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segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Economia do Petróleo - O Risco

Original de 2017...
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Encomendaram-me um artigo com as perguntas abaixo listadas:
O que é petróleo? Qual a sua composição química? Como foi formado? Como é encontrado na natureza? Como é feito o estudo geológico para encontrar o óleo? Em quais tipos de rochas se pode encontrar petróleo? Quais são as principais características que as rochas apresentam e que são indicativos de encontrar petróleo e gás natural? Se for mais de uma, quais são as diferenças entre elas? Quais são as características que um poço precisa ter para que seja considerado um poço comercialmente viável? (*) Como é feito esse estudo? O que é pré-sal? Qual a diferença entre as demais áreas em que se encontra petróleo?

Ao invés de responder uma a uma, no velho estilo Q&A, preferi responder apenas uma delas... a que está em vermelho ... com um texto só passeando pelos vários aspectos que determinam a viabilidade de um campo de petróleo, tentando passar por todos os demais pontos questionados ao longo dele...

E vou publicá-lo aqui em uns poucos capítulos .... pode ser?
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Antes, um breve alerta, explicando o (*) acima: não se aplica o termo 'viabilidade' a um poço de petróleo, mas, sim a um campo de petróleo, que pode ter um ou mais poços produtores. Vou modificar aqui a pergunta para: o que é preciso saber para se determinar que vale a pena perfurar um poço de petróleo?

Desde já, deixo aqui um disclaimer: não espere encontrar aqui um tratado técnico detalhado sobre o tema, a intenção foi apenas apresentar alguns aspectos dessa indústria, pra quem só ouve falar sobre ela, e não tem ideia da magnitude desse mundo, que começa lá debaixo da terra. Os puristas que me perdoem! Ah, e também releve o estilo leve... esse é meu estilo de escrever...


Capítulo 1: O Risco 


Em primeiro lugar, claro, para um campo ser viável, o petróleo precisa existir! A responsabilidade de se encontrar petróleo é do Segmento Upstream da Indústria, que investiga as possibilidades de existência de petróleo, perfura poços e, caso confirmada sua presença em quantidade comercial, produz o petróleo, processa e trata óleo e gás natural no estado bruto para entregá-los ao Segmento Downstream, que produz os derivados que serão consumidos pelo mercado. Mais recentemente, dá-se destaque também ao Segmento de Midstream, responsável pelas entregas entre segmentos, utilizando as mais variadas modalidades, sem mexer com as propriedades do que carrega.

A possibilidade de se encontrar petróleo depende da conjunção de alguns fatores da natureza, independentes entre si, que têm que estar presentes simultaneamente. De um modo geral, avalia-se a existência pela análise de 5 fatores: a geração, a migração, o fechamento, o reservatório e o ’timing’ da ocorrência deles todos. Para colocar numa linguagem lúdica, o petróleo tem que nascer, viajar, encontrar um obstáculo que será sua morada final e tudo tem que ocorrer com sincronismo para se propiciar que o ouro negro se encontre na região que é de sua propriedade, pronto para ser explorado pelo homem.

Então, vamos lá, ponto a ponto. 

Geração (O Nascimento)

O petróleo nasce na Rocha Geradora, uma rocha argilosa ou carbonática, mormente folhelhos, siltitos, e calcilutitos, portadoras de matéria orgânica. Carcaças de animais e principalmente vegetais (algas em destaque), mortos há milhões de anos, são soterrados por quilômetros de camadas rochosas ao longo do tempo. A ação da pressão dessas camadas, associada a temperaturas que variam de 80 a 200 graus Celsius, faz com que tal matéria orgânica se transforme em compostos de hidrogênio e carbono, os hidrocarbonetos, elementos básicos do petróleo, o chamado ouro negro, que pode apresentar-se na forma líquida (óleo), semi-sólida (betume) ou gasosa (gás natural). A triste realidade: nós, ainda que com pequena contribuição, poderemos ser o petróleo do futuro! Não há como escapar!

