo em sua mente!', aliás, esse trecho bem poderia ter sido escrito por George, nosso místico Beatle. 
 
Falando em Versos, é uma boa hora pra comentar a estrutura da letra. O 1º e o 2º Versos abrem a canção e são críticas ao comportamento dos que acham a chuva uma coisa ruim, aliás, eu mesmo me questiono por que a gente diz: "Nossa, como o tempo está feio!" Feio, por quê? É muito relativo! No 1º Verso, John até diz que tem gente que preferia estar morta a testemunhar um dia chuvoso, um exagero, mas que teve ótimo efeito na letra, veja: "If the rain comes they run and hide their heads, they might as well be dead. If the rain comes, if the rain comes." E no 2º, ele diz que quando o sol brilha, eles correm pra fora pra sorver suas limonadas à sombra, hehehe: "When the sun shines they slip into the shade, and sip their lemonade. When the sun shines, when the sun shines.". Todos esses versos são entremeados pelo magnífico refrão que resume o estado de mente do autor, duas vezes, a primeira após o Verso 2, a outra entre os Versos 3 e 4: 
 
"Raaaain, I don't mind! Shiiiiine, the weather's fine!" 
 
Essa pérola de letra foi feita por John, mas Paul reclama um 30% de participação, o que lhe pode ser atribuído, pois houve uma sessão de trabalho dos dois sobre ela, na casa de John, em Weybridge. Ela ganhou vida em duas sessões de estúdio, a 1ª no dia 14 de abril de 1966, um dia trabalhoso, onde após 5 horas dedicadas ao Lado A do compacto, passaram ao Lado B por outras 5 horas, onde foi feita a base, com John e George em suas guitarras (base e solo, porém sem seção solo), Paul no baixo e Ringo em sua bateria. Paul melhoraria sua linha de baixo em posterior overdub, mas Ringo não precisou: ele estava possuído e entregou, naquela noite/madrugada aquele que ele mesmo considera seu melhor desempenho da carreira como baterista! Note logo no começo, no destaque da introdução que ele abre solo, na caixa, e logo depois que entram os demais, ele dá uma virada ainda na caixa (a la atração de circo) para introduzir o 1º Verso. Ao longo dele, ele dá mais quatro viradas, estava inspirado o rapaz. E ele parece que gostou da ideia e segue virando nos demais versos, variando a quantidade, a duração, e as batidas, sempre inovando, às vezes abrindo as viradas no chimbal (hit-hat). Legal que nos refrões, é Ringo quem os abre com batidas nos dois pratos na primeira nota ("Rain") e depois fica quieto, deixando o show para o baixo de Paul, mas logo fica com saudade e retoma com outra espetacular virada para introduzir, ou a 2ª parte do refrão ("Shine"), ou o verso que vem depois. Um espetáculo, de verdade. 
 
O tal 'show' no baixo de Paul veio na sessão seguinte, dois dias depois, que durou 11 horas (!) integralmente dedicadas a overdubs à canção. Tanto durou a sessão pois foi objeto de muita experimentação. Uma delas foi o uso de um alto-falante na saída do amplificador do baixo, fazendo o instrumento soar como nunca antes. E Paul se inspirou, floreando suas linhas de baixo de três modos diferentes nos três primeiros versos, e variando inclusive nos refrões: no primeiro, bate 16 notas Sol, uma em cada tempo, mas no segundo, faz 8 tercinas descendentes (meu filho explicou que são queálteras de 3, uau!), Sol-Re-Sol, ou seja, colocando 24 notas no mesmo espaço que as 16 do 1º refrão. Genial! Rogo especialmente que, ao ouvirem, USEM FONES DE OUVIDO. Os alto-falantes de equipamentos multimídia raramente têm energia mecânica suficiente para reproduzirem essas nuances maravilhosas. Sem fones de ouvido, não ouviam o baixo! Outros Beatles também deram show naquela sessão. Ringo (novamente), agora num pandeiro muito bem colocado, e os outros 3 nos vocais! O vocal principal, claro, é de John, dobrado artificialmente nos versos, e harmonizado com ele mesmo nos refrões. Paul e George se juntam a John, em harmonia tripla, nas respostas ao vocal principal de John durante os versos 2 ( “when the sun shines down.”, depois "sun shines"), 3 (“when the rain comes down” , depois "show you") e 4 (“when it rains and shines” e "can you hear me"). 
 
Finalmente, o tal vocal reverso. Era prática comum entregar aos compositores (se eles assim o requisitassem) uma cópia do som que gravaram num dia para que ouvissem em casa e buscassem oportunidades de melhoria. Os quatro Beatles tinham um equipamento apropriado em casa. Assim foi feito na madrugada daquele dia 14. Ao chegar em casa, meio chapado, ao montar a fita no gravador, ele o fez ao contrário. Muitos não saberão do que se trata essa operação, só os mais velhos, ou os curiosos deste tempo facilitado pela tecnologia digital. A fita vinha num carretel, toda enroladinha, e com seu final soltinho, aí você colocava o carretel no equipamento e, manualmente, acoplava aquela ponta solta num local apropriado para que fosse sensível ao cabeçote de reprodução ou gravação. Sugiro até que vejam no YouTube. Só que existe uma forma certa de se encaixar o carretel, assim ou assado, do outro lado. O fato é que John a colocou assado, e ao dar play, a fita começou ao rodar ao contrário. E John fez uma viagem. E achava que era produto da maconha que estava em sua mente. Ficou extasiado! E na sessão seguinte, disse: "Quero isso na minha canção!". Havia acabado de acontecer uma 'serendipity', tenho até um post em que explico o termo (LINK). Eles passaram aquele dia brincando com a novidade de tocar em reverso tudo, todos os instrumentos e vocais, mas o que sobrou na canção foi aquilo que se houve após o Verso 4, que é o trecho “when the rain comes they run and hide their heads.” tocado ao reverso. Ainda vem um "Rain" em falsete triplo, e mais um reverso de “when the sun shines,”. A técnica seria usada muitas vezes pelos Beatles e, claro, por muitos outros artistas que beberam da mesma fonte. 
 
O compacto Paperback Wtriter / Rain foi lançado em 30 de maio na Inglaterra e 10 dias depois nos EUA. Foi Nº 1 apenas em UK. A canção Rain não passou da posição 23 na Billboard, acho que os americanos não entenderam a mensagem e a soberba técnica utilizada, enfim. Nos países de língua hispânica, foi lançado como na imagem, não me canso de divulgar. É muito engraçado! 
 
'Lluvia' nunca foi tocada ao vivo pelos Beatles, mas felizmente houve filmes promocionais. Escolhi este (LINK) porque eles estão dublando razoavelmente bem, dá pra notar um pouco da febre de Ringo na bateria e finaliza com um sorridente Lennon dublando o vocal reverso no final!

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