Migração (A Viagem)

Após a geração, o petróleo convive com água salgada nos poros da rocha geradora até que é expulso (migração primária) para as rochas carregadoras ou para falhas, por diferencial de pressão. O petróleo busca sempre um ponto de menor pressão e, por isso, o caminho é geralmente ascendente, em direção à superfície, mas pode ser levado a quilômetros de distância (migração secundária). Se sua alegre viagem acontece sem obstáculos, em passo de tartaruga geológica, o petróleo pode chegar até a superfície já na forma asfáltica, por vir perdendo seus componentes voláteis, o que ocorre por vezes. Em inglês, chamado ‘oil seep’. Aliás, os primeiros ‘óleos’ descobertos foram achados assim.

Fechamento (O Obstáculo)

O petróleo caminha até que encontra um impedimento para prosseguir: uma trapa ou um selo. As trapas são divididas em dois grandes grupos: i. as trapas estruturais, compostas por dobramentos ou falhas selantes, provocadas por movimentos da crosta terrestre e  ii. as trapas  estratigráficas,   que bloqueiam o petróleo por variações na litologia, ou,  em outras palavras, nas propriedades das rochas, o que pode ocorrer por fenômenos diversos. No momento em que encontra um obstáculo, também chamado de ‘selo’, o petróleo interrompe seu caminho e a mesma rocha que testemunhara sua viagem, agora o acumula, e  muda, levianamente, sem razão aparente, sua identidade: é, agora, o reservatório!

Reservatório (A Morada Final) – ou O Campo de Petróleo

Não, o petróleo não se encontra em grandes lagos subterrâneos! O reservatório de petróleo nada mais é que uma rocha porosa, uma rocha com espaços preenchido por fluidos. Se os poros são intercomunicáveis entre si, diz-se que a rocha é permeável. No reservatório, o óleo, por ser mais leve, segrega-se da água e se instala em sua porção superior. O gás, mais leve ainda, pode sair de solução e fica lá no topo. Um bom reservatório tem porosidade mínima de 10% e a máxima não passa de 35%. Arenitos e conglomerados (como os turbiditos) são tradicionais rochas-reservatório. Ser ou não ser um bom reservatório .......... eis a questão do risco!

Timing (Sincronismo)

Os fenômenos descritos até aqui não ocorrem da noite para o dia! A escala de tempo aqui é geológica e a unidade é milhão de anos! Além de ser necessária a ocorrência de todos eles, tudo tem que ter acontecido na ordem correta. A estrutura tem que estar pronta para conter o petróleo que migrou após ter nascido na rocha geradora e de lá ter sido expulso. Um exemplo comum de falta de timing: há geração, o petróleo migra e somente depois ocorre a estruturação. A esta altura, o querido ouro negro já está a léguas de distância, em busca de outro ombro amigo, na propriedade alheia!


Geólogos e Geofísicos (tratá-los-emos aqui pelo termo que engloba as duas categorias, Geocientistas) têm ferramentas (e muita imaginação!) para inferir a probabilidade de ocorrência de cada um destes fatores fundamentais para a ocorrência de petróleo. A cada ponto, em um exemplo numérico, estará um percentual, referente a tal probabilidade: 
    
    Geração -100% (o cara tem certeza que o petróleo foi gerado)
    Migração - 60%
    Fechamento - 70%
    Reservatório - 80%
    Sincronismo - 60%

Pronto! O petróleo só estará lá em baixo, quietinho, esperando que o bondoso homem venha mostrar-lhe a luz do sol se, e somente se, todos os componentes do risco ocorrerem, simultaneamente! Como são todos fatores independentes, a probabilidade total é o produto das probabilidades individuais! Portanto, o risco que o investidor encara, de encontrar petróleo em sua propriedade, neste exemplo numérico, é a multiplicação 100% x 60% x 70% x 80% x 60%, que resulta, sim, em APENAS 20%. Ou seja, ele sabe que tem um risco de 80% de não encontrar nenhum petróleo ali, onde ele precisa que esteja, em sua propriedade!

